Palestina (continuação).
Após a morte de Salomão (935 a.C.) as 10 tribos do
norte não aceitaram a chefia do seu filho Roboão e constituíram um estado
próprio que se chamou Reino de Israel.
As duas tribos do sul formaram o Reino de
Judá. Depois de dois séculos, o Reino de Israel é conquistado pelos
assírios e seus habitantes deportados para províncias assírias. (722 a.C.). Chegou a hora do
Reino de Judá: os caldeus o destruíram e deportaram os habitantes para a
Babilônia (586 a.C.).
Jerusalém foi pilhada e queimada; a “lei” virou cinza (textos que supostamente
compunham os cinco primeiros livros da Bíblia). No exílio, fundados na tradição
oral e nos fragmentos de textos, o sacerdote Esdras e outros eruditos elaboram
a “lei” (cinco primeiros livros do AT) em substituição a supostos textos que os
caldeus teriam queimado junto com o templo de Jerusalém (não há evidência da
anterior existência desses livros).
Ciro, rei da Pérsia, conquista a
Babilônia e autoriza os judeus a retornarem a Palestina. Parte deles preferiu
ficar na Mesopotâmia, indício de que o “cativeiro” não era tão ruim como
pintado por alguns escritores. Na verdade, tratava-se de exílio e não de cativeiro. Aliás, não se pode confiar nos textos
contidos na Bíblia ou em livros esparsos, escritos por judeus sobre a história
deles, porque são tendenciosos; exageram nos padecimentos e nas vitórias;
denigrem os inimigos; inventam episódios e manipulam números e datas. Para se
obter alguma verdade é necessário recorrer à história documentada dos povos daquela
época. Após prestar vassalagem à Pérsia, os judeus caíram sob o domínio de
Alexandre da Macedônia e depois de Ptolomeu do Egito. Liderados pela família
Macabeus, eles conseguiram independência política por um século. Depois, foram
dominados por Roma (63 a.C.).
As divisões territoriais da
Palestina (tetrarquias) eram administradas por governantes judeus nomeados por
Roma. A dinastia de um desses governantes durou 81 anos (Herodes, 37 a.C. a 44 d.C.). A Judéia
(sul da Palestina) passou a ser administrada diretamente por Roma. Ao tempo de
Jesus adulto (o Cristo) o administrador era um general romano chamado Poncio
Pilatos. Instigada pelos zelotes (judeus nacionalistas radicais) a massa
revoltou-se contra a autoridade romana enquanto a elite, ciente do poderio de
Roma, sensatamente preferia manter o status
quo (66 d.C.). A revolta foi sufocada e Jerusalém novamente destruída (70
d.C.). De protetorado (país sob
proteção de outro mais forte) a Palestina passou a província de Roma. O imperador Adriano impôs a cultura helênica na
Palestina (isto restringia a liberdade religiosa dos judeus), fundou uma
colônia em Jerusalém e ali construiu um templo dedicado a Júpiter Capitolino
(isto ofendia o sentimento religioso dos judeus). Um rabino de nome Akiba
declara messias o líder popular radical Simon Bar Kokhba e o encoraja a chefiar
revolta contra a autoridade romana. Sufocada a rebelião pelos romanos, os
judeus foram expulsos de Jerusalém (132 a 135 d.C.).
Na antiguidade, cada povo tinha
os seus deuses e a religião estava ligada à política. Daí o rei ser ao mesmo
tempo comandante político e sumo sacerdote. O povo submetia-se à autoridade
política e aos sacerdotes e profetas. Nas cerimônias públicas misturavam-se
religiosidade e civismo. O povo hebreu seguiu o figurino da época. A religião final
desse povo serviu de ponto de partida ao cristianismo e ao islamismo. No
período pré-mosaico (1400 a
1100 a.C.),
os hebreus eram animistas: adoravam
os espíritos residentes em árvores, montanhas, poços, fontes de água e pedras de
formato especial; praticavam a necromancia (adivinhação pela invocação dos
mortos), a magia e o sacrifício de animais racionais e irracionais. Com o
tempo, os hebreus evoluíram para o politeísmo
antropomórfico: deuses de forma e características humanas que tutelavam
lugares e tribos e recebiam o tratamento genérico de “El” (= sagrado). A monolatria foi o estágio seguinte
(período mosaico: 1100 a
800 a.C.).
Na monolatria exige-se o culto exclusivo a um só deus embora a existência de
outros deuses de povos distintos seja reconhecida. A nova religião foi imposta
por Moisés. Na condição de príncipe e sacerdote egípcio, Moisés conhecia o
monoteísmo do faraó Aquenaton cultivado por uma elite sacerdotal egípcia em
caráter privado. Moisés viu nos hebreus egípcios a oportunidade de realizar o
seu sonho: constituir um estado monoteísta. O novo deus era antropomórfico.
