quarta-feira, 15 de dezembro de 2021

METÁSTASE NAZISTA

No dia 6 de dezembro de 2021, a cidadã fluminense Gabriela Lima ocupou a tribuna livre da Câmara Municipal de Resende/RJ por 5 minutos regimentais. Em nome do Diretório Municipal do Partido dos Trabalhadores (PT) e do seu próprio, ela protestou contra as ofensas que, em sessão anterior, certo vereador dirigiu aos ex-presidentes da república Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff e demais militantes do PT e dos partidos de esquerda em geral. Os ofendidos foram (i) acusados de corruptos, terroristas e assassinos (ii) tratados como ratos, ratazanas e baratas. O ofensor ainda elogiou Sérgio Paranhos Fleury por ter matado Marighella. Disse que o delegado fizera pouco, pois, devia exterminar todos os esquerdistas. 
Nesse diapasão, quando parlamentar, o atual presidente da república censurou o regime militar por não fazer o que tinha de ser feito: matar uns 30 mil inimigos. No exercício do seu mandato presidencial, esse cidadão é responsável pela morte de cerca de 300 mil brasileiros, em decorrência: [1] do seu negacionismo no que tange à eficácia: (i) das recomendações da ciência (ii) da vacinação na pandemia [2] da injustificada demora no atendimento à saúde pública. 
Na referida sessão do dia 6/12, vereadores e público se comportaram de forma civilizada. Aos militantes do PT foi permitido estender bandeira vermelha no auditório. A plateia aplaudiu os dois discursos proferidos da tribuna livre. Na saída, os militantes do PT entoaram palavras de ordem e tiraram fotografia na frente do prédio, sem agressões e sem ofensas. No dia seguinte, antipetistas chamaram essa pacífica manifestação de “baderna”, vocábulo usado pelos oficiais do exército na ditadura militar, e comentaram de forma pejorativa o discurso de desagravo proferido pela cidadã fluminense Gabriela Lima. No entanto, ela o proferiu em bom tom e salientou a gravidade dos crimes que denunciava, sem gritaria ou paroxismo.
A inviolabilidade por opiniões, palavras e votos não isenta de pena e nem livra de processo judicial os parlamentares que abusam das suas prerrogativas, como já decidiu o Supremo Tribunal Federal. A conduta do vereador foi abusiva. Pregar o extermínio dos adversários colide com a garantia constitucional do pluralismo político e caracteriza prática nazista definida como crime nas leis de segurança nacional e do genocídio. Rebaixar humanos à condição de animais irracionais é ferir o princípio da dignidade da pessoa humana declarado na Constituição da República (CR/1988). Louvar a prática criminosa de um assassino e torturador como o delegado Fleury, serviçal da ditadura militar, caracteriza o delito definido no Código Penal como apologia ao crime e ao criminoso. Injuriar, difamar e caluniar, extrapolando os limites éticos e jurídicos da legislatura municipal, configura crime comum e falta de decoro parlamentar.
O Diretório Municipal do PT denunciou esses crimes em petições dirigidas ao presidente da Câmara Municipal e ao Promotor de Justiça, mas estão sendo tratadas com morosidade, o que pode ser visto como aval à conduta delituosa. O direito de petição é assegurado a todos os brasileiros. As autoridades públicas têm o dever jurídico de despachar as petições que lhes são apresentadas, deferindo ou indeferindo, sem engaveta-las e sem retardar os trâmites. 
O caso em tela não se reduz a uma questiúncula paroquial. Desborda dos lindes municipais. A oradora falou em metástase cancerosa. Lembrou que o município é uma célula do organismo político da nação. O vírus do nazismo aninhado numa célula comunica-se às demais até infectar todo o organismo multicelular da vida nacional. O município (à romana) ou comuna (à francesa), é a microfísica da vida social e política com peculiares interesses e básicas necessidades da população no âmbito de uma circunscrição territorial. A comuna foi a base dos movimentos emancipatórios na colônia e no império do Brasil. Na república, apesar dos retrocessos autocráticos no país, a comuna se firmou como pessoa jurídica de direito público. Dotada de governo autônomo, provida de lei orgânica, órgãos legislativo e executivo próprios, a comuna consiste na unidade política, administrativa e geográfica onde, dentro dos limites espaciais traçados no mapa do estado, obras públicas são realizadas e serviços públicos são prestados. O esteio financeiro do município compreende impostos, taxas e contribuições de melhoria, todos autorizados pela CR/1988 e disciplinados por leis federais, estaduais e municipais. Há também (i) o produto da arrecadação de alguns tributos federais e estaduais destinado, total ou parcialmente, aos municípios (ii) assistência técnica prestada pelo estado. 
A comuna está sujeita à intervenção do governo estadual [1] quando deixa de (i) pagar a dívida fundada (ii) prestar contas (iii) aplicar parte da receita municipal em educação e saúde [2] quando a intervenção é determinada pelo tribunal de justiça para (i) assegurar a observância de princípios constitucionais (ii) prover a execução de lei, de ordem ou de decisão judicial. 
Na vida comum e cotidiana da população local mui próxima da administração da comuna, são vivenciados objetivamente, na linha dos costumes, da história e da cultura de cada região: (i) hábitos democráticos e autocráticos (ii) progresso, estagnação e retrocesso (iii) ações e omissões lícitas e ilícitas (iv) alegrias e tristezas (v) amor e ódio. A mentalidade autoritária e o projeto de dominação política de um grupo geram condutas nazifascistas. O episódio da comuna de Resende aqui tratado, serve de exemplo por ser tipicamente nazista, reflexo, talvez, do nazismo renascido na Europa e na América neste século. A Academia Militar das Agulhas Negras, localizada na comuna, prenhe do fascismo visceral do exército desde a proclamação da república, passando pela ditadura civil (1930) e pela ditadura militar (1964), também influi, juntamente com a vocação do atual governo de extrema direita, no pendor nazista de alguns vereadores que deram o seu aval, ainda que silencioso, à criminosa conduta do colega.

