segunda-feira, 30 de abril de 2012

FUTEBOL


24.04.2012. Semifinais da champions league (UEFA). Barcelona x Chelsea. Local: Espanha. Resultado: empate 2 x 2. O time inglês, que vencera o time catalão no primeiro confronto usando tática defensiva (na Inglaterra), classifica-se para a partida final do campeonato. O jogo mostrou: (i) de um lado, a beleza plástica do clube espanhol, seu espírito coletivo agressivo e confiante; (ii) de outro, a retranca do clube inglês e sua determinação em impedir o adversário de obter resultado favorável. O time inglês jogou sem um jogador durante parte do primeiro tempo e todo o segundo tempo da partida. Terry foi expulso no primeiro tempo. Longe da bola, fora de qualquer jogada, aplicou um “tostão paulista” no adversário. O agredido atirou-se ao solo e se contorceu como se estivesse com a perna quebrada. O árbitro auxiliar comunicou o fato ao árbitro principal. Diante daquele quadro que parecia desesperador, o arbitro aplicou o cartão vermelho ao invés do amarelo que seria o normal. Burrice do inglês. Esperteza do chileno que logo depois se levantou, andou e correu durante toda a partida. Pela estupidez e irresponsabilidade, Terry devia ser demitido do clube. Atuaram alguns jogadores medíocres em ambos os clubes; outros de boa qualidade; nenhum excelente. O clube catalão teve: (i) a posse de bola em torno de 75% do tempo total da partida; (ii) gol bem anulado (Alves estava impedido ao passar a bola); (iii) pênalti desperdiçado (a bola chutada por Messi bateu na trave). Dos quatro gols da partida o de Ramires foi o mais bonito. O outro gol dos ingleses ocorreu no minuto final da partida; Torres recebeu a bola em posição legal, desmarcado, avançou em direção ao gol catalão, driblou o goleiro e com calma enviou a bola para dentro da rede. Esse jogador custou uma fortuna ao Chelsea, ficou no banco até quase o final do jogo. Quando ele entrou, Drogba saiu. O time inglês poderia ter vencido a partida se o treinador não fosse medroso. Adotou tática suicida diante da notória eficiência do ataque do time catalão. Teve mais sorte do que juízo. Sem descurar da defesa, podia ter escalado juntos Drogba e Torres na ofensiva e superar os espanhóis em dois ou mais gols. Há ocasiões em que bons jogadores da mesma posição atuam juntos com resultados positivos. O treinador deve confiar no talento dos jogadores. Pelé e Rivelino atuaram juntos na seleção brasileira (1970). Juninho Pernambucano e Felipe quando jogaram juntos, o Vasco venceu; separados, o Vasco perdeu para o Botafogo e não se classificou para a partida final do campeonato carioca (29/04/2012).

25.04.2012.     Semifinais da champions league (UEFA). Real Madri x Bayern. Local: Espanha. Resultado: 2 para o RM x 1 para o BM. O time alemão, que vencera por esse mesmo placar o time espanhol na partida realizada na Alemanha, classificou-se para a partida final do campeonato europeu. Da soma dos gols feitos no tempo regulamentar das duas partidas resultou empate: 3 x 3. Isto exigiu prorrogação da segunda partida por 30 minutos. O empate persistiu. O desempate se faz por tiro direto dentro da área do goleiro com a bola colocada na marca do pênalti. Os espanhóis desperdiçaram três cobranças e acertaram uma. A vitória coube aos alemães que desperdiçaram duas cobranças e acertaram duas. Disputarão partida final com os ingleses no mês de maio/2012. Os dois clubes espanhóis foram eliminados. Em futebol não há time invencível ou de outro planeta. Mesmo em períodos de excelência, há derrotas. Este jogo do RM x BM foi mais atraente do que o jogo do dia anterior. As duas equipes atuaram bem na defesa e no ataque. No primeiro tempo, a equipe alemã vacilou na defesa e sofreu dois gols. Depois, melhorou e não permitiu que a equipe espanhola aumentasse o placar. O Bayern conseguiu um gol de pênalti, ainda no primeiro tempo, cobrado por Robben. Esse holandês não tem o mesmo desempenho que exibiu em 2010, na copa da África. Perdeu gols incríveis nas duas partidas. Os seus companheiros também exibem nível ordinário (algum destaque para Gustavo). O mesmo se diga de Ronaldo e seus companheiros (algum destaque para Alonso, Marcelo, Özil e Pepe). Ronaldo faz gols, mas pisa na bola, erra passes, além de constantemente ser desarmado, cair e reclamar. Os goleiros são de alto nível; cada um defendeu dois pênaltis; durante as partidas tiveram bom desempenho.

sexta-feira, 27 de abril de 2012

ABORTO5


Quando referido à vida humana, o aborto extrapola os lindes do direito, pois interessa à religião e às ciências biológicas e comove a sociedade. Daí a facilidade de pensamentos e crenças estranhos à prestação jurisdicional serem introduzidos no processo judicial gerando confusão e prolixidade por falta de percepção da diferença entre a linguagem do direito e a linguagem da religião, da física e da matemática. Em linguagem livre, foi publicado neste blog (fevereiro de 2010) artigo sobre a vida, seguido de dois outros sobre iluminação mental e amor (tríade mística: vida, luz e amor). O texto adverte para as diversas acepções do vocábulo vida. A mais ampla é a de energia inteligente que gera o universo e o mantém em movimento. Tal energia cria a matéria na sua estrutura mineral, vegetal e animal, segundo padrões inteligentes que a mente humana apreende como leis da natureza. Nada se perde. Tudo flui e se transforma. Esses padrões são gerados pela mente cósmica ou divina, conforme doutrina mística ainda não encampada pela ciência.