Segundo a lenda, Javé exibiu suas costas para satisfazer a curiosidade de
Moisés: “me verás por detrás, pois a
minha face não pode ser vista; o homem não poderia me ver e continuar a viver”.
Javé era bondoso e maldoso, possuía as virtudes e os defeitos humanos. O seu
poder não ultrapassava as fronteiras da Palestina (deus tribal). Esse deus
punia as pessoas e as tribos quando o contrariavam. Os kenitas, povo que vivia
próximo ao Monte Sinai, tinham um deus semelhante. Moisés o tomou por
empréstimo e o batizou com o nome de Javé. O decálogo contido no livro Êxodo
(Bíblia, AT) foi escrito entre os anos 700 a 300 a.C., quando Moisés já estava morto há
centenas de anos. O nome Jeová ao
invés de Javé, resultou de um erro cometido por tradutores cristãos no século
XIII (1201 a
1300).
O politeísmo vigorava no mundo
antigo e a classe sacerdotal era poderosa. O faraó Aquenaton tentou fazer do
monoteísmo religião oficial do Egito. Acusado de heresia por afrontar a
religião tradicional, ele ficou em prisão domiciliar no seu palácio.
Acredita-se que as suas refeições eram temperadas com doses homeopáticas de
veneno. Morreu jovem. Retornaram: o Egito, ao politeísmo; os sacerdotes, ao
poder; a cidade de Tebas, ao seu antigo esplendor. A cidade construída pelo rei
herege foi abandonada às traças. De olhos postos neste precedente e com receio
de igual fracasso, Moisés convenceu os hebreus egípcios de que eles tinham sido
eleitos por um deus poderoso. O engodo visava ao sucesso da nova religião,
obter fidelidade do povo e impedir o politeísmo no estado a ser constituído.
Apesar dos esforços de Moisés e
dos profetas posteriores, os hebreus recaíram no politeísmo por diversas vezes.
Além disto, mantiveram a adoração da serpente, os sacrifícios sangrentos, as
orgias nos rituais de fertilidade, o fetichismo e a magia. Chefes de seitas
ascéticas reagiram à corrupção nas práticas religiosas, condenaram o conforto
da vida civilizada e incitaram o povo hebreu a morar em tendas. Elias, um
desses chefes, abominou o culto de Baal, matou os seus sacerdotes e insistiu no
culto exclusivo a Javé. Seguiu-se a revolução profética dos anos 800 a 600 a.C. Os profetas
defendiam uma nova filosofia religiosa: (1) monoteísmo ao invés de monolatria: Javé é o único deus do universo; não existem
outros deuses; (2) Javé é deus da
retidão, mas não é onipotente, pois a sua força é limitada pela justiça e pela
bondade; (3) o mal deste mundo vem
dos homens e não do deus; (4) a religião tem finalidade ética: Javé não se atém ao ritual e ao sacrifício;
espera que os homens pautem suas vidas pela justiça, ajudem os oprimidos e
amparem os órfãos e as viúvas. Os abusos sociais, o acúmulo de riqueza, a
exploração do pobre pelo rico, as práticas religiosas estrangeiras, as
superstições, tudo isto os profetas condenavam. Sob a proteção de Javé, o povo,
se purificado, escaparia do domínio estrangeiro. Os profetas advertiam
governantes e governados do perigo da invasão estrangeira; eles aspiravam uma
sociedade harmônica e justa, relações sociais humanitárias, integridade e
independência da nação.
Os hebreus da época anterior ao exílio não acreditavam
no céu, no inferno ou em
Satã. No seio do povo era escassa a espiritualidade. Havia
traços supersticiosos. Durante o exílio na Babilônia, os judeus tornaram-se pessimistas,
fatalistas e passaram a acreditar na transcendência da natureza do seu deus (586 a 539 a.C.). Javé passou a ser
visto como onipotente, inacessível, santo, e seus pensamentos e hábitos não
eram de homem. O dever do homem era a submissão à vontade divina. A fim de
assegurar a identidade nacional pela via religiosa, as lideranças judias
restabeleceram a guarda do sábado, as formas de adoração na sinagoga, a
circuncisão e a distinção entre alimentos puros e impuros. Deste retrocesso
resultou maior poder aos sacerdotes e a religião se torna eclesiástica. Os
judeus sentiram a poderosa influência da religião persa durante e após o exílio
na Babilônia e dela absorveram o dualismo, o messianismo, o esoterismo e a
noção de vida extraterrena. Eles aceitaram idéias persas como: (1) a crença em
Satã como agente do mal; (2) a vinda de um redentor espiritual; (3) a
ressurreição dos mortos; (4) o juízo final; (5) a revelação divina. Passaram a
acreditar que os textos sagrados eram ditados diretamente por deus aos seus
fiéis; se não ditados, ao menos, eram inspirados por deus. Sob tal crença, os
textos escritos por Esdras e outros eruditos durante o referido exílio foram aceitos
como de inspiração divina (586
a 539 a.C.).