terça-feira, 10 de março de 2015

FILOSOFIA XV - 27



EUROPA (1900 a 2014). Continuação.

Henri Bérgson (1859 a 1941), filósofo francês, segue a linha do irracionalismo, do movimento romântico, reagindo contra a ciência. A ênfase do seu pensamento recai sobre a ação. Demonstra pouco apreço pela precisão buscada pela ciência. O fluxo da experiência é uma realidade que se opõe ao disfarce das formas rígidas geradas pela razão. A influência da lógica há de ser minimizada. O universo se compõe de duas forças: a material e a vital, ambas envolvidas em uma luta permanente. A força vital é moldada parcialmente pelas condições materiais em que opera, pois conserva a sua liberdade de ação. A evolução é um processo criativo que produz novidade genuína. Bérgson expõe essa teoria no seu livro “Evolução Criadora”. Ele faz uma analogia com o processo criativo da arte (criação artística). O artista é levado a se expressar por um impulso criador, tal qual a força vital quando atua na natureza. No processo evolutivo as mudanças ocorrem mediante persistentes impulsos criadores que produzem caracteres até então inexistentes. Na evolução humana o indivíduo passa do predomínio da vida instintiva para o predomínio da vida intelectiva, responsável por uma vida infeliz. O intelecto asfixia o instinto; o homem perde a liberdade ante as restrições derivadas dos conceitos. A forma mais elevada do instinto é a intuição (atividade mental sintonizada diretamente com o mundo). A intuição capta a experiência tal como é. O problema do intelecto é só se adequar à descontinuidade do mundo material; a linguagem é estrutura de conceitos descontínuos. A vida é essencialmente contínua e o intelecto não pode compreendê-la. O tempo da teoria física é uma metáfora espacial; o tempo da intuição é real e genuíno. A mente consciente liga o passado e o presente através da memória.   

Benedetto Croce (1866 a 1952), pensador, jornalista italiano, desfrutou bom padrão financeiro enquanto viveu. Fundou e foi editor do “La Critica”, jornal literário (1905). Benedetto não é considerado filósofo do ponto de vista acadêmico. Foi pouco molestado na era fascista e prestou serviços ao governo italiano após a guerra.  A sua reflexão filosófica privilegia a Estética. O seu pensamento vem exposto no “Breviário de Estética”, em quatro lições. A mente se envolve em uma experiência concreta quando contempla uma obra de arte. A realidade é espiritual. As mudanças no mundo são progressivas e cíclicas. Ao regressar à fase inicial, a mente estará enriquecida com nova percepção. A íntima ligação entre o erro e a verdade surge porque é inconcebível o erro puro e simples; por ser inconcebível, não existe; se algo existe, então é concebível. “O que pode ser e deve ser, é”. O erro fala com duas vozes: uma afirma o falso, a outra o nega. É um conflito entre o sim e o não que se chama contradição. Em princípio, tudo no mundo pode ser descoberto; daí a perenidade da ciência e da filosofia como paixão do espírito pela verdade. No seu livro “Lógica como Ciência do Conceito Puro”, publicado em 1928, Benedetto diz que a Lógica – lato sensu – tem uma posição singular no campo das ciências filosóficas, parecendo estar dentro e acima da Filosofia, ao mesmo tempo, quando na realidade ela está dentro e não fora da Filosofia, tal qual o espelho da água que reflete a paisagem e ao mesmo tempo dela faz parte. As ciências naturais, enquanto construções de pseudos conceitos, não visam a ação por serem elas próprias a ação. No seu livro “Filosofia da Prática” publicado em 1932, Benedetto refere-se à implicação das ciências teóricas com as ciências práticas. Não há pessoa exclusivamente teórica, nem exclusivamente prática; algumas são mais teóricas, geralmente de temperamento nervoso e inquieto; outras mais práticas, de temperamento muscular e gestual positivo. A volição e a atividade prática conservam peculiar caráter perante o conhecimento. A luz intelectual é fria enquanto a vontade é cálida. Quando a pessoa passa da contemplação para a ação, a sensação é de parto. Filhos não se fazem com pensamento e palavra. As leis são atos volitivos cujo conteúdo é uma classe de ações. Se o espírito é liberdade, então toda ação só pode ser livre, insuscetível de coação. Ação e coação se repelem. O povo aceita livremente a coação do governante. Ao invés de resistir, as pessