sábado, 30 de março de 2024

FUTEBOL

A seleção brasileira masculina de futebol enfrentou, em jogos amistosos, duas poderosas seleções europeias. Em 23/03/2024, venceu a inglesa em Londres, no estádio Wembley, pelo placar mínimo (1x0), gol de Endrick no segundo tempo da partida. A inglesa mostrou-se agressiva e persistente no ataque. A brasileira fechou-se na defesa, acautelou-se contra as bolas altas na área, valeu-se do contra-ataque e perdeu algumas finalizações. Em 26/03/2024, a brasileira empatou (3x3) com a espanhola em Madri, no estádio Santiago Bernabéu. Arbitragem sofrível. No primeiro tempo, a anfitriã marcou um gol de pênalti e outro em jogada individual do camisa 10 (Olmo). A visitante marcou um gol em jogada individual do camisa 10 (Rodrygo) que, ao interceptar passe, encobriu o goleiro. No início do segundo tempo, placar ainda adverso, Endrick marcou o segundo gol da visitante. Depois, a anfitriã, de pênalti, marcou o seu terceiro gol.  No último minuto, a visitante, de pênalti, cobrado por Paquetá, marcou o seu terceiro gol. 
Jogos disputados como se fossem de campeonato. Gramados em bom estado. Campeãs mundiais em 1966, a inglesa e em 2010, a espanhola, as duas seleções exibiram futebol de alto nível apoiadas por suas torcidas. Dois fatores contribuíram para o bom desempenho da brasileira: [1] A presença (i) de treinador maduro, seguro, eficiente e (ii) de jogadores confiantes, de bom nível técnico, moralmente bem formados. [2] A ausência (i) de treinador que desestabiliza a equipe e (ii) de jogadores com deficiência moral, como Daniel, Neymar e Robinho. 
Ao contrário do caso de Neymar com a brasileira no hotel de Paris, nos casos de Daniel e Robinho não houve acordo com as vítimas, ambas europeias. Instaurou-se processo judicial e os dois foram condenados. Dir-se-á que, sob o ângulo moral, outro jogador também devia estar fora da seleção por ato criminoso. Todavia, há diferença entre a situação deste e a daqueles três, porque (i) o caso das apostas esportivas não está concluído, o que assegura o vigor da presunção de inocência (ii) o objeto da investigação é a prática de crime patrimonial e não a de crime contra a liberdade sexual. Psicologicamente, o episódio das apostas parece influir. O jogador cometeu muitas faltas no primeiro jogo. Se fosse campeonato, seria expulso. No jogo seguinte, ele voltou a ser punido com cartão amarelo. Tecnicamente, trata-se de jogador acima da média.  
A Confederação Brasileira de Futebol parece que outorgou carta branca ao novo treinador para selecionar e escalar. Nada de Tite. Nada de Neymar. Nada de patrocínio intervencionista. Se reduzir o número de passes errados, de desarmes sofridos e de chances de gol perdidas, a seleção, bem treinada e autoconfiante, poderá ser campeã. Ronaldo conta que certa ocasião, ao ser perguntado pelo treinador se havia estudado a equipe adversária, respondeu: “Eles é que devem se preocupar comigo e não eu com eles”. Ronaldo fora eleito o melhor jogador do mundo. Tal confiança, porém, não afasta o cuidado da equipe de “combinar com os russos” (royalties para Garrincha). 
