sábado, 30 de junho de 2012

SAGRADO


Sagrado significa algo que os humanos consideram santo, puro, venerável, intocável ou inviolável. O vocábulo tem sido aplicado a: (1) deuses, cultos, ritos, imagens; (2) idéias, princípios, números, palavras, ensinamentos, mandamentos, relações; (3) mestres, profetas, sacerdotes, monges; (4) animais, como o escaravelho e a vaca; (5) cidades, como Jerusalém e Meca; (6) objetos, como cálice, espada, livro, totem, cristais; (7) relíquias cristãs da crucifixão, tais como: fragmentos da cruz, cravo, espinho, sudário; (8) formas e lugares naturais como astros, árvores, pedras, montanhas, grutas, lagos.  

Sagrado é rótulo que os humanos colam em todas essas coisas. Exemplos: (1) Vida sagrada, rótulo de um tipo de existência implicado nas relações humanas com o mundo físico e espiritual. (2) Templo sagrado, rótulo da construção material e ideal dedicada a cultos e rituais religiosos e místicos. (3) Bíblia sagrada, rótulo de uma coleção de 73 livros distribuída em duas partes: a primeira, produzida pelos judeus (antigo testamento) e a segunda, produzida pelos cristãos (novo testamento). (4) Sagrada família, rótulo reducionista e estereotipado que o sacerdócio católico colou na família de José e Maria, sem mencionar os irmãos e as irmãs de Jesus. (5) Sagrado coração, rótulo católico ao sentimento de amor que havia em Jesus. (6) Hora sagrada, rótulo do momento do dia dedicado à prece e à meditação. (7) Palavra sagrada ou “palavra de Deus”, rótulo das mensagens contidas na bíblia. (8) Número sagrado, rótulo dos números com significado simbólico: 1 = unidade fundamental do universo: Deus; 2 = dualidade: ângulo, esquadro, pólos positivo e negativo, matéria e espírito; 3 = perfeição: tríade, trindade, triângulo; 4 = estabilidade: quadrado, ar + água + fogo + terra; 7 = duração: dias da criação do mundo, ciclos da vida humana, velas do candelabro; 10 = mandamentos, soma dos números perfeitos: 1 + 2 + 3 + 4; 12 = divisão: casas do zodíaco, meses do ano, tribos de Israel, colégio apostólico original; 40 = infinito: possibilidades múltiplas.

Lideranças espirituais da humanidade cobrem entes físicos e metafísicos com o manto da santidade, da inviolabilidade, da pureza; desse modo, criam a esfera do sagrado, repositório de temores, interesses, consolos e esperanças. O homem é a medida de todas as coisas afirmava Protágoras, filósofo grego. Como há diferentes visões de mundo, cada indivíduo ou grupo humano mede e valora as coisas segundo a sua própria visão e sagra o que lhe parece digno de cuidado especial. Conseqüência: o sagrado de um grupo pode ser o profano de outro. Deus não é sagrado nem profano; existe indiferente aos atributos com os quais os humanos o qualificam. Os ateus não acreditam na sua existência. Os cientistas dele prescindem quando estudam e explicam a origem, a estrutura e o funcionamento do universo. Coisas sagradas para membros de uma religião não têm valor para membros de outra religião. Templos sagrados de um povo são demolidos por outro. Conquistadores europeus pisoteiam o solo sagrado (cemitério) dos indígenas americanos. População assiste com reverencial respeito vacas sagradas transitarem e defecarem nas ruas das cidades indianas, enquanto os gaúchos fazem churrasco da carne bovina.

Infantilidades, fantasias, falsidades e contradições contidas nas escrituras rotuladas de sagradas são vistas como “verdades sagradas” por seus adeptos. A cegueira dos crentes convém aos mercadores da fé. Numinoso, o sagrado viceja no terreno da ignorância, imaginação, fragilidade, temor e esperança, genetrizes da crença religiosa. O ser humano recorre à ilusão para atenuar vicissitudes da sua fugaz existência neste planeta. Busca um sentido. Aspira eternidade. Disto se aproveitam os estelionatários da fé.

sexta-feira, 22 de junho de 2012

PILULAS


Traumas do povo brasileiro. No século XIX: exílio de Pedro II. No século XX: anos 50: derrota na copa do mundo, mortes de Francisco Alves e de Getúlio Vargas. Anos 80: mortes de Tancredo Neves e de Ayrton Senna.

Alegrias da gente brasileira. No século XIX: chegada do rei de Portugal à colônia americana, independência da colônia e abolição da escravatura. No século XX, anos 40: fim da guerra mundial e regresso dos soldados brasileiros. Alguns ficaram no cemitério de Pistóia (Itália). Nos anos 50 e seguintes: vitórias nas copas do mundo de futebol de 1958, 1962, 1970 e 1994. Nos anos 80: fim da autocracia, eleições diretas em todos os níveis, promulgação da Constituição. No século XXI, ano 2002: vitória da seleção brasileira na copa do mundo de futebol; eleição de um operário à presidência da república.