terça-feira, 14 de dezembro de 2021

POSSE IMPUGNÁVEL

Firmes nos seus estatutos, a ordem dos advogados, o ministério público, o partido político, têm legitimidade para impugnar, no Supremo Tribunal Federal, a posse no cargo de ministro da pessoa nomeada pelo presidente da república. A impugnação pode ser fundamentada nos seguintes motivos: 
Alinhamento com o nazifascismo do presidente da república a quem serviu por algum tempo. O pensamento e a ação nazifascistas são contrários ao fundamento democrático da república brasileira. 
Falta de idoneidade moral e de decoro para execer a judicatura revelada publicamente ao se vangloriar de haver mentido e enganado os examinadores na sabatina do Senado. 
Como dois garotos arteiros, ele e o presidente da república se deixaram fotografar e filmar abraçados com largos sorrisos, comemorando a proeza esperta e enganosa. Mostraram tratar de modo leviano assunto muito sério e relevante para a nação brasileira.  
A religião da pessoa não é óbice à judicatura, salvo se alicerçar projeto político revolucionário para fazer do Brasil uma república autocrática religiosa fundamentalista. O cidadão cuja posse no STF está marcada para esta semana, deu mostras de ser “terrivelmente evangélico”, ou seja, de integrar o grupo evangélico que nutre o propósito de assumir o poder político no país e exercê-lo de forma hegemônica e autoritária. Esse projeto é contrário à democracia, à liberdade religiosa e à laicidade do estado brasileiro. 
Além das instituições acima mencionadas, qualquer ministro do STF poderá se insurgir contra a posse de pessoa que se revela desqualificada para a judicatura no mais alto escalão do Poder Judiciário. Urge cancelar a cerimônia de posse até que o plenário do STF decida sobre a oportuna, necessária e conveniente impugnação. Se a decisão for contrária à posse, o presidente da república indicará outra pessoa.  


