quarta-feira, 30 de julho de 2014

FILOSOFIA XIII - 10



EUROPA (1600 a 1800). Continuação.

Os movimentos inspirados em idéias e sentimentos profanos e religiosos foram lastreados no comportamento da economia medieval. Esta se desenvolvia em favor da comunidade, sem objetivo de lucro, com pequeno acréscimo no justo preço como remuneração do mercador. Daí, o caráter estático dessa economia. As cidades italianas que mantinham o monopólio do comércio no Mediterrâneo cobravam caro pelos produtos vindos do Oriente (sedas, perfumes, especiarias, tapeçarias). Os mercadores espanhóis e portugueses procuraram descobrir novas rotas para o Oriente fora da área dominada pelos italianos. A utilização da bússola e do astrolábio trouxe maior segurança aos navegantes para se aventurarem no alto mar. Desde o século XII, nos ambientes cultos, sabia-se da esfericidade da Terra. Somente o vulgo ainda acreditava que a Terra era plana e que depois da linha do horizonte havia o abismo. Espanhóis e portugueses incluíam nas suas viagens o objetivo da catequese religiosa. Com o comércio internacional gerado pelas novas rotas, a economia se dinamiza e o lucro é liberado. Esse fato é conhecido como “revolução comercial” (1401 a 1500). Essa revolução lançou os fundamentos do capitalismo moderno. Ganhar dinheiro tornou-se um fim em si mesmo e acumular fortuna, um ideal aceito e almejado. A razão – e não a fé religiosa – domina a economia. O planejamento é sua técnica. O mundo profano é a pátria do dinheiro e do trabalho útil. A atividade econômica rompeu os vínculos de subordinação com a igreja e a moral. Indiferente ao pecado, o lucro é o principal e legítimo objetivo do negociante. A ambição de ganho condenada como turpitudo por Tomás de Aquino, agora é vista como vocação e mérito do homem de negócios. A busca e a posse de metais preciosos, o aumento dos preços, a jogatina no mundo dos negócios, a riqueza pessoal como válido propósito da vida, tudo isto passou a integrar o novo capitalismo.

O lucrativo comércio com o Oriente e a disputa entre Portugal e Espanha por riqueza e pelo domínio do novo mundo descoberto pelas viagens marítimas despertou outras nações para a navegação (França, Inglaterra, Holanda). Apesar de a América ter sido descoberta pelos povos da Escandinávia por volta do ano 1000, coube ao genovês Cristóvão Colombo a descoberta em nome dos reis da Espanha para fins de domínio territorial, exploração econômica e catequese (1492). O pioneirismo da navegação oceânica organizada coube aos portugueses nos meados do século XV. Logo foram seguidos pelos espanhóis, ingleses, franceses e holandeses, fundadores de colônias nos continentes americano, africano e asiático. Os metais preciosos oriundos do tesouro dos Incas, dos Astecas e das minas do México, da Bolívia e do Peru, aumentaram as reservas nos cofres europeus. Toda aquela região americana estava sob o domínio espanhol. As relações entre colônia e metrópole ajudaram na construção do capitalismo europeu. A acumulação de riqueza para inversão futura com o propósito de lucro é característica do capitalismo que atinge a maturidade no século XIX (1801 a 1900).

A revolução comercial inclui o sistema bancário. O empréstimo de dinheiro como atividade comercial acontece na Europa no século XIV (1301 a 1400). Começa com algumas casas comerciais em cidades italianas. Depois, o governo também se dedica à atividade bancária, como na Suécia (1656) e na Inglaterra (1694). As casas comerciais italianas introduzem na circulação econômica as letras de câmbio e o cheque. Isto facilitou as trocas nacionais e internacionais. A mineração, a fundição e a tecelagem se despregam do sistema corporativo quando o capitalista se torna proprietário das ferramentas e das máquinas. Os operários são contratados e recebem salários. Assistência social e garantia trabalhista não existem. Na indústria de tecelagem adota-se o sistema doméstico de produção capitalista. Os mercadores associam-se para monopolizar certa atividade comercial em alguma parte do mundo, sem personalidade jurídica. Submetem-se a riscos comuns e comprometem parte dos seus recursos. Contribuem para a manutenção de docas, armazéns e para a defesa contra quem pretendesse quebrar o monopólio. A associação era disciplinada mediante regras acatadas por todos os membros. A sociedade por ações sucedeu esse tipo de companhia. Algumas dessas companhias tinham patentes. O governo lhes concedia o monopólio comercial e o privilégio de exercer autoridade sobre a população colonial. Graças ao privilégio, a Companhia Inglesa das Índias Orientais governou a Índia como se fosse um Estado particular até 1784.

Outra característica da revolução comercial foi uma eficiente economia monetária. Dificilmente moedas eram aceitas fora da cidade em que circulavam. A partir de 1300, o ducado (Veneza) e o florim (Florença) começaram a circular e ser aceito em toda a Itália e na Europa Setentrional. A experiência frutificou. O comércio e a indústria exigiam sistemas monetários estáveis e uniformes para se desenvolver. Os Estados mais importantes adotaram padrão de dinheiro para ser usado nas transações. A Inglaterra iniciou a cunhagem uniforme durante o reinado de Elizabeth. Na França, o procedimento da cunhagem completou-se na época de Napoleão. A revolução comercial inclui o mercantilismo, modelo de economia em que o governo intervém para estimular a prosperidade nacional e aumentar o tesouro do Estado (erário). Os mercadores apoiaram os reis e obtiveram vantagens. A monarquia absoluta atendia aos interesses dos mercadores associados aos empreendimentos do rei.

O mercantilismo apoiou-se na idéia de a prosperidade da nação ser determinada pela quantidade de metais preciosos existentes dentro dos seus domínios e à sua disposição. Essa doutrina foi inspirada na prosperidade e no poder da Espanha, cuja fortuna parecia resultar da abundância de metais preciosos oriundos das colônias americanas. O Estado que não tivesse metais preciosos obrigava-se a incentivar a produção industrial e exportar mais do que importar mercadorias. Desse modo, acumulava a prata e o ouro resultantes da balança comercial favorável. O mercantilismo implicou nacionalismo, protecionismo e imperialismo. Para ser forte a nação devia depender o menos possível das mercadorias estrangeiras. O governo devia controlar os salários, as horas de trabalho, os preços e a qualidade dos produtos, bem como, incentivar o crescimento da população. Os pobres deviam servir como operários e soldados. A caridade ou o espírito de justiça estavam ausentes da relação entre as camadas alta, média e baixa da sociedade. As colônias forneciam matéria-prima e consumiam os produtos vindos da metrópole. O Estado ganhava mais do que os mercadores.  Os atos de navegação de 1651 e 1660, expedidos pelo governo britânico, tinham por objetivo garantir o monopólio do transporte de produtos da colônia para a metrópole e que certos produtos, como o tabaco e o açúcar, viessem diretamente para os portos da Inglaterra onde seriam pagas as taxas alfandegárias. O espírito dessas leis era o de que as colônias serviam para enriquecer a metrópole. A França, sob Luiz XIV, conheceu e aplicou amplamente o mercantilismo (1643 a 1715). O grande maestro da economia dessa época foi o ministro Jean-Baptiste Colbert. Sendo o Estado francês a encarnação do absolutismo, a tarefa de Colbert ficou facilitada. O mercantilismo foi a expressão econômica lógica do absolutismo político.    

domingo, 27 de julho de 2014

SELEÇÃO



Depois da derrota da seleção brasileira na Copa de 2014, entidades esportivas, jogadores, treinadores, torcedores, jornalistas, bradam por mudanças imediatas no futebol brasileiro. Essas mudanças podem ser de dois tipos: estrutural e funcional. 