As diferentes manifestações da vida acontecem quando o planeta reúne condições ambientais favoráveis. Na Terra, a combinação química adequada ensejou a vida vegetal e animal há milhões de anos. Em decorrência do complexo químico e físico que lhes dá existência e características próprias (sensibilidade, nutrição, reprodução, defesa, pulsão na linha evolutiva desde as espécies germinais simples até os organismos mais complexos) os vegetais e animais receberam dos cientistas o tratamento de seres vivos para distingui-los dos minerais. No amplo sentido, o universo é um ser vivo. No sentido estrito, ser vivo cumpre ciclo natural: nascimento, crescimento, maturidade, envelhecimento, morte. Reage ao meio ambiente e aciona mecanismos de conservação da espécie. Os animais buscam alimento, abrigo e acasalamento. Os animais racionais têm a vida abreviada por atos voluntários e involuntários, coletiva ou individualmente: guerra, rebeliões, acidentes com veículos, hábitos nocivos, suicídio, infanticídio, homicídio, genocídio. O feto ainda não é animal e sim projeto que poderá ou não ser concluído com êxito. No útero, falta autonomia ao nascituro. Este apenas se torna animal ao respirar fora do útero e ativar o sistema nervoso, respiratório, circulatório e digestivo do seu próprio organismo. Vida significa também o modo de ser e de estar no mundo: vida familial, social, política, econômica, monástica. A um ambiente agitado diz-se que tem vida. Há vida interior quando a pessoa relaciona-se consigo mesma (cogita, reza); há vida exterior quando se relaciona com os outros (comunica, expressa).

A provável exaustão das fontes de abastecimento diante do crescimento demográfico exige controle da natalidade e redução do consumo. Os métodos anticoncepcionais e o aborto são vistos como parte da solução desse grave problema mundial. Países de todos os continentes adotam medidas restritivas ao aumento da população (China é o exemplo mais citado). Tragédias decorrentes de fatores naturais (terremotos, maremotos) têm ceifado milhares de vidas humanas. Contam-se aos milhares os mortos em conflitos e acidentes. Ainda assim, o aumento da população preocupa líderes da Europa e da América. A igreja cristã se opõe tenazmente ao aborto. Qualifica-o de assassinato, como se o embrião fosse pessoa. Coloca-se contra o direito posto pelo Estado. Faz terrorismo moral e religioso, esquecida de que ela própria torturou e matou milhares de pessoas. Há crenças e idéias diferentes entre indivíduos e nações. Merecem respeito. Da vida racional surgem conceitos radicais: (i) de espiritualidade, que conduzem ao desprezo do corpo (ii) de materialidade, que conduzem ao desprezo da alma. As posições intermediárias merecem acatamento. A reflexão filosófica assenta-se na razão enquanto a religião assenta-se na emoção. O alicerce é o mesmo para todos: a natureza física, emocional e racional do ser humano. As necessidades do corpo e da alma reclamam satisfação. A plenitude da vida humana abrange os dois mundos: material e espiritual. Considerada a dupla dimensão do mundo, morte significa a passagem da vida material à espiritual. O corpo se desintegra (tu és pó e ao pó retornarás); a personalidade anímica se funde na alma universal (a casa do meu pai tem muitas moradas).

terça-feira, 24 de abril de 2012

ABORTO4


O Brasil é uma república democrática alicerçada em: (I) valores: vida, liberdade, igualdade, segurança, propriedade, trabalho; (II) princípios: soberania popular, separação dos poderes, representação popular, cidadania, dignidade da pessoa humana, livre iniciativa; (III) objetivos permanentes: (a) construir uma sociedade livre, justa e solidária (b) garantir o desenvolvimento nacional (c) erradicar a pobreza e a marginalização (d) reduzir as desigualdades sociais e regionais (e) promover o bem de todos sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.   

A fim de manter a coerência com esses valores, princípios e objetivos declarados na Constituição de 1988, os poderes da república devem respeitar as diferenças compatíveis com o arcabouço moral da sociedade. Gestante feliz com a expectativa de ser mãe, mesmo de um filho sem o encéfalo; gestante infeliz com a certeza de que será mãe de um filho sem o encéfalo; ambas merecem o apoio da família, da sociedade e do Estado.

As pessoas têm crenças distintas. Nem todas têm os mesmos ideais e a mesma visão de mundo. Todas são iguais perante a lei (plano jurídico), mas desiguais entre si (plano existencial). Todas nascem livres e iguais em direitos (plano jurídico), mas desiguais nas condições sociais e econômicas (plano existencial). Todas são semelhantes e se nivelam no mundo natural (determinismo), mas desempenham diferentes funções no mundo cultural (liberdade) e nele organizam de diferentes modos as suas comunidades (autoridade).

A república laica no Brasil dura 123 anos. Está na hora de o povo se livrar do ranço imperial e respirar plenamente a atmosfera republicana democrática. O legislador de 1942, sob influência da teocrática mentalidade do século XIX (1801-1900) elaborou norma penal que submete ao dogma católico os teístas de distintos matizes religiosos, os deístas e os ateus. Tal constrangimento não se compadece com a liberdade de consciência e de crença assegurada na Constituição de 1988. Ao legislador cabe atualizar a legislação. Na eventualidade de omissão, o povo pode tomar a iniciativa, como aconteceu com a lei da ficha limpa.

Lei nº xxxxxde xx de xxxxx de 2012.