domingo, 12 de dezembro de 2021

FRAQUEZAS HUMANAS

Os seres humanos são deficientes físicos, emocionais, intelectuais, morais e espirituais. Reconhecer, controlar e superar essas deficiências depende do esforço de cada indivídulo. A educação doméstica,  escolar e social, bem como o atendimento à saúde física e mental, ajudam os humanos nesse reconhecimento e nessa superação. Quem consegue assumir o controle de si mesmo estará apto a controlar a conduta alheia, quer como legislador, quer como governante e magistrado. 
No plano dos fatos, muitas vezes, essas relevantes funções políticas são exercidas por pessoas despreparadas, que não conseguem sequer controlar a si próprias ou viver em harmonia com a sua família e seu círculo de amizades; pessoas mentirosas, hipócritas, desleais, sem pudor algum, insensíveis à segurança e ao bem-estar da comunidade local ou nacional, desprovidas do senso moral, da empatia e da compaixão. Ainda assim, muitas vezes, algumas delas prestam concurso para cargos públicos e são aprovadas por bancas examinadoras frouxas e condescendentes. 
O fato, por exemplo, de alguém ser padre, pastor ou rabino, não significa necessariamente que esse alguém seja técnica e intelectualmente preparado para o cargo civil; que esse alguém seja honesto, confiável, eticamente idôneo. A experiência social indica que esse alguém pode ser: (i) explorador da fé religiosa alheia (ii) molestador de crianças, adolescentes e adultos de ambos os sexos (iii) ladrão de galinhas e/ou de gravatas (iv) mercador da crença religiosa (v) estelionatário (vi) nazista (vii) portador de vícios comuns às fraquezas humanas.  
Acautelai-vos contra os espertalhões da vida civil, militar e religiosa! Eles são os sepulcros caiados de que falava o profeta Jesus, o Cristo. 

sexta-feira, 10 de dezembro de 2021

A BÍBLIA E A CONSTITUIÇÃO IV

Enquanto vigorar a Constituição da República Federativa do Brasil promulgada em 1988 (CR/1988), julgamentos com base na Bíblia ou na interpretação de textos religiosos, no âmbito do Legislativo e do Judiciário, padecerão do vício de inconstitucionalidade por violarem o fundamental princípio da laicidade do estado. A liberdade religiosa vale para todos e não só para alguns de determinada religião. Não se nega a posse de alguém no cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) por ser adepto desta ou daquela religião e sim por ter se revelado desonesto, mentiroso, hipócrita, enganador, portador de caráter incompatível com o decoro exigido de quem exerce função pública.  
O juiz e o tribunal prestam tutela jurisdicional (i) a pessoas de todas as religiões (ii) a pessoas místicas sem religião institucionalizada (iii) a pessoas que não acreditam em deus. Para essas pessoas há compreensível desconforto e constrangimento moral ao se depararem com símbolo religioso estranho à sua crença, ostentado na sala de audiências, na câmara ou no plenário do tribunal. Isto acontecia na fase imperial da história do Brasil, quando havia religião oficial. Com o advento da república, o estado passou a ser laico, ou seja, sem religião oficial. A nação continuou religiosa, porém, de forma plural e republicana. 
Não só nos tribunais, mas, também, em outras repartições públicas das esferas federal, estadual e municipal, orná-las com símbolos religiosos caracteriza afronta ao princípio da laicidade. Em artigos publicados na Tribuna da Imprensa carioca, quando ainda circulava como jornal impresso, e em postagens no sítio da rede de computadores coordenado por magistrado, lancei as ideias aqui expostas, estribado na CR/1988 que garante a igualdade de direitos e obrigações, a liberdade de consciência e de crença e declara ser vedado privar alguém dos seus direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política. [5º, I, VI, VIII].