Aliás, bom evitar comparações com os jogadores da letra R de Rivaldo, Rivelino, Roberto Carlos, Romário, Ronaldinho, Ronaldo e, também, com o grupo de letras GLP de Garrincha, Gerson, Leônidas e Pelé. Hoje, brasileiros e europeus se nivelam. Destarte, a prudência aconselha aguardar a Copa América para, então, avaliar, elogiar e erigir novos ídolos, se for o caso. 
O racismo entrou na ordem do dia por causa das ofensas sofridas na Espanha por Vini Jr., jogador negro do clube Real Madri. Da seleção espanhola participaram dois jogadores negros que deram muito trabalho aos defensores brasileiros. Tal escalação indica que as ofensas não ganharam a simpatia geral dos espanhóis. Negros de distintas nacionalidades jogam em clubes espanhóis sem que o racismo se manifeste de modo explícito e constrangedor. Ronaldinho Gaúcho, por exemplo, jogando pelo Barcelona contra o Real Madri, foi aplaudido de pé pela torcida adversária. Diante desses fatos, o caso Vini desperta curiosidade. Às vezes, o êxito dos negros incomoda os brancos, como se viu nas olimpíadas de 1936, em Berlim (Owens x Hitler).  
A justiça desportiva aplicou pena de suspensão ao jogador Gabriel Barbosa por tentativa de fraude no exame antidoping. Não fosse isto e diante da sua excelente qualidade técnica e boa forma física, ele poderia integrar o elenco da seleção brasileira. Segundo noticiado pela imprensa, dos exames a que ele foi submetido ao longo da carreira, nenhum resultou positivo. A fraude, consumada ou tentada, deve ser provada sem deixar margem à dúvida. In dúbio pro reo. Com imparcialidade, o tribunal deve examinar os fatos, as circunstâncias, a idoneidade dos meios de prova e pesar os efeitos da decisão. A aplicação da lei ao caso concreto deve ser ponderada, razoável e justa. Havendo 22 jogadores em campo, o critério da escolha para exame antidoping sujeita-se a questionamento. Se exames periódicos são realizados em datas  diferentes, cabe indagar, por exemplo, o motivo de a escolha recair, invariavelmente, sobre o mesmo atleta. Isto pode caracterizar perseguição, deliberado propósito de prejudicar o atleta e/ou o clube, assistindo a estes, o direito de recorrer ao poder judiciário nacional com fulcro nas garantias constitucionais. [CR 5º, XXXV, LXVIII, LXIX + 217, § 1º]. 
As decisões da justiça desportiva estão sujeitas ao crivo do poder judiciário, mormente quando afetam direitos fundamentais. A definição de tentativa de fraudar exame antidoping não está clara e bem desenhada na lei. Essa lacuna deixa o atleta e o clube à mercê do capricho dos acusadores e julgadores. Outrossim, desatende ao direito, decisão lançada em termos genéricos tais como: “prejudicar de várias maneiras o trabalho dos oficiais”. Necessário especificar o prejuízo e detalhar as maneiras. Se os exames foram realizados a contento, como noticiado no caso em tela, maior será a necessidade de explicar em que consistiu a tentativa e se houve, ou não, intenção de fraudar. Não se descarta a hipótese de abuso da autoridade à vista do hábito comum, no Brasil, de usar pessoas famosas como escada para o agente se promover socialmente. O árbitro Armando Marques, branco espevitado, por exemplo, sem justa causa, expulsou Pelé durante um jogo. Fê-lo para constar do seu currículo ter sido ele o único árbitro do planeta a expulsar de campo o maior jogador de futebol de todos os tempos.
Espiritual miséria humana!   

