O presidente da república nomeou Carlos
Alberto Decotelli, professor universitário, para o Ministério da Educação. A
qualificação acadêmica do nomeado foi questionada por universidades e pelos
meios de comunicação social (imprensa, televisão, rede de computadores) sob
alegação de haver inconsistências no currículo. O professor foi acusado de
mentir, de fraudar, de praticar falsidade ideológica. Sem piedade, sem
moderação, sem prévios cuidados no exame da vida acadêmica do acusado.
O presidente da república, no exercício da sua privativa competência constitucional, manteve a nomeação do professor,
decisão que deve ser respeitada pelos poderes legislativo e judiciário, pouco
importando o azedume da opinião pública. Logo depois, o professor pediu demissão do cargo. Para qualquer ministério, o presidente
da república pode nomear, se lhe aprouver, um gari ou um cabo do exército.
Nenhuma lei exige diploma universitário para o cidadão brasileiro ser ministro
de estado, basta que seja maior de 21 anos e esteja no exercício dos direitos
políticos. A responsabilidade pela nomeação cabe exclusivamente ao chefe de
governo. [CR 84, I + 87].
Jornalistas movidos pelo sensacionalismo,
políticos movidos pelo oportunismo, manifestaram opiniões e julgamentos tão
severos quanto levianos, contra o professor. Se a enganação fosse praticada por
um professor branco, como Fernando Henrique Cardoso, provavelmente as elites e
a média nenhum alvoroço causariam, ao contrário, manifestariam o seu
incondicional apoio. Nenhuma estranheza causou a esses moralistas contestadores o fato de um bacharel branco, de 24 anos de idade, ser nomeado juiz federal e professor de direito em universidade federal, no ano seguinte ao da sua formatura. Nada comentaram ou investigaram o fato de esse mesmo jovem bacharel, logo depois, em curto tempo, ter concluído o mestrado e o doutorado em direito na mesma universidade em que lecionava.
A análise racional do caso, desprovida dos
ingredientes partidários, emocionais e espetaculares, mostra o exagero e a
tendenciosidade dos ataques ao professor negro situado à direita do espectro
político e pronto para servir ao governo de extrema-direita.
Da nota expedida pela Fundação Getúlio
Vargas (FGV), verifica-se que o professor concluiu o curso de mestrado. Portanto, tem
o título acadêmico de Mestre, que lhe seria negado se a banca examinadora
notasse plágio na sua dissertação. Em razão da pandemia, a FGV alega estar
impossibilitada de buscar documentos nos seus arquivos por falta de
funcionários. Informa que o professor lecionou na FGV, mas não era
professor da FGV, ou seja, não integrava o quadro de professores
efetivos.
Da universidade de Rosário/Argentina, vem
a informação de que o professor cursou o doutorado, porém, o seu trabalho final
não foi aprovado (tese). Logo, o professor tem o curso de doutorado, mas
faltam-lhe o diploma e o título de doutor.
Da universidade alemã vem a notícia de que
o professor fizera uma pesquisa acadêmica de 3 meses, em nível de
pós-doutorado, mas não o curso de pós-doutorado propriamente dito.
Do currículo exibido na tela do aparelho
de televisão constata-se que o professor não afirmou ter o diploma e o título
de Doutor e de Pós-Doutor, mas sim ter frequentado os cursos. Sobre a
frequência ao curso de doutorado, não há dúvida. Sobre a frequência ao curso de
pós-doutorado, resta esclarecer (i) se naquela universidade alemã há
cursos de pós-doutorado (ii) se a pesquisa realizada pelo professor integra ou
não integra curso regular de pós-doutorado.
Dúvida não resta, entretanto, do preparo intelectual e do cabedal de conhecimentos do professor. Resta apurar se o episódio afeta, ou não, a sua idoneidade moral. A Constituição da República declara os princípios éticos da administração pública que devem ser observados por todos. [CR 37]. Todavia, quando débil o aspecto ético, prevalecem os aspectos técnico e intelectual da nomeação, mormente por se tratar de cargo de confiança, além de não ser função reservada a servidor estatutário.
Dúvida não resta, entretanto, do preparo intelectual e do cabedal de conhecimentos do professor. Resta apurar se o episódio afeta, ou não, a sua idoneidade moral. A Constituição da República declara os princípios éticos da administração pública que devem ser observados por todos. [CR 37]. Todavia, quando débil o aspecto ético, prevalecem os aspectos técnico e intelectual da nomeação, mormente por se tratar de cargo de confiança, além de não ser função reservada a servidor estatutário.