Certa ocasião, no mencionado sítio, discutimos sobre esse assunto, em posições opostas, eu de um lado e desembargador católico de outro, ambos integrantes da magistratura fluminense. O católico afirmou que manteria o crucifixo no seu gabinete ainda que fosse retirado do plenário do tribunal. A intuição futuróloga do desembargador católico se fez presente. O novo presidente do tribunal aderiu às ideias acima citadas e determinou a retirada do crucifixo do plenário. O fato de ele ser judeu certamente contribuiu para essa boa e adequada iniciativa. 
Outra herança dos tempos imperiais e autoritários que ainda permanece no costume forense é a posição do acusador em patamar superior ao do defensor nas audiências das varas e nas sessões dos tribunais. A posição do agente do ministério público, autor da ação penal – portanto, parte ativa da relação processual – sentado ao lado do magistrado, passa ao público a imagem de conluio entre o órgão acusador e o órgão julgador. As aparências são valiosas às instituições e às autoridades públicas e por isto devem ser bem cuidadas. “Não basta à mulher de César ser honesta; ela tem que parecer que é honesta”. 
O democrático princípio da igualdade de todos perante a lei e a paridade de forças entre acusação e defesa que dele emana não estão refletidos na arquitetura forense e no funcionamento do judiciário brasileiro. Às vezes, no plano dos fatos, o mencionado conluio acontece realmente, como se viu na chamada operação lava-jato em Curitiba/PR. O infame conluio ocorreu do piso à cúpula do Poder Judiciário naquele vergonhoso capítulo da história forense, expressão do mais sórdido corporativismo da magistratura nacional. Tristes trópicos! 
O motivo da cumplicidade foi político partidário: impedir a eleição à presidência da república do candidato do Partido dos Trabalhadores. Depois de alcançado esse propósito com a injusta prisão do candidato por 580 dias, o STF anulou os processos criminais instaurados contra ele. Por indução do ministro Fachin, os processos retornaram às instâncias inferiores para recomeçar do zero e renovar a esperança de impedir nova candidatura do líder petista. Todos foram arquivados para frustração não só do esperto e traiçoeiro ministro, como também para desespero de todos os antipetistas invejosos, preconceituosos e deficientes morais.  
Serve de amostra o processo referente ao triplex de Guarujá, mencionado por tendenciosa emissora de TV, useira e vezeira em manipular notícias e falsear a verdade. A contragosto da juíza, esse processo foi arquivado com base na regra da prescrição. Decisão extintiva da punibilidade. Portanto, nem condenatória, nem absolutória. Curiosidade jurídica: prescrição de crime que não existiu! À semelhança do caso do sítio de Atibaia/SP, não havia prova alguma da materialidade e da autoria do crime imputado ao petista. Havia tão só a montagem artificial de suposições e de fatos aleatórios feita pelo agente do ministério público e pelo juiz de Curitiba. 
Ao contrário do afirmado por adversários, inclusive jornalistas da tendenciosa média corporativa, a liberdade do petista não resultou de “filigranas jurídicas” e sim da justa e correta aplicação de preceitos constitucionais atinentes aos direitos humanos e, em especial, ao devido processo jurídico, ante a ilegal e gravíssima conduta do juiz da causa: parcialidade. O STF decidiu em harmonia com o modelo constitucional brasileiro: estado democrático de direito.  
Filigrana tem significado decorativo, algo tecido em fios de ouro ou prata, trabalho feito com arte, delicadeza e fantasia. Na operação lava-jato houve muita fantasia, obra de arte criada pelo juiz e pelo procurador da república para tirar a liberdade de pessoas inocentes. Obra de arte que lhes rendeu dividendos financeiros e políticos. Arte de um grupo de moleques que, indevida e levianamente, mediante provas forjadas, destroçou a economia do país e manchou reputações.