Dá nova redação a dispositivos da lei 9.278, de 10 de maio de 1996.
O Presidente da República:
Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte lei:

            Art. 1º. Os artigos 3º, 4º e 11, da lei 9.278 de 10 de maio de 1996, passam a vigorar com a seguinte redação:
Art. 3º. Cabe à mulher, casada ou não, decidir sobre a gravidez e o método anticoncepcional que, sob orientação médica, adotará.
Art. 4º. Cabe à gestante, casada ou não, decidir sobre a continuidade ou a interrupção da gravidez.
§1º. A interrupção só poderá ser executada mediante procedimento médico.
§2º. Em sendo a gestante incapaz para os atos da vida civil, a interrupção dependerá de autorização judicial.
Art. 11. Revogam-se as disposições em contrário, especialmente os artigos 124 a 128 do Código Penal.
            Art. 2º. Esta lei entra em vigor na data da sua publicação.

Brasília xx de xxxxx de 2012, 190º da Independência e 123º da República.

sábado, 21 de abril de 2012

ABORTO3


A proibição legal do aborto assenta-se em proposições de índole religiosa tais como: a vida é um dom divino; o ser humano foi criado por Deus; o ser humano em gestação é sagrado e intocável; a sua proteção é um imperativo da consciência cristã. Segundo esse pensamento, a proteção do nascituro deve ser prevista em lei e garantida pelo Estado. A regra estatal brota do pensamento, do sentimento e da vontade do legislador, sob condicionamentos culturais integrados por idéias de justiça, verdade, bondade, beleza e santidade. O interesse, a utilidade e a necessidade são forças propulsoras do processo de gestação das regras de direito.

No julgamento da argüição de descumprimento de preceito fundamental em 13/04/2012 (ADPF 54) o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou legítima a interrupção da gravidez quando ao nascituro faltar encéfalo. Crânio sem essa parte significativa do sistema nervoso faz o animal parecer vegetal. Há humanos com o crânio cheio de massa encefálica, mas vazio de idéias. Nascem com encéfalo, mas não sabem usá-lo. Os doentes mentais são isentos de pena quando praticam delitos sem consciência da ilicitude. Há pessoas que usam o cérebro com finalidade perversa. Algumas são punidas; outras, não. Há criminosos de boa saúde mental que dificilmente são punidos: políticos corruptos e banqueiros estelionatários.

A ação judicial denominada argüição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) tem por finalidade evitar ou reparar lesão resultante de ato do poder público. Sem indicação do ato lesivo, a medida judicial não deve ser admitida “ex vi legis” (9.982/99, 3º, II). A citada ação foi discutida em abstrato visando a excluir do tipo penal aquela modalidade de aborto. O artigo 128 do código penal livra de punição o aborto praticado por médico em duas hipóteses: (i) quando há risco de morte para a gestante (ii) quando a gravidez resulta de estupro. O STF superou os entraves processuais, admitiu a mencionada ação e acolheu a pretensão ali deduzida. Em conseqüência, o código penal passa a ter norma oculta: terceira hipótese de impunidade de aborto praticado por médico. Segundo o vetusto princípio da separação dos poderes, cabia ao poder legislativo incluir essa norma no código penal. A ADPF 54 cumpriu papel de mandado de injunção: supriu a omissão do legislador.

No julgamento em tela, a rigidez lógica cedeu passo à flacidez do razoável. A suavidade do bom senso temperou a força da razão. Entre o feto e a gestante, o legislador optou pela mulher nas duas hipóteses legais de impunidade. O tribunal procedeu de igual maneira: entre o feto e a gestante, optou pela mulher e criou uma terceira hipótese de impunidade.

O tribunal decidiu com prudência. No caso de anencefalia do nascituro, reconheceu a liberdade da mulher, tanto para levar a gestação até o fim, como para interrompê-la. Atribuiu poder de decisão à gestante. Nem todos suportam o sofrimento de igual maneira. Algumas gestantes, por motivos religiosos ou para sentir a ventura de ser mãe, mantêm a gravidez até o final; desejam embalar aquele filho nos braços, ainda que por poucas horas. Outras gestantes não suportam a idéia e o sofrimento de parir aquele filho que nascerá morto ou terá vida curta e inconsciente, filho que jamais será um Alberto Limonta, formado em medicina.

quarta-feira, 18 de abril de 2012

ABORTO2


No início dos anos 50, do século XX (1901-2000), foi transmitida pelo rádio, no Brasil, com enorme audiência, novela mexicana intitulada “O Direito de Nascer”, drama de uma jovem solteira que engravidara. Perdida a esperança do casamento, temendo envergonhar a família abastada e católica, a jovem sofreu a angústia de decidir entre manter ou interromper a gravidez. Os costumes da época nivelavam-na às prostitutas. Resolveu parir. O filho foi entregue aos cuidados de outra mulher. A jovem entra para um convento e se torna freira. Com amor e dedicação, a negra Dolores criou e educou o menino branco, batizado Alberto Limonta, que se formou em medicina.

O legislador brasileiro fixou o termo inicial da personalidade civil no nascimento com vida. Apesar disto, colocou a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro (nome, imagem, integridade física e psíquica, intimidade, privacidade, sucessão hereditária, atos da vida civil). Ao estabelecer esta ressalva, o legislador mira o processo completo da gestação; faz da expectativa do nascimento com vida, o pressuposto da ressalva. O objetivo da regra é garantir igual fruição de direitos no seio da família e da sociedade ao ser que, ao respirar fora do útero, se faz criança. Só é possível o nascituro figurar como vítima de crime contra a pessoa por ficção criada pelo legislador ou pelo intérprete da lei. Mediante esse artifício, o nascituro é considerado pessoa para efeitos penais, excepcionando a lei civil. Sem a ficção, a paciente do crime de aborto provocado com o consentimento da gestante teria de ser a sociedade, eis que a matéria interessa à família (economia doméstica) e ao Estado (densidade demográfica). Colocar a sociedade como vítima do crime de aborto só é possível na secção ficcional do direito. O imponderável não é estranho à jurisprudência. Chain Perelman, jurista belga, em sua Logique Juridique (Toulouse, Dalloz, 1979) cita dois casos interessantes.

