sábado, 23 de dezembro de 2023

IRRACIONALIDADE HUMANA

Perduram as definições de Aristóteles: “O Homem é um animal racional” + “O Homem é um animal político”. No cristianismo, perdura a proposição bíblica: “Deus criou o Homem à sua imagem e semelhança”. Portanto, sob a ótica religiosa, o Homem não é animal, não resulta do processo evolutivo biológico. Todavia, sob a ótica científica, o Homem é animal e resulta do citado processo. O Homem pertence à categoria racional (homo sapiens). Os seres vivos são passíveis de classificação. Os humanos são seres vivos. Logo, os humanos são passíveis de classificação. As diferenças físicas entre os humanos são utilizadas como critérios taxionômicos. Da classificação dessas diferenças resultam as raças. Dos cruzamentos entre elas, surgem novas raças (miscigenação). De homo sapiens existiam (i) no mundo da natureza, há 20 mil anos, três raças: negroide, mongólica e caucasiana (ii) no mundo da cultura, há 6 mil anos, três tipos: homo social, homo econômico e homo político. 
O trato científico não afasta do ser humano a dimensão irracional própria do reino animal. Na sua integridade física e psíquica, sob os ângulos biológico e sociológico, o Homem é (i) animal submetido às leis da natureza (ii) racional por ter a faculdade de pensar (iii) irracional por agir segundo os seus sentimentos, interesses e apetites, mesmo contra a lógica, a moral, o direito e o bom senso. 
O binômio racionalidade + irracionalidade está presente (i) na paz e na guerra (ii) na harmonia e no conflito no âmbito das instituições (lar, escola, igreja, empresa, parlamento, tribunal). Se amor, bons pensamentos, bons sentimentos, boa conduta, prevalecessem nas relações humanas, haveria paz duradoura e fraterna convivência. Contudo, na sociedade moderna, vigora a regra egocêntrica ditada pelo instinto de conservação: cada um por si e Deus por todos. Entretanto, sem o outro não há comunidade, sociedade e nem estado. Os humanos são animais gregários. A vida de relação interdependente é fato natural e social. Nos intensos casos de sofrimento, de felicidade ou de confraternização, o solidário espírito fraterno se manifesta.
Os vocábulos estória e história, na sequência do presente artigo, serão empregados com significados distintos. 
Estória = narrativa frívola, infantil, brotada da íntima convicção sem respaldo na realidade, contos da carochinha, lenda nos textos religiosos.
História = narrativa veraz com selo de autenticidade, baseada em fatos comprovados sobre pessoas, coisas, acontecimentos, instituições, comunidades, sociedades, estados. 
A fim de angariar simpatia e obter proveito político e econômico, os judeus divulgam a estória do “Povo de Deus”, inventada por alguns deles durante o desterro na Babilônia. O objetivo dessa estória era (i) disciplinar o povo de “cabeça dura”, como Moisés se referia aos hebreus (ii) separar os judeus do gentio e, assim, garantir pureza à raça, pois, naquela época, eles estavam misturados a outros povos mediante laços sensuais e conjugais (iii) tornar obrigatório o culto exclusivo a Javé (iv) impor a Torá (Pentateuco) como escritura sagrada e lei magna do povo judeu. Esse “Povo de Deus” é o mesmo que provocou a crucifixão de Jesus e que agora, em 2023, massacra os palestinos de Gaza. A Torá, redigida por Esdras no século IV a.C., foi lida em público por ele e companheiros, em Jerusalém. Depois disto, os judeus passaram a se considerar “Povo de Deus”. Esse “Deus” chamava-se Javé, ou Jeová, divindade genocida, sanguinária, vingativa, inventada na Babilônia. Através de uma sarça ardente, esse “Deus” falou com Moisés. Ainda hoje, milhões de pessoas acreditam nessa estória.
Os cristãos e os muçulmanos também são “Povo de Deus”. Diferente do Deus do povo judeu, o Deus do povo cristão não é infernal e sim celestial, amoroso, misericordioso, a quem Jesus chamava de Pai. Os muçulmanos prestam culto ao Deus chamado Alá. O seu profeta é Maomé. A sua escritura (Al Corão) autoriza a guerra contra os infiéis e promete as delícias do paraíso aos fiéis. Em comum, esses povos têm a irracionalidade, o monoteísmo e o dogma da superioridade do homem sobre a mulher. As suas crenças religiosas sustentam-se no medo, na ignorância e na fraqueza humana. Fé sem a luz da razão significa blasfêmia. Se Deus dotou o Homem de razão, a fé cega, então, contraria a vontade divina.
Jesus, profeta monoteísta, nada deixou por escrito. Relatos sobre a sua vida e a sua doutrina datam dos anos 50 a 100 (século I), feitos por apóstolos e discípulos mediante epístolas, evangelhos e o livro Apocalipse. Seus dados biométricos, fisionomia, compleição física, são desconhecidos e deles se encarrega a imaginação de cada pintor e especulador. A sua família morava na Galileia (Norte da Palestina), composta do pai, da mãe e de seis filhos (quatro meninos e duas meninas), conforme os costumes daquela época e o mandamento divino crescei e multiplicai. Jesus foi geneticamente concebido depois que, na ausência de (ou do) marido, a sua mãe recebeu a visita de um anjo. Aos 12 anos de idade, ele debateu temas religiosos com sacerdotes no templo de Jerusalém. Outros fatos da sua infância, adolescência e mocidade são desconhecidos. A virtual data do seu nascimento (25 de Dezembro) foi copiada da religião romana. 
Jesus iniciou o seu magistério na Galileia aos 30 anos de idade. Depois, como rabi itinerante, passou pela Samaria (Centro da Palestina) e chegou à Judeia (Sul da Palestina), onde foi morto aos 33 anos de idade. A sua doutrina, quiçá haurida na escola iniciática do Egito, contrariava dogmas do judaísmo. Por blasfêmia, o jovem impetuoso e turbulento profeta galileu foi condenado à morte pelo tribunal judeu (Sinédrio). Ironia da estória: o “Povo de Deus” matou o “Filho de Deus”. 