sábado, 23 de março de 2024

EU E A ROSA-CRUZ II

A concordância e a discordância frequentam as relações humanas. A primeira, conduz à amizade e à paz; a segunda, à inimizade e à guerra. Fora dos extremos. a concordância pode ser diplomática, conciliadora, no intuito de encerrar o debate e preservar a amizade; a discordância pode ser conveniente ao encorpar o debate na busca da verdade, do esclarecimento ou do consenso, sem provocar inimizade. 
Instituições religiosas e místicas apresentam seus mandamentos e ensinamentos como verdades incontestáveis, escritos sob inspiração divina quando não ditados diretamente pela divindade. As contradições e as falsidades contidas nesse material são resolvidas mediante a interpretação: (i) dos sacerdotes, pastores e teólogos, condicionada pela fé (ii) dos intelectuais, cientistas e filósofos, condicionada pela razão. Os religiosos consideram a fé, caminho da verdade absoluta e a razão, caminho da verdade relativa. Os fiéis são vistos como dignos das recompensas que recebem na Terra e que receberão no Céu. Os infiéis são vistos como livres pensadores, ateus e arrelientos, merecedores dos castigos na Terra e no Inferno. 
Nessa matéria, a principal discordância está na essência e não na existência. Os descrentes sabem da influência social e política do pensamento e da prática das organizações religiosas e místicas no curso da história. No entanto, a fé religiosa e mística é matriz da ilusão, obnubila o cérebro dos crentes e sustenta a vigarice das elites religiosas e políticas. Alicerçadas nas ilusões metafísicas, as instituições religiosas, desde as antigas civilizações até as modernas, exploram a população, acumulam tesouros e exercem os  poderes espiritual e secular. 
Ainda jovem e solteiro (26 a 28 anos de idade), frequentei, aos sábados, de 1965 a 1967, as convocações ritualísticas da Loja Curitiba. Em diferentes ocasiões, a convite do mestre, atuei como guardião externo, guardião interno, cantor, capelão e sonoplasta, embora sem pertencer ao quadro de oficiais. Eu atuava como coringa, sentia-me útil, agradecido e integrado. Todavia, passadas algumas décadas, o meu entendimento entrou em rota de colisão com a doutrina rosa-cruz. Inobstante os 55 anos em que estive filiado à venerável fraternidade, ruiu a minha crença nos profetas, nas profecias post factum, nas narrativas da Bíblia e da literatura mística.
Vejo o Antigo Testamento – parte judaica da Bíblia – como um códex resultante da compilação de tradições orais feita por Esdras, sacerdote judeu, na Babilônia, nos anos 500 a 401 antes de Cristo (a.C.). Trata-se do esforço do sacerdote para unir e disciplinar os judeus no retorno à Palestina, depois de autorizados por Ciro, rei da Pérsia que havia conquistado a Babilônia em 538 a.C. A maioria daqueles judeus era ignorante; mesclava-se com outras raças cujos deuses passava a cultuar. Esdras impôs um monoteísmo exclusivista, racial e nacional. Aliou a isto, um tom de superioridade ao inventar que os judeus eram um povo escolhido pelo deus Javé e que esse deus os colocou acima dos outros povos. Essa parte foi bem recebida e nela os judeus acreditam até hoje. Esdras copiou o monoteísmo posto no Egito cerca de 1375 a 1355 a.C., pelo faraó Aquenaton [grafia portuguesa]. Apesar das periódicas recaídas no politeísmo, a monolatria ficou sendo a base da religião. As religiões dos coetâneos também eram nacionais: cada povo tinha seus próprios deuses e suas liturgias. 
Vejo o Novo Testamento – parte cristã da Bíblia – como fruto da mentalidade judaica dos apóstolos. Segundo os evangelhos, Jesus criou nova seita, com novos preceitos e um novo deus denominado Pai Celestial, poderoso, amoroso, misericordioso, diferente do deus Javé (ou Jeová), satânico, cruel, vingativo, genocida, exclusivo da nação hebraica. Inicialmente, a seita de Jesus tinha caráter nacional palestino. Entretanto, depois da sua morte, alguns dos seus discípulos atravessaram as fronteiras da Palestina e difundiram a doutrina por outros países. À medida que o cristianismo foi se expandindo na Ásia e na Europa, o Pai Celestial foi assumindo extensão universal, deus da humanidade e do mundo. Apesar desta expansão, a maior parcela da humanidade não é cristã.  
Os evangelhos mostram um Jesus: (i) divino, humano e ungido (ii) sábio, amoroso, terapeuta fabuloso (iii) mestre radical e violento (iv) apreciador de vinho, boa comida e de companhia masculina e feminina (v) protetor dos pobres, mulheres e crianças (vi) crítico dos costumes judaicos e da riqueza (vii) opositor ferrenho dos fariseus e saduceus (viii) político astuto que distingue o reino dos homens do reino de Deus e contesta a autoridade do estado. 
Ao contrário do que pensam os cristãos, Jesus não é Deus e tampouco filho unigênito de Deus. Todos os seres vivos são filhos de Deus. Se Jesus existiu biológica e historicamente, então ele foi um ser vivo, do gênero animal, da espécie racional, do tipo semita, nascido na Palestina em local e data desconhecidos. Nazaré não existia, quer como cidade, quer como aldeia ou  simples povoado. Nazareno era apelido do filho hebreu que os pais entregavam ao serviço de Deus. A data 25 de dezembro foi adotada pela igreja cristã para substituir o culto que nesse dia era prestado ao deus Mitra, na Roma imperial. Depois de cinco séculos, o cristianismo superou o mitraísmo na Europa. Aparência física desconhecida. Jesus não foi retratado em pintura, escultura, desenho ou texto enquanto vivia, até porque, naquela época, ele não tinha a importância social e religiosa que adquiriu séculos depois. Ele era tão banal quanto os outros indivíduos que circulavam na Palestina e se diziam mensageiros da verdade divina. Se existiu de fato, então Jesus tinha a aparência do homem hebreu: dolicocéfalo, olhos e cabelos castanhos, nariz adunco, pele morena, estatura mediana, compleição robusta, diferente dos galãs que o representam nos filmes de Hollywood.

