sábado, 26 de novembro de 2022

PODER DE DECISÃO

Empresários, políticos e a média corporativa pressionam o recém-eleito presidente da república para que revele de imediato a composição do ministério do seu futuro governo, ou, pelo menos, indique os nomes dos futuros ministros da área econômica. 
Convém lembrar que o sigilo e a publicidade são dois instrumentos da política utilizáveis no tempo certo, conforme as balizas éticas e jurídicas que o assunto exigir. Afigura-se precipitada a revelação da composição do ministério sem que o presidente eleito esteja empossado no cargo. Embora a tenha desenhado na mente, há inconveniência em torná-la pública, ainda que pese a ansiedade de alguns setores da sociedade. Juridicamente, antes da posse, ele nada pode decidir como governante. Na transição, as suas decisões de cunho político pairam na intencionalidade. No período governamental, elas poderão – ou não – se materializar. 
Decidir é operação da inteligência que implica escolha, resolução e determinação. Inerente ao poder de decisão, a operação lógica de emitir juízos de realidade e juízos de valor é própria da inteligência humana. Supõe duas ou mais alternativas possíveis. Cabe ao agente decidir de modo resoluto qual delas prevalecerá. O agente da decisão pode ser pessoa natural (homem e mulher) ou ente cultural (família, escola, clube, empresa, igreja, estado). 
A decisão tem por objeto pessoas, coisas, lugares, relações. Na sociedade, entre outros objetivos, a decisão individual ou coletiva (i) escolhe a cidade onde morar, a profissão, o produto a adquirir ou a fabricar (ii) soluciona controvérsias, busca conciliar ou remediar (iii) opta por preferências (iv) visa o bem particular e a satisfação do interesse privado. No estado, entre outros objetivos, a decisão visa (i) a paz, a segurança, o progresso, o bem-estar geral, a satisfação do interesse público (ii) o orçamento, os tributos, as finanças públicas (iii) a construção de escola, de hospital, de estrada, de usina (iv) a nomeação de pessoa para cargo público (v) a redução das desigualdades sociais e a assistência aos necessitados. 
O motivo da decisão pode ser pessoal ou impessoal, egoístico ou altruístico, honesto ou desonesto, verdadeiro ou falso, justo ou injusto.  O fundamento da decisão pode ser comum, técnico, artístico, científico, filosófico, ideológico, religioso, místico. O processo da decisão pode ser [1] informal quando a decisão, ainda que influenciada pelas convenções sociais, está livre de regramento prévio como, por exemplo,  a escolha do nome do filho, do almoço aos amigos, da roupa que usará no jantar romântico, do partido a que se filiar [2] formal quando a decisão é culminância de procedimentos disciplinados por regras escritas e obrigatórias como, por exemplo, (i) no âmbito estatal, a resultante do processo judicial (ii) no âmbito da empresa privada, a resultante do procedimento delineado nos estatutos. 
A capacidade humana de decidir os rumos da família, da escola, do clube, da empresa, da igreja, da nação, do estado, constitui efetivo poder de orientar, conduzir e controlar. Nas instituições públicas e privadas, as decisões dos órgãos subalternos sujeitam-se ao poder revisional dos órgãos superiores. Vibrações do ambiente, informações e dados concretos, influem na tomada de decisão. De um modo geral, a execução das decisões depende das pessoas e dos meios materiais, financeiros, técnicos, táticos e estratégicos disponíveis. Os objetivos da decisão podem se frustrar por incidência de fatores naturais e culturais em sentido contrário. 
Na república democrática, o poder de decisão política no grau máximo pertence ao povo. Esse poder inclui (i) reunir-se em assembleia constituinte, organizar o estado e declarar os direitos fundamentais (ii) escolher os seus representantes na assembléia constituinte e nos órgãos estatais constituídos (iii) tratar diretamente de assunto de relevante interesse nacional mediante plebiscito e referendo (iv) ter a iniciativa de leis. No Brasil, esse poder soberano é exercido por agentes políticos de três órgãos: Legislativo, Executivo e Judiciário. Para ser legítimo e válido, o poder desses órgãos deve ser exercido dentro dos parâmetros constitucionais. Os seus agentes (parlamentares, chefes de governo, juízes) sofrem influência e recebem adminículos da elite intelectual, da burocracia civil e militar, das corporações nacionais e multinacionais, dos bancos, dos sindicatos, das associações civis e religiosas, das empresas de comunicação social. 
No Legislativo, o poder de decisão é democrático e tem caráter deliberativo, ou seja, na elaboração das leis, antes de ser colocada em votação, a matéria é submetida a discussão. Regras regimentais disciplinam o processo de tomada de decisão nas comissões e no plenário. No Executivo, o poder de decisão é monocrático. No entanto, além do cabedal próprio do presidente, as suas decisões incluem ideias, pretensões e interesses advindos dos seus conselheiros da cozinha e do gabinete, dos lobbies e das demais fontes acima citadas. No Judiciário, o poder de decisão é monocrático nos juízos singulares, democrático nos tribunais do júri, aristocrático nos demais tribunais. As decisões são tomadas validamente quando o respectivo processo segue as normas (i) da organização judiciária, quanto às decisões administrativas (ii) da lei processual, quanto às decisões jurisdicionais.