terça-feira, 7 de dezembro de 2021

A BÍBLIA E A CONSTITUIÇÃO III

No Brasil, desde que satisfaçam os requisitos de idade, experiência, moralidade, escolaridade, conhecimento especial e cultura geral, as cidadãs e os cidadãos podem prestar concurso público para a magistratura. Se aprovados, são nomeados e empossados no cargo e, assim, ingressam na carreira. Há também ingresso direto nos tribunais por via política e livre nomeação (sem concurso público). Certa vez, o Superior Tribunal Militar negou-se a empossar no cargo de ministro cidadão nomeado pelo presidente Sarney. Diante disto, o presidente nomeou outra pessoa que foi aceita pelo tribunal e empossada no cargo. O Supremo Tribunal Federal (STF) teria a mesma coragem? Os ministros negariam posse a um pastor evangélico que apesar de mentiroso e hipócrita foi aprovado pelo Senado e nomeado por um presidente nazifascista? A mentira e a hipocrisia não são impedimentos morais ao exercício da magistratura? A mentira, o engodo, a hipocrisia, não são incompatíveis com o decoro exigido para o cargo?
Os requisitos acima citados são exigidos também ao candidato a ministro do STF. Incluem idoneidade moral, notável saber jurídico e posicionamento diante de questões relevantes. Todavia, a politicagem e a esperteza enganosa tornam todos esses requisitos irrelevantes no plano dos fatos. Abrem as porteiras para a passagem da boiada. 
Nos tribunais brasileiros exercem judicatura magistrados teístas, deístas, católicos, protestantes, espíritas, judeus, muçulmanos, budistas. As crenças religiosas, ideológicas e filosóficas estruturam o pensamento e a visão de mundo, entranham-se na alma e condicionam as ações humanas. Portanto, a influência delas nas decisões judiciais é inarredável. Alguns magistrados exteriorizam-nas ao vestir a toga. Lembro de dois magistrados do Estado da Guanabara que cobriam inteiramente o terno e a gravata com a toga. Assumiam postura sacerdotal. O mesmo fazia outro juiz que ingressou na magistratura do novo Estado do Rio de Janeiro pelo quinto constitucional na vaga destinada aos advogados. Nomeado depois para ministro do STF, ele conservou aquela digna postura desprovida de vaidade. Conheci colegas que observavam rigorosamente a separação entre estado e igreja. Eles seguiam o exemplo de Lavoisier. O notável cientista francês dizia deixar a bíblia na antessala do laboratório. Aqueles juízes deixavam a bíblia no vestíbulo do fórum. Nenhum desses meus colegas de toga participava de projeto de poder político. Mantinham a independência em relação à política partidária e aos poderes legislativo e executivo. Exerciam o poder jurisdicional dentro das balizas constitucionais. Cediam às pressões só quando sintonizadas com as convicções por eles construídas a partir das provas idôneas produzidas no devido processo jurídico.   
A eleição de pastores evangélicos mudou o cenário; introduziu o fundamentalismo religioso na política. Aqueles evangélicos que têm ambições políticas e afinidade formam um bloco coeso na defesa de um informal projeto de dominação. As lideranças políticas europeias na década de 1930 comportaram-se como o avestruz. O resultado foi a dominação nazista e a carnificina da segunda guerra mundial. Os brasileiros devem ficar atentos e ativos. O bloco evangélico nazifascista ocupa as chefias do governo, da câmara e do senado. Logo ocupará a chefia da suprema corte se não houver resistência contra esse movimento do qual se depreende a intenção de fazer do Brasil uma república autoritária religiosa fundamentalista. 
Dir-se-á: Luiz Inácio Lula da Silva será eleito presidente da república em 2022. A extrema direita perderá o poder e o projeto de dominação naufragará. 
Indaga-se então: Depois de terminar o mandato de Lula, a extrema direita permanecerá sob controle? Porventura os parlamentares e ministros nazifascistas deixarão de ocupar cadeiras no parlamento e na suprema corte? 
Se os socialistas e os liberais cruzarem os braços, assistirão ao enterro da democracia. A extrema direita saiu do armário e mostra as garras na Europa e na América. Nas igrejas evangélicas, nas corporações, nos bancos, nos partidos políticos, na administração pública, nos meios de comunicação social, há células da extrema direita, bases fortes que não devem ser menosprezadas.     
Concluída a sabatina no Senado (1º/12/2021), o sabatinado se vangloriou de ter enganado os examinadores. Disse que a vitória para o homem foi um passo e para os evangélicos foi um salto. Na visão de brasileiros de outras linhas cristãs, foi um assalto. Parlamentares, presidente da república, esposa e auxiliares, todos evangélicos, festejaram a proeza com abraços, gestos, pulos e urros. A fim de acalmar as bases eleitorais e o rebanho, os parlamentares evangélicos logo avisaram que as palavras ditas na sabatina contrárias à fé e à doutrina das suas igrejas visavam apenas à vitória do pastor. Portanto, não eram para valer. Assim, também, não eram para valer as palavras contrárias ao nazifascismo por ele praticado quando servia ao atual presidente da república. 
De esperteza em esperteza, navega o barco desta republiqueta de bananas. Parodiando Napoleão Bonaparte: a quem tem padrinho ou patrocínio tudo se concede e facilita; aos outros, o rigor da lei. A consequência disto, no caso em tela, é a desmoralização do tribunal. 