Bíblia Sagrada. São Paulo. Editora “Ave Maria”. 1987.
Burns, Edward McNall - História da Civilização Ocidental. PA. Globo. V. 1. 1955.
Jaguaribe, Hélio - Um Estudo Crítico da História. SP. Paz e Terra. V.1. 2001.
Josefo, Flávio – Antigüedades Judias. Madri. J.V. Donado. 2013.
Kempis, Tomás de – Imitação de Cristo. Petrópolis/RJ. Vozes. 2015.Lewis,
Harvey Spencer – La Vida Mística de Jesús. Califórnia. Amorc. 1967.
Mahfuz, Naguib – Akhenaton, O Rei Herege. Rio. Record. 2005.
Stewart, Ian - Será que Deus Joga Dados? Rio. Zahar. 1991.  


sábado, 16 de março de 2024

EU E A ROSA-CRUZ

Durante 55 anos (1965-2020), com o número 27513 (R+C), estive filiado à Antiga e Mística Ordem Rosae Crucis - AMORC, cuja sede para os países de língua portuguesa localiza-se no Brasil, na cidade de Curitiba, capital do Estado do Paraná. Durante todo esse período paguei pontualmente as contribuições até outubro de 2020, inclusive. A partir daí, a AMORC não mais enviou boletos. Cessados os pagamentos, extingue-se o vínculo contratual. Na maçonaria (Grande Oriente), onde fui iniciado nos graus de aprendiz, companheiro e mestre, o maçom mantém o seu título e o seu vínculo mesmo que esteja inativo. Ao contrário da ordem rosa-cruz, a ordem maçônica tem um braço político que me pareceu, depois de algum tempo, comprometer a independência e a imparcialidade exigidas pela função de juiz de direito por mim exercida. Em consequência, assumi o status de maçom adormecido (inativo).  
Enquanto filiado à AMORC, percorri todos os graus e recebi todos os ensinamentos da venerável fraternidade. Participei de cerimônias iniciáticas. As aposições de nome (batismo) dos meus 3 filhos, ainda bebês, foram realizadas na Loja Curitiba (1972, 1975, 1979). No Rio de Janeiro, eu e outros membros fundamos o Capítulo Leblon do qual fui mestre, minha esposa foi matre e minha filha, columba. Os membros se cotizaram para a compra de um imóvel na Gávea onde se instalou a Loja Gávea, sucessora do Capítulo Leblon. As maiores cotas foram dadas por mim e pelo frater Romualdo. Da escritura de compra consta a AMORC como adquirente.
As monografias ensinam técnicas para: (i) reflexão e meditação (ii) conexão com o mundo espiritual (iii) operar com as leis naturais e sobrenaturais (iv) obter boa saúde física e mental. 
Os ensinamentos rosa-cruzes têm seus alicerces nas crenças: (i) no Deus que cada pessoa traz no coração e na mente (ii) na imortalidade da alma (iii) na existência de um mundo espiritual habitado por grandes mestres e por almas desencarnadas (iv) na reencarnação das almas. 
Eu divergia desses pontos centrais da doutrina sem contestação explícita a fim de salvaguardar a harmonia e evitar divisão e conflito internos. A Paz Profunda não se alcança sem a pacificação dos afetos. A minha liberdade de pensar, sentir, agir e a minha capacidade de tolerar ampliaram-se. A minha concepção de mundo e as minhas atitudes perante a vida mudaram e não mais coincidiam com os belos e vetustos ensinamentos da AMORC. 