A mudança estrutural é a mais urgente. Inegável e insofismável o interesse nacional na organização da seleção brasileira de futebol. Entre os objetivos fundamentais da república brasileira está o de promover o bem de todos. O bem cultural entra nessa pluralidade, incluído na ordem social. O futebol é um bem cultural da nação brasileira. A sua transferência da esfera privada para a esfera pública ampara-se nos dispositivos constitucionais que estabelecem como dever do Estado a democratização do acesso aos bens culturais e o fomento às práticas desportivas. O novo dispositivo a ser introduzido na Constituição com base nesses preceitos dará tratamento específico à seleção ante o seu alto valor para a cultura popular. A seleção refletirá a vontade do povo e não a caprichosa e autocrática vontade do presidente da Confederação Brasileira de Futebol - CBF. Emenda à Constituição Federal poderá introduzir o artigo 217-A, criando um órgão estatal de composição mista: pessoas indicadas pela Câmara dos Deputados, pelo Ministério dos Esportes, pela CBF e por associações de árbitros, jogadores e jornalistas. Esse órgão colegiado, autônomo e representativo terá a exclusiva competência de organizar e administrar a seleção. Por representar o Brasil de modo significativo no cenário mundial a seleção não deve mais ficar na esfera privada. O novo órgão propiciará benéfico distanciamento dos interesses econômicos privados. A seleção livrar-se-á das idiossincrasias dos dirigentes da CBF. A formação do elenco dependerá menos da simpatia ou antipatia de tais dirigentes em relação aos jogadores. Simpático ou não, lobo ou cordeiro, o atleta selecionado deve estar em forma, exercer bem a sua função em campo e manter os laços de solidariedade e urbanidade com os membros da equipe.

A mudança funcional ocorre normalmente quando a seleção brasileira sai perdedora em copas do mundo. Mudam o treinador, a comissão técnica e jogadores. Assim foi no passado e assim acontece no presente. Convenhamos: há mérito em obter o lugar no torneio mundial com 32 seleções de nível médio e superior. Nas 20 edições da copa do mundo as seleções brasileiras perderam 15, fato que os torcedores sepultaram no fundo da memória (com exceção da derrota sofrida em 1950). Os torcedores gostam de recordar somente as 5 vitórias das quais apenas duas foram consecutivas (1958 e 1962). O novo treinador (Dunga) é tão bom quanto os antecessores e outros treinadores em atividade. Convocar jogadores jovens e veteranos desde que todos estejam em plena forma física, técnica e psicológica foi iniciativa sensata. Ele provou sua qualificação ao dirigir a seleção de 2010. Imaturos, Ganso e Neymar não foram convocados naquela ocasião. Posteriormente, verificou-se o acerto da exclusão. Na partida final do torneio mundial de clubes os dois já entraram derrotados do ponto de vista psicológico (18.12.2011). Suplicando as bênçãos do ídolo Messi, eles dobraram a espinha frente aos catalães. Ganharam um “chocolate” (4x0). Este não é o perfil de jogador adequado para uma seleção que outrora não se intimidava diante de adversários fortes ou de estrelas estrangeiras. O treinador Scolari também não convocou Ganso para integrar a seleção de 2014. Convocado, Neymar teve um desempenho discreto. O treinador Scolari porta bom currículo. Ao ser escolhido para dirigir a seleção ele foi aplaudido e incensado pela imprensa, a mesma que agora lhe aponta o dedo acusador. O atual treinador (Dunga) tem justo motivo para se manter reservado diante dessa imprensa volúvel e leviana.

A preocupação maior desse jornalismo chinfrim não é com a seleção e sim com a audiência das suas emissoras e com a venda dos jornais e revistas. Para satisfazer seus interesses esse jornalismo rompe com os limites da ética e do direito. Com petulância e desfaçatez os jornalistas dessa laia invadem a privacidade alheia, buscam saber a cor da cueca do jogador ou da calcinha da namorada, distorcem o que foi dito nas entrevistas e reportagens, perturbam o trabalho da equipe esportiva tomando-lhe o tempo e pretendendo impor-lhe diretrizes. O atual treinador é contra a badalação que desassossega o grupo. Tal qual Leonel Brizola, gaúcho como ele, Dunga não se deixa seduzir pela luz dos holofotes, não se conduz pela conversa e nem se intimida com a agressividade e a pressão desses jornalistas. Tampouco se impressiona com jornalista do tipo folgado e gozador que se vale do deboche como armadura para esconder frouxidão e covardia. Por tudo isto, a ala carnavalesca da imprensa não gosta do treinador Dunga e não perde ocasião para fustigá-lo. Jornalistas mequetrefes aproveitam-se da profissão para excretar ódio e veneno pela boca. Manipulam consultas ao povo para provar falsamente a rejeição do treinador e indispô-lo com a opinião pública. Contra a evidência dos fatos, essa malta de difamadores esforça-se para desqualificar o bom trabalho desse treinador. Patrulhamento indecoroso. Jornalismo da pior espécie.

Dentre os poucos esquemas táticos existentes, cada treinador escolhe o da sua preferência. Há esquemas ofensivos, há esquemas defensivos e há esquemas que conciliam os extremos. Os brasileiros imitam os estrangeiros no coletivo. Os estrangeiros tentam imitar os brasileiros no individual. Fundada no caráter coletivo do futebol, a robotização aprimorou a técnica do conjunto e reduziu o espaço da criatividade individual e do improviso. A seleção holandesa de 1974 foi o primeiro modelo. Depois, veio o modelo espanhol (2010) e, agora, o alemão (2014). Apesar do longo preparo, a seleção germânica penou para vencer a platina. O sofrido gol da vitória, único da partida, só aconteceu no final da prorrogação.

No que tange à disciplina em campo, as mudanças mais urgentes estão na regra do impedimento e na punição da violência. Só o impedimento passivo conhecido como “banheira” deve permanecer como infração. A maliciosa esperteza viola o dever de lealdade. A nova regra ou a interpretação da regra atual deve considerar legal a invasão do espaço desprotegido quando: (1) ocorre na seqüência da jogada a partir do espaço protegido; (2) for subseqüente à cobrança de falta ou de escanteio; (3) a defesa se afasta para deixar o adversário sozinho no momento do lançamento da bola. Diante desta mudança a defesa omissa não será mais beneficiada, a malandragem em campo não terá sucesso, as jogadas bonitas não mais serão interrompidas porque o atacante está com a ponta da chuteira no espaço desprotegido, a arbitragem exibirá a face mais séria e pedagógica do esporte e muitos equívocos prejudiciais ao espetáculo e ao resultado do jogo serão evitados. Cotovelada dolosa ou culposa no rosto do adversário deve ser punida com expulsão sem margem de tolerância. O jogador profissional deve ter habilidade suficiente para evitar que seu cotovelo, seu braço ou sua mão atinjam o rosto do adversário ainda que “sem querer”. A presunção de ingenuidade e inocência do agressor é incompatível com o nível profissional e com a realidade.  

Houve sensível melhora no rendimento das equipes em todo o mundo desde que se adotou, ainda no século XX, o planejamento tático, a análise dos jogos filmados, o ensaio das jogadas, a disciplina coletiva, a formação de jogadores a partir das categorias de base (infantil e juvenil). Aos jogadores são destinadas camisas, chuteiras e caneleiras de material e modelo especiais para maior conforto. Os jogadores de seleção e dos melhores clubes são assistidos por médicos, psicólogos, nutricionistas, massagistas e professores de educação física. Eles têm à sua disposição alimentação balanceada, aparelhos de ginástica de última geração tecnológica, acomodações higiênicas e confortáveis. O aprimoramento técnico deles exige disciplina, esforço, dedicação, repetição de movimentos à exaustão. Condicionam-se reflexos. A união da capacidade técnica com o talento faz um excelente jogador. Técnica se adquire. Talento é inato, mas inútil se não for cultivado.

sexta-feira, 25 de julho de 2014

FILOSOFIA XIII - 9



EUROPA (1600 a 1800). Continuação.