Na Inglaterra, vigorava lei que cominava pena de morte ao crime de furto de valor igual ou superior a 40 shillings. Durante anos, os juízes ingleses avaliaram todo e qualquer furto em 39 shillings para evitar a sentença capital. Em 1808, o judiciário inglês, ao apreciar certo caso, avaliou 10 libras esterlinas (= 200 shillings) em 39 shillings. Foi a gota d’água. Sintonizado com o judiciário, o parlamento inglês abrandou a pena cominada ao crime. “A ficção chegou ao extremo e a lei foi modificada logo depois” (p.63).       

Em decorrência da invasão alemã, o rei da Bélgica governava mediante decretos com força de lei. A legitimidade desses decretos foi questionada perante o judiciário. De acordo com a Constituição belga, ao rei era vedado legislar isoladamente. O tribunal (Corte de Cassação) não negou a evidência, porém declarou legítimos os decretos. Invocou a força das coisas, a força maior, a necessidade de manter a soberania do Estado sem solução de continuidade. “Obra do homem, ela (a lei constitucional ou ordinária) está submetida, como todas as coisas humanas, à força das coisas, à força maior, à necessidade” (p. 77/78).

A proibição do aborto advém da valoração do fato existencial pelo legislador. O catolicismo criou raízes na América portuguesa, herança religiosa da metrópole européia que enviou padres com a dupla missão de manter a fé dos colonos e de catequizar os nativos. Religião oficial na colônia, no Estado luso brasileiro surgido em 1815, com a carta régia expedida por João, príncipe português, e no Estado brasileiro surgido em 1822, com a independência apoiada por Pedro, príncipe português. Mesmo após a queda do império em 1889, os dogmas católicos continuaram subjacentes à legislação, apesar de o novo Estado ser laico, tolerar o ateísmo e acolher o pluralismo religioso (cristianismo católico e protestante, espiritismo, judaísmo, islamismo, budismo, xintoísmo). Da miscigenação racial, da multiplicação dos imigrantes, da variedade dos credos religiosos e políticos, da assimilação do produto da civilização contemporânea, resultou um mosaico cultural; implicou mudança na hierarquia dos valores que, ainda, não se refletiu plenamente na legislação.

domingo, 15 de abril de 2012

ABORTO


Abortar significa frustrar um processo natural ou cultural; impedir que um resultado se produza. O abortamento pode ser casual quando ocorre sem a intervenção da vontade como, por exemplo: semeadura perdida em conseqüência da estiagem ou do excesso de chuva, obra que não se completa em virtude da morte do escritor, prenhez gorada por disfunção orgânica. O abortamento é intencional quando intervém a vontade como, por exemplo: operação militar obstada em virtude de razões estratégicas, colheita agrícola arrasada em virtude de razões econômicas, gravidez interrompida por motivos pessoais. Este último exemplo interessa ao direito penal. A voluntária expulsão do feto antes do final da gestação é tipificada como crime no código penal (art. 124): “Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque”. O delito se configura só quando o nascituro apresenta sinais vitais. Feto já morto no ventre materno pode ser retirado sem que isto caracterize ação criminosa.

O bem tutelado pela norma penal é a vida humana e não qualquer tipo de vida vegetal ou animal. Crimes contra a flora e a fauna são tratados em lei extravagante (9.605/98). Ao magistrado enquanto no desempenho da função judicante não cabe: (i) explicar a origem e o desenvolvimento do fenômeno biológico e o ciclo vital dos seres humanos, tarefa que cabe ao cientista; (ii) especular sobre o significado da vida, tarefa que cabe ao filósofo e ao teólogo. Como diz o povo bem humorado: “cada macaco no seu galho”. Cabe ao cientista explicar o fato natural; ao jurista, o fato cultural. A lei natural vincula-se à necessidade lógica; a lei cultural refere-se à conveniência dos negócios humanos. Sob ângulo prático – e não especulativo – o legislador designa o início e o fim da vida humana para efeitos jurídicos. Vida em sociedade, vida privada, vida escolar, vida pregressa, vida reclusa, são expressões utilizadas judicial e extrajudicialmente longe do significado biológico.

Ponderada a substantiva importância da necessidade, da utilidade ou do interesse em jogo, a lei é elaborada visando a determinado objetivo. A lei enforma a sociedade, disciplina a conduta humana e informa o caso concreto nas relações sociais. A sua eficácia ocorre de modo pacífico no meio social, regularmente. Quando há conflito ou dúvida, a solução jurídica obtém-se mediante a atuação de conciliadores, árbitros, juízes e tribunais, no devido processo legal. Busca-se a solução mais adequada ao caso e que melhor se afeiçoe à Constituição e à lei. Ao analisar os casos submetidos à sua apreciação, o juiz não se divorcia das suas crenças e convicções morais, religiosas, místicas e filosóficas. Em conseqüência, os julgamentos podem ser eventualmente tendenciosos. Julgamento viciado pela corrupção do magistrado é fato notório e antigo no mundo. Esse tipo de juiz constitui minoria, segundo opinião geral.    