sábado, 4 de dezembro de 2021

A BÍBLIA E A CONSTITUIÇÃO II

Aprovado na sabatina a que se submeteu no Senado para obter vaga no Supremo Tribunal Federal (STF), André Mendonça disse que trouxera prontas as respostas ao questionário feito pelos senadores. Como noticiado na Globonews, um dos examinadores, ao saber disto, ficou decepcionado e apreensivo. Com razão. A indiscreta confissão do sabatinado tornou pública a fraude apta a anular a sabatina: informação privilegiada. Nos termos do código civil, tal sabatina está viciada e caracteriza ato nulo de pleno direito.   
Preparar-se para prestar exames nos concursos públicos é usual e necessário. Entretanto, o que não pode é o candidato receber informação privilegiada sobre as questões do exame. Há pouco tempo, no Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, foi impugnado concurso para a magistratura porque alguns candidatos foram previamente informados sobre as questões que seriam propostas. Percorridos os trâmites administrativos, a impugnação foi rejeitada e as nomeações dos aprovados foram confirmadas. Prevaleceu a teoria do fato consumado. No caso Mendonça, o fato ainda não se consumou.
Certamente, os componentes do bloco parlamentar evangélico que pressionavam o Senado para aprovar o presbiteriano, encarregaram-se de informa-lo antecipadamente das questões que seriam formuladas, quiçá até o ajudaram a montar as respostas. Esse fato ajusta-se à dissertação clara e firme do jornalista André Trigueiro no programa estúdio 1, do canal Globonews, sobre a formação de um ativo bloco evangélico com projeto de poder. Na ocasião, os jornalistas comentavam a citada sabatina.  
O projeto referido pelo jornalista parece existir de fato, mas não de direito. A intenção que se capta nesse movimento é a de fazer do Brasil uma república autoritária religiosa fundamentalista. Evidenciam esse propósito: (i) as ruidosas manifestações do bloco evangélico no plenário da Câmara dos Deputados sobre a conquista do poder político iniciada com a eleição do atual presidente da república (ii) a influência cada vez maior da bancada evangélica fundamentalista no Legislativo (iii) o ingresso dos seus representantes no Judiciário.
Segmento da mais ampla família religiosa protestante apropriou-se do termo “evangélico”, como se apenas os seus membros fossem os seguidores autênticos e fiéis do evangelho de Jesus, o Cristo, senhores exclusivos da sagrada escritura. Consideram pervertidas as demais denominações cristãs. O candidato sabatinado integra esse grupo “terrivelmente evangélico” que coloca a Bíblia acima de tudo. Daí, a assertiva: na vida, a Bíblia; no tribunal, a Constituição, do esperto sabatinado para agradar a comissão examinadora durante a sabatina. 
A Bíblia por ele mencionada compõe-se de 73 livros dos mais diversos autores (alguns desconhecidos) e se divide em duas grandes partes: a judaica (antigo testamento) e a cristã (novo testamento). Os cinco primeiros livros da primeira parte foram escritos no século IV antes de Cristo por eruditos judeus liderados por Esdras, sob a tutela do rei da Pérsia. Os quatro primeiros livros da segunda parte foram escritos nos séculos I e II da era cristã por eruditos cristãos em nome dos apóstolos. Intitulam-se evangelhos, palavra que significa “boa nova”, apelido da mensagem trazida ao mundo por Jesus, o Cristo. 
Na vida do povo brasileiro importa não só essa bíblia branca de pouca verdade e muita fantasia, mas, também (i) a bíblia morena das crenças, dos cultos e rituais dos nativos e dos afrodescendentes (ii) a bíblia do espiritismo (Livro dos Espíritos) (iii) a bíblia dos muçulmanos (Corão) (iv) outros textos sagrados. Há milhões de brasileiros das mais diferentes confissões religiosas e místicas todas amparadas no ordenamento jurídico.