Respeito a imagem da divindade que cada humano traz em sua mente e em seu coração. Acredito: [1] Que essa imagem é desenhada pelas instituições religiosas e místicas [2] Que “inspiração divina” é engodo [3] Que conhecimentos podem ser obtidos por harmonização, tanto a espontânea (insight) como a intencional, com os conteúdos da zona gravitacional da Terra [4] Que deuses e deusas antigos e atuais da África, da América, da Ásia, da Europa e da Oceania, têm suas respectivas imagens desenhadas pela cultura de cada povo, selvagem ou civilizado [5] Que a origem das crenças religiosas está: (I) no medo, na ignorância e na credulidade dos humanos (II) na consciência que eles têm (i) da sua fraqueza ante a pujança da natureza (ii) da finitude e da brevidade das suas existências (III) no anseio por proteção superior (IV) na esperança de viver num mundo melhor após a morte [6] Que a parte animal dos seres humanos é forte e comanda; que a parte racional é fraca e orienta.    
A personalidade-alma de cada pessoa, construída durante a existência terrena, morre com o corpo. Daí, a impossibilidade da reencarnação. Nada de ilusões metafísicas, apesar do encanto e da beleza que proporcionam. O mundo espiritual é o arquivo dinâmico da história humana. O seu conteúdo pode ser comparado às partículas eletromagnéticas de fonte humana que inundam o nosso planeta, captadas pelos telefones celulares e transformadas em sons e imagens.
Segundo a teoria de Einstein, o Sol, ao “afundar na superfície da grade do espaço/tempo", cria em torno de si uma zona gravitacional por onde circulam os planetas. Provada essa teoria, cada planeta será como um Sol que se “afunda na superfície da grade do seu espaço/tempo" e cria em torno de si uma zona gravitacional. Na zona da Terra circulam a Lua e trilhões de partículas eletromagnéticas. Considerada no seu conjunto psicossomático, ao “afundar na superfície da grade do seu espaço/tempo", a humanidade cria uma zona gravitacional em torno de si onde circulam os elementos da sua energia vibrátil. Cuida-se de um repositório de sons, imagens, experiências e conhecimentos cuja fonte é o ser humano.
Por espíritos, entendo essas vibrações de energia significante emanadas da zona gravitacional da Terra, captadas de acordo com as suas diferentes frequências: (1) involuntariamente pelos bebês (2) voluntariamente, por via introspectiva, pelos adultos, para fins místicos, artísticos ou científicos. Depois da morte restam, na zona gravitacional, as partículas da significante energia vibrátil do ser humano que podem ser acessadas pelas vias apropriadas. 
“O Homem é a medida de todas as coisas” (Protágoras). Cada ser humano é um Sol “afundado na superfície da grade do seu espaço/tempo". Em sua privada zona de gravitação, giram pensamentos, sentimentos, valores, interesses, coisas, pessoas e instituições. Ecce homo!     
 