sábado, 19 de novembro de 2022

OPINIÃO

Da tribuna da Câmara dos Deputados, uma deputada acusou o presidente da república recém-eleito, de ladrão e corrupto. Em Nova Iorque, ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) foram agredidos verbalmente por manifestantes brasileiros. Aquela e estes fazem parte do coro de cidadãos que, inconformados com o resultado das urnas, protestam de modo abusivo e violento, em frontal colisão com a ordem jurídica.
Na república democrática, liberdade e responsabilidade andam juntas, como irmãs siamesas. A Constituição garante aos parlamentares o livre exercício das suas elevadas funções sem receio de serem processados e presos. Concede-lhes inviolabilidade civil e penal por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos (CR 53). Todavia, essa liberdade não é absoluta e nem se confunde com licença para delinquir. Do ponto de vista moral e jurídico, veda-se ao parlamentar (i) agir contra a integridade e os fundamentos da república (ii) usar os meios destinados ao desempenho das suas funções, para satisfazer sentimentos pessoais e propósitos particulares seus ou de terceiros (iii) usar a tribuna para ofender os seus pares, adversários, inimigos e cidadãos em geral.
Para o bem das instituições políticas, esses abusos não devem ser tolerados. Se o ofensor for parlamentar federal, o ofendido tem o dever cívico de processá-lo perante o STF. A eventual omissão do ofendido contribui para: (i) agravar o clima de impunidade no país (ii) legitimar a falta de decoro na casa dos representantes do povo. Tal omissão pode indicar que o ofendido (i) está com medo da exceção da verdade (ii) não se importa com o nível ético das instituições políticas (iii) não tem disposição e coragem para reagir.  
Se, no episódio acima citado, o acusado não representar contra a deputada perante o STF, ele estará concordando tacitamente com o teor da acusação. “Quem cala, consente”. As pessoas que em Nova Iorque ofenderam os ministros do STF, também devem ser identificadas e processadas judicialmente, na forma da lei. O governo brasileiro deve solicitar ao governo estadunidense a extradição daqueles brasileiros criminosos que lá se encontram. A omissão do presidente da república recém-eleito e dos ministros togados, no que tange à defesa da honra, contribuirá para (i) a expansão desse tipo de crime (ii) o agravamento do clima de impunidade. As ofensas foram dirigidas contra autoridades do alto escalão da república. Os efeitos constrangedores atingem a nação.  
Ao se ver impune, o criminoso anima-se a prosseguir na prática dos crimes tratados com indiferença ou brandura pelo ofendido, pela sociedade e/ou pela autoridade estatal. A estória das vidraças de uma alheia edificação ilustra bem esse comportamento. O indivíduo quebra intencionalmente uma vidraça. Nada lhe acontece. Depois, quebra outra e outra. Nada lhe acontece. Então, na certeza da impunidade, ele se anima a quebrar todas as vidraças.  
Opinião é o estado intermediário da inteligência entre a certeza e a dúvida. Supõe mais de um entendimento sobre o mesmo assunto. Consiste no juízo afirmativo ou negativo, apreciativo ou depreciativo, sobre pessoas, coisas, épocas, lugares, costumes. As opiniões de distintos sujeitos sobre o mesmo objeto podem ser concordantes ou discordantes. O acordo da maioria da população sobre o entendimento de assunto de interesse geral tipifica opinião pública.
Pública ou privada, a opinião será (i) legítima, quando feita com conhecimento das causas e dos efeitos, alicerçada em fatos provados, em normas vigentes e em valores aceitos no meio social (ii) ilegítima, quando leviana, presunçosa, preconceituosa, sem os alicerces retromencionados. Quem emite opinião ilegítima está ao desamparo do direito e da moral, merece a censura e o desprezo das outras pessoas e ser judicialmente processado. 
Opinião foi o sugestivo nome do espetáculo musical exibido no Teatro de Arena, Copacabana, em dezembro de 1964, encenado por Zé Kéti + João do Valle + Nara Leão + Maria Bethânia, dirigido por Augusto Boal, textos de Armando Costa, Oduvaldo Vianna Filho e Paulo Pontes. A ditadura militar tinha sido implantada em 1º de abril de 1964. [Consolidada em 13/12/1968 pelo AI nº 5, exauriu-se em 31/12/1985, com a extinção do mandato do último general presidente]. 
O referido espetáculo, fusão de música popular e textos em cena teatral, foi a primeira peça pública de resistência pacífica e intelectual à ditadura. Em 1966, outros artistas juntaram-se ao grupo pioneiro e instituíram o Teatro Opinião. Tratava-se de um modelar movimento artístico e político de protesto a favor da liberdade e da democracia. Iniciado em 1964, exauriu-se em 1983. Nesse mesmo ano, teve início o movimento “Diretas Já” em Pernambuco (março/1983), Goiânia (junho), Curitiba e São Paulo (novembro). Exauriu-se em abril de 1984, quando a Câmara dos Deputados rejeitou a PEC nº 5, de 02/03/1983, apelidada “Dante de Oliveira”, sobre eleição direta para presidente da república.