Celebração. Hoje, 22 de junho de 2012, reúnem-se aqui em casa Jussara, minha esposa; Evandro, Gabriela e Rafael, meus filhos; Pedro, meu neto e Samantha, minha nora; para celebrar meus 73 anos de idade (22/06/1939). Ocasião rara. Sou refratário a esse tipo de comemoração. Pouquíssimas vezes houve, assim mesmo, de modo discreto no âmbito do lar. Na infância, em minha cidade natal (Ponta Grossa, Estado do Paraná) ainda havia bolo que minha mãe fazia muito bem. Depois que mudamos para Curitiba (1949) nunca mais. Tempos difíceis. Desde o curso primário até o curso universitário passei meus aniversários fazendo as provas escolares que antecediam as férias de julho. Não recebi brinquedos nem coisas supérfluas. Família numerosa e pobre. O afeto dos meus pais, dos meus irmãos, da minha esposa, dos meus filhos e neto, dos meus amigos e parentes, tem sido o presente que guardo no meu coração e pelo qual sempre agradeço a Deus. Faço o mesmo agradecimento pelo amor que recebi das minhas antigas namoradas, desde a primeira (menina do jardim de infância, aos 6 anos de idade) até a penúltima (irmã da fraternidade rosacruz, aos 31 anos). Casei com a última namorada, aos 32 anos. Dizem que a primeira namorada é inesquecível. Quanto a mim, lembro de todas, sem exceção e com ternura. Nos momentos semanais de recolhimento espiritual, agradeço a Deus também pelo bem querer dos meus irmãos da Ordem R+C, dos meus professores, dos meus colegas de bancos escolares, dos meus companheiros de boemia da época de solteiro e dos vizinhos nos diversos bairros das diferentes cidades em que morei. Incluo no agradecimento as pessoas com quem trabalhei, desde a infância até a maturidade, pela paciência que tiveram comigo, pelo saber que me transmitiram e pela estima que me devotaram. Agradeço a Deus pelo respeito e pela admiração que me dedicaram alunos da faculdade, colegas de toga, advogados, membros do ministério público, defensores públicos e serventuários. Dou graças a Deus pelos dons do meu ser e pelos bens que me foram confiados. A vida continua com saúde e boa dose de felicidade.

quarta-feira, 20 de junho de 2012

PILULAS


Rogai por nós. Atitude cômoda. Esperamos que Deus, os santos, os pais, os professores, o governo e outros façam por nós alguma coisa, zelem por nossos bens e interesses, quando tudo isto a nós incumbe realizar. A frase de J. F. Kennedy estava parcialmente correta: devemos perguntar o que devemos fazer pela pátria e não o que a pátria deve fazer por nós, porém o complemento é necessário: nós pela família, pela comunidade, pela pátria e pelo mundo; a família, a comunidade, a pátria e o mundo por nós. O indivíduo não deve ser tratado como peça de um mecanismo ou de um organismo, sem luz e dignidade próprias, sem merecer os préstimos da sociedade e do Estado. A relação entre pessoa e nação deve ser de troca justa e lícita. O indivíduo deve servir ao conjunto e receber segurança; contribuir para o todo mediante atos e tributos, mas receber assistência e serviços públicos necessários e úteis.      

Conhece-te a ti mesmo. Primeiro passo. Serve a ti mesmo, à tua família, à tua comunidade, ao teu país. Escolher os governantes é um dos modos de prestar este serviço. 

Viver a dualidade. Espírito e matéria. Consciência de estar em dois mundos ao mesmo tempo. Consciência de que esses dois mundos são expressões de uma única e sublime realidade: alma universal (Vida, Luz e Amor).

Comer e beber. A comida mais saborosa não se compara ao alimento divino. A bebida mais agradável não se compara ao néctar divino. Quem experimentou?

Não temais aqueles que matam o corpo, mas não podem matar a alma (Jesus, citado por Thomas Hobbes, in Leviatã, p. 411 + Novo Testamento, Mateus 10: 28). O suicida, fanático, não tem medo de morrer por uma causa religiosa ou política; mata o corpo certo de que preservará a alma. Os ascetas desprezam o corpo e valorizam a alma.

Obediência a Deus. Como saber se o mandamento é dele ou do homem político e ambicioso que o escreveu? (Hobbes, p. 412). Não só o mandamento como também toda a escritura “sagrada”. Na bíblia, antigo e novo testamento, nada provém de Deus ou do espírito santo. Tudo provém do cérebro de alguns espertalhões, que sabiam ler e escrever, para dominar a massa ignara. Desde o século IV antes de Cristo, quando Esdras e companheiros redigiram os cinco primeiros livros do antigo testamento, até o século XX depois de Cristo, ler e escrever era privilégio de poucos. Na bíblia sobram lorotas e contradições, que mereceram a crítica de dois judeus ilustres: Spinoza (filósofo) e Einstein (cientista). Incrível como esse livro lastreou a civilização ocidental a partir da queda do império romano. Isto revela o altíssimo grau de ignorância e credulidade em que vivia a imensa maioria dos povos da Europa. Fé cega que atravessou o século das luzes (razão livre) e escraviza o espírito de gente crédula até os dias atuais, graças ao esforço contínuo e eficaz do clero católico e protestante que mantém o rebanho na cegueira. Reis e ditadores, visando proveito político e financeiro, apoiaram o clero nesse esforço. A doutrina religiosa combate a razão e a teoria científica.    