Na literatura, a maioria dos autores imitava as formas clássicas. Havia nas obras certo ardor pela razão. A escrita decorativa, empolada e artificial, subordinava o conteúdo à forma. A França foi o principal foco do classicismo na literatura. Seus expoentes foram: La Fontaine, Corneille, Racine e Molière. O primeiro (Jean de la Fontaine, 1621 a 1695), poeta, notabilizou-se por suas “Fábulas”. Satirizava os costumes sociais mediante a descrição de hábitos dos animais irracionais. Pierre Corneille (1606 a 1684) e Jean Racine (1639 a 1699) eram dramaturgos, autores de tragédias fundadas nos princípios da “Poética” de Aristóteles, enquanto exaltavam o ideal francês do século XVII (razão e força de vontade). Jean-Baptiste Poquelin (Molière, 1612 a 1673), destacou-se pela originalidade da sua comédia, penetrante crítica da natureza humana. O essencial da comédia, dizia ele, “é representar todos os defeitos dos homens e particularmente dos homens do nosso tempo”. Ridiculariza a pretensão daqueles que para subir na escala social afetavam cultura superior à sua inteligência, ou dos médicos que afirmavam ter competência infalível. Além desta predileção pela sátira, Molière mostrou, em algumas das suas peças, piedade e simpatia pelos desafortunados. Na Inglaterra, entre outros podem ser citados Milton, Pope e Defoe. O primeiro (John, 1608 a 1674), filósofo, poeta, puritano, influiu na revolução puritana, serviu ao governo Cromwell e pregava a moralidade como essência da beleza. Sua obra mais conhecida, “Paraíso Perdido”, é uma síntese das crenças religiosas da sua época e da epopéia da fé protestante. Advoga a responsabilidade moral do indivíduo e a sabedoria como instrumento da virtude. Quando as paixões triunfam sobre a razão, perde-se o paraíso nesta vida. Alexander Pope (1688 a 1744), poeta, deísta, mecanicista, acredita que a natureza é governada por leis inflexíveis, que o homem deve estudar e seguir a natureza a fim de colocar ordem nos assuntos humanos. Daniel Defoe (1660 a 1731), jornalista, escritor, ficcionista, autor de “Robinson Crusoé”, célebre obra, símbolo literário do liberalismo clássico e marco inicial da novela moderna.
A reação romântica ao classicismo na literatura começou com “Emílio” e “Nova Heloísa”, de Jean-Jacques Rousseau. Esse movimento repudia o intelectualismo e o formalismo, retorna à simplicidade e ao naturalismo, enfatiza os instintos e os sentimentos humanos. Para ser feliz, o homem devia se orientar pelo coração e não pela razão nas questões vitais. O homem comum e o campônio são glorificados. Compaixão pelo fraco e pelo oprimido. Deus é a causa primeira e a alma da natureza. Na literatura romântica alemã destacaram-se Schiller e Goethe. O primeiro (Friedrich, 1759 a 1805), em sintonia com o sentimento de independência da época, idealiza os feitos heróicos e glorifica as lutas pela liberdade. Desse teor é a sua mais conhecida obra: “Guilherme Tell”, drama da luta do povo suíço contra o domínio da Áustria. Johann Wolfgang von Goethe (1749 a 1832), poeta festejado internacionalmente por seu “Fausto”, livro que expõe uma pessoal filosofia e expressa o espírito da época moderna. O homem deve se libertar das imposições e prosseguir na busca de conhecimento e experiência.

A música ocidental, que teve seu início como arte da voz humana, surge no século XVII como arte instrumental (criação por meios mecânicos). Começam a orquestração e a ópera. Antecedido pelo cravo e pelo o órgão, como instrumento de teclado, surge o piano no século XVIII, cujas potencialidades foram aproveitadas por Mozart. No mesmo século, o violino chega à perfeição. Os violinos fabricados pelas famílias Amati, Stradivari e Guarnieri, do norte da Itália, jamais foram sobrepujados. Inspirada no drama grego e nos mistérios medievais, a ópera surge por volta de 1600. Representação teatral, cantada e musicada, a ópera se tornou divertimento popular de rápido e duradouro sucesso, fonte de emprego para músicos, cantores, cenógrafos, entre outros operadores. Uma das maiores figuras da música instrumental no século XVIII foi o alemão Johann Sebastian Bach, duas vezes casado, pai de 20 filhos (1685 a 1750). Apesar da sua genialidade e dignidade viveu na pobreza pela baixa remuneração que recebia como professor, diretor e executante. Dotado de inteligência e de imaginação acima do comum, zeloso, trabalhador e disciplinado, influiu no desenvolvimento da música, revolucionou a técnica de execução no teclado, difundiu a escala de intervalos iguais que possibilita a modulação da clave, inventou a moderna música para órgão e compôs canto coral com vistas à liturgia luterana. Outro magnífico organista foi G. F. Handel (1685 a 1759). Ele foi um dos poucos que teve sucesso financeiro como compositor e executante e êxito com a ópera italiana. Criou o moderno oratório (tratamento dramático de tema religioso). O seu mais famoso oratório foi “O Messias”.

No final do século XVIII, a composição de música instrumental toma formas aperfeiçoadas: sonata, concerto e sinfonia. Os compositores desse período não se mantiveram fiéis aos estilos das outras artes (barroco e rococó), entre eles os venezianos Albinoni (1671 a 1750), Marcello (1686 a 1739) e Vivaldi (1675 a 1741). Eles colocaram a forma a serviço da inspiração, privilegiaram a independência sem perder a elegância. Haydn e Mozart foram expoentes desse período. Ambos lutaram contra a pobreza e sofreram humilhações impostas por aqueles que desfrutavam superior posição social. Joseph Haydn, graças aos seus dotes naturais, conseguiu ver o seu valor reconhecido ainda em vida (1732 a 1809). Obteve conforto financeiro. Compôs para canto e para instrumentos. As mais notáveis composições foram os quartetos para corda e as sinfonias. Wolfgang Mozart, nascido numa família de músicos, prodígio musical que compôs aos cinco anos, tocou em público aos seis anos e publicou trabalhos aos sete anos, pautou sinfonia e ópera, morreu aos 35 anos, enterrado em vala comum e cheio de dívidas em conseqüência da vida dissoluta que levou (1756 a 1791).

Ludwig van Beethoven nasceu em Bonn, mas viveu por muito tempo em Viena (1770 a 1827). Infância pobre e infeliz, figura paterna ríspida, adolescência e maturidade cheias de dificuldade, formaram um temperamento rude, áspero, uma personalidade recalcada. Independente na ação e no pensamento, Ludwig não dobrava a espinha ante a aristocracia vienense. Por volta dos 30 anos a surdez começa a incomodá-lo e se torna completa nos últimos anos da sua vida. Isto não o impediu de compor, mas apenas de ouvir a sua música. Exímio pianista e improvisador, não podia mais tocar em público. A sinfonia e a música de câmera constituem suas mais numerosas composições. Combinou a forma clássica com o romantismo. A “Terceira Sinfonia” (ou Sinfonia Heróica) está entre as suas composições mais conhecidas e executadas. Franz Schubert nasceu e viveu em Viena (1797 a 1828). Assemelha-se a Mozart, tanto na curta existência quanto na sua melodia graciosa. As sinfonias de Schubert são ricas em lirismo e contrastes harmônicos. Compunha por instinto e rapidamente: óperas, missas, quartetos para cordas, sinfonias. Boêmio, romântico, produziu mais de 600 canções simples, universais, ricas de sentimentos. Ao invés de lhe trazer fortuna, a volumosa produção pouco lhe rendeu financeiramente. Os editores pagavam quantia ínfima, receosos de inundar o mercado com as obras de um único compositor. Lei da economia: a escassez valoriza o produto; a abundância o desvaloriza. Schubert sofreu privações durante a sua meteórica passagem por este planeta e morreu na miséria.

quarta-feira, 23 de julho de 2014

FILOSOFIA XIII - 8



EUROPA (1600 a 1800). Continuação.

Gottfried William Leibniz afirmou a relatividade do tempo e do espaço. Na opinião dele, o universo está organizado segundo determinados fins. No universo não há dois seres idênticos e a diferença não é numérica, espacial ou temporal, mas sim essencial. Os seres que compõem o universo são forças vivas (mônadas). A natureza não dá saltos. O éter é o meio que a luz do Sol atravessa para chegar a Terra. Christian Huygens inventou o relógio de pêndulo, aperfeiçoou o telescópio, descobriu o fenômeno da polarização, o método para fabricação de vidro acromático e desenvolveu a teoria ondulatória da luz. William Gilbert contribuiu para o conhecimento do fenômeno elétrico e introduziu a palavra “eletricidade” no vocabulário científico ao descobrir as propriedades do imã. Stephen Gray e Charles Dufay descobriram que a condutividade das substâncias variava e que havia dois tipos de eletricidade: positiva e negativa (1698 a 1739). Alessandro Volta constrói a primeira bateria e prova a identidade entre o magnetismo animal e a eletricidade (1745 a 1827).