domingo, 10 de março de 2024

HOLOCAUSTO - II

Os judeus, que se acham etnia especial selecionada por seu deus nacional chamado Javé ou Jeová, reclamam de perseguição, vítimas da maldade alheia. Em alguns períodos da sua história não houve perseguição alguma; em outros, houve perseguições legítimas e ilegítimas, mais por motivos políticos e sociais do que religiosos. Não há perseguição imotivada. 
Guiados por Abram, sem perseguição alguma, os hebreus saíram da Mesopotâmia e entraram em Canaã, posteriormente denominada Palestina pelos romanos no século I a.C. Pastores, lavradores e negociantes, inclinados ao mal, sem refinamento, os hebreus viviam às turras com seus vizinhos em Canaã. Decorridos três séculos, acossados pela escassez de alimentos, emigraram para o Egito onde José, filho de Jacó, era ministro plenipotenciário. José era o Henry Kissinger daquela época (XVII a.C.). Lá, permaneceram por 430 anos. As novas gerações eram de hebreus egípcios. Então, numeroso contingente de hebreus egípcios autorizado por Ramsés II e comandado por Moisés, partiu do Egito para Canaã. Carregava prata e ouro, bens valiosos considerados “despojos”, surrupiados do patrimônio egípcio. Evitou passar por território filisteu. Preferiu o trajeto mais longo, pelo deserto. Ao descobrir o furto praticado pelos hebreus, a autoridade egípcia saiu-lhes no encalço. Perseguição legítima. 
As agruras durante o trajeto despertaram, em milhares deles, a intenção de retornar ao Egito. Ante a discordância de Moisés, eclodiu a rebelião. Nas imediações do Monte Sinai onde as tribos estavam acampadas, os rebeldes foram vencidos e mortos. A batalha provou que os hebreus não eram escravos no Egito. Ninguém luta até a morte no intento de voltar à escravidão. Os rebeldes queriam livrar-se do jugo posto por Moisés e retornar à pátria egípcia que acolheu os seus ancestrais, onde não passavam fome, viviam bem e enriqueceram.
Os redatores dos livros da Bíblia apelam para o romance a fim de engrandecer o povo hebreu. Pesos, medidas, quantidades e qualidades de coisas e pessoas mencionados nesses livros devem ser vistos com cautela, considerados os contextos históricos, a técnica e a cultura incipientes, os exageros e as falsidades postos pelos redatores. Crimes cometidos por esse povo são tratados como heroísmo e obediência à vontade divina. Reis medíocres são ombreados a faraós do Egito e a reis da Assíria, da Babilônia, da Pérsia. Vitórias sobre reinos pequenos cujos habitantes foram exterminados pelos hebreus são vistas como façanhas extraordinárias. Salomão é apresentado como o mais sábio dos homens, portanto, superior aos sumérios, egeus, egípcios, babilônios, assírios e persas. Os filósofos gregos e latinos ainda não haviam nascido. Esse rei era idólatra, perdulário, vaidoso, fascinado pelo esplendor das monarquias orientais. Após a sua morte, o seu reino dividiu-se em dois: [1] Israel, na região norte da Palestina, povo israelita urbano, astucioso, aberto à influência estrangeira, destruído pelos assírios 700 anos antes de Cristo [2] Judá, na região sul da Palestina, povo judeu conservador, fechado à influência estrangeira, composto de pastores, lavradores e negociantes, destruído pelos caldeus 500 anos antes de Cristo.