domingo, 17 de junho de 2012

FIBRA NO FUTEBOL


Habilidade às vezes não basta na atividade esportiva. Diante de certos adversários e em determinadas competições a habilidade individual necessita de complemento. No sumô japonês e na luta xavante, além da habilidade, aplica-se força máxima e violência mínima. Fibra, vontade inquebrantável de vencer, faro de gol, gana para golear (grana eles têm) são complementos de que carecem alguns jogadores brasileiros. Quando fazem um gol, acomodam-se: “fiz a minha parte”. Há gentilezas exageradas com as equipes estrangeiras durante o jogo, atitudes para se mostrar bom moço que, no fundo, revelam carência afetiva e subserviência (ternos abraços, afagos, entrega da bola nas mãos do adversário, mesuras excessivas no pedido de desculpa pela falta cometida). Sintomas de fragilidade mental, falta de têmpera e de virilidade. Jogadores com tais sintomas necessitam assistência psicológica de profissionais capacitados. A seleção brasileira deve ser integrada por gente que não tenha medo de assombração, comissão técnica e jogadores que não se intimidem com a boa fama dos adversários.

O jogo Brasil x Argentina (3x4), em 09/06/2012, foi um bom teste preparatório para os jogos olímpicos. No sistema ofensivo as duas seleções mostraram equivalência, o que se refletiu no placar. Neymar sofreu falta na área argentina ignorada pelo árbitro. Isto se deve à fama desse jogador de cair muito e cavar faltas. O pênalti poderia influir no resultado. A desonesta esperteza dá nisso. Os árbitros estrangeiros estão prevenidos e deixam de marcar até faltas que existem. Se permanecer na seleção brasileira, Neymar precisa deixar de fricotes, ser mais objetivo, não se meter no setor dos zagueiros e volantes da sua equipe, ficar de campana da linha intermediária para frente (como faz Messi, o seu ídolo), moderar a quantidade dos dribles (a qualidade é boa, repertório variado e bonito). Dele se espera mais eficácia nos passes e nas finalizações e menos quedas e reclamações de garotinho mimado.

A defesa argentina não deu sopa e desceu o sarrafo. Já a defesa brasileira assoprou a sopa até amornar e a deu de colher na boca do Messi, que a sorveu sem agradecer. Os gols do argentino resultaram da sua velocidade, simplicidade, objetividade, oportunismo e empenho na execução. Com essas características ele atua na seleção e no seu clube, carrega a bola nos pés com habilidade, corre em diagonal da direita para a esquerda, entra na área e chuta certeiro. Dois gols foram desse jeito na partida de sábado. Os defensores brasileiros apenas acompanharam a corrida do atacante. O seu terceiro gol saiu de fora da área. Depois de escapar de um adversário na linha intermediária ele conduziu a bola livremente até o semicírculo e chutou sem ser molestado.

Em beleza e grau de dificuldade, nenhum gol do argentino superou os gols de placa de Derley e Diego Souza feitos no dia seguinte, domingo, 10/06/2012, e o de Lucas feito na quinta feira, 14/06/201. No jogo Náutico x Botafogo (3x2) Vítor, do meio do campo, passa a bola com pouca força para o goleiro. O jogador do Náutico, Derley, sai em disparada, vence os adversários na corrida, alcança a bola um segundo antes do goleiro, aplica “meia lua” e faz o gol da vitória. Dedica a bela jogada ao seu filho Bernardo, recém nascido. No jogo Vasco x Bahia (2x1), Diego Souza também faz um gol espetacular. Na área, ele dribla os adversários e encobre o goleiro como um hábil e precioso toque na bola. No jogo São Paulo x Coritiba (1x0), Lucas aplica sensacionais dribles na entrada da grande área e chuta em diagonal marcando o gol.    

As jogadas de gol do Messi só se comparam com a jogada do Derley em velocidade, oportunismo e precisão. O argentino é do tipo goleador: insaciável, faz dez gols na mesma partida se a defesa adversária facilitar. Os seus chutes com a perna esquerda, na maioria, são precisos. Às vezes, falha na cobrança de pênalti. Ser goleador não significa ser gênio, nem o melhor jogador do mundo. Just Fontaine, o maior goleador de todas as copas (13 gols em uma só) não era gênio e nem o melhor jogador do mundo. O mesmo se diga de Sandor Kocsis, segundo maior artilheiro de todas as copas (média de 11 gols). Na seleção húngara de 1954, o gênio era Puskas; na brasileira de 1958, era Didi. Participando de 4 copas, Pelé obteve a média de 6 gols. Participando de 4 copas, Ronaldo Nazário obteve a média de 3,8 gols. Messi disputou copa sem fazer gol (2010). Atacante robótico, embora sofra desarmes, ele aproveita a fraqueza adversária para golear. Messi é deficiente na cobrança de faltas e escanteios, na maioria dos passes, na criação e no cabeceio. Comparado com Deco, Juninho Pernambucano, Marcos Assunção, Oscar, Pirlo e Riquelme, ele ainda é aprendiz. 

