EUROPA (1600
a 1800). Continuação.
Baruch Spinoza (1632 a 1677), holandês,
filho de pais judeus, educado na ortodoxia hebraica, dela se afastou ao se
dedicar à filosofia. Em decorrência dos
seus estudos e das suas idéias ele foi amaldiçoado e expulso da sinagoga e da
comunidade judia. Razão, tolerância e justiça são os fundamentos da filosofia
de Spinoza, defensor da liberdade de pensamento. O único bem perfeito que
prodigaliza felicidade duradoura é o amor incondicional e desinteressado a
deus. A idéia de deus formada por Spinoza foi adotada por Albert Einstein
[ambos judeus pelo sangue, mas não pela religião e nem pela cultura]. Suas
obras principais são: “Ética” e “Tractatus Theologico Politicus”. Na opinião de
Spinoza, espírito e matéria são aspectos distintos de uma única substancia
essencial. Deus, substância, universo, são
uma só e mesma coisa (panteísmo). A inteligência humana é parte da inteligência
divina. Mediante idéias adequadas o homem chega a conhecer a conexão entre as
coisas. Perceber as coisas sob um ponto de vista atemporal faz parte da mente
humana. A visão intelectual do universo fica turvada pelas paixões. A
ignorância está na raiz de todo mal. O instinto de conservação é a força motriz
dos atos humanos. Riqueza, prazer, poder e fama, são coisas vazias e vãs, mas o
homem as preza. O homem se escraviza às coisas, às influências externas, e se
liberta quando unido a deus. A liberdade consiste na independência, na
capacidade de determinar a si próprio, de pensar e agir sem medo algum. O homem
livre medita sobre a vida e não sobre a morte. Na função do corpo político
{Estado} a liberdade é essencial. A liberdade de pensamento e a existência
social comungam a mesma essência. Nem tudo pode ser regido por leis. O que não
for proibido é permitido, apesar de danos eventuais. O bom governo promulga
leis oportunas e pertinentes, sem se imiscuir nas crenças e na instrução. Tal
governo deve ser exercido por uma classe privilegiada, politicamente
responsável, que respeite a propriedade e a todos permita manifestar suas
potencialidades.
Jacques-Bénigne Bossuet (1627 a 1704) bispo, teólogo
francês, orador, escritor, político, preceptor de Luiz XIV e do delfim, nasceu
em Dijon e faleceu em
Paris. Das suas obras, destacam-se os “Discursos sobre a
História Universal” e “Política Tirada das Santas Escrituras”. Defende a
monarquia absoluta. O fundamento da monarquia é a autoridade paterna advinda da
natureza. Cada povo deve seguir como
ordem divina o governo estabelecido no seu país, porque deus é um deus da paz
que almeja a tranqüilidade das coisas humanas. Todo governo legítimo goza
da proteção divina. Vós sois deuses,
tendes um caráter divino em vossa autoridade que ostentais em vossa fronte, dizia
Bossuet, dirigindo-se aos reis. Todo o poder vem de deus (omnis potestas a deo) e em nome de deus é exercido pelo monarca.
Por isso mesmo, os súditos lhe devem obediência inconteste. Os reis são senhores absolutos e têm
naturalmente a disposição plena e livre de todos os bens, tanto os seculares
como os eclesiásticos, para deles usar como sábios ecônomos, ou seja, segundo
as necessidades do seu Estado. O príncipe a ninguém deve prestar contas do
que ordena. Acima do príncipe não há autoridade alguma, quer pessoal, quer
legal; o seu julgamento é inapelável. Apesar de absoluta e indivisível, a
soberania comporta freios. Governo absoluto não é o mesmo que governo
arbitrário. Em que pese não estar sujeito à força
coativa da lei, o soberano está submetido à força diretiva do direito e da moral. Não existe poder isento de
toda lei divina, natural ou humana. Sob um deus justo, não existe poder
arbitrário. O monarca deve respeitar os princípios éticos essenciais e as leis
fundamentais do reino {perenes, difusas, que enlaçam os costumes e não brotaram
de vontade individual}. A autoridade do Papa limita-se à matéria religiosa. O
povo deve obedecer ao soberano sem qualquer tipo de resistência, sem
comentários ou resmungos. A resistência só é legítima quando o soberano ordena
contra deus.