Oportuno transcrever abaixo o texto da orelha do livro “A Indústria do Holocausto”, citado no artigo intitulado Holocausto publicado neste blog em 22/02/2024.
“As atrocidades nazistas transformaram-se num mito americano que serve aos interesses da elite judaica. O holocausto é uma indústria que exibe como vítimas o grupo étnico mais bem-sucedido dos Estados Unidos e apresenta como indefeso um país como Israel, uma das mais formidáveis potências militares do mundo, que oprime não-judeus em seu território e em sua área de influência. O número de sobreviventes dos campos de concentração é exagerado para chantagear bancos suíços, indústrias alemãs, e países do Leste Europeu em busca de indenizações financeiras. A luta feroz por indenizações tem como efeito colateral insuflar o anti-semitismo na Europa. Israelenses e judeus americanos são hoje as grandes forças de opressão, perseguindo palestinos e negros americanos”.
“Afirmações como estas deflagraram uma grande polêmica nos últimos meses de 2000 na Europa e nos Estados Unidos, provocando reações indignadas de historiadores e lideranças judaicas. Um dos principais motivos para a indignação é que o autor dessas declarações não era um líder de grupo neonazista ou um radical islâmico, e sim um professor judeu da Universidade de Nova York. Mais: filho de judeus egressos do Gueto de Varsóvia e sobreviventes dos campos de concentração de Maidanek e Auschwitz”.
“Em A indústria do holocausto, Norman Finkelstein mostra que o extermínio de judeus durante a Segunda Guerra, foi transformado em uma representação ideológica que defende interesses de classe e sustenta políticas. Finkelstein, de 47 anos, recorda sua infância, durante a qual não se discutia o holocausto, para mostrar que o interesse pelo assunto coincidiu com a Guerra dos Seis Dias, quando os Estados Unidos perceberam que seria interessante ter um parceiro forte no Oriente Médio. E, para os grupos judaicos americanos e a direita então no poder em Israel, a melhor forma de angariar simpatia era vender a ideia de que a hostilidade árabe poderia levar a uma reedição da Solução Final. É quando, segundo Finkelstein, nasce a indústria do holocausto e ganham destaque personagens como Elie Wiesel e Simon Wiesenthal. Hoje, essa indústria dedica-se a cobrar indenizações de empresas e países, e o autor acusa instituições judaicas mundiais de mentir sobre o número de sobreviventes para extorquir dinheiro que não é efetivamente entregue às vítimas reais. O que, segundo Finkelstein, reduz o martírio de milhões de pessoas a instrumento de chantagem”. 
Bíblia. AT. Gênesis 41: 37/44 + 47: 27. Êxodo 12: 37/38 + 13: 17 + 32: 9, 22, 27/28.  
Burns, Edward McNall - História da Civilização Ocidental. PA. Globo. V. 1. 1955.
Jaguaribe, Hélio - Um Estudo Crítico da História. SP. Paz e Terra. V.1. 2001.
 