Robert Boyle, irlandês, químico, notabilizou-se com a sua obra “O Químico Cético ou Paradoxos e Dúvidas Físico-químicas”, onde rejeita as teorias dos alquimistas e a dos médicos que seguiam a orientação de Paracelso (1627 a 1691). Com o seu trabalho contribuiu para a autonomia científica da Química. Estabeleceu a distinção entre mistura e composto, estudou a natureza do fósforo, tirou álcool da lenha, sugeriu a idéia de elementos químicos e reviveu a teoria atômica. Ainda no século XVIII foram descobertos alguns gases como o dióxido de carbono, o hidrogênio e o oxigênio. Henry Cavendish, um dos homens mais ricos da Inglaterra nesse período, além de descobrir o hidrogênio demonstrou que o ar e a água não eram substâncias simples como então se acreditava, mas sim substâncias compostas (ar = oxigênio + nitrogênio; água = oxigênio + hidrogênio). Antoine Lavoisier (1743 a 1794) batizou de oxigênio e hidrogênio os dois gases recentemente descobertos e provou que: (1) a combustão e a respiração são formas de oxidação, aquela rápida, esta lenta; (2) o diamante é uma forma de carbono; (3) a vida é um fenômeno químico. Dele é a lei da conservação das massas: “em a natureza nada se perde, nada se cria, tudo se transforma”. Ainda que a matéria possa alterar o seu estado numa série de reações químicas, isto não mudará o seu total; a quantidade de matéria é a mesma, tanto no começo como no fim de cada operação, podendo ser verificada pelo peso. Lavoisier, que também era coletor de tributos, sugeriu reformas fiscais. Por ser funcionário do governo anterior (monarquia) foi acusado de crime contra o povo. O advogado alertou o tribunal de que o réu era um grande cientista. Entre os fundamentos da sentença que condenou o réu consta o de que “a república não precisa de cientistas”. O químico genial morreu na guilhotina por obra e graça da revolução francesa.

Robert Hooke foi o primeiro biólogo a observar a estrutura celular da matéria viva através do microscópio (1653 a 1703). Quando ele expôs a descoberta ao seu colega Isaac Newton, este exclamou: “Isto é incrível Hooke”! [Dizem que, envaidecido, Hooke ficou verde de alegria e contentamento]. Marcelo Malpighi descobriu a sexualidade das plantas e constatou a semelhança da função das folhas dos vegetais com a função dos pulmões nos animais (1628 a 1694). Anthony van Leeuwenhock descobriu o protozoário e a bactéria e descreveu o espermatozóide humano (1632 a 1723). Jan Swammerdam, médico holandês, contribuiu para a embriologia ao descrever a vida de insetos desde a larva até a maturidade. Ele comparou a transformação do girino em rã ao desenvolvimento do embrião humano. Carl Von Linné (simplesmente, Lineu) cientista sueco, destacou-se na tarefa de classificar o conhecimento existente (1707 a 1778). Dividiu os seres naturais em três reinos: mineral, vegetal e animal. A nomenclatura refletiu a forma política da época: monarquia, reino, rei. Dividiu cada reino em classes, gêneros e espécies. Inventou a nomenclatura biológica: cada planta ou animal é designado pelo nome do gênero seguido do nome da espécie. Ao ser humano, Lineu deu o nome de homo sapiens. Contrariou a Bíblia e a igreja ao afirmar que o número de espécies não era fixo. Buffon, cientista francês, reconheceu a íntima relação entre os humanos e os animais superiores e considerou-os membros da mesma família (1707 a 1788). Ele admitia a possibilidade de as formas orgânicas descenderem de um único tipo primordial. James Hutton foi o primeiro cientista a estudar sistematicamente as rochas com o propósito de compreender a história do nosso planeta (geologia). Em 1785, ele publica a sua Teoria da Terra. Defende a tese de que os processos geológicos do passado foram os mesmos do presente. Causas análogas às mudanças no passado remoto ocorrem no presente. Isto contrariava a Bíblia, segundo a qual a Terra foi criada por deus na forma atual em seis dias (Gênesis 1,2).

A medicina avançou pouco no século XVII. A dissecação de cadáveres era considerada profanação. As escolas de medicina que a praticassem arriscavam-se a ser depredadas pela população (1750). A cirurgia era ofício menor, próprio dos barbeiros. No século XVIII houve redução da taxa de mortalidade motivada: (1) pela inoculação e pela vacinação no combate à varíola; (2) pela instalação de maternidades com técnicas novas de obstetrícia; (3) pelo progresso da higiene e adoção de hábitos sadios.

Na arte e na literatura européia dos séculos XVII e XVIII nota-se uma inclinação geral para reviver o espírito da idade clássica (Grécia e Roma). Alusões à mitologia e temas clássicos estão presentes nas obras (estátuas, quadros, livros). Na arquitetura prevaleceu o estilo barroco (extravagante, magnificente, esplendoroso, artificial) presente nas igrejas, palácios, teatros, museus, edifícios públicos. Esse estilo refletia o poderio dos estados dinásticos que surgiram nessa época e o absorvente interesse por luxo propiciado pela revolução comercial. Outro estilo mais leve do que o barroco que vigorou principalmente no século XVIII foi o rococó, assim apelidado por causa das volutas e dos desenhos imitando conchas, muito usados na decoração. A pintura evoluiu em paralelo com a arquitetura. Os expoentes dessa época no estilo barroco foram: Peter Paul Rubens (1577 a 1640), Anthony Van Dyck (1599 a 1641), ambos flamengos, retrataram governantes e nobres; pintaram nus em formas arredondadas e exuberantes de acordo com a robustez física enaltecida naquela época. Diego Velásquez (1599 a 1660), pintor da corte real de Espanha, representava em grande parte das suas obras as cabeças da realeza e da nobreza, geralmente em luz branda e prateada. No estilo rococó destacaram-se os pintores Antoine Watteau (1624 a 1721) e François Boucher (1703 a 1770); reproduziram a elegância aristocrática de maneira sentimental e que bem servia à finalidade decorativa. Alguns pintores não se subordinaram aos dois estilos vigentes, tais como: Rembrandt, Hals e Goya. O primeiro (Rembrandt van Ryn, 1606 a 1660), holandês, consta do rol dos maiores pintores de todos os tempos. Seus quadros mostram sutil colorido e raridades da natureza, rabinos solenes, pedintes esfarrapados, cenas da Bíblia, com forte carga dramática. Franz Hals (1580 a 1666), também holandês, pintava retratos realistas, como o sorriso de um bêbado na taberna, o entusiasmo de itinerantes cantores e comediantes, a miséria dos desamparados. O espanhol Francisco Goya (1746 a 1828) mostra a crueldade da guerra. Ele detestava a aristocracia, desprezava a igreja e ridicularizava a hipocrisia social, sentimentos e atitudes refletidos em seus quadros.

segunda-feira, 21 de julho de 2014

FILOSOFIA XIII - 7



EUROPA (1600 a 1800). Continuação.

O período dos déspotas na Europa coincidiu com produções intelectuais que enriqueceram a cultura ocidental (1600 a 1800). Do exame de fatos sociais verifica-se a atuação de forças subterrâneas despercebidas no passado que irrompem no presente e assim desvenda-se eventual mistério da revolução cultural. O movimento social do fim da Idade Média (renascença), a prosperidade forte ou fraca das camadas média e pobre da sociedade, a descoberta de terras longínquas e de povos estranhos, são fatores que influíram na produção intelectual européia dos séculos XVI a XVIII. As mudanças ocorridas no pensamento artístico, científico e filosófico das quais decorreram uma visão de mundo nova e um novo comportamento individual e coletivo são agrupadas racionalmente sob o título de revolução intelectual. A ênfase dada pelos humanistas italianos ao pensamento matemático de Pitágoras e de Platão foi importante para o renascimento da investigação científica. A arquitetura refletiu esse desdobramento. “A beleza consiste na harmonia das proporções adequadas” (Vitrúvio, arquiteto romano do século I). “A arquitetura é música congelada” (Goethe, poeta e filósofo alemão). A consonância visual no desenho arquitetônico corresponde à consonância auditiva dos intervalos pitagóricos (música). O princípio pitagórico das proporções incide não apenas nas artes, mas também no campo científico e nas relações sociais. A teoria da harmonia gerou um padrão de excelência no campo artístico e científico. Expressões inspiradas na filosofia de Pitágoras: “Deus é o grande arquiteto do universo”. “No princípio, deus geometrizou” (ou calculou).