A FIFA e os fãs (fanatismo é cegueira) consideram Messi o melhor jogador do mundo. Esta admiração pelo argentino contribui para o fraco desempenho do fã em campo (caso de Neymar). Se aquela avaliação fosse correta, indicaria que o futebol mundial vai mal das pernas, postas as deficiências do eleito. No Brasil, pelo menos, há excelentes jogadores em equipes bem entrosadas. Na Europa (copa da UEFA, 2012) as seleções exibem bom entrosamento, futebol cibernético, mas as atuações individuais são sofríveis. As velhas estrelas já queimaram todo o combustível. Aguarda-se o surgimento de novas estrelas.

quinta-feira, 14 de junho de 2012

JUSTIÇA COMPROMETIDA


Poderoso na política brasileira, Luiz Inácio tem facilidade para cooptar. Foi ele que nomeou a maioria dos ministros do supremo tribunal, salvo as crias de Dilma Rousseff (Luiz Fux e Rosa Weber); de Fernando Henrique (Gilmar Mendes); de Fernando Collor (Marco Aurélio) e de José Sarney (Celso de Mello). A nomeação dos ministros é precedida de informal disputa entre candidatos não ostensivos, todos com padrinhos, negociada com o presidente da república e o grupo governista. Os requisitos de reputação ilibada e notável saber jurídico são negligenciados. Pesa a afinidade do perfil do candidato com o do grupo dominante. Muito se parlamenta. Compromissos são assumidos. Nada é de graça.

Ao estabelecer a competência privativa do presidente da república para nomear, o legislador constituinte distinguiu ministros e magistrados (CR 84, XIV e XVI). Ministro é auxiliar do chefe de governo. O procedimento de escolha e nomeação remonta aos tempos imperiais. Os membros do STF recebem o título de ministro e não de juiz.  Ministro vitalício e não o demissível ad nutum do artigo 84 da Constituição da República.

Magistrado é o agente do Estado com superior poder de governar. Na extensão do conceito incluem-se: (1) magistrados administrativos, como o presidente da república, membros do ministério público e do tribunal de contas; (2) magistrados judiciais, como os ministros dos tribunais superiores, os desembargadores e os juízes de instância. No uso estrito, o vocábulo magistrado designa exclusivamente os agentes togados do Estado que exercem a função jurisdicional. Esta magistratura togada atua só quando provocada no processo adequado para dar eficácia à ordem jurídica. Cabe-lhe controlar a constitucionalidade das leis e resolver litígios aplicando normas jurídicas segundo métodos hermenêuticos. Os juízes que ingressam na carreira por aprovação em concurso público e aqueles que ingressam diretamente nos tribunais (sem concurso) quando almejam passar à categoria de ministro dos tribunais superiores, assumem compromissos políticos como conditio sine qua non para preenchimento da vaga. Não se pode esperar independência e imparcialidade de ministro ligado ao governo por compromisso moral apto a abrir portas de comunicação entre o nomeado e quem o nomeou sem concurso público.

Luiz Inácio está cobrando a fatura. Livrou-se de ser processado por crime de responsabilidade enquanto governava. Ele se manteve no cargo graças: (i) à maioria que conquistou no Congresso Nacional; (ii) ao recuo dos oposicionistas ante a ameaça dos situacionistas de também instaurarem processo contra Fernando Henrique; (iii) à saída de José Dirceu que, a conselho do deputado Roberto Jefferson, retirou-se oficialmente do governo. Recentemente, ao buscar apoio de ministro desonesto nomeado por Fernando Henrique, Luiz Inácio mostrou estar cônscio das falcatruas. Ficou evidente o intento de: (i) usar a CPMI do caso “Cachoeira” como instrumento de chantagem; (ii) procrastinar o julgamento do processo apelidado de “Mensalão” para que a punibilidade dos réus seja extinta por exaustão do tempo (prescrição).

O citado processo, que o ministro Barbosa levou mais de ano para relatar, agora está retido nas mãos do ministro Lewandowski (nome do centroavante da seleção polonesa de futebol). Se alguns ministros pedirem vista, o julgamento dar-se-á depois da copa do mundo de futebol (2014). Dois ministros aposentar-se-ão este ano. Será necessário aguardar a nomeação de novos ministros. A presidente da república não tem prazo para a escolha. Preenchidas as vagas, os novos ministros pedirão vista por desconhecer o conteúdo do processo. Cada qual gastará cerca de um semestre na penosa tarefa. A previsão do Delúbio, um dos réus, pode se tornar realidade: isto vai dar em nada. Episódios como este da vida política brasileira (parlamentar, administrativa e forense) lembram ópera bufa, teatro de fantoches e a frase atribuída ao general De Gaulle: o Brasil não é um país sério. 