A interrupção voluntária da gravidez se inscreve entre os crimes contra a vida (homicídio, induzimento ao suicídio, infanticídio e aborto). Por sua vez, tais crimes pertencem ao gênero dos crimes contra a pessoa (crimes contra a vida, a honra e a liberdade individual; lesões corporais, rixa e periclitação da vida e da saúde). A república brasileira tem como um dos seus fundamentos a dignidade da pessoa humana (CF 1º, III). A inviolabilidade do direito à vida é garantida a brasileiros e a estrangeiros residentes no país, ou seja, garantida a pessoas humanas; logo, nascidas e vivas (CF 5º, caput). No aborto provocado sem o consentimento da gestante, a vítima é a mulher (pessoa). No aborto provocado com o consentimento da gestante, a vítima é o feto (que não é pessoa). De acordo com a lei civil brasileira, pessoa é o ser humano que nasce com vida e, assim, adquire personalidade civil. Destarte, o nascituro será pessoa se nascer com vida, caso em que, sujeito de direitos e deveres na ordem civil, poderá exercê-los mediante representante legal. O aborto impede o nascituro de chegar ao estado de pessoa. Em não sendo pessoa, o nascituro não pode ser vítima de crime contra a pessoa. Cuida-se de conclusão lógica de solar evidência.

quarta-feira, 11 de abril de 2012

PÁSCOA2


A idéia central da páscoa cristã é a ressurreição de Jesus, o Cristo. Demonstrada a falsidade dessa idéia, a comemoração perde o sentido. Se não houver morte, não haverá ressurreição. A morte do corpo humano ocorre quando cessam as funções respiratória, cardíaca e cerebral; não mais atuam instinto, desejo, vontade, sentimento, pensamento. Ao processo de integração sucede o de desintegração. Se o cérebro deixa de funcionar, os procedimentos para revitalizar o organismo são inócuos; quando muito, recuperam vida vegetativa. A história da medicina e a crônica vulgar registram casos de morte aparente, perda temporária dos sentidos físicos. A morte definitiva resulta do processo de mutação universal no mundo físico citado por Heráclito e Lavoisier. Para o místico, a morte do ser humano significa passagem do mundo material ao mundo espiritual com o acervo consciente da personalidade.

O ciclo vital do ser humano provoca o sonho da eternidade. A bíblia hebraica (antigo testamento) e cristã (novo testamento) vem embalada neste sonho. A ressurreição faz parte deste sonho. Da leitura do episódio narrado pelos evangelistas – do qual falta registro exotérico historicamente válido – verifica-se que Jesus foi retirado da cruz ainda com vida; que não houve ressurreição e sim artimanha. A crucifixão serviu para facilitar a aceitação e a difusão da doutrina de Jesus; com este propósito, foi estabelecida a crença na morte e ressurreição. Herodes Antipas, tetrarca da Galiléia, autoridade competente para decidir o caso criado pelo sacerdócio judeu, absolveu Jesus. Pilatos acatou a decisão do tetrarca e declarou Jesus inocente. Os sacerdotes acusaram o general de proteger um subversivo e ameaçaram levar o fato ao conhecimento do imperador romano. Pilatos lavou as mãos. Para não se complicar, permitiu a aplicação da lei romana (morte por crucificação) já que a lei judaica (morte por apedrejamento) não podia ser aplicada – não só por causa da páscoa no sábado – como também por determinação legal de Roma.

Convicto da inocência de Jesus, Pilatos autorizou José de Arimatéia a retirar o corpo da cruz sem que lhe fossem quebradas as pernas. O curto período na cruz foi insuficiente para causar a morte. Além de Jesus, dois crucificados permaneciam vivos; quebraram-lhes as pernas para apressar a morte. Pilatos cumpriu o seu dever: (i) como soldado, perante o imperador, ao permitir que Jesus fosse crucificado por subversão denunciada pelos sacerdotes; (ii) como civil, perante a sua consciência, ao permitir que Jesus fosse retirado da cruz ainda com vida. De um lado, Pilatos atendeu aos judeus; de outro, aos cristãos. O apóstolo Marcos menciona o testemunho do centurião sobre a morte de Jesus (Mc 15: 44,45), formalidade que Pilatos validou prontamente. No direito romano, a forma era essencial à validade de certos atos. O centurião recebera propina para dar esse testemunho (Mt 28: 12).

Jesus foi socorrido no sepulcro de propriedade de Arimatéia; mudou o visual para não ser reconhecido pelos fariseus; nem Maria Madalena o reconheceu (Jo 20: 11,15); os demais discípulos só ficaram convencidos após verem as feridas deixadas nas mãos de Jesus e assistirem à sua refeição (Mt 28: 17; Mc 16: 14; Lc 24: 16, 36, 43; Jo 21: 4). Durante sete anos, aproximadamente, os apóstolos conviveram com um nazareno, homem de cabelos longos, barba comprida, bigode, vestindo túnica branca e calçando sandálias. Ao se defrontarem com um homem de rosto liso, cabeça raspada, vestuário comum, que se apresentava como o rabi crucificado, a reação de descrédito foi natural e imediata. Cumpridos os votos e a missão, os nazarenos podiam cortar os cabelos, a barba, o bigode, usar trajes do costume social e encetar vida comum. Encerrada a sua missão, Jesus retira-se da vida pública e termina seus dias longe de Jerusalém, ao lado da sua amada.

domingo, 8 de abril de 2012

PÁSCOA


Etimologicamente, a palavra páscoa, de origem hebraica, significa passagem. No âmbito religioso, páscoa significa a festa anual em que: (i) os judeus comemoram o êxodo, emigração do povo hebreu do território egípcio, guiado por Moisés; (ii) os cristãos comemoram a ressurreição de Jesus. Para os cristãos católicos, a páscoa deve ser celebrada todos os anos entre os dias 22 de março e 25 de abril, segundo decisão do Concílio de Nicéia do ano 325. Em termos simbólicos e místicos válidos para a cristandade (ortodoxos, heterodoxos, católicos, protestantes, espíritas) páscoa significa passagem do judaísmo ao cristianismo; conversão de judeus e pagãos à doutrina de Jesus, o Cristo; nascimento de nova religião.

A semana santa católica tem início no domingo de ramos e termina no domingo de páscoa. O primeiro domingo refere-se à entrada de Jesus, em Jerusalém, como profeta, messias e rei, sob aclamação do povo, aplausos e acenos com folhagens. Comentário: homenagem arquitetada naquela época para apresentar Jesus publicamente como líder apoiado pelo povo.

A segunda feira, sexto dia anterior à páscoa, refere-se à unção de Jesus durante reunião com os discípulos em Betânia. A terça feira, quinto dia anterior à páscoa, refere-se ao anúncio de Jesus de que seria traído por um dos apóstolos. Comentário: o episódio da traição fora previamente combinado com Judas Iscariotes.

A quarta feira, quarto dia anterior à páscoa, refere-se ao pacto entre Judas Iscariotes e os sacerdotes judeus para entrega de Jesus. A quinta feira, terceiro dia anterior à páscoa, ceia do cordeiro pascal, quando Jesus lava os pés dos apóstolos. Comentário: no sacrifício à divindade, a vítima humana do antigo ritual foi substituída por animal irracional: o cordeiro. Com estribo na crucifixão, a igreja criou a imagem de Jesus como cordeiro sacrificado à divindade para tirar os pecados do mundo. No lugar da matança de cordeiros a igreja colocou a hóstia representando o corpo e o sangue de Jesus como símbolo do sacrifício. A quinta feira foi selecionada por místicos rosacruzes para recolhimento espiritual, a sexta feira pelos muçulmanos, o sábado pelos judeus e o domingo pelos cristãos.  

A sexta feira, segundo dia anterior à páscoa, refere-se aos padecimentos e crucifixão de Jesus. O sábado, primeiro dia anterior à páscoa, refere-se à vigília pascal, enquanto Jesus permanece no sepulcro. O domingo, dia da páscoa, refere-se à ressurreição de Jesus, anunciada por Madalena. Comentário: nos dias atuais, a ressurreição virou questão de fé, exclusivamente. Sob exame racional, falta-lhe alicerce. Da análise lógica dos evangelhos retira-se a evidência de que Jesus não morreu na cruz. Logo, não ressuscitou no terceiro ou em qualquer outro dia, pois só ressuscita quem esteve morto. Há quem sustente que Jesus não existiu historicamente e sim como personagem de uma ficção religiosa.

No domingo de páscoa tem início o tempo pascal que finda no pentecostes (qüinquagésimo dia). Segundo narrativa do livro “Atos dos Apóstolos”, integrante do novo testamento, nesse dia o espírito santo desceu sobre eles. O tempo pascal compõe-se de sete semanas dedicadas a episódios e mensagens posteriores à ressurreição, tais como: aparição de Jesus a Madalena nas adjacências do sepulcro e aos dois discípulos a caminho da aldeia de Emaús; admoestação a Tomé por sua incredulidade; multiplicação dos pães, pescaria abundante e andar sobre as águas; novo mandamento aos discípulos (amai-vos uns aos outros como eu vos amei); missão atribuída aos apóstolos e as derradeiras instruções de Jesus antes de ascender ao céu; eleição dos diáconos, prisão e martírio do diácono Estevão, perseguição e dispersão da comunidade cristã de Jerusalém; pregação do evangelho, batizados e aumento do número de adeptos; união de Deus com a comunidade cristã através do espírito santo; destino de Pedro e Paulo.

sexta-feira, 6 de abril de 2012

FUTEBOL


Em “Tempos Modernos”, filme de 1936, Charles Chaplin mostrou, com humor, a robotização do homem: produção industrial em série faz do operário um especialista em apertar parafuso. O automatismo na atividade externa parece provir dos movimentos involuntários do corpo humano (reação imunológica, secreção glandular, circulação do sangue, mecanismo instintivo, sístole, diástole, digestão, respiração). A ação robótica tornou-se forma econômica do trabalho em setores da sociedade e do estado, fundada no planejamento racional prévio que visa a maior produtividade e a boa qualidade de bens e serviços. Incide a norma: evite pensar; siga as instruções. No jogo de xadrez, pensar é essencial; há tempo. No caratê, pensar atrapalha; a ação reflexa é mais eficaz; resulta de treinamento com exaustivas repetições. No futebol, enquanto pensa, ainda que por cinco segundos, o jogador perde a bola. Agilidade mental e física é essencial. Importa mais direcionar eficazmente a bola do que correr com ela nos pés. A atividade mental do jogador no momento do lance deve ser reflexa e não reflexiva. Por implicar análise e demandar tempo, ainda que breve, o pensamento reflexivo é mais adequado às pausas (quando o jogador não está com a bola ou o jogo está suspenso).

A partir da década de 70, tomando-se como referência a seleção holandesa de 1974, verifica-se que a robotização aprimorou a técnica de jogar coletivamente e diminuiu o espaço da criatividade individual e do improviso. A técnica sufocou a arte. Houve sensível melhora no rendimento das equipes em todo o mundo desde que se adotou o planejamento tático, a análise dos filmes de jogos, o ensaio das jogadas, a disciplina coletiva, a formação de jogadores a partir das categorias infantil, juvenil e aspirante. Venezuela, Dinamarca, Japão, Nigéria, Austrália, ilustram essa evolução. Para o saudável condicionamento do corpo utilizam-se aparelhos da última geração tecnológica e dieta recomendada por nutricionistas. Ao conforto dos jogadores em campo são destinadas camisas, chuteiras e caneleiras de material e modelo especiais. Os jogadores são assistidos por médicos, psicólogos, massagistas e professores de educação física. Os jogadores de ponta são cercados de regalias.