domingo, 13 de novembro de 2022

AMIZADE

Amigos residentes em Campinas/SP, enviaram nesta semana, via WhatsApp, texto sobre amizade. Começa com o pai aconselhando o filho a não esquecer os amigos. Prossegue com o filho narrando o seu aprendizado: (i) conservar os amigos, pois, deles podemos precisar (ii) comunicar-se regularmente com eles para não os perder (iii) os amigos sempre estarão prontos a nos ajudar nos tempos difíceis, a nos receber de braços abertos e a nos abençoar (iv) em torno da mesa, bebendo cerveja, vinho, chá ou café, num bar ou restaurante, à sombra de árvore ou em casa, os amigos conversarão sobre os velhos tempos (v) ao iniciar a jornada terrena não sabemos o quanto precisaremos dos outros. O texto provocou em mim as reflexões a seguir expostas. 
Amizade entre humanos implica (i) inimizade e confrontos: amor versus ódio, amigo versus inimigo (ii) coesão de grupos afins desde o nível familial até o nacional (iii) convergência habitual e divergência ocasional. 
Segundo o testemunho de Platão, filósofo grego, Sócrates afirmava que a amizade era o vínculo que mantinha as pessoas socialmente unidas. Referia-se não só às relações amistosas entre indivíduos como também às relações do povo com as instituições sociais e políticas, afeição responsável pela integridade da cidade (amor à pátria). 
Segundo o testemunho dos apóstolos, Jesus, profeta israelita, colocava no centro da sua doutrina: o amor, a paz, a fraternidade, a igualdade, a comunhão de bens, a obediência à autoridade de deus, à autoridade do estado e à autoridade do pai e da mãe. A ideia cristã de amor assemelha-se à socrática de amizade: afeição não só entre indivíduos como também entre as pessoas e as instituições (família + igreja + escola + estado). O amor de que falava o profeta caracterizava-se por ser incondicional e por sua fonte divina. 
Na vida real, os apóstolos competiam entre si, desentendiam-se, arreliavam. Amizade trepidante. Nem Jesus foi plenamente cristão, conforme se vê dos episódios da sua vida adulta narrados nos evangelhos. A instintiva preservação da vida, dos bens, da dignidade própria, leva os humanos a reagirem aos ataques. Ninguém oferece a outra face ao agressor (salvo por submissão, tortura ou covardia); nem tira a roupa e a dá a quem lhe pede (salvo sob ameaça de arma).  
Segundo os místicos, a tríade: Luz (inteligência) + Vida (movimento) + Amor (liga afetiva), é a chave do universo. Trata-se da energia cósmica tridimensional que está na raiz do mundo. O amor é a energia afetiva unificadora (i) de partículas em átomos (ii) de átomos em moléculas para consistência da matéria (iii) de moléculas em células para consistência dos seres vivos (iv) de seres vivos para coexistência, convívio e reprodução. 
