EUROPA (1900 a 2014). Continuação.
A tensão entre URSS e EUA teve
reflexos negativos em todas as nações do globo. A disputa entre o país
socialista e o país capitalista pela hegemonia no mundo foi apelidada de guerra fria por Walter Lippmann, comentarista
político estadunidense, expressão que se consolidou no vocabulário da política
internacional como característica do período de 1945 a 1991. A expectativa de uma
terceira guerra mundial deixa o mundo em suspense nesse período. Grave era o
perigo geral proveniente da corrida espacial e armamentista. O potencial
destruidor das armas contemporâneas colocou as grandes nações no caminho da coexistência
pacífica. As duas grandes potências estabeleceram regras para o caso de um
conflito nuclear. A população civil devia ser poupada. Foram celebrados tratados
e acordos para limitar testes com bombas e evitar a proliferação de armas
nucleares. Do medo da hecatombe nuclear surgiu a esperança de que ela jamais
ocorresse. Havia preocupação com a sobrevivência humana, com a proteção do
patrimônio econômico e cultural e com a organização estável e duradoura de uma
sociedade internacional que proporcionasse paz e prosperidade.
A competição entre as duas
grandes potências estremeceu o espírito de conciliação e de colaboração
internacional que presidira a fundação da ONU. O então Secretário-Geral da ONU,
U-Than, afirma que essa competição envenenou as relações internacionais do
pós-guerra (1963). O poder divorciou-se da ética e do direito nos negócios
internacionais e enveredou para a espionagem, o seqüestro, a tortura, o
assassinato, o genocídio, a derrubada de governos legítimos, o apoio a
ditaduras, o desrespeito à autodeterminação dos povos. A produção de material
bélico cresceu em progressão geométrica e os preços de tanques, aviões, navios,
submarinos, atingiram níveis estratosféricos. Isto representou um peso colossal
no orçamento militar dos países. A corrida armamentista e a disputa ideológica
e econômica nos continentes africano e asiático eram manifestações do
envenenamento a que se referiu U-Than.
A URSS foi a primeira a lançar ao
espaço sideral um satélite artificial (Sputnik) e uma nave tripulada por ser
humano (Yuri Gagarin, extasiado com a cor azul da Terra, 1961). Astronautas
fincaram a bandeira dos EUA na Lua (1969). O terrorismo de grupo e o terrorismo
de Estado marcaram presença na Europa, Ásia e África. A América também teve os
seus dias amargos, tais como: o da explosão em local público no Brasil
(Riocentro, RJ) e em local privado na Argentina (sinagoga) e o choque
proposital de aeronaves civis contra edificações nos EUA (Pentágono e World
Trade Center). Questões regionais como as de Cuba, do oriente médio e do
sudeste asiático, ganhavam dimensão planetária desassossegando as nações ante a
expectativa de novo conflito mundial. As duas potências dispunham da bomba de
hidrogênio e de mísseis intercontinentais que podiam ser lançados da terra e do
mar. A fim de evitar a hecatombe, linha telefônica foi instalada entre os
gabinetes dos chefes de governo dos EUA e da URSS depois da crise dos mísseis
soviéticos com ogivas nucleares em Cuba (1962). O governo estadunidense
decretou embargo econômico a Cuba, no que foi acompanhado pelos países aliados.
Do ponto de vista secular, a
derrocada da URSS começou com a “Conferência sobre Segurança e Cooperação na
Europa” em Helsinque, realizada de comum acordo entre Washington e Moscou como
estratégia para congelar a guerra fria (détente,
1975).