terça-feira, 12 de junho de 2012

ÉTICA E POLÍTICA


Em torno dos escândalos “Cachoeira” e “Mensalão” e nas reuniões com ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), o ex-presidente Luiz Inácio da Silva faz o que melhor sabe fazer desde os tempos em que era líder sindical: negociar. Graças a essa habilidade, ele se tornou o presidente mais poderoso em períodos democráticos da história republicana do Brasil. As emissoras particulares de TV refrearam o ímpeto oposicionista para não perder a concessão outorgada pelo governo federal (CR 223 + 49, XII). Em jogo: milhões de dólares e dívidas com o banco estatal. Jornalista de credibilidade nacional foi demitido de emissora de TV privada por crítica sistemática ao governo. O pessoal do ramo entendeu o recado: ou a empresa demite jornalista inconveniente ou perde a concessão. A liberdade de imprensa ficou reservada ao jornalismo impresso e à rede de computadores. No século XX, evidenciou-se o domínio dos meios de comunicação social pelos detentores do poder econômico. O direito de propriedade assumiu a primazia. A liberdade de imprensa desvinculou-se da verdade e da honestidade. A informação é manipulada segundo os interesses do dono do veículo. 

Luiz Inácio agregou partidos grandes, médios e pequenos ao seu grupo político e sindical, ampliou o número de ministérios para atender a essa clientela e a manteve nutrida de benesses durante todo o mandato. Obteve folgada maioria no Congresso Nacional. Isto lhe garantiu blindagem contra eventuais processos por crime de responsabilidade política. Permitiu-lhe, ainda, controlar comissões parlamentares e executar o seu programa de governo. Conseguiu se reeleger e eleger a sucessora, mulher sem carisma e sem experiência pessoal em disputa por cargos eletivos. Coube à companheira a tarefa de guardar o cargo para o companheiro. Daí a insistência de Luiz Inácio junto ao partido para lançá-la candidata. Desse modo, ele deu seqüência ao projeto de permanência da sua facção no governo por 20 anos.

Luiz Inácio nomeou 6 e a sucessora nomeou 2 ministros para o Supremo Tribunal Federal. A facção lulista soma 8 ministros entre os 11 daquele tribunal. Isto garante ao grupo governista apoio judicial em questões relevantes. Luiz Inácio conversou com os ministros Dias Tóffoli, Carmen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes. A presidente Dilma Rousseff conversou com Ayres Britto, presidente do STF. De todas essas conversas, vazou a mantida com Gilmar. Soube-se, então, que em todas essas conversas entrava o próximo julgamento do processo apelidado de “Mensalão”.  

Entendimento entre parlamento, chefia de governo e tribunal ocorre também em outros países. Serve de exemplo a crise entre o presidente e o congresso dos EUA de um lado e a corte suprema de outro, nos anos 30, do século XX. Depois de duradoura queda de braço com o presidente Roosevelt e com o congresso e de declarar inconstitucionais dezenas de leis, a corte suprema recuou e apoiou o programa de desenvolvimento social e econômico do governo (New Deal) ao decidir, após 1937, pela constitucionalidade das leis federais impugnadas por representantes das altas finanças e da indústria. (Conferir: A Corte Suprema e o Direito Constitucional Americano. Leda Boechat Rodrigues. Rio, Forense, 1958, p.118).   

Luiz Inácio superou Fernando Henrique em dimensão histórica e prestígio pessoal. Fernando Henrique favoreceu a classe rica e o capital financeiro. Zombou da classe média, ofendeu os aposentados e menosprezou a classe pobre. O projeto de manter o seu grupo no poder por longos anos gorou, enquanto o de Luiz Inácio progride. A política deste, voltada para as classes desfavorecidas, torna difícil o retorno do grupo tucano ao poder pela via democrática. Só um golpe de Estado tornará isto possível. O grupo tucano terá de fazer o que a UDN e os militares da aeronáutica fizeram como Getúlio Vargas. Pelo voto, ninguém o venceria. Então, mataram-no (Virgínia Lane dixit). Pelo voto, ninguém vencerá Luiz Inácio.

sábado, 9 de junho de 2012

PALADINOS DA ÉTICA


A ética e o direito podem ser defendidos com recato e firmeza, sem alarde. Quando o agente público freqüenta os meios de comunicação social como paladino da lei e da moral, convém ao povo colocar as barbas de molho. Delegados de polícia, membros do ministério público, legisladores, chefes de governo, ministros, juízes, quando se postam como paladinos e se envaidecem com as loas que os incensam, provavelmente ocultam outra face pouco lisonjeira. Firmes na imagem de herói dos bons costumes, eles sentem-se autorizados a contornar a lei. Acreditam-se novos Midas. Soberbos, carimbam de lícitas as suas ações e omissões, inclusive aquelas que o ingênuo infante percebe como crimes previstos na lei penal. Descerrada a cortina, colocados ao nível das pessoas comuns, ficam aturdidos ante a outrora inimaginável probabilidade de também eles sofrerem as penas da lei. A igualdade perante a lei, em condições adversas, se lhes afigura preceito injusto. Tais pessoas consideram-se merecedoras de tratamento especial e de absolvição compensadora de efetivos ou imaginários serviços prestados à sociedade e ao Estado.     

Ao depor no conselho de ética do Senado Federal (29/05/2012), o senador Demóstenes Torres, membro do ministério público estadual goiano, acusado de participar do esquema de corrupção apelidado “Cachoeira”, equivocou-se ao afirmar que o processo político é espécie do processo administrativo. Inverteu gênero e espécie. O processo político é a dinâmica do Estado. Os fins desse processo estão umbilicalmente ligados aos fins do Estado. As regras desse processo estão contidas na Constituição, nas leis e nos costumes. As autoridades que o presidem são do Estado, dispõem do poder discricionário na extensão que o direito autoriza e nem sempre são punidas pelos abusos que praticam. Há três tipos básicos de processo político: parlamentar, administrativo e judicial. Esses tipos seguem as regras estabelecidas na ordem jurídica (garantia do devido processo legal); admitem as garantias do contraditório (ação versus exceção), da ampla defesa e do juiz natural. A diferença está nas causas que os instauram e na decisão que os encerra. A decisão final no processo parlamentar é política, sem laços necessários com a lógica jurídica, pois inclui circunstâncias que transcendem o âmbito da lei. No processo administrativo a decisão é legal, vinculada aos estritos termos da lei. No processo judicial a decisão é jurídica, segundo o direito interpretado pelos juízes.

O processo parlamentar compreende as vertentes: (1) legislativa, no que se refere à produção de emendas à Constituição, de leis, decretos legislativos e resoluções; (2) fiscal e de controle, no que concerne aos atos e contas da administração pública; (3) investigativa, quanto a fato de relevante interesse público; (4) disciplinadora, quanto à conduta de senadores e deputados. Cabe à comissão parlamentar de inquérito, órgão interno do Poder Legislativo com função temporária e investigativa, apurar fato determinado, como no caso Cachoeira. A comissão dispõe de plenos poderes de investigação. No final dos trabalhos, elabora relatório com propostas e indicações. Encaminha-o à Mesa (órgão diretor), ao Ministério Público, à Advocacia-Geral da União e ao Executivo, conforme o caso, para as providências cabíveis. Se na apuração do fato ficar constatado envolvimento de algum parlamentar, a comissão poderá sugerir à Mesa instauração de processo disciplinar, cujos trâmites acontecem no conselho de ética da Casa (Senado ou Câmara dos Deputados). Partido político também pode requerer a atuação desse conselho, como aconteceu no caso do senador Demóstenes Torres, denunciado por conduta incompatível com o decoro. Instaurado o processo disciplinar, completada a instrução após ampla defesa do acusado, o conselho decidirá pelo arquivamento ou pelo julgamento. Se for a julgamento, o parlamentar só perderá o mandato se assim decidir, em sessão plenária, a maioria absoluta dos membros da Casa. Decisão política e soberana, livre das algemas jurídicas quanto ao mérito. O Judiciário só poderá anular tal decisão se a Casa a proferir sem respeitar a garantia do devido processo legal.

sexta-feira, 8 de junho de 2012

ANJO E DEMÔNIO

O ser humano tem dupla face: angelical e demoníaca. A primeira está ligada ao mundo espiritual. A segunda está ligada ao mundo material. A face angelical prioriza a fé e se volta para a santidade e a beleza. A face demoníaca prioriza a razão e se volta para a verdade e a justiça. O aspecto demoníaco deriva das apetências geradas pela natureza terrenal da espécie humana. O código genético da espécie humana gera efeitos  em nível biológico que se refletem de modo positivo e negativo no comportamento social. Tais efeitos integram o lado demoníaco (terrenal) da personalidade. Não há demônio externo ao ser humano. O demônio como entidade isolada e maldosa brota da imaginação de líderes religiosos. Não tem existência real. Foi criado com o propósito de: (i) atender a inclinação do indivíduo de transferir a culpa dos seus atos censuráveis a terceiros; (ii) manter as pessoas fiéis à igreja e aos seus mandamentos; (iii) aterrorizar as pessoas com sofrimentos no inferno, domicílio do tal demônio, caso violassem os preceitos divinos. Os líderes religiosos, dizendo-se inspirados pelo espírito santo, classificam os preceitos em divinos e humanos, e estabelecem os respectivos castigos. Jesus, o profeta e mestre dos cristãos, fruto da conjunção carnal de homem e mulher, como os demais seres humanos, tinha também a mesma natureza bipolar: angelical e demoníaca.

quarta-feira, 6 de junho de 2012

AMOR E JUSTIÇA2


Às relações humanas convém a nominal e negativa definição: amar é não odiar; odiar é não amar. A ausência de afeição pode significar indiferença e não ódio. Inobstante a contraditória conduta de Jesus que transparece da narrativa dos apóstolos, os seus ensinamentos e mandamentos podem ser acolhidos por qualquer pessoa. Ateus, teístas, judeus, muçulmanos, hinduístas, budistas, xintoístas, podem aceitar o mandamento de amar ao próximo por ser o amor uma lei cósmica. Ao mesmo tempo, podem rejeitar o caráter divino que os cristãos atribuem ao profeta. No plano dos fatos, muitos que se intitulam cristãos não seguem os ensinamentos e os mandamentos de Jesus, o Cristo. Sacerdotes católicos e protestantes entregam-se à luxúria, conspiram, mentem, provocam batalhas em nome de Cristo. Filhos matam pais visando a entrar logo na herança. Para se livrar do incômodo, pais matam filhos, mães jogam filhos no lixo, crianças são largadas na rua como cães sem dono. Invasões, conflitos, genocídios, são praticados por nações e governos ambiciosos. Tortura, roubo, recusa de prestar ajuda, devastação da natureza. A falta do humanitário amor está na base dessas censuráveis condutas. O Estado pode cominar pena a ações e omissões contrárias ao bem comum, porém não pode obrigar as pessoas a cultivarem amor em seus corações.

A abordagem realista e racional do amor, como força afetiva essencial da vida, sem o colorido romântico que lhe empresta o poeta, permite percebe-lo como gerador da inclinação para coisas que causam prazer. A relação sexual entre animais racionais se diferencia da relação entre animais irracionais apenas por envolver fantasia, religião, ética e direito. O amor do ser humano a si próprio provém do desejo de atender aos reclamos do corpo e da alma. O amor entre o homem e a mulher, narrado no romance e na poesia, inclui a submissão, o que levou Jean-Paul Sartre a definir o amor como o desejo de possuir o outro. O desejo, aglutinador de apetências, faz o ser humano procurar fora de si mesmo o poder, a fama, a riqueza, o saber, a felicidade.

Sófocles, na “Antígona”, se refere a essa força afetiva: Amor, invencível amor, tu que subjugas os mais poderosos; tu, que repousas nas faces mimosas das virgens; tu que reinas tanto na vastidão dos mares como na humilde cabana do pastor; nem os deuses imortais, nem os homens de vida transitória podem fugir a teus golpes; e quem for por ti ferido, perde o uso da razão! Tu arrastas, muita vez, o justo à prática da injustiça e o virtuoso, ao crime; tu semeias a discórdia entre as famílias... Tudo cede à sedução de uma mulher formosa, de uma noiva ansiosamente desejada; tu, amor, te equiparas, no poder, às leis supremas do universo, porque Vênus zomba de nós!  

A força afetiva e magnética da vida manifesta-se entre os seres humanos como amizade, simpatia, fidelidade, caridade, compaixão, solidariedade, fraternidade, paixão, devoção, veneração. Inspira a proteção à família, às crianças, aos adolescentes, aos idosos, aos deficientes físicos e mentais. Sem exigir reciprocidade, pessoas amam as virtudes e denominam: (i) teose, ao amor a Deus; (ii) justiça, ao amor à igualdade; (iii) filosofia, ao amor à sabedoria; (iv) ciência, ao amor à verdade; (v) ética, ao amor à bondade; (vi) arte, ao amor à beleza; (vii) religião, ao amor à santidade.

O magnetismo do amor associa os seres humanos. A necessidade, a utilidade e o prazer são os motores do interesse na associação. A elegância das formas atrai as pessoas. A existência do ser vivo transcorre na fração da eternidade capturada pela inteligência humana denominada tempo. Os sentimentos humanos se expressam e duram nesse tempo. A relação amorosa entre as mesmas pessoas tanto se desgasta como se fortalece. Vigiai e orai, recomendava o profeta e grande mestre dos cristãos.

sábado, 2 de junho de 2012

AMOR E JUSTIÇA


A falta de amor aos filhos, por ser atípica, não gera efeitos jurídicos. A censura limita-se ao campo da moral, da religião e do misticismo, sempre que a existência de Deus for aceita sem reservas como fonte da vida (alma universal), da luz (inteligência) e do amor (força afetiva essencial). No sentido amplo, amor é força atrativa inerente à vida. Em nível micro cósmico, essa força estrutura átomos, moléculas e células. Em nível macro cósmico, essa força estrutura sistemas estelares e galáxias. Os cientistas, no extremo das investigações nucleares e das investigações astrofísicas, incapazes de identificar a fonte, consideram essa força gerada espontaneamente. Em biologia também se acreditava na geração espontânea de bactérias até que no século XVIII (1701-1800) Lavoisier, após experiência em laboratório, provou o contrário. A fonte da energia fundamental do universo aguarda um novo Lavoisier para ser descoberta na área científica. A física contemporânea chegou à fronteira do conhecimento racional nessa direção. A partir daí, entram a intuição, a imaginação e a fé. Adentra-se ao vasto campo da incerteza, da opinião e da ignorância, arena onde se digladiam ateus, teístas, religiões, ideologias e filosofias de vida. Cada qual reivindica para si o monopólio da verdade. Em nome da divindade e da verdade geram rivalidades e conflitos bélicos cujo registro histórico é o incômodo testemunho da estupidez humana.