Os humanos coexistem, mas, nem todos convivem. As diferenças de pensamento, de sentimento, de vontade, de interesse, de crença, de culto, tornam o convívio conturbado, infeliz, insuportável, ou, impossível. Por um lado, essas diferenças funcionam como barreiras à união das pessoas e, por outro lado, como causas da separação das pessoas que já estavam unidas. 
Segundo Augusto Comte, filósofo francês, a sociedade repousa no tripé: Amor (princípio) + Ordem (base) + Progresso (fim). Esse amor coincide com a amizade socrática ao significar laços afetivos entre as pessoas e também entre o povo e as instituições. A ruptura desses laços desagrega a sociedade, desestrutura o estado, enseja desordem e retrocesso. Esse amor é o “afeto que se encerra em nosso peito varonil... da amada pátria do Brasil”, nos versos do Hino à Bandeira.
Abençoar significa deitar bençãos sobre alguém, sobre alguma coisa ou sobre algum lugar. Bênção é ato de natureza religiosa e mística. Visa a proteção sobrenatural ou divina, invocada por alguém em benefício de outrem, de alguma coisa ou de algum lugar. No Brasil, principalmente nas grandes cidades, as bênçãos com ou sem o sinal da cruz, com ou sem a imposição das mãos, dadas pelos pais aos filhos, pelos avós aos netos, pelos amigos a terceiros, constituem antigo costume ora revogado pelo desuso. Continua em vigor a benção sacerdotal, porém, mais mecânica do que consagradora e protetora. Amigos abençoarem e receberem de braços abertos quem está em dificuldade (principalmente financeira) é pouco frequente. Na sociedade ocidental, a regra é “salve-se quem puder”. A perda de um ente querido ou de um bem valioso como a liberdade, a saúde, a moradia, o emprego, estimula a solidariedade. A ajuda mútua mais frequente ocorre entre os pobres. Iguais na miséria, nas dificuldades e na dor, solidarizam-se. Instituições públicas prestam assistência emocionalmente apática. 
Ao iniciar a jornada terrena, a criança nada sabe e seus amigos são: a mãe (quando não há infanticídio), o pai (quando não há abandono), os irmãos e parentes (quando não há indiferença), os médicos e enfermeiros (quando não há negligência). A criança e os que a cercam dependem dos bens produzidos pela sociedade. Nas respectivas camadas sociais, os grupos solidarizam-se conforme os seus sentimentos e/ou interesses. Prezam as instituições que os favoreçam. O interesse pela vida é a espinha dorsal da amizade que une os humanos. Liberdade, igualdade, fraternidade, utilidade, são vértebras dessa espinha juntamente com outros valores como: honestidade, verdade, justiça, bondade, santidade. A interdependência dos humanos é fenômeno natural e social gerado pela afetividade da energia cósmica (instinto gregário). 