As idéias absolutistas de
Bossuet e de outros teóricos foram aceitas porque a época em França era
tumultuada e as pessoas reclamavam ou aspiravam ordem e segurança mais do que a
liberdade. Os indivíduos acreditavam que o rei só queria o bem de todos e que
possuía as virtudes que o credenciavam. Os expositores de tais idéias
esforçavam-se para agradar o monarca reinante e o credo religioso cristão
(católico ou protestante). Conforme o momento histórico, ficava difícil
conciliar a espada e a cruz. Os comerciantes queriam estabilidade política e proteção
para os negócios. O mercantilismo e a política despótica encontravam apoio nas
teorias sobre o governo absoluto. Época de crise, de incerteza, de perigo ou de
transição, favorece o florescimento de governos fortes. Os homens sentiam-se
impotentes para resolver individual e isoladamente os seus problemas.
Acreditavam que o rei era o que devia ser (sábio, virtuoso, justo,
magnânimo, protetor, valente, dedicado ao bem comum). Os súditos acabaram por
se desiludir e se rebelar.
Emanuel Swedenborg (1688 a 1772) nascido em
Estocolmo, filho de um bispo luterano, destacou-se na literatura, na ciência e
no misticismo. Em decorrência de conflito bélico, orientou o transporte por
terra de duas galeras e cinco barcos num percurso de quatorze milhas, feito notável
para a época (1718). Dedicou-se à mineração e ao estudo da química, ótica,
fisiologia, matemática e astronomia. Descobriu o sétimo planeta do sistema
solar. Escreveu inúmeros textos sobre essas matérias, tais como: “Economia do
Reino Animal”, “De Coelo et Inferno
Exauditis et Visis”, “Sapientia
Angélica de Divino Amore”. No seu “Produmum
Principiorum”, Swedenborg trata da estrutura molecular e expõe a sua teoria
atômica. Após sentir-se iluminado espiritualmente, aos 54 anos de idade,
chefiou a seita denominada Nova Igreja de Jerusalém, com adeptos na Europa, na
América, na África e na Ásia. A sua doutrina partia da existência de um mundo
espiritual onde se encontra tudo que existe no mundo material, porém, sob forma
diferente. “Quanto mais sábio é o homem,
mais adorador é da divindade”. A alma se nutre ao unir-se ao corpo humano.
A natureza é sempre semelhante a si mesma; repete-se em sucessivos planos.
No campo da filosofia, o
ápice da revolução intelectual foi o movimento conhecido como iluminismo. Iniciado na Inglaterra por
volta de 1680, espalhou-se pela Europa continental. A Enciclopédia, obra monumental que reunia o saber de filósofos e
cientistas até o século XVIII, foi considerada o símbolo do iluminismo. Entre
as idéias fundamentais desse movimento inscrevem-se: (1) A razão é o único guia
infalível da sabedoria; as raízes do conhecimento estão na percepção sensorial;
as impressões dos sentidos devem ser purificadas no cadinho da razão antes de
adquirir valor para explicar o mundo ou para indicar o caminho de uma vida
melhor. (2) O universo é máquina governada por leis inflexíveis; a natureza não
comporta milagres ou interferência divina. (3) A melhor estrutura da sociedade
é a mais simples e natural. (4) Religião, governo, economia, devem ser purgados
de todo artificialismo e reduzidos a uma forma concorde com a razão e a
liberdade natural. (5) Pecado original não existe. (6) A perfeição estará ao
alcance da sociedade e do homem se houver liberdade para seguir as diretrizes
da razão e dos instintos.
O iluminismo foi inspirado
no racionalismo de Descartes, Spinoza e Hobbes. Os expoentes do iluminismo
foram: John Locke (1632 a
1704) e Isaac Newton (1642 a
1727). Denis Diderot, Jean D´Alambert, Claude Helvetius, Barão de Holbach,
todos filósofos do final do século XVIII, concordavam com o racionalismo e o
liberalismo de Voltaire. Diderot (1713 a 1784) e D´Alambert (1717 a 1783) figuram entre
os autores da “Encyclopédie” supra mencionada, por eles projetada como luz
sobre trevas. Os enciclopedistas não eram ateus. Tinham sua peculiar noção de
deus. Diderot era panteísta. “Se deus não existisse, teríamos de inventá-lo”,
dizia Voltaire.