O germinar da semente, o florescimento do broto, o desabrochar da flor, constituem movimentos amorosos no reino vegetal. Impelidos por essa força afetiva essencial, animais da mesma espécie se unem para acasalamento e vivem em grupo; as fêmeas alimentam os filhotes e os defendem com zelo; os machos se mantêm distantes e indiferentes (às vezes, matam os filhotes). O ambiente uterino e a amamentação provocam o amor visceral entre mãe e filho. Comparada à materna, débil é a ligação amorosa entre pai e filho. Na relação humana bilateral, a força afetiva vai além do nível biológico e desperta brandura, ternura, carinho, entre a mulher e o homem; entre filhos e pais; entre irmãos; entre parentes e amigos. O alvo da estima sem reciprocidade pode ser a terra natal, a casa, o jardim, a boneca, a bicicleta, o automóvel, o clube esportivo, a profissão, o livro, a arte, o saber, a santidade. Algumas vezes, a afeição por pessoas, bichos, coisas, virtudes, santos, deuses, chega ao ponto da devoção e veneração.

No plano religioso e místico, há o dever de amar o próximo: cônjuge, filho, parente, amigo, inimigo. No plano jurídico esse dever não se ajusta. Sobre matéria de foro íntimo o Estado não tem autoridade. O direito disciplina a conduta ativa ou omissiva, mas não o sentimento ou o pensamento. Estes apenas entram na análise da ação ou da omissão para se compreender os motivos e avaliar o grau de culpa. Para os cristãos, amar é mandamento, segundo lição atribuída ao profeta Jesus: “Amarás o senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda tua alma e de todo teu espírito, e amarás o teu próximo como a ti mesmo”. “Tendes ouvido o que foi dito: amarás o teu próximo e odiarás teu inimigo; eu, porém, vos digo: amai vossos inimigos, fazei bem aos que vos odeiam, orai pelos que vos maltratam e perseguem.” Como os discípulos davam mostra de rivalidade, o profeta recomendou amor fraterno na esperança de que entre eles não houvesse disputa. Acrescentou, pois, o mandamento: “Amai-vos uns aos outros como eu vos amo. Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a sua vida por seus amigos.” ((Mateus 5: 43/44 + 22: 37/39; João 15: 12/13).
  
Sentimentos opostos de amor e ódio no discurso e na prática de Jesus revelam nele a incoerência própria do ser humano. Diz o mestre e profeta: Não julgueis que vim trazer a paz a Terra. Vim trazer – não a paz – mas a espada. Eu vim trazer a divisão entre o filho e o pai, entre a filha e a mãe, entre a nora e a sogra, e os inimigos do homem serão as pessoas de sua própria casa. Quem ama seu pai ou sua mãe mais que a mim, não é digno de mim. Quem ama seu filho mais que a mim, não é digno de mim. Se alguém vem a mim e não odeia seu pai, sua mãe, sua mulher, seus filhos, seus irmãos, suas irmãs, sim, até sua própria vida, não pode ser meu discípulo. O irmão entregará à morte o irmão, e o pai o filho; e os filhos insurgir-se-ão contra os pais e dar-lhes-ão a morte. (Mateus 10: 34/37; Lucas 13: 51/53 + 14: 26; Marcos 13: 12).

Jesus ora prega amor e paz, ora prega ódio e guerra. Mostra a sua face angelical no sermão da montanha ao falar dos bem aventurados. Mostra a sua face demoníaca no templo quando chicoteia os mercadores e tomba as mesas. Mostra a face angelical ao se compadecer da mulher adúltera. Mostra a face demoníaca ao desafiar e ofender os fariseus, escribas e sacerdotes, amaldiçoar cidades, secar a figueira, rogar pragas. Jesus manda que haja amor fraterno entre os apóstolos, mas humilha publicamente a mãe e os irmãos quando o procuraram. O acesso estava difícil. Alguém avisou: “Tua mãe e teus irmãos estão lá fora e desejam ver-te”. De modo petulante, Jesus indaga: quem é minha mãe e quem são meus irmãos? Em atitude que sugere demagogia, aponta com as mãos para os discípulos ali reunidos e ele mesmo responde: eis aqui minha mãe e meus irmãos. Todo aquele que faz a vontade de meu Pai que está nos céus, esse é meu irmão, e minha irmã e minha mãe. A mãe e os irmãos de sangue ficaram ao relento como se não fossem dignos do profeta e do seu deus. A ironia é companheira da história: depois da crucifixão do profeta, seus irmãos de sangue, Tiago e Judas Tadeu, propagaram a nova doutrina. Tiago foi morto quando era líder (bispo) da nova igreja em Jerusalém.  (Mateus 12: 46/50 + 24: 1/2; Lucas 8: 19/21 + 21: 5/6; Marcos 3: 31/35 + 13: 1/2).