quinta-feira, 2 de dezembro de 2021

A BÍBLIA E A CONSTITUIÇÃO

Na sabatina de ontem no Senado (01/12/2021), o bacharel André Mendonça, candidato ao cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal –STF, ao defender o seu merecimento, buscou convencer os senadores de que a sua religião não iria influir nos seus julgamentos no tribunal. Disse que na vida é a Bíblia e no tribunal, a Constituição. Certamente, pretendeu enfatizar o óbvio: o estado brasileiro é laico, embora a nação brasileira seja religiosa. Retórica oportuna e palatável com o objetivo de conquistar aprovação dos examinadores, o que realmente aconteceu. Faltam, agora, a nomeação pelo presidente da república e a posse a ser dada pelo presidente do STF marcada para o dia16/12/2021. Ante o encerramento das atividades do STF no dia seguinte, provavelmente o novo ministro entrará em exercício no próximo ano ocupando a vaga deixada pelo ministro Marco Aurélio.  
O fato de o cidadão ser filiado a uma religião não é óbice, no vigente ordenamento jurídico brasileiro, ao exercício da judicatura. Nos tribunais brasileiros há cristãos católicos, cristãos protestantes, espíritas, judeus, muçulmanos, budistas. A composição dos tribunais reflete a liberdade religiosa assegurada na Constituição. Óbice é o candidato situar-se nas extremidades do espectro político, tanto à esquerda como à direita. Ambas, a comunista e a nazifascista, são antidemocráticas e o Brasil é um estado democrático de direito. Cabe aos representantes do povo brasileiro impedir que comunistas e nazifascistas ocupem cargos relevantes para os destinos do país e venham destruir a própria democracia. Socialistas, sim, comunistas não. Liberais, sim, nazistas não. 
A formação acadêmica, cultural, ideológica, moral, religiosa e mística do juiz influi nas suas decisões, posto não haver decisão judicial puramente normativa. A complexidade do raciocínio dos magistrados na aplicação do direito ao caso concreto tem sido tratada em nível científico por respeitáveis teóricos da ciência e da filosofia jurídicas como Perelman, Alexi, Siches, Reale. 
Basta lembrar que além de norma, o direito é fato e valor, produto do pensamento, da consciência e da experiência dos humanos no seu evolver histórico e social. A juridicidade implica esse tripé. O magistrado interpreta o fato sub judice à luz dos valores materiais e imateriais vigentes na sociedade que mais lhe tocam na alma e busca no ordenamento jurídico a norma que melhor se afeiçoa à sua compreensão e à sua vontade para fundamentar a sua decisão final. 
Nesse mister, o magistrado não está alheio às pressões de grupos ou da sociedade em geral. A elas pode sucumbir. O direito está longe de ser uma ciência exata. Caracteriza-se mais como ciência do razoável. Por vezes, ao aplicarem a norma ao caso concreto, os magistrados se afastam também do razoável e do honesto, nutrindo ideias, sentimentos e interesses próprios e/ou de outros. Isto não só no Brasil como também em outros países. Na democracia estadunidense, por exemplo, os juízes da suprema corte são tendenciosos e racistas, apesar da flexibilização quanto aos negros e indígenas a partir da segunda metade do século XX.  Se o juiz foi indicado por presidente republicano, ele não facilitará causa dos democratas; se indicado por presidente democrata, ele não facilitará causa dos republicanos. Isto em nível político. Em nível econômico, facilitam causa dos donos do capital e são rigorosos com os prestadores de serviço remunerado. Em nível religioso, facilitam causa do protestantismo e são rigorosos com os católicos e demais confissões.  
A Bíblia é livro sobre o qual se põe a mão para jurar obediência à lei e à verdade. Divide-se em duas grandes partes contraditórias entre si: a judaica (Antigo Testamento) e a cristã (Novo Testamento). O líder cristão, hebreu-israelita, revogou a escritura do líder hebreu-hebreu, embora, com astúcia política, tenha dito que viera apenas aperfeiçoá-la. Na verdade, os dogmas essenciais do judaísmo foram por ele rejeitados. Até o seu deus, amoroso e misericordioso é diferente do deus cruel e vingativo dos judeus. 
Os cristãos católicos e protestantes apegados ao Antigo Testamento, na verdade, não são cristãos e sim judeus. Os católicos e protestantes fiéis aos ensinamentos de Jesus, o Cristo, apegados ao Novo Testamento (à “boa nova” = evangelho) são os autênticos cristãos. Ainda assim, ser cristão na linha de Jesus, o Cristo, é missão quase impossível neste planeta. Daí, ele ter afirmado que o seu reino não era deste mundo. Todavia, a sua doutrina contribuiu para melhorar o pensamento e a conduta de grande parte da população mundial. Entretanto, decorridos dois mil anos, ainda prevalece a face demoníaca da natureza humana, tanto no Oriente como no Ocidente.