sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

código da vinci VIII

FEMININO SAGRADO

Há outras interpretações possíveis do quadro de Leonardo da Vinci, “Última Ceia”, além daquela dada pelo autor do livro “O Código Da Vinci”. O escritor e os seus contestadores deixaram de extrair algumas conseqüências dos seguintes fatos: (i) o quadro ter sido pintado na parede do refeitório de um mosteiro em Milão; (ii) a homossexualidade de Leonardo, da qual Amy prefere duvidar, insinuando que houve um único episódio de sodomia.

A pintura é uma criação artística de Leonardo e não o retrato da ceia de Jesus com os apóstolos. Leonardo não esteve presente à santa ceia. Jesus e os apóstolos não posaram para o pintor. Os tipos pintados naquele quadro saíram da criatividade e da sensibilidade do artista. Ninguém sabe como eram os traços fisionômicos e demais características físicas de Jesus e dos apóstolos. Caminhando e pregando sob sol e intempéries durante 3 anos, na cidade, no campo, na montanha, no deserto, Jesus, provavelmente, não teria a pele alva. Seus olhos podiam ser verdes, azuis ou castanhos. O seu cabelo podia ser claro ou escuro, liso ou ondulado. Sabe-se que era comprido por causa do voto nazareno. Estatura alta ou baixa. Compleição física franzina ou robusta, mas vigorosa para agüentar as caminhadas, as reuniões, o magistério, os confrontos nas ruas e no templo e o suplício da crucifixão. O seu aspecto parecia não ferir o senso estético das mulheres e das crianças.

Leonardo passou o viés andrógino à sua pintura. O primeiro apóstolo à direita de Jesus, na pintura da santa ceia, não é o único com feição e gestos efeminados. Esse apóstolo seria João, o “discípulo amado” de Jesus. O curioso é que essa expressão encontra-se, apenas, no evangelho de João, que outorgou esse título a si próprio. Os demais apóstolos também eram amados. Na época da última ceia, João era um jovem imberbe e genioso. O terceiro apóstolo à esquerda de Jesus parece-se com mulher tanto quanto João. Os traços finos e os longos cabelos dourados dão-lhe acentuado toque feminino. Quanto aos seios de João (Madalena, segundo o escritor), ficam por conta da imaginação do intérprete do quadro. O segundo apóstolo à esquerda de Jesus também está com o lado esquerdo do corpo virado para a mesa e parece mostrar mais volume de seios do que João. Na realidade, são dobras da túnica.

A letra V, símbolo da feminilidade (cálice), realmente, pode ser imaginada no espaço entre Jesus e João (Madalena). Invertida, essa letra passa a ser o símbolo da masculinidade (espada). O cálice: Maria Madalena. A espada: Jesus. Contudo, outras letras podem ser encontradas no quadro, se pintadas com a imaginação do intérprete. O fato de os artistas, por vezes, colocarem mensagens ocultas em suas obras, pode levar os críticos e intérpretes a versões fantasiosas. A figura de Maria Madalena fascina algumas pessoas, todavia, enxergá-la no quadro de Leonardo parece exagero. Os 12 apóstolos eram homens: Simão (Pedro), Tiago (filho de Zebedeu), João, André, Filipe, Bartolomeu, Mateus, Tomé, Tiago (filho de Alfeu), Tadeu (Judas), Simão (o Zelador) e Judas Iscariotes. Com a morte de Judas Iscariotes, um homem (Matias), não uma mulher, foi eleito pela assembléia dos discípulos para sucede-lo (Atos 1: 15,26). Isto reflete a cultura patriarcal da época. Leonardo foi fiel ao número de apóstolos. Tudo o mais naquele quadro é fruto da sua criação artística. A pista sobre o feminino sagrado e o santo graal foi pavimentada pela imaginação e a licença artística do autor de “O Código Da Vinci”.

Os evangelistas não descrevem o local da ceia, o tipo de mesa e a posição que nela ocupou cada apóstolo. Informam, apenas, que foi no andar superior de uma casa, em uma sala mobiliada. A mesa principal poderia ser redonda, retangular ou em forma de ferradura. Pela descrição contida nos evangelhos, a ceia pascal era a costumeira: vegetal, carneiro, pão, vinho e canto dos salmos. Todavia, Jesus introduz um novo simbolismo naquela ceia. Em dado momento, divide um único pão entre os comensais, circula um único cálice de vinho em que todos beberam e lava os pés dos apóstolos. Comunhão, serviço, humildade, fraternidade. João foi prolixo no capítulo da última ceia e o único evangelista a se referir à lavagem dos pés.

Ao narrarem a última ceia, os evangelistas omitiram as mulheres, quiçá em virtude da disputa entre Pedro e Maria Madalena pela liderança do grupo. Segundo os costumes da época, as mulheres exerciam papel subalterno; eram coadjuvantes. A liderança feminina podia acontecer de fato, mas não de direito. A presença de mulheres naquela ceia pascal é de alta probabilidade, inclusive no preparo dos alimentos e na arrumação da sala. Elas acompanhavam Jesus em todos os lugares, desde a saída da Galiléia; faziam parte da comunidade formada pelo mestre, apóstolos, discípulos e simpatizantes. Considerando que a assembléia da comunidade jesuítica naquele período contava, pelo menos, com 120 membros (Atos 1:15), participaram da cerimônia, certamente: (i) o mestre e os 12 apóstolos, integrantes do círculo interno, na mesa principal; (ii) discípulos de ambos os sexos, integrantes do círculo externo, em mesa(s) suplementar(es). O patriarcado, na Palestina, era instituição muito forte. Basta ver o modo autoritário como Jesus se dirige à sua mãe, quando procurado por ela e seus irmãos. Na cruz, essa atitude não mudou (João 19:26). Jesus colocou a mãe sob os cuidados de João, um jovem adolescente. Jesus fala do Pai Celestial. Jamais mencionou a Mãe Celestial. Na tradição esotérica, a Terra simboliza a Deusa-Mãe, e o Sol, o Deus-Pai.

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