terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

FUTEBOL



Seleção inglesa x seleção brasileira (2 x 0). Os ingleses bem entrosados mostraram um futebol eficiente. Até o momento, mostram-se preparados para a copa de 2014. Os brasileiros estão bem individualmente. Necessitam melhorar o conjunto. O treinador convocou jogadores experientes e novatos, todos bons e em forma. Entre os experientes, Ronaldo Gaúcho perdeu um pênalti. Demérito para o batedor; mérito para o goleiro. O batedor tem a obrigação de converter a penalidade em gol diante da enorme vantagem de que dispõe: tiro livre (sem barreira) a pequena distância com enorme gol à sua frente. O goleiro não tem obrigação de defender diante da evidente desvantagem decorrente da punição; se defender, aleluia! Artilheiros como Zico, Romário, Neymar, perderam cobranças de penalidade, o que não lhes retirou a qualificação de bons jogadores. Agora mesmo, no campeonato português, na partida contra o Rio Ave, o artilheiro do Porto cobrou penalidade com a “cavadinha” e o goleiro defendeu. O batedor reabilitou-se na mesma partida ao cobrar de modo simples uma segunda penalidade. Certa vez, o argentino Palácio deixou de converter três penalidades distintas no mesmo jogo.

A presença de Parreira na comissão técnica é mau agouro. Com a sua displicência ele enterrou a seleção de 2006. O elenco daquela seleção era muito bom: Cafu, Juninho Pernambucano, KK, Mauro Silva, Roberto Carlos, Robinho, Ronaldo Gaúcho, Ronaldo Nazário, Zé Roberto, entre outros. Todos confiavam na conquista da copa. A concentração da equipe virou festa. Desvario. Resultado: ficou nas oitavas-de-final. Há jogadores briosos que merecem respeito. Desgostosos com a derrota e com aquele clima carnavalesco, Juninho Pernambucano, Mauro Silva e Zé Roberto decidiram não mais participar da seleção brasileira. Ausência sentida em 2010. Seria bom se voltassem à seleção para a copa de 2014, agora sob o comando de Luis Felipe Scolari. A questão da idade é preocupação de jornalistas brasileiros repetitivos, medíocres, desatualizados com a medicina. Ao treinador mais importa saber se o jogador está em forma do ponto de vista físico, técnico e psicológico e situado entre os melhores da atualidade. Em caso positivo, estudar o modo de bem aproveitá-lo na seleção brasileira.  

Campeonato paulista. 23/02/2013. Bragantino x Corinthians (2 x 2). O Bragantino jogou bem. Lembrou o tempo em que o jovem Luxemburgo era o treinador. Grande partida do Pato; atuou como nos seus primeiros jogos na categoria profissional. Por que ele não jogava tão bem na Europa? Aconteceu o mesmo com Robinho que ambicionava o título de melhor jogador do mundo e cuja estrela perdeu o brilho em céus europeus. Talvez o mesmo aconteça com Lucas, cuja ambição é a mesma de Robinho. Já as estrelas de Careca, Falcão e Romário brilharam naquele firmamento sem a preocupação de ganhar aquele título. Inibição de uns, desenvoltura de outros? Bem possível. O fato negativo pode ter diversas causas: (i) falta de adaptação ao clima europeu, ao futebol europeu, aos costumes europeus; (ii) política dos treinadores; (iii) indiferença da torcida local; (iv) saudade do paparico da imprensa, dos amigos, parentes e torcedores.

sábado, 23 de fevereiro de 2013

PASSARINHADA



1951. Alto da Rua Itupava, periferia de Curitiba, onde as casas eram de madeira e havia chácaras de imigrantes e descendentes. Plantavam verduras, legumes, pés de laranja, pêra, jabuticaba; criavam gado leiteiro, porcos, galinhas. Havia cavalos atrelados a carroças de rodas de madeira com aros de ferro, sem molejo, tábua servindo de banco. Nós, minoria, de baixa estatura, pele morena, cabelos e olhos escuros, contrastávamos com aquela gente alta, pele clara, cabelos louros ou castanhos claros, olhos azuis ou verdes. Olhávamo-nos com mútua curiosidade. Ao falar, eles erravam na concordância e na pronúncia. No alvorecer do dia e da adolescência eu saía com a minha cetra para caçar passarinhos. No bornal, a munição: pequenas pelotas de barro feitas por mim e secadas ao sol. No regresso, eu depenava os dois passarinhos que caçara e minha mãe os temperava e fritava, mais para nutrir o meu orgulho de caçador do que para alimentar o corpo. O diminuto volume da carne não mexia o ponteiro da mais sensível balança. Pesava mais a satisfação moral de comer a caça.

2013. Campos e morros de Penedo, distrito de Itatiaia/RJ. Ao raiar do dia os passarinhos começam a cantar aqui no quintal de casa e nas cercanias. Suspendo a música da meditação. Escuto-os. Entôo sons vocálicos, cada qual no tom adequado para acompanhá-los. Penso: provavelmente, os místicos orientais se inspiraram no canto dos pássaros quando inventaram os mantras. O meu diabinho interior questiona: por que os passarinhos cantam? Podiam apenas voar, beber, comer e reproduzir. Respondo: é da natureza deles; cantam de alegria. O diabinho pondera: mas o canto pode ser de tristeza. Os poetas cantam as desilusões e as experiências que os fizeram sofrer. Respondo: sim, mas os poetas são homens e não passarinhos. O diabinho opina (aliás, era essa a sua intenção desde o início): da minha parte, acho que os passarinhos cantam o hino à vida. O canto os fortalece e os identifica; cada espécie, o seu gorjeio. Aborrecido por ver minha verdade questionada e minha vaidade ferida não lhe dei resposta. Liguei o aparelho de som. Música suave. Voltei a meditar.

As andorinhas costumam enfileirar-se nos quatro fios da rede elétrica que passa em frente e ao lado da minha casa. Por um longo tempo ali ficam quietas ou a bicar embaixo das asas; às vezes, uma ou outra muda de posição. Há ocasiões em que não passam de uma dezena, param pouco e logo vão embora. Hoje contei mais de 100. Uma festa! Veio um pardal e se empoleirou no topo do poste com pose de dono do pedaço. Ouço um canto alto, forte e melodioso. Não é do pardal, nem da andorinha. Localizo o cantor: um passarinho, inho, inho, do tamanho do mindinho. Fico admirado: como este pequerrucho pode cantar desse jeito alto e vigoroso? Assemelha-se à espécie de passarinho que no Paraná, ainda crianças, nós chamávamos de corruíra. Ele parece gostar da audiência. Faz trejeitos, olha-me de soslaio, finge que não me vê estufa o peito e capricha no agudo. Aceito o desafio. Finjo também que não o vejo, fico no pátio e não arredo o pé enquanto ele não decola. O bem-te-vi também canta alto e forte, mas é um gigante comparado com o tamanho deste passarinho. Quando um canta outros respondem e a cantoria parece orquestrada por maestro. Ouvem-se cantos vindos de mais distante, tanto das corruíras (vou chamá-los assim) como dos bem-te-vis, sabiás, pintassilgos e outras espécies de passarinho. Cria-se autêntica e natural sinfonia.

sábado, 16 de fevereiro de 2013

POESIA



Nos meus cadernos de escola, nesta carteira, nas árvores, nas areias e na neve /
Escrevo teu nome.
Em toda página lida, em toda página branca, pedra, sangue, papel, cinza /
Escrevo teu nome.
Nas imagens redouradas, na armadura dos guerreiros e na coroa dos reis /
Escrevo teu nome.
Nos jungles e no deserto, nos ninhos e nas giestas, no céu da minha infância /
Escrevo teu nome.
Nas maravilhas das noites, no pão branco da alvorada, nas estações enlaçadas /
Escrevo teu nome.
Nos meus farrapos de azul, no tanque sol que mofou, no lago lua vivendo /
Escrevo teu nome.
Nas campinas, no horizonte, nas asas dos passarinhos e no moinho das sombras /
Escreve teu nome.
Em cada sopro da aurora, na água do mar, nos navios, na serrania demente /
Escrevo teu nome.
Até na espuma das nuvens, no suor das tempestades, na chuva insípida e espessa /
Escrevo teu nome.
Nas formas resplandecentes, nos sinos das sete cores e na física verdade /
Escrevo teu nome.
Nas veredas acordadas e nos caminhos abertos, nas praças que regurgitam /
Escrevo teu nome.
Na lâmpada que se acende, na lâmpada que se apaga, em minhas casas reunidas /
Escrevo teu nome.
Em meu cão guloso e meigo, em suas orelhas fitas, em sua pata canhestra /
Escrevo teu nome.
No trampolim desta porta, nos objetos familiares, na língua do fogo puro /
Escrevo teu nome.
Em toda carne possuída, na fronte de meus amigos, em cada mão que se estende /
Escrevo teu nome.
Na vidraça das surpresas, nos lábios que estão atentos, bem acima do silêncio /
Escrevo teu nome.
Em meus refúgios destruídos, em meus faróis desabados, nas paredes do meu tédio /
Escrevo teu nome.
Na ausência sem mais desejos, na solidão despojada e nas escadas da morte /
Escrevo teu nome.
Na saúde recobrada, no perigo dissipado, na esperança sem memórias /
Escrevo teu nome.
E ao poder de uma palavra, recomeço minha vida, nasci para te conhecer /
E te chamar liberdade.
(“Um Único Pensamento”. Paul Éluard. Trad. Manuel Bandeira e Carlos Drumond de Andrade).

