EUROPA (1900 a
2014). Continuação.
Johannes Hessen cita Descartes (cogito ergo sum) e Maine (volo ergo sum) para afirmar que o homem
possui uma certeza imediata da existência do próprio “eu”. O racionalismo e o
idealismo não podem ser afirmados ou negados mediante procedimentos puramente
racionais. O método racional é insuficiente. Necessário um caminho irracional:
o volitivo. O homem é um ser de
vontade e de ação. Nas resistências que sofre ao seu querer e desejar o homem
vive a realidade de um modo imediato. A certeza do cogito parte dos processos do pensamento. A certeza do volo parte dos processos da vontade.
Johannes cita Aristóteles: os objetos do conhecimento já estão preparados, têm
uma essência determinada e são reproduzidos pela consciência que reflete a
ordem objetiva das coisas; o conhecimento
é função receptiva e passiva. Johannes cita Kant: os objetos do conhecimento
são produzidos pela consciência criadora da ordem objetiva das coisas; o conhecimento é função produtiva e ativa.
Como ser de vontade e de ação, o homem está submetido à antítese do “eu” e do
“não-eu”, do sujeito e do objeto, o que torna impossível superar o dualismo.
Johannes cita Lotze: “a realidade abre-se como uma flor em nosso espírito”. A
fonte comum do ideal e do real, do pensamento (cogitatio) e do ser (extensio),
reside na divindade, origem comum do sujeito e do objeto.
Conhecer significa apreender espiritualmente um objeto. Esta
apreensão se faz de modo mediato pelo discurso (movimento da mente de uma idéia
a outra) ou de modo imediato pela intuição sensível e espiritual. O ser
espiritual do homem compõe-se de três forças fundamentais: o pensamento, o sentimento e a vontade, o
que permite distinguir três tipos de intuição: a racional, a emocional e a
volitiva. Todo objeto compõe-se de
três elementos: essência, existência e valor, todos suscetíveis de apreensão intuitiva (racional, o
primeiro; volitiva, o segundo; emocional, o terceiro). Há juízos de valor obtidos tanto mediante o discurso racional como
mediante a intuição. Os valores estéticos só podem ser apreendidos emocional e
intuitivamente. Os juízos morais de valor supõem uma norma ética aplicável à
conduta. A verdadeira qualidade valiosa de sentimentos como justiça, temperança, pureza, só pode ser experimentada e vivida
imediatamente e conhecida intuitivamente. A vivência e a intuição também
representam um papel preponderante na esfera religiosa. Deus não é objeto da
metafísica e sim da religião. A ausência de contradição no pensamento é um
critério de verdade válido na esfera das ciências ideais ou formais. Na esfera das ciências reais o critério de verdade consiste na certeza provocada pela
realidade imediata do objeto (evidência sensível x evidência racional). “O que garante a validade dos princípios não
é a vivência matizada da evidência, mas sim a íntima intuição da fecundidade
sistemática dos mesmos”.
Johannes expõe a sua teoria das
categorias (“teoria especial do conhecimento”) ao discutir a essência das
categorias como substância e causalidade e tece considerações sobre a
fé e o saber. As categorias são conceitos fundamentais do conhecimento,
segundo Aristóteles, ou puras determinações do pensamento, segundo Kant. O
primeiro assim discrimina as categorias: substância, quantidade, qualidade,
relação, lugar, tempo, posição, estado, ação e paixão. As categorias podem ser
do pensamento reflexivo e do pensamento especulativo (Hartmann) ou categorias
reflexivas e categorias constitutivas (Windelband). Relação de inerência e de
subsistência, a substancialidade é um produto do pensamento que intervém na
experiência. A causalidade é um nexo real entre as coisas. O princípio da
causalidade é um pressuposto necessário a todo conhecimento científico da
realidade. Esse princípio tem o valor epistemológico de um pressuposto. O
conhecimento humano não se limita ao mundo fenomênico, eis que avança até a
esfera metafísica para chegar a uma visão filosófica do universo. Tal qual a
filosofia, a religião também dá uma interpretação do sentido do universo. A
religião é uma esfera de valor completamente autônoma, assenta-se sobre as suas
próprias bases e não se confunde com a filosofia e nem com a ciência.
Martin Heidegger (1889 a 1976), professor,
filósofo alemão, foi um dos expoentes do existencialismo
e discípulo do mestre da fenomenologia (Husserl). Martin foi acusado de servir
ao governo e à ideologia nazista no período de 1930 a 1940. A sua filosofia vem
exposta no livro “O Ser e o Tempo”, publicado em 1927. Ele considerava o
conceito ser como o tema principal da
filosofia e que, por isto mesmo, devia ser revisitado. Nos seus estudos
filosóficos, a metafísica e a epistemologia cederam lugar para a análise dos
diversos aspectos da existência humana. O mais importante é a presença (o
“estar aí”). O “nada” tem algo positivo. A raiz do passado está no futuro. Para
compreender a história vivida é necessário saber a idéia que os homens daquela
época tinham em relação ao futuro. Passado e futuro estão ligados por uma comum
e intrínseca origem. O seu jogo de tensões recíprocas cria o que é próprio do
tempo, o tempo autêntico.
Antonio Gramsci (1891 a 1937), italiano
nascido na ilha Sardenha, no seio de família pobre e numerosa, filósofo
marxista, jornalista, militante revolucionário, cursou Literatura na
Universidade de Turim, onde as fábricas Fiat e Lancia ofereciam emprego.
Trabalhou para manter os estudos. Na juventude, Antonio participou de conselhos
operários considerados ponto de partida para a instauração do socialismo no
Estado. Escrevia textos políticos e sociais em jornais de esquerda, como o
“Avanti”. Fundou o jornal “L´Ordine Nuovo” (1919) e colaborou na fundação do
Partido Comunista Italiano por divergência com o Partido Socialista Italiano
(1921). Na Rússia, a serviço do partido, conheceu Giulia Schucht, jovem
violinista, com quem se casou e teve dois filhos (1922). Submisso a Stalin e à
direção do partido soviético, Antonio foi incumbido de unir os partidos de
esquerda na Itália e combater o fascismo. Organizou o jornal oficial do
partido: “L´Unitá”. Foi eleito deputado (1924). Em decorrência da sua
militância política, Antonio foi preso pela polícia fascista (1926). Obteve
liberdade condicional em 1934 por motivo de saúde cujo bom estado nunca mais
recuperou.
No período da prisão, Antonio
escreveu “Cadernos do Cárcere”, expondo a sua compreensão do marxismo diferente
da ortodoxia. Entendia ser a economia um fator de menor importância nas
mudanças sociais. A consciência humana é independente e intervém na realidade
material para construí-la e modifica-la. A consciência, pois, não é mero
reflexo do mundo material como querem os ortodoxos. A luta entre os agentes do
capital e os agentes do trabalho se trava no campo das idéias e condiciona a
disputa pelo poder na sociedade. Cada classe busca a hegemonia ao fazer
prevalecer a sua visão de mundo no Estado. Burguesia
e proletariado disputam o domínio
intelectual e político.
Antonio estimula os
revolucionários marxistas a se esforçarem para conquistar o controle das
instituições culturais através das quais poderão disseminar as idéias
socialistas. O fator econômico é secundário. O poder da classe dominante no
modo de produção capitalista não advém do controle do aparelho do Estado, que
pode mudar de mãos mediante uso de maior força. O poder advém da hegemonia cultural sobre a classe
dominada. Assim, a classe dominante exerce o controle: (1) do sistema
educacional; (2) da instituição religiosa; (3) dos meios de comunicação.
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