O aprimoramento técnico do jogador exige disciplina, esforço, dedicação, repetições de movimentos. Condicionam-se reflexos. Formam-se automatismos. Busca-se o resultado coletivo ótimo. A boa capacidade técnica faz um bom jogador; unida ao talento, faz um excelente jogador. Técnica e arte bem conjugadas fazem um craque. Técnica se adquire. Talento é inato mas inútil se não houver cultivo, meio e ensejo de se manifestar. O indivíduo pode ser um asno em História e Geografia (intelecto bruto) e um gênio no esporte (inteligência lúdica). A genialidade em repouso no código genético manifesta-se quando reunidas condições naturais e culturais favoráveis à expressão técnica, artística, científica ou filosófica. A tal propósito, em passagem que faz parecer acidental, Marcel Proust escreve: “(...) o que fazia pensar nesses atores ou romancistas medíocres que em certas épocas desfrutam de uma reputação de gênios, seja devido à mediocridade dos confrades, entre os quais nenhum artista superior é capaz de mostrar o que é o talento verdadeiro, seja pela mediocridade do público, o qual, caso existisse uma extraordinária individualidade, seria incapaz de compreendê-la.” (“A Prisioneira”, volume III da série “Em Busca do Tempo Perdido”, Rio, Ediouro, 2002, p. 208).

Há jogadores brasileiros desfibrados, como se viu na decisão do campeonato mundial de clubes: os santistas submissos aos catalães. Assim como os santistas, há jogadores de outros clubes com essa têmpera de banana, lânguidos em decorrência das mordomias e dos mimos. Ao contacto físico com o adversário rolam metros e metros no gramado, contorcem-se como se estivessem na iminência de ir para o hospital. Parecem meninos com dodói chamando a mamãe. Afagados pelo médico, massagista, preparador físico, transportados para fora do campo, logo se recompõem e retornam fagueiros. Visível a intenção de comover a torcida, de chamar para si as câmeras de televisão e colocar sua imagem na tela. Seria bom ver na seleção brasileira jogadores com têmpera de aço na copa mundial de 2018. Para a de 2014 não há tempo. A forja está fria.

quarta-feira, 4 de abril de 2012

FUTEBOL


Apesar das evidências do passado e do presente, o contingente brasileiro de vira latas prefere fuçar o monturo: enaltece a mediocridade estrangeira e menospreza as virtudes nacionais. No futebol há jogadores notáveis em todos os continentes. Reconhecer-lhes o valor é medida de justiça. Contudo, o nivelamento com jogadores brasileiros de superior categoria é inadmissível. Chega-se ao desplante de equiparar o jogador da moda a Pelé! Qualquer jogador que se sobressai, logo é comparado a Pelé. Ser comparado ao Papa traz mais dividendos do que ser comparado ao sacristão.

Isto acontece com Messi, atualmente. Jogador da moda, visão de jogo razoável, veloz, oportunista, conduz a bola nos pés com habilidade em direção à meta adversária, feliz em algumas finalizações. Em perspectiva ampla, detectam-se as limitações: previsível, dificuldade de improvisar, frequentemente desarmado, passes sofríveis, chuta bem com o pé esquerdo e mal com o direito, deficiente na cobrança de faltas, no cabeceio e no amortecimento da bola. Há estrangeiros do passado e do presente mais habilidosos do que ele: Cristiano Ronaldo, Di Stéfano, Eusébio, Gerd Müller, Johan Cruyff, Maradona, Puskas, Sneijder, Zidane. Do boxe, pode-se extrair a comparação: Messi, batedor como Joe Frazier; os craques citados, virtuosos como Muhammad Ali.

Deve ser creditada ao árbitro a vitória do Barcelona (3) sobre o Milan (1) na modesta atuação das duas equipes em 03/04/2012. Em jogadas igualmente questionáveis, ele assinalou dois pênaltis a favor do time catalão e deixou de assinalar pênalti a favor do time italiano. A parcialidade na arbitragem não é vício exclusivo dos brasileiros. Mais: no Brasil, a boa arbitragem tem sido a regra e não a exceção. Contribui para essa melhora: (i) as imagens da televisão; (ii) as judiciosas ponderações dos comentaristas de arbitragem; (iii) a fiscalização e o controle pela comissão de arbitragem. Considerado o padrão das equipes, houve excesso de faltas. Ibrahimovic parecia jogador de várzea, apesar do bom passe para o gol milanês. Pato entrou no segundo tempo, ficou em campo poucos minutos e saiu. Parece não estar recuperado dos males que o afligem.