domingo, 17 de dezembro de 2023

TROVAS

 Vontade mansa de rimar

Nem sei para que isto serve

Se para nutrir a fraca verve

Se para meu tempo ocupar

 

Noite chuvosa sombria

Leve cadência para embalar

As mágoas da alma fria

De quem se recusa a sonhar

 

Trovas e trovoadas

Chegam enlaçadas

Aquelas para alegrar

Estas para assustar

sexta-feira, 8 de dezembro de 2023

SABER NOTÁVEL

A indicação do Ministro da Justiça para ocupar vaga no Supremo Tribunal Federal (STF) agitou o Senado Federal, órgão do Poder Legislativo competente para sabatinar o candidato escolhido pelo Presidente da República. Os requisitos a serem preenchidos pelo candidato, segundo dispõe o artigo 101 da Constituição da República, são: (i) idade superior a 35 anos e inferior a 65 anos (ii) notável saber jurídico (iii) reputação ilibada. 
Motivados por venenosa política partidária, os senadores da oposição ao atual governo federal mostram-se propensos a questionar o requisito do notável saber. Disto, subentende-se que os dois outros requisitos não serão questionados ante a sua pública notoriedade.
Em sabatinas anteriores, os senadores não se alvoroçaram tanto como agora. Eles aprovaram até pessoas que não preenchiam o requisito do notável saber jurídico. Certa vez, em sessão do STF, enquanto examinava um caso, o ministro Barroso ironizou o “notável saber jurídico”. Deixou a impressão de que se tratava de algo imaterial, subjetivo, de difícil avaliação e fácil engano. A sabatina tem sido vista como simples formalidade, compadrio dos senadores com o Presidente da República. Em atenção ao constitucional princípio da harmonia entre os poderes, os senadores aceitam a indicação feita pelo Executivo, ainda que o candidato, ou, a candidata, não preencha aquele requisito.  
No processo mental da cognição, o saber é um conhecimento de especial conotação. Resulta da interação do elemento lógico com o dado empírico carregada do convencimento da verdade. O saber notável situa-se acima do conhecimento vulgar e pode ser técnico, artístico, científico, filosófico, religioso. O conhecimento considerado verdadeiro por convenção e/ou por convencimento, qualifica-se como saber quando regularmente aplicado à vida humana, individual e coletivamente; equivale dizer: quando incorporado ao modus vivendi do indivíduo e/ou da sociedade. 
Para ser ministro do STF, a Constituição de 1988, ora em vigor,  exige que o candidato tenha saber jurídico. Essa mesma exigência constou das constituições de 1934, 1937, 1946 e 1967/69. Portanto, não basta conhecer, tem que saber. Não basta ter conhecimento científico do direito. O candidato necessita, ainda, demonstrar que tem sabedoria jurídica. Isto compreende: (i) experiência jurídica, “conhecimento de experiência feito”, no dizer de Camões (ii) proficiência como operador do direito (iii) bom senso. O ministro Octávio Gallotti, do STF, dizia: “O direito é lógica e bom senso”. O conhecimento, a experiência, a proficiência e a sensatez, no caso de ministro do STF, devem ser notáveis, portanto, acima do comum, dignos de nota, ou seja, notórios no ambiente acadêmico, forense, político e social. 
Para caracterizar o notável saber jurídico concorrem diversos indicadores: (i) a docência exercida por vários anos e de forma ilustre em faculdade de direito (ii) a autoria de obra de direito de boa qualidade técnica, científica e literária (iii) o renome como jurista (iv) os títulos acadêmicos autênticos e reconhecidos (v) as aprovações em concursos públicos na área do direito (vi) o efetivo exercício profissional como advogado, defensor público, membro do ministério público, magistrado (vii) o efetivo exercício do poder de legislar e administrar (viii) o efetivo exercício de função jurídica na estrutura de qualquer dos poderes da república, ou, de corporações privadas com sede ou filial no Brasil.   
A pessoa aprovada na sabatina e nomeada para o cargo de ministro do STF leva consigo uma incógnita. A experiência de décadas torna isto evidente. As aparentes qualidades pessoais positivas podem sofrer mutação. O Dr. Jekyll transforma-se no Mr. Hyde. As fraquezas humanas podem macular o caráter do juiz. O espírito público, a imparcialidade, a independência, a serenidade, o senso de justiça, a moralidade, a dedicação exclusiva à judicatura, a assiduidade, a celeridade e a eficiência, tudo isso pode ser aviltado por [a] estímulos financeiros, políticos partidários, ideológicos [b] pressão de indivíduos e grupos [c] ligações perigosas [d] insensibilidade em relação aos sentimentos e aos direitos do povo [e] agressividade no trato com os jurisdicionados [f] ímpeto despótico [g] vaidade.