domingo, 3 de março de 2024

TOLERÂNCIA

Carmen Lúcia, ministra do Supremo Tribunal Federal, disse, nesta semana, quando trabalhava no Tribunal Superior Eleitoral, não gostar de ser juíza num mundo louco. De fato, em tal mundo, afigura-se mais apropriada justiça cibernética do que justiça humana convencional. Na extensão daquela frase é possível incluir: (i) o morticínio na Ucrânia e em Gaza (ii) as portas abertas à guerra nuclear (iii) a animosidade entre Putin e Biden (iv) a sanha assassina de Netanyahu (v) a competição entre as seitas religiosas e a imersão delas na política partidária (vi) o ódio e a intolerância grassando na sociedade brasileira.
Tolerar significa: (i) estar disposto a ouvir pacientemente opiniões contrárias às suas (ii) ser indulgente com o que desagrada, com as crenças alheias, com as ofensas pessoais, com as violações às regras vigentes. Tolerância consiste na disposição de espírito para tolerar. A sua presença nas relações humanas contribui para a coexistência pacífica entre pessoas, nações e estados. A ultrapassagem de limites faz da tolerância frouxidão moral. Através da análise racional e circunstancial dos atos e fatos traçam-se limites. 
A tolerância civil não deve chegar ao ponto de minar a forma de governo estabelecida na Constituição. A sociedade convive com zonas de prostituição e casas de tolerância onde homens casados transam com mulheres sem a mácula do adultério. O Congresso Nacional se compõe de duas casas de tolerância onde opiniões contrárias são debatidas e criminosos anistiados. Os tribunais judiciários são casas de intolerância onde, mediante o devido processo, pessoas são condenadas por ações e omissões contrárias ao direito. 
A tolerância religiosa não deve chegar ao ponto de minar os bons costumes vigentes na sociedade, o que (i) exige autodomínio dos fiéis e dos líderes das diversas seitas (ii) evita confronto bélico (iii) facilita a coexistência fraterna. O espírito de tolerância religiosa orientou a assembleia constituinte brasileira de 1988. Os deputados instituíram a liberdade de consciência e de crença. Desde o golpe republicano de 1889, tal liberdade vem declarada nas diversas leis orgânicas do estado brasileiro. Não há religião oficial. O estado brasileiro é laico. A nação brasileira é religiosa. A Constituição assegura liberdade de culto. A parcela maior da nação brasileira compõe-se de católicos, protestantes, kardecistas e umbandistas; a parcela menor, de judeus, muçulmanos, budistas e hinduístas. 
O direito à liberdade religiosa implica o dever de tolerância. Havendo intolerância explícita entre seitas, o estado pode intervir mediante o devido processo jurídico a fim de assegurar a eficácia da norma constitucional que a todos garante aquela liberdade. Atualmente, a coexistência pacífica entre religiões está ameaçada pela agressiva busca de hegemonia e de domínio político encetada por seita evangélica pentecostal. Isto lembra 1980, quando o líder sindicalista Luiz Inácio da Silva e companheiros perceberam que só atividade sindical era insuficiente para colocar em nível de igualdade os termos do binômio capital + trabalho. Precisavam de poder político. Então, apoiados pela igreja católica, fundaram o partido dos trabalhadores. Agora, os evangélicos pentecostais, apoiados pela igreja protestante, têm partido político e desafiam a laicidade do estado. 
A manifestação política e religiosa na Avenida Paulista em 25/02/2024, exibiu o inconstitucional amálgama religião/política. O episódio evidenciou (i) a intolerância dessa parcela minoritária do povo brasileiro com os valores democráticos e com as crenças de outras seitas religiosas (ii) a pretensão de anistia para os agentes dos crimes praticados contra o estado democrático de direito (iii) a participação ativa de lideranças civis e religiosas no fracassado golpe de 08/01/2023.
A civilização ocidental traz no seu bojo a tolerância recomendada por Jesus no sermão da montanha: amai os vossos inimigos; fazei bem aos que vos odeiam; abençoai os que vos maldizem; orai pelos que vos injuriam; ao que te ferir numa face, oferece-lhe também a outra; ao que te tirar a capa, não impeças de levar também a túnica; ao que tomar o que é teu, não lho reclames. (Lucas 6: 27/30). Utópicos mandamentos diante da real incapacidade humana de amar e tolerar incondicionalmente. A humanidade não é, nunca foi e jamais será comunidade de anjos e santos. Ao criar seita hebraica com nova imagem de deus e novos preceitos, o profeta galileu mostrou-se tolerante com a seita dos essênios e intolerante com as seitas dos fariseus e dos saduceus. Estas duas seitas predominavam na vida religiosa e política da Palestina. Naquela época, os galileus ao norte, os samaritanos ao centro e os judeus ao sul, habitavam a Palestina, todos sob a lei mosaica (Pentateuco). Lei mosaica escrita no século IV a.C., na Babilônia, por Esdras, sacerdote judeu, vinte séculos depois da morte de Moisés (2.500 - 500 = 2.000 = 20 séculos). 
A divergência entre a seita do galileu e as seitas dos judeus residia na liturgia, na interpretação e na aplicação do Pentateuco. Valendo-se da sua autoridade de profeta hebreu, Jesus xingava fariseus e escribas: víboras, hipócritas, sepulcros caiados, e quejandos. Hoje, se algum missionário for pregar o evangelho no Irã, criticar o Islã, ou ofender os aiatolás, será morto. Transpor os limites da tolerância pode gerar consequências funestas. Jesus, quiçá pela impulsividade da sua juventude, sem a prudência da maturidade, atacou adversários poderosos. Fê-los inimigos. Foi por eles condenado à morte como blasfemo e subversivo. A sentença do Sinédrio foi executada por crucifixão na forma da lei romana. Apedrejamento era o modo hebreu de executar a pena de morte sem as formalidades jurídicas de Roma.