Leonid Brejnev, na chefia da
URSS, insistira na realização dessa conferência pensando no reconhecimento
internacional das fronteiras entre os países da Europa e assim evitar
intervenções armadas como as ocorridas na Alemanha Oriental (para sufocar o levante
de 1953), na Hungria e na Tchecoslováquia (em 1956 e 1968, respectivamente, para
impedi-las de se desligarem do Pacto de Varsóvia). Leonid aceitou as cláusulas
sobre direitos humanos que constaram da ata final da reunião. Os dissidentes
internos da confederação soviética (países satélites + países federados)
aproveitaram-se disto para exigir coerência do Kremlin, unidade de princípios,
liberdade e respeito aos direitos humanos. A pressão por autonomia aumentou. A
má situação econômica da URSS contribuiu para o desfecho implosivo (1981 a 1990).
Mikhail Gorbachev, na chefia da
URSS, iniciou a reestruturação política e econômica (perestroika). Acreditava que a aceleração do desenvolvimento social
e econômico do país era a chave para a solução de todos os problemas (1985). No
“Congresso do Partido Comunista”, Mikhail afirmou que as dificuldades
econômicas começaram a se acumular a partir da década de 1970 e as metas dos
últimos planos qüinqüenais não foram alcançadas. Admitiu atraso geral nas
seguintes áreas: (1) ciências, engenharia, eletricidade, carvão e petróleo; (2)
indústrias dos metais ferrosos e dos produtos químicos; (3) formação de
capital; (4) educação, saúde e cultura; (5) serviços à população (1986).
Bulgária, Hungria, Polônia, Romênia, Tchecoslováquia (estados satélites),
romperam os vínculos políticos com a URSS (1989). O muro de Berlim que separava
a Alemanha Oriental da Alemanha Ocidental veio abaixo por ação espontânea e
rebelde do povo (09/11/1989). A Alemanha se reunifica e Berlim é a capital
(1990). Armênia, Bielorússia, Casaquistão, Estônia, Geórgia, Letônia, Lituânia,
Moldávia, Rússia e Ucrânia (estados federados) rompem o vínculo federativo. Mikhail
Gorbachev assina o decreto de dissolução da URSS (1991). Perde eficácia a ata
final da Conferência de Helsinque que fixara as fronteiras européias. A guerra fria chega ao fim.
Do ponto de vista espiritual, a
derrocada da URSS tomou impulso com a visita do papa à Polônia (1979). Leonid
Brejnev, chefe do governo soviético, tentou impedir a visita. O governo da
Polônia insistiu em receber o religioso, invocando o orgulho nacional: o papa
era polonês! Leonid lavou as mãos. A massa do bolo desandou.
O papa não tinha arsenal bélico –
fato que na segunda guerra mundial inspirou o motejo de Stalin – porém,
dispunha de recursos mais poderosos do que fuzis, tanques e canhões. Karol
Wojtyla, ator, atleta, sacerdote vigoroso física, moral e espiritualmente,
entra no território comunista, beija o solo e provoca um terremoto. Multidões
ouvem-no e cantam com entusiasmo em praça pública. João Paulo II (Wojtyla) coloca
deus e Jesus acima de Marx e Lênin. O efeito mesmerizador de palavras e gestos
faz o povo sentir a presença divina e perder o medo. A onda religiosa engolfa a
Europa Oriental. Segundo o magistério pontifical, a moralidade devia ser uma só
nas esferas individual, nacional e internacional. No ano seguinte, apoiado pela
igreja católica, Lech Walesa, operário polonês, em frente ao estaleiro Lênin,
em Gdansk, anuncia a fundação do sindicato de trabalhadores “Solidariedade” (Solidarnosc), o primeiro sindicato livre
em solo comunista (1980). O episódio foi uma fissura no bloco do leste europeu.
Lech foi eleito presidente da Polônia. No Brasil, ainda sob ditadura militar,
mas já na fase de distensão lenta e gradual, Luiz Inácio da Silva, operário, lidera os metalúrgicos do Estado de São Paulo e funda o Partido dos
Trabalhadores com apoio da igreja católica e de um grupo de intelectuais
(1980). Luiz Inácio esperou 22 anos para ser eleito presidente do Brasil.