sábado, 9 de fevereiro de 2013

POESIA



Tu me queres alva / me queres de espuma / me queres de nácar / que seja açucena / mais casta que todas. / De perfume suave / corola fechada. / Nem raio de lua / filtrado me toque. / Nem a margarida / seja minha irmã. / Tu me queres nívea / tu me queres branca / tu me queres casta.
Tu, que as taças todas / já tiveste à mão. / Os lábios corados / de frutos e mel. / Tu, que no banquete / coberto de pâmpanos / as carnes gastaste / festejando a Baco. / Tu, que nos jardins / escuros do engano / lascivo e vermelho / correste no abismo.
Ó tu, que o esqueleto / não sei por que graça / ou por que milagre / conservas intacto / só me queres branca / (que Deus te perdoe!) / só me queres casta / (que Deus te perdoe!) / só me queres alva.
Foge para o bosque / vai para a montanha. / Purifica a boca / vive na humildade. / Segura com as mãos / a terra orvalhada. / Alimenta o corpo / de raiz amarga. / Bebe a água das rochas / dorme sobre a geada / renova os tecidos / com salitre e água. / Conversa com os pássaros / lava-te na aurora.
E já quando as carnes / ao corpo te voltem / e quando hajas posto / nas carnes a alma / que pelas alcovas ficou enredada / então – homem puro – / pretende-me nívea / pretende-me branca / pretende-me casta.
(“Tu me queres casta”. Alfonsina Storni. Trad. Oswaldo Orico).

sábado, 2 de fevereiro de 2013

POESIA



A brigada dos velhos repete sem se cansar. / A cantilena é sempre igual: / Camarada, para as barricadas! / E eu digo: barricadas da alma e do coração. / E eu digo: somente é comunista verdadeiro / quem destrói as pontes da retirada. / Basta de marchas futuristas / ou de saltos no futuro. / Construir um trem é pouco. / Se a canção rebelde não levanta os povos / de que serve a mudança de marcha? / Ajuntai os sons uns aos outros / e prossegui cantando e assoviando. / Há, entretanto, lindas letras / U R S S / É pouco para fabricar um par de botinas / ou coser os galões às calças. / Os deputados não movimentarão os exércitos / se os músicos não abrirem a marcha. / Basta de verdades baratas. / Arrancai o ranço do coração! / As ruas são nossos pincéis / e paletas as nossas praças. / No livro do tempo / ainda não foram cantadas / as mil páginas da revolução. / Para a rua, futuristas, tambores e poetas!

(“Ordem do dia aos exércitos da arte”. Vladimir Vladrovitch Maiakowsk. Trad. Sérgio Milliet).


Toma-me agora que ainda é cedo / e levo dálias novas pela mão / Toma-me agora que ainda está sombria / a minha cabeleira ondulante e vadia / agora que ainda tenho uma carne olorosa / os olhos de cristal e a pele de uma rosa. / Agora que me calça o meu pé de roseira / a sandália vivaz da primavera. / Agora que em meu lábio o riso soa / como um sino que bate e cuja nota voa. / Depois... Ah! Eu sei / que nada mais do que hoje tenho, então terei! / Hoje, mais tarde não. Vem, antes que anoiteça / e que murche com o tempo esta corola fresca. / Hoje, e não amanhã. Amor: não percebeste / que a parasita azul acabará cipreste?

(“A Hora”. Juana de Ibarbourou. Trad. Oswaldo Orico).