A revolução científica – aspecto da revolução cultural – caracterizou-se pelo enriquecimento do vocabulário, novos conceitos, métodos e fundamentos que foram surgindo no cenário europeu. O cientista discerne permanências no fluxo impetuoso dos fenômenos que ocorrem dentro de uma realidade cambiante. Tais fenômenos eram estudados sob o nome de Filosofia Natural. Somente no século XIX foi dado o nome de Ciência ao estudo metódico e sistemático dos fenômenos naturais. A Ciência tornou-se um dos aspectos poderosos e dominantes da cultura ocidental. Essa nomenclatura patenteava a autonomia da ciência em relação à filosofia. De um modo amplo, ciência pode ser entendida como o estudo racional e sistemático da natureza e da sociedade. Desde a Idade Antiga houve atividade científica. Todavia, por volta do século XVII (1601 a 1700) essa atividade foi adquirindo características próprias com intensidade cada vez maior e se multiplicou em vários ramos. A tônica foi a idéia mecanicista de um universo governado por leis naturais (regularidades e permanências observadas na natureza batizadas de “leis” pelos cientistas por analogia com as leis ditadas pelos homens para governo da sociedade. Algumas dessas leis naturais serviram de guia à conduta humana e de inspiração ao legislador, ao filósofo e ao místico).

No estágio científico da Idade Moderna, o animal falante é superado pelo animal calculador. A natureza foi matematizada. “O cálculo tensorial conhece melhor a Física do que o próprio Físico”, dizia Langevin com proposital exagero para ressaltar o predomínio da matemática na ciência moderna e o quadro psicológico do pensamento relativista. A matemática abre novos caminhos à experiência. Revigora-se a matemática entendida como gramática da dimensão e da ordem. Na linguagem das grandezas não há lugar para sentimento. No passado, a técnica da medição e da contagem (medir e calcular) seguiu a trilha das caravanas e das galeras nas rotas comerciais. Na Idade Moderna, essa técnica assumiu papel relevante. A razão foi colocada no pedestal. Explica-se a natureza em linguagem matemática. Verificou-se, entretanto, que a explicação dos fenômenos naturais nessa linguagem não era por si só garantia de exatidão; que ciência exata é termo desprovido de sentido, salvo para específica aplicação, pois, em caráter geral, a exatidão depende da qualidade dos instrumentos disponíveis e das condições pessoais do cientista e do ambiente cultural (econômico, político, social). O uso de artifícios ou expedientes matemáticos não faz da ciência nem mais nem menos exata. A exatidão do conhecimento depende das circunstâncias e pouco importa se os seus enunciados são verbais ou matemáticos. Toda lei científica é uma verdade aproximada e só pode ser usada com segurança quando se conhece os limites da sua aplicabilidade. Estes limites se esticam ou se estreitam conforme a precisão desejada.

No passado, a ciência interessava-se pelo formato das coisas, era mais anatômica do que fisiológica, preocupava-se com o espaço sem incluir o tempo. Depois da geometria plana que atendia aos navegantes de superfície dos mares (navios) foi necessária geometria para atender aos navegantes da profundidade dos mares (submarinos) e depois a geometria para atender aos navegantes das alturas (aeronaves). A introdução dos explosivos, do relógio acionado por pesos e do relógio acionado por molas caracteriza a base material da Idade Moderna: além da energia animal (homem + besta) explora-se também energia derivada de outras fontes. As propriedades da mola distendida atraíram a atenção dos cientistas quando o relógio destacou-se entre as invenções modernas. Da experiência eles extraíram a lei da distensão das molas: a relação entre o peso apenso à extremidade da mola e o alongamento sofrido é uma constante. O peso que a força elástica da mola pode suportar depende da sua distensão.

Na esfera prática, o ser humano busca o conhecimento para alterar o mundo. Na esfera teórica, a busca do conhecimento ocorre por curiosidade e lazer intelectual. Na esfera contemplativa, a busca responde ao anseio por iluminação espiritual. Aqueles que se dedicam à ciência, à filosofia e ao misticismo integram a elite intelectual e espiritual do mundo. O cientista e o filósofo às vezes cedem a sua independência em troca de favores do governo ou de poderosos grupos privados. Ante a frouxidão, a moral valoriza-se: “uma consciência limpa é um travesseiro macio” (ditado alemão).

Descobertas revolucionárias ocorreram no campo da matemática e da física. René Descartes inventou a geometria analítica (aplicação da álgebra à geometria). Isaac Newton e Gottfried William Leibniz desenvolveram o cálculo infinitesimal. Newton expõe as três leis do movimento: (1) todos os corpos, se não impedidos, movem-se a uma velocidade constante e em linha reta; (2) a força é proporcional ao produto da massa pela aceleração; (3) a toda ação corresponde uma reação igual e contrária. Partindo da obra de Galileu, Newton publica a sua teoria sobre gravitação universal: cada partícula de matéria no universo atrai outra partícula com uma força inversamente proporcional ao quadrado da distância entre elas e diretamente proporcional ao produto das suas massas. O mundo material ficou sob um só princípio unificador. As dúvidas sobre a teoria de Copérnico foram removidas. A mecânica celeste adquire fundamentos científicos. Newton fundou a hidrodinâmica, acrescentou dados à hidrostática, inventou tabelas úteis para a navegação e explicou que as cores do arco-íris resultavam da decomposição da luz branca. A física newtoniana vigorou até o século XX.

sexta-feira, 18 de julho de 2014

FILOSOFIA XIII - 6



EUROPA (1600 a 1800). Continuação.

Nacionalismo, absolutismo, protestantismo capitalismo, individualismo, caracterizaram o que se convencionou chamar de Idade Moderna. Nas relações internacionais algumas potências competiram entre si a começar pela Espanha no esplendor do século de ouro com as riquezas vindas do continente americano e Portugal com seu império colonial na América e na África. Seguiram-se novas potências: França, Inglaterra, Áustria, Holanda e Rússia.

Renascença, revolução religiosa, revolução científica, revolução técnica, revolução comercial, revolução agrícola, revolução industrial, revolução política, foram movimentos miscigenados que propiciaram uma renovada face à civilização européia no curso dos séculos XIV a XIX (1300 a 1900). O que ocorria em progressão aritmética passou a acontecer em progressão geométrica [há progressão aritmética quando a série numérica tem o mesmo número diferencial; há progressão geométrica quando a série numérica tem como diferencial números multiplicados]. Essas revoluções não implicaram bruscas rupturas com o passado apesar das mudanças nos costumes, nos conceitos, na linguagem, nas teorias, nas instituições, na visão de mundo. De um modo geral, tais mudanças se processaram gradual e continuamente em conexão umas com as outras. Quando o resultado de tais mudanças adquire certa estabilidade elas passam a ser tratadas como “revolução” por analogia com o movimento dos astros.  

O trabalho científico intensificou-se: gravitação terrestre (Galileu) e universal (Newton), cálculo diferencial que determina a inclinação de uma curva em um ponto determinado, cálculo integral que acha a área limitada por um trecho da curva, deslocamento de um corpo no espaço medido no tempo (velocidade), aumento ou redução da velocidade (aceleração), cálculo do coeficiente diferencial por meio de uma construção geométrica. O cálculo integral atingiu o máximo de utilidade quando o carvão substituiu a tração animal como fonte de energia. Os métodos do cálculo integral são particularmente úteis na resolução de problemas referentes à medição de figuras sólidas e se tornaram a base da nova Física e da nova Química. O cálculo diferencial forneceu os meios de estudar o movimento mecânico. A sua aplicação no campo da Física tornou-se realidade após a revolução industrial como o instrumento matemático mais adequado para medir a eficiência da nova maquinaria. Verificou-se como a natureza química do combustível e dos alimentos se relaciona com o trabalho que a máquina e o organismo vivo são capazes de realizar. [Na avaliação de alguns cientistas, a vida é apenas um fenômeno químico]. Entra no vocabulário científico a palavra energia, assim entendida a capacidade de produzir trabalho. A necessidade de medir o calor levou à invenção do termômetro.

Independente do nascimento, quem tivesse dinheiro e bens podia se integrar à nobreza {aristocracia do berço x aristocracia do patrimônio}. A fortuna patrimonial superou a linhagem. Vultos da Idade Média eram de origem humilde (Miguel Ângelo, Shakespeare) ou filhos ilegítimos (Bocaccio, Leonardo da Vinci, Erasmo). Algumas profissões eram modestamente remuneradas: artista, escritor, advogado, médico, professor. Parcos eram os ganhos da camada mais baixa da sociedade. A revolução comercial favoreceu mais a burguesia e menos os trabalhadores. Pedreiros e carpinteiros recebiam quantia irrisória por dia trabalhado (menos de 1/30 avos do salário mínimo brasileiro). O descontentamento gerou rebeliões. Em época de transição o espírito de revolta paira no ar. O surto do individualismo veio imbricado com o forte desejo de poder e de prazer em nível individual. Romperam-se os freios representados pela humildade e pelo comedimento. A jactância própria da ilimitada afirmação do eu refletia-se no modo de vestir dos homens e das mulheres das camadas média e alta da sociedade. Aumentou o consumo de açúcar, café, chocolate, chá, como adendos da alimentação das referidas camadas sociais. Cresceu a procura de roupas de linho e de algodão, de artigos de luxo, de mobília de mogno desenhada por grandes mestres como Chippendale, Hepplewhite e Sheraton. Essa procura e esse consumo indicam um melhor padrão de vida se comparado com os padrões dos séculos anteriores.