quarta-feira, 9 de novembro de 2022

LUTO REBELDE

Eleições periódicas integram o lento processo de aprendizado político e permitem que o povo se conheça melhor a cada novo ciclo. Composto das camadas sociais de pobres, remediados e ricos, o povo brasileiro toma conhecimento (i) do igual valor do voto de cada cidadão (ii) da pouca atenção dos eleitores aos programas e às biografias dos candidatos (iii) da divisão ideológica no seio do corpo eleitoral (iv) da influência sobre o eleitor exercida (a) pelos partidos políticos (b) por grupos civis, militares e religiosos (c) pelos patrões (d) pelo uso político das empresas de comunicação social e das plataformas digitais.     
O fato de a porção nazifascista da nação brasileira estar se sentindo enlutada não significa que a porção democrata, por causa disto, esteja obrigada a suportar danos. O sentimento de dor pela perda de alguém da nossa mais alta estima, ou, pela perda de algo que muito valorizamos, dura algum tempo e deve ser suportado dentro dos princípios éticos, jurídicos e religiosos vigentes na sociedade. A perda parece injusta a quem a sofre, no entanto, parece justa a terceiros, à pátria, a Jesus, a Deus. 
Os nossos irmãos nazifascistas se mantêm na dimensão econômica do poder na sociedade, porém, não se conformam de ser afastados da dimensão política do poder no estado. Embora grave, foi menos violenta a precedente afronta à legitimidade do governo Rousseff gerada pelo inconformismo de Fernando Henrique e Aécio Neves diante da derrota (2014-2016). Os tucanos violaram o sistema democrático entrando pelo fétido esgoto do lawfare. Hoje, mais violentos, os vencidos também se comportam como maus perdedores: acampam diante de quarteis pedindo intervenção federal, fazem bloqueios de ruas e estradas, atacam brasileiros que votaram no presidente eleito, ou, que a ele demonstram simpatia nas escolas, nas igrejas, nas ruas, em qualquer lugar. Os rebeldes usam armas, drones, gestos, agressões físicas e ofensas morais. Esse comportamento é típico dos nazistas alemães e dos fascistas italianos da primeira metade do século XX. Essa facção atua na sociedade e no estado, dentro e fora do atual governo. 
O nazifascismo é antidemocrático por natureza, está presente em todo o território nacional e se compõe de milhões de brasileiros, a maior parte concentrada nos estados sulinos por onde entrou e vicejou na primeira metade do século XX. Os 100 milhões de eleitores favoráveis à democracia devem se organizar, defende-la e impedir o avanço do nazifascismo. Os ataques dos nazifascistas devem ser revidados pela força e pelo direito. Os democratas não devem se acovardar, nem tratar com flores quem os trata a porretadas; devem agir com coragem e determinação tal como agiu a torcida do Corinthians. Nas trepidantes relações humanas não se oferece a outra face às bestas. As partes da polícia, do ministério público e da magistratura ainda não intoxicadas pelo nazifascismo, devem apurar com firmeza a responsabilidade criminal desses indivíduos. Rigor e celeridade no devido processo legal são necessários e urgentes.
O luto desses bandidos não merece respeito algum. A dor que sentem pela perda do poder político e pela derrota do seu líder não autoriza a violência contra pessoas e o vandalismo. Esse tipo de reação ao legítimo processo eleitoral é insensato, ilegal e injustificável. De 2018 a 2022 entraram para a vida política ativa 9.151.667 neófitos. O corpo eleitoral subiu de 147 para 156 milhões de eleitores. Esses novos eleitores trazem para a disputa eleitoral a sua adolescência, a sua imaturidade, a sua limitada experiência e o seu limitado saber. Os seus votos valem tanto quanto os votos dos adultos e dos idosos. Nas diferentes faixas etárias de pessoas de ambos os sexos tanto há convergência como há divergência de ideias, sentimentos, vontades e interesses.
O eleitor padrão guia-se mais por suas emoções e seus sentimentos. A inteligência serve de instrumento lógico para justificar as decisões ditadas pelo coração. Esta é a característica psicológica principal do fascismo. O fascista é romântico, ou seja, nele prevalece o sentimento e não a razão. Ele se inclina mais facilmente ao fanatismo. O eleitor padrão vota no candidato filiado ao partido da sua simpatia, pouco importando se o tal candidato é culto ou não, honesto ou não, capacitado ou não. Daí, esse eleitor votar para governador num Ademar paulista, num Pezão fluminense e, para presidente, num Jair qualquer. Geralmente, o indivíduo busca ajustar-se à opinião do grupo no qual vive, sem o hábito de analisar racionalmente o que lhe é oferecido.
O eleitor padrão é manipulável no âmbito da sua visão de mundo. O eleitor condicionado, seja pela ideologia, pela religião ou pelo interesse egoístico, tem o seu lado definido no qual faz as suas escolhas. Fora do padrão, o eleitor tende a se abster, a anular o voto ou a votar em branco. Cabe às elites a tarefa de aperfeiçoar o sistema político. O processo de mudança pode ser lento. O sistema implantado pela Constituição de 1988, por exemplo, até hoje não foi inteiramente assimilado. 