Profissionais da imprensa esportiva se impressionam em demasia com título concedido pela FIFA. O narrador do jogo transmitido pela emissora de televisão (Bandeirantes) gritava ensandecido o nome de Lionel Messi, várias vezes, como se o jogador fosse um gênio porque marcara gol de pênalti. Sem barreira, a pequena distância do gol, a chance do batedor marcar é bem maior do que a do goleiro defender. A desvantagem do goleiro integra a punição pela falta cometida dentro da sua área. No canal ESPN, narrador e comentarista são mais comedidos. Observaram bem: Messi marcou gol só com bola parada; ficou sem marcar com bola em movimento. Examinado sob critérios objetivos e comparado a grandes jogadores do passado e do presente, Messi aparece como simples operário, produto da robotização do futebol, sem arte, repetindo as mesmas jogadas e um só tipo de drible à semelhança daqueles praticantes de artes marciais que se especializam em golpe único. Joga com o mesmo potencial, tanto no clube como na seleção. A diferença está no nível de atuação. No clube, rende mais. Arrolam-se entre as causas do desnível: (i) maior motivação; (ii) maior entrosamento com os companheiros do clube em virtude do convívio prolongado {o que permite jogar por música telepaticamente}; (iii) poucas equipes adversárias de alto nível {o que enseja mais gols e vitórias do clube}; (iv) treinador corajoso e sensato.

segunda-feira, 2 de abril de 2012

FUTEBOL


Além das citadas estrelas de primeira grandeza do futebol mundial, há uma plêiade de defensores, armadores e atacantes brasileiros, cada qual na sua época e fase áurea, cujo brilho não é menor do que o brilho das grandes estrelas estrangeiras. Basta lembrar de: Ademir da Guia, Ademir Meneses, Adriano, Alex (Grécia), Amarildo, Barbosa (goleiro), Bebeto, Branco, Cafu, Caju (Paulo Cezar), Careca, Carlos Alberto, Castilho (goleiro), Clodoaldo, Coutinho, Dener (Portuguesa/Vasco), Diego (Alemanha), Dirceu Lopes, Djalma Santos, Djalminha, Domingos da Guia, Edmundo, Edu (Santos FC), Falcão, Gerson, Gilmar (goleiro: Corinthians/Santos), Giovane, Heleno de Freitas, Jair, Jairzinho, Juan, Júlio Cezar (goleiro), Juninho Pernambucano, Júnior, KK, Leandro, Leandro Damião, Leão (goleiro), Leivinha, Lucas (São Paulo FC), Lúcio, Luis Pereira, Maicon, Marcos (goleiro), Marcos Assunção, Marinho, Mauro Silva, Miller, Nelinho, Neto (Corinthians), Neymar, Nilmar, Nilton Santos, Palhinha, Pato, Pepe, Petronilho, Pinheiro, Poy (goleiro), Raí, Reinaldo, Renato, Rivaldo, Rivelino, Roberto Carlos, Roberto Dinamite, Robinho, Rogério Ceni (goleiro), Ronaldo Gaúcho, Ronaldo Nazário, Sócrates, Taffarel (goleiro), Tostão, Túlio Maravilha, Vagner Love, Vavá, Zagalo, Zé Roberto, Zico, Zinho e Zito.

No futebol mundial, estrelas estrangeiras têm seu brilho ofuscado pelo brilho mais intenso de craques brasileiros, tanto no passado como no presente. A história é testemunha, abastecida por documentos e pelo conhecimento oriundo da tradição oral, escrita e audiovisual. Quando atuam brasileiros e estrangeiros de alto nível na mesma partida, quer na mesma equipe, quer em equipes adversárias, lado a lado ou se confrontando, a história registra brilho maior dos brasileiros. Os clubes da Europa estão coalhados de defensores, armadores e atacantes brasileiros, o que indica qualidade boa e diferencial. Raro encontrar na mesma partida, em equipes distintas, um exuberante Zidane aplicando chapéu num Ronaldo decadente. O grande número de vitórias e de boas colocações da seleção brasileira em campeonatos internacionais se deve ao nível de excelência dos jogadores brasileiros, apesar das ocasionais estiagens.  

Entre os estrangeiros bem cotados no cenário internacional não há inventor de jogadas, mas tão somente executores de jogadas inventadas pelos brasileiros. Além das jogadas citadas linhas atrás, inventadas por Friedenreich, Leônidas, Didi, Garrincha e Pelé, os estrangeiros imitam ou tentam imitar: (i) o drible elástico do Rivelino; (ii) o uso do calcanhar para executar passes, dribles e gols, inventado e popularizado por Sócrates; (iii) as pedaladas do Robinho. A pedalada – no singular – Garrincha a executava, porém, as pedaladas – no plural – para confundir o adversário, foram aplicadas por Robinho e imitadas nos campos de futebol do mundo.

Os inventores do “corta luz” e do “gol olímpico” são desconhecidos. Corta luz é finta sem tocar na bola que impede acesso ao adversário e o permite ao companheiro, mediante uso do corpo no mesmo lugar ou em deslocamento. Quando utilizada no passe, o primeiro receptor funciona como cortina: sem tocar na bola, deixa-a passar para um segundo receptor, enganando e surpreendendo o adversário. Gol olímpico resulta da cobrança do escanteio. Antes de 1924, não era válido. Nesse mesmo ano, após adquirir legitimidade, esse gol foi executado oficialmente pela primeira vez por Billy Alston, na Escócia, porém só recebeu o apelido de “olímpico” em 1928, no jogo do Vasco da Gama contra o clube uruguaio Montevideo Wanderes, vencido pelo clube brasileiro. Ao cobrar escanteio, Santana marcou o gol da vitória. Os uruguaios eram campeões olímpicos. Os brasileiros, por zombaria, apelidaram o gol de “olímpico”. Valeu como batismo. O nome ficou. Por ser de difícil execução e exigir perícia, esse gol é raro. Marcelinho Carioca e Roberto Carlos fizeram gols olímpicos jogando pelo Corinthians e Ronaldo Gaúcho pelo Flamengo. O sérvio Dejan Petkovic marcou nove gols olímpicos de 1999 a 2009, jogando pelo Vitória (Bahia), Flamengo e Fluminense.