A moral em fins da Idade Média (renascença) era frouxa. A fabulosa história dos Bórgia serve de exemplo. Jogo, prostituição, adultério, assassinato, faziam parte dos costumes. Em defesa da honra, o ofendido fazia justiça com as próprias mãos. O papa Paulo III afirmava que homens únicos em sua profissão, como Benvenuto Cellini, não estavam submetidos à lei (1500 a 1571). Cellini jactava-se de haver matado seus rivais. A ética tradicional perdera significado para grande parte da população renascentista. Os principais objetivos eram a satisfação individual e a vitória na luta para adaptar o mundo ao sistema de crenças e interesses do indivíduo. Mulheres qualificadas de feiticeiras se viram indefesas ante a cruel perseguição. Grassava o banditismo nas cidades grandes e nas estradas. Consumo crescente de bebidas alcoólicas inclusive entre os pobres. Jogo e duelo eram práticas freqüentes. A revolta contra os ideais morais dos teólogos e contra os tabus ascéticos da igreja ocorreu também nas ações sociais. Vida amena e perdulária dos ricos exteriorizada nas roupas, nos móveis, nos perfumes, na etiqueta, no modismo. Maneiras convencionais substituíam a moral. Fidelidade e amor conjugal ridicularizados. Adultério enaltecido (ter amante era sinal de status; não ter, era opróbrio). Nos domingos, dia de missa, os bordéis ficavam abertos e os teatros fechados. Nada de bom havia no amor, salvo o prazer físico.

A revolução intelectual (artística, literária, científica, filosófica) afetou profundamente a civilização ocidental. Os iluministas imaginavam o universo como um relógio movendo-se por si mesmo eternamente. O mecanismo do relógio forneceu ao pensador a metáfora do cosmo e da sociedade: deus era o relojoeiro; o funcionamento do relógio mostrava obediência ao seu comando; o rei era o relojoeiro a cujo comando os súditos deviam obedecer. O iluminismo – luz da razão – influiu: (1) na reforma das leis penais, abrandando o rigor das penas e da sua execução; (2) na abolição da escravatura; (3) na oposição à guerra; (4) na defesa das camadas média e pobre da sociedade; (5) na busca de nova base para a moralidade. O infortúnio dos pobres recebe maior atenção com o progresso da razão e da doutrina dos direitos naturais do homem. Além disto, a camada média da sociedade (burguesia) necessitava do apoio da camada pobre (camponeses e operários) para destronar a nobreza civil e eclesiástica. Thomas Paine deu voz a esse movimento ao dizer que um único lavrador honesto valia mais do que todos os bandidos coroados. Gabriel Mably e o Marquês de Condorcet advogavam a distribuição da riqueza entre as camadas sociais como caminho único para se chegar à igualdade. A propriedade da terra tinha de ser dividida em partes iguais a fim de evitar a exploração do pobre pelo rico (1709 a 1794). O ideal de liberdade religiosa foi determinante na separação entre a Igreja e o Estado. A tese de uma ordem natural contribuiu para aniquilar o feudalismo remanescente, os monopólios e os privilégios que vigoravam naquela quadra da história européia. No entanto, na quadra seguinte, a tirania política e religiosa foi substituída pela tirania econômica do mais rico. A nova classe dominante passou a ser titular dos privilégios e monopólios nos séculos XIX e XX.

quarta-feira, 16 de julho de 2014

FILOSOFIA XIII - 5



EUROPA (1600 a 1800). Continuação.

A pressão social fazia do humano um elemento do ente coletivo mergulhado na objetiva consciência comunitária como acontecia na tribo e continuou a acontecer na cidade e no império. Os povos orientais mantinham o sentimento de união íntima a um todo cósmico, fenômeno cultural que explica a duradoura vigência de regimes autocráticos e o reverencial respeito à autoridade. Nos povos ocidentais operou-se mudança em direção ao individualismo. Após o advento do cristianismo, a consciência da individualidade ampliou-se e se tornou mais aguda. Apesar da sua origem oriental, a doutrina cristã vingou no solo ocidental com pronunciado sentido humanitário ao valorizar o ser humano como individualidade anímica e não apenas como partícula de um organismo cósmico. Essa doutrina acentua a dignidade da pessoa humana; prega a igualdade entre os seres humanos sob a paternidade divina, o que se afina com um modo de vida democrático. No plano histórico, a igreja cristã adotou em sua organização clerical o modelo imperial romano e conviveu com o regime autocrático durante toda a Idade Média. A igreja foi organizada hierarquicamente tendo na base os crentes, no meio a casta sacerdotal e na cúpula o papa. Contrariando a separação entre poder secular e poder espiritual preconizada por Jesus (a César o que é de César, a Deus o que é de Deus) o clero estendeu o seu poder sobre reis e imperadores, interferindo nos negócios de Estado.

A revolução comercial iniciada no século XV, que incluiu as grandes navegações de portugueses e espanhóis em busca de novas rotas para o comércio, simboliza o novo capitalismo, cujos lineamentos (lucro, grandes empresas, economia de mercado, trocas monetárias, trabalho assalariado) desenhavam-se desde o século XII, com a paulatina desintegração do feudalismo. A separação entre ética e economia ocorreu no plano dos fatos antes de ganhar fundamento teórico. Goethe percebeu este divórcio ao afirmar que o homem de ação não tem consciência e que esta é própria do homem contemplativo. Certamente, o poeta alemão referia-se à consciência moral e não à consciência como fenômeno cognitivo natural. O lucro e os juros perderam as vestes do pecado. A reação mais vigorosa aos freios postos pela igreja católica à conduta dos crentes em geral e à atividade dos comerciantes e banqueiros em particular, aconteceu no século XVI com a revolução protestante iniciada por Lutero. O individualismo aprofundou-se com amparo na teologia calvinista.

A partir da revolução comercial e da revolução protestante o individualismo torna-se possessivo, germe subjetivo do capitalismo selvagem. A nova e poderosa classe social européia (burguesia protestante) rebela-se contra a supremacia do papa e do imperador e empreende luta pela liberdade de religião, de ação e de pensamento. Em oposição ao universalismo da igreja e do império (catolicismo) essa burguesia defende o nacionalismo, a existência autônoma do grupo nacional e o direito de cada nação se constituir em Estado (princípio das nacionalidades). A pretendida autonomia política da nação incluía o poder absoluto do rei e a uniformização da moeda, dos pesos e medidas, das práticas administrativas e das leis. O fortalecimento do rei nacional significava: (1) subordinação dos senhores feudais; (2) independência em relação ao papa e ao imperador; (3) organização de exército permanente; (4) produção do direito; (5) centralização da justiça e da tributação.

O caminho para a burguesia européia concretizar aspirações de domínio econômico e político e de preeminência social foi desbastado por dois fatores: (1) descontentamento dos camponeses com as autoridades eclesiásticas e seculares; (2) rivalidade entre a autoridade eclesiástica e a autoridade secular. Na França, o movimento culminou com violenta revolução política (1789). Na opinião de Saint-Just, intelectual jacobino da revolução francesa, o século XVIII deve ser colocado no Panteão. O revolucionário abade Siéyès elaborou a teoria que distingue poder constituinte (político) e poder constituído (jurídico). O primeiro pertence à nação e o segundo ao governante que deve exercê-lo dentro da legalidade posta pelo povo. Estribados nessa teoria, os revolucionários implantaram ordem democrática fundada na tríade: liberdade, igualdade, fraternidade. Eles promulgaram a declaração dos direitos do homem e do cidadão como bússola para o governo da nação. A declaração de direitos refere-se ao homem como espécie natural e ao cidadão como pessoa vinculada a um Estado. Essa declaração revestiu caráter universal e se revelou uma das maiores conquistas do mundo civilizado. A revolução francesa com sua doutrina filosófica, política e jurídica repercutiu no mundo. Os Estados europeus surfaram na onda nacionalista e adotaram constituições escritas (salvo a Inglaterra). As colônias da América Latina, à medida que obtinham independência da Espanha e de Portugal, elaboravam as suas próprias constituições (1801 a 1900). O reino brasileiro seguiu o modelo europeu (unitário e monárquico) sob a tutela discreta da Inglaterra e adotou o nome de Império do Brazil.