terça-feira, 1 de novembro de 2022

VITÓRIA

O Tribunal Superior Eleitoral publicou o resultado final das eleições presidenciais (31/10/2022). Quantitativamente, notam-se pequenas mudanças do 1º para o 2º turno. 
A) Corpo eleitoral sem alteração: 156.454.011 eleitores. B) Comparecimento às urnas aumentou +570.424 (123.682.372 x 124.252.796). C) Votos válidos aumentaram +322.634 (118.229.719 x 118.552.353). D) Abstenções diminuíram -570.424 (32.770.982 x 32.200.558). E) Votos nulos aumentaram +442.891 (3.487.874 x 3.930.765). F) Votos em branco diminuíram -195.101 (1.964.779 x 1.769.678). 
A mudança mais significativa ocorreu entre o 1º e o 2º turnos, na votação dos dois candidatos à presidência da república. Luiz Inácio cresceu +3.086.495 (de 57.259.504 para 60.345.999). Jair Messias cresceu +7.134.009 (de 51.072.345 para 58.206.354). A diferença entre os candidatos foi de 2.139.645 votos. Dada a sua extensão, essa diferença mostra-se inadequada para definir a vitória como “apertada”. Considerando o corpo eleitoral, o comparecimento às urnas, os votos válidos, as abstenções, os votos nulos, os votos em branco e os votos recebidos pelos dois candidatos no segundo turno, a vitória pode ser considerada confortável, ou seja, nem apertada e nem folgada. 
Por vitória apertada na disputa eleitoral para dirigir um clube, para sair candidato por um partido político, ou, para governar um país, há de ser entendida a diferença de apenas 1 voto entre o vencedor e o vencido (ou de uma dezena de votos conforme o número de eleitores). Nos Estados Unidos da América (EUA), em 2000, a vitória de George W. Busch no colégio eleitoral por 25 votos foi considerada apertada: 271 x 266. O curioso é que na eleição direta a vitória foi de Al Gore por uma diferença de 543.816 votos: 51.003.986 x 50.460.110. Esse fato repercutiu no mundo. Nos EUA o federalismo é autêntico, original, forte e histórico. Daí, a eleição indireta que representa a vontade do povo de cada estado da federação prevalecer sobre a eleição direta que representa a vontade nacional unitária do povo.      
Apertada é a vitória que acontece por um triz, por uma diferença mínima, à beira do empate ou da derrota, numa disputa entre forças equivalentes. A vitória do Flamengo/RJ sobre o Atlético/PR, por exemplo, na partida final da Copa Libertadores da América de futebol masculino (outubro/2022), foi por diferença mínima (1 x 0). As duas equipes jogaram muito bem, com bravura e boa técnica. Mesmo com um jogador a menos desde o primeiro tempo da partida, o clube paranaense mostrava boas condições para empatar. Destarte, a vitória do Flamengo qualifica-se como apertada
Em competições (esportivas ou não), vitória é vitória, seja apertada, folgada ou confortável. Ao vencedor, a taça. Ao vencido, as lágrimas. Na qualificação da vitória entram fatores subjetivos, além da objetividade dos fatos. As eleições para cargos eletivos da república têm esse caráter competitivo frequentemente assemelhado, aqui no Brasil, ao jogo de futebol.       
Há alguns anos, na briga de foice por audiência do programa de televisão do saudoso Gugu Liberato, a saudosa artista e apresentadora Hebe Camargo tentava conciliar: Por que essa briga? Há público para todos! [Na década de 1950, li na “Revista do Rádio” que a jovem cantora era portuguesa. Depois da sua morte em 2012, veio a notícia de que ela era brasileira de Taubaté/SP.  Fiquei na dúvida]. 
Estimada Hebe: As eleições de 2022 aqui neste “vale de lágrimas” mostraram que também há público para todos os candidatos. Foram eleitos deputados, senadores e governadores de diferentes cores partidárias e perfis éticos. Foi eleito um presidente da república de esquerda abraçado a uma parcela da direita moderada. O candidato derrotado também recebeu muitos votos da outra parcela da direita moderada e dos eleitores da extrema direita. Se o candidato da esquerda houvesse esmorecido, acomodado à vitória do primeiro turno, teria perdido as eleições no segundo turno. No entanto, a sua equipe não esmoreceu e lutou até o fim da campanha. O esforço foi compensado.  
Como previsto em artigo anterior publicado neste blog (Analfabetismo Político, 09/10/2022), sobraram quase 10 milhões de votos válidos para os dois candidatos dividirem entre si no segundo turno, posto que as abstenções, os votos nulos e os votos em branco somaram quase 38 milhões de eleitores, repetindo o primeiro turno. Daquela sobra, o atual presidente da república abocanhou 2/3 e subiu de 51 para 58 milhões de votos. O antigo presidente abocanhou 1/3 e subiu de 57 para 60 milhões de votos como previsto no artigo acima referido. 
A maior parte da população brasileira percebeu, felizmente, o que estava em jogo nestas eleições: a sobrevivência da democracia, a reconstrução do país, a recuperação do prestígio do Brasil no cenário internacional, a trincheira para impedir o avanço do nazifascismo. No período democrático que se inaugura em 01/01/2023, amor, paz, liberdade, igualdade e prosperidade são a anunciada tônica do novo governo. No entanto, o convívio com nossos irmãos nazifascistas é altamente pernicioso; requer cautela e constante vigilância. Picar com ferrão é ato instintivo do nazifascista.