Do movimento constitucionalista europeu e americano decorreu um novo conceito de Constituição. Do ponto de vista ontológico, todo Estado tem uma constituição, que é o seu modo de ser e de existir no mundo, com um território próprio, povo, governo e regras oriundas dos costumes, dos atos dos legisladores, das decisões dos tribunais e das obras dos jurisconsultos. Paralelo ao conceito ontológico surge com o citado movimento o conceito deontológico: documento escrito, racional, sistemático, elaborado e promulgado pelo sujeito do poder constituinte, contendo as regras de organização do Estado e a declaração dos direitos fundamentais dos indivíduos. Passou-se dos princípios emanados dos costumes historicamente sancionados e das leis esparsas escritas ou não, às regras fundamentais concentradas em um documento escrito para maior segurança dos governados.

Até o século XVIII, na Europa, a vida doméstica e social era dominada pela crença religiosa cristã (católica + protestante). Depois, passou a depender mais do jogo das probabilidades. A partir do século XIX, a estatística de população humana assume grande importância em virtude das investigações científicas para determinar as leis do comportamento social (sociologia). Os jogos de azar e a organização do seguro são estudados para fundamentar a teoria da probabilidade. O modelo dos jogos de azar foi utilizado como modelo físico dos fenômenos naturais. Os cientistas verificaram que várias combinações de caracteres hereditários ocorrem em proporções numéricas. Na sua fase inicial, o seguro era um jogo, uma forma de especulação. Nos séculos XIV e XV, o setor financeiro começa a exercer poder mediante apólices de seguro, empréstimos a juros elevados, transações de crédito, apostas no tempo de vida do indivíduo e no sexo dos nascituros, visando ao ganho e divertimento. As transações eram altamente especulativas fundadas na probabilidade: aquele que mais tem, mais ganhará; aquele que menos tem, perderá o pouco que tem. A idéia de freqüência entra no cálculo probabilístico. Com base no número de vezes que algo acontece, verifica-se a chance de tornar a acontecer. Diferente do conceito vulgar, a probabilidade matemática é sempre uma fração. Quanto mais a ciência se aproxima da verdade, mais estreito fica o espaço da probabilidade. A regularidade observada nas relações sociais permite o cálculo estatístico embora passível de equívocos. No cálculo da renda per capita, por exemplo, o resultado é enganoso do ponto de vista material. A renda do operário e a renda do capitalista são colocadas no mesmo nível quando na realidade aquela é bem menor do que esta.   

domingo, 13 de julho de 2014

COPA 2014 - FINAL



Chega ao fim o cosmopolita e periódico torneio de futebol que aproxima os povos e contribui para afastar preconceitos e apresentar a realidade sem o verniz ideológico. Das 20 edições desse torneio, 10 foram organizadas no continente europeu {Itália (2), França (2), Suíça, Suécia, Inglaterra, Alemanha (2), Espanha}; 8 no continente americano (Uruguai, Brasil (2), Chile, México (2), Argentina, EUA); 1 no asiático (Coréia + Japão); 1 no africano (África do Sul). As seleções brasileiras venceram copas organizadas em países da Europa (Suécia), da América (Chile, EUA, México) e da Ásia (Coréia, Japão). Hoje, o espetáculo acabou. Quem riu, riu. Quem chorou, chorou. Quem cantou, cantou. Quem calou, calou. O Comary Circus recolheu a lona e desmanchou o picadeiro. Se nada mudar, voltará em 2018 com os mesmos artistas, as mesmas acrobacias e quiçá novas palhaçadas. 

Nas partidas semifinais, a seleção da Alemanha venceu a do Brasil (7x1) e as seleções da Argentina e da Holanda empataram sem gols (0x0). Na decisão por pênaltis a vitória coube à seleção argentina. Nas partidas finais, o terceiro lugar coube à seleção holandesa que venceu a brasileira (3x0). Tanto no conjunto como em valores individuais a holandesa foi superior. Equilíbrio continental: seleção da Europa (Alemanha) disputa o primeiro lugar com seleção da América (Argentina). Durante o torneio as seleções européias evitaram badalações. Mostraram-se cautelosas e reservadas. No gramado do estádio seus atletas não faziam preces e nem se benziam. No jogo ou na guerra deus não escolhe lado. Aparentavam confiança. Cantavam o hino do seu país sem entoação forçada e agressiva.

No mais recente e premonitório artigo da série “Copa 2014” publicada neste blog, foi dito que perder para a seleção alemã não seria vergonha. Surpreendente foi o placar elástico, inimaginável, inédito e traumático, marca indelével de uma fragorosa e acachapante derrota. Santo deus! O que foi aquilo? Pane coletiva no início do jogo em conseqüência do primeiro gol. Rolo compressor alemão a esmagar a defesa brasileira. Adolescentes grogues em campo. O mundo esportivo ficou pasmo. A desestruturação psicológica dos brasileiros enseja questionamento. A psicóloga da seleção era alemã? Filiada ou eleitora do PSDB? Prestava efetiva e diariamente os seus serviços? Necessitaria também ela de assistência psicológica ou de aperfeiçoamento especializado? A Confederação Brasileira de Futebol - CBF não pagou os salários da psicóloga, dos membros da comissão técnica e dos jogadores?

Em 1950 a derrota doeu na alma brasileira porque havia motivo forte e plausível para crer na seleção e na vitória. Em 2014, o que doeu foi o vexame pela goleada sofrida. A comoção de agora foi menor do que a anterior porque – além das moléculas da indiferença – o organismo nacional estava parcialmente sem empolgação e descrente da vitória. Apesar da maciça propaganda e das expectativas criadas pela mídia carnavalesca, parte da população sabia que o gigante pintado era na realidade um pigmeu. A corrupção e os gastos fabulosos com a organização da copa no Brasil arrefeceram o ânimo do povo. Nada disto aconteceu em 1950.   
  
Thiago Silva e Neymar não evitariam a derrota se estivessem em campo. No time de uma estrela e dez planetas quando aquela se apaga estes perdem calor. A estrela esteve sem brilho e sem vigor. A conduta piegas de entrar em campo um com a mão no ombro do outro, de expor faixa com o nome da estrela, de rezar e se benzer em público, já indicava fragilidade e prenunciava a catástrofe. Palavras de Jesus: “Quando orardes não façais como os hipócritas que gostam de orar de pé nas sinagogas e nas esquinas das ruas para serem vistos pelos homens. Quando orardes, entra no teu quarto, fecha a porta e ora ao teu Pai em segredo e teu Pai que vê num lugar oculto recompensar-te-á.” (Bíblia, NT, Mateus 6:5/6).

A série de artigos acima citada criticava a perniciosa badalação, apontava inconsistência da seleção e lamentava a ausência de jogadores veteranos como Ronaldinho e Luis Fabiano que estavam em boa forma e tecnicamente superiores aos da lista de convocados. A experiência e a maturidade dos veteranos seriam de grande valia. O problema é que eles empanariam o brilho da nova estrela. Ao invés de um sistema planetário haveria uma constelação e isto não convinha aos fins publicitários. Preferir elenco jovem e imaturo teve o seu preço. Além disso, a contradição: Lucas, jovem talentoso, foi preterido. Ele poderia ofuscar a nova estrela e isto os dirigentes não desejavam. Diante da insuficiente forma técnica, física e psicológica dos convocados e da pouca inteligência no setor de armação, melhor teria sido a participação de Damião (Santos), Walter (Fluminense), Ganso (São Paulo) e Douglas (Vasco).

Ainda treinador da seleção brasileira, Mano Menezes – cujo trabalho de longo prazo foi interrompido graças à impaciência de torcedores – questionado por repórteres, afirmou atender às solicitações do presidente da CBF, porque era essa autoridade que contratava e demitia os treinadores da seleção. Quem desatendesse as solicitações presidenciais seria demitido. A mesma prepotência da ditadura militar. Saldanha foi demitido porque desatendeu ao pedido (ordem) do general Médici para incluir Dadá Maravilha no elenco da seleção de 1970. Zagalo ocupou a vaga e atendeu ao capricho do ditador.

O atual ditador da CBF vetou a convocação de excelentes jogadores. Daí a opinião publicada neste blog (25/05) fundamentada juridicamente para a seleção brasileira de futebol sair da esfera privada e ficar a cargo de órgão estatal de composição mista (pessoas indicadas pela Câmara dos Deputados, pelo Ministério dos Esportes, pela CBF e pelas associações nacionais de árbitros, de atletas e de jornalistas). Isto é possível mediante emenda constitucional acrescentando um artigo (217-A) na Constituição Federal. Vontade autocrática do presidente da CBF substituída por vontade democrática de um órgão colegiado, autônomo e representativo. A seleção brasileira livrar-se-ia da pilantragem que a governa.

Das 20 edições da copa do mundo, as seleções brasileiras venceram 5 e perderam 15.  Isto significa que seleções de outros países exibem futebol em nível de excelência para vencer a competição. Por este ângulo também se vê a impertinência de encarar a vitória como obrigação do jogador. Conforme dito no artigo anterior, a obrigação do jogador é a de se dedicar à seleção com denodo. Isto os jogadores brasileiros fizeram até acima das suas forças. A vitória depende de outros fatores além do desempenho do jogador. Considere-se, ainda, que a seleção brasileira pentacampeã é uma abstração. O que existe concretamente é a seleção do momento, campeã ou não. Em perspectiva histórica, o mais adequado é falar de seleções brasileiras, no plural, pois no curso do tempo há novos componentes e circunstâncias. Diferentes seleções representaram o Brasil em épocas distintas sem exibir necessariamente o mesmo padrão e a mesma eficiência, quer do ponto de vista coletivo, quer do ponto de vista individual. Nas seleções de outros países isto também acontece.

Nas 20 edições da copa do mundo, apenas em 6 a seleção do país hospedeiro conquistou a taça: Uruguai (1930); Itália (1934); Inglaterra (1966); Alemanha (1974); Argentina (1978); França (1998). Portanto, 14 edições foram vencidas por seleção estrangeira e não por seleção nacional do país em que elas se realizaram. Prevalece a etiqueta do bom, gentil e hospitaleiro anfitrião: permitir ao hóspede estrangeiro levar a taça.  

14 de julho. Nessa data, há 225 anos, os pobres de Paris tomavam a Bastilha, episódio símbolo da revolução que mudou o panorama político do mundo civilizado.

sexta-feira, 11 de julho de 2014

FILOSOFIA XIII - 4



EUROPA (1600 a 1800). Continuação.

A reforma protestante foi autêntica revolução que mudou espiritual e idealmente a política e a economia na civilização ocidental. A reforma católica foi interna sem inaugurar seitas. Na Espanha do século XV, um cardeal de nome Ximenes iniciou movimento de revivência religiosa aprovado pela monarquia. Fundaram-se escolas. Abusos dos mosteiros e dos padres foram combatidos. O propósito desse movimento era o de fortalecer a igreja, afastar os heréticos e os infiéis e regenerar a vida espiritual da nação. Na Itália do século XVI, grupo de padres trabalhava para que os sacerdotes da igreja se tornassem mais dignos do nome cristão, resistindo ao paganismo da fase renascentista e à depravação da corte pontifical. Algumas ordens foram fundadas para se dedicar à piedade e ao serviço social, como a dos padres que faziam votos monásticos de pobreza, castidade e obediência e a dos frades empenhados em seguir o exemplo de Francisco de Assis (capuchinhos).

A reforma católica ganhou ímpeto quando a nação alemã converteu-se ao luteranismo. O papa Adriano IV abre campanha contra os abusos dos religiosos católicos. Com a sua morte, a campanha ficou suspensa por onze anos, tempo que durou o governo do seu sucessor Clemente VII, da família Médici. A campanha foi retomada pelo papa Paulo III (1534 a 1549) e seus sucessores Paulo IV (1555 a 1559), Pio V (1566 a 1572) e Xisto V (1585 a 1590). Sob o governo desses papas, a reforma católica atingiu o ápice. A inquisição que havia declinado na renascença italiana toma novo impulso. Na cidade italiana de Trento foi realizado um concílio convocado pelo papa em 1545 com o objetivo de redefinir as doutrinas da fé católica. O concílio durou 18 anos. Foram reafirmados: (1) os dogmas contestados pela revolução protestante; (2) a necessidade das boas ações – tanto quanto a fé – para a salvação; (3) os sacramentos para alcançar a graça divina; (4) a transubstanciação; (5) a sucessão apostólica do clero; (6) a crença no purgatório; (7) a invocação dos santos; (8) o celibato para o clero; (9) a autoridade da Bíblia igual a autoridade da tradição dos ensinamentos apostólicos, ambas verdadeiras e legítimas fontes da fé cristã; (10) supremacia da autoridade do papa, inclusive sobre o concílio [contrariando a linha aristocrática dos séculos XIV e XV, que colocava a autoridade do concílio acima da autoridade monocrática do papa]. As indulgências foram proibidas. A ignorância dos padres foi atenuada com a criação de seminários teológicos em cada diocese. Estabeleceu-se a censura de livros para evitar a propagação de idéias heréticas. Comissão criada pelo papa elabora a primeira lista conhecida como Índice dos Livros Proibidos (1564). Depois, foi criado um órgão com o nome de Congregação do Índice encarregado de atualizar a lista.

Inácio de Loyola, fidalgo espanhol da região basca, funda a Companhia de Jesus (1534). Esta companhia desempenhou papel fundamental na execução das decisões do Concílio de Trento. Arrebanhou povos da Polônia e do sul da Alemanha. A companhia foi aprovada pelo papa Paulo III (1540). Mais do que uma sociedade monástica, a companhia era um regimento de soldados que juraram defender a fé católica. Suas armas: a eloqüência, a persuasão, o conhecimento, a espionagem e a intriga. Alguns deles se tornaram padres para ter acesso ao público e expor suas verdades como oráculo de deus. Outros serviram à inquisição. Outros eram missionários, propagando a fé católica por todos os continentes. Fundaram colégios e seminários. Dedicaram-se à educação e à evangelização. Os jesuítas se opunham aos protestantes, combatiam a heresia e exaltavam o livre arbítrio. Foram os principais arquitetos e executores da inquisição na Espanha.  

Batalhas entre católicos e protestantes se tornaram freqüentes: Alemanha (1546 a 1547) e França (1562 a 1589) conheceram os seus horrores, como o massacre da Noite de São Bartolomeu (1572). A fúria arrefeceu depois do Edito de Nantes que pregava a tolerância religiosa (1598). Para manter o protestantismo, a Holanda (norte dos países baixos) sustentou guerra contra a Espanha, venceu e obteve a sua independência (1609). A Bélgica (sul dos países baixos) era católica e permaneceu sob o domínio espanhol. O quadro era de intolerância religiosa tanto da parte dos católicos como da parte dos protestantes. Extremismo e violência dos dois lados. A perseguição contra os protestantes e infiéis foi levada a efeito pela inquisição. O seu mais eminente mártir foi Giordano Bruno, por sua filosofia mística panteísta e os seus cardeais axiomas da ciência moderna. Ele afirmava a eternidade do universo e a relatividade do tempo e do movimento; negava qualquer elemento especial nos corpos celestes desconhecido na Terra; recusava-se a acreditar em milagres; defendia a tese de que nem sempre a intervenção de deus era para o bem do homem. Esse conjunto de idéias o levou à fogueira (1600). A grande vítima do protestantismo foi Michel Severt, que descobrira a pequena circulação do sangue. Foi queimado em fogo brando (1553). Pesava sobre ele a acusação de: (1) recusar a doutrina da trindade e da predestinação; (2) ensinar que a Palestina era terra estéril quando a Bíblia diz o contrário: que aquela terra era abundante em leite e mel.

Luteranos e católicos condenaram a teoria de Copérnico por contrariar as escrituras e abalar a organização religiosa. Tomando posição contrária à dos teólogos cristãos do século XIII, o Concílio de Trento decidiu que a fé exclui qualquer dúvida; que a verdade revelada pela fé não se submete à demonstração. Aqueles teólogos afirmavam que a verdade da fé deve ser submetida à demonstração. A reforma religiosa também teve efeitos negativos nas artes. Calvino condenava tudo que falasse aos sentidos. Qualquer quadro ou imagem na igreja profanava o culto a deus. O Concílio de Trento mandou pintar calções e camisolas nas figuras nuas pintadas por Miguel Ângelo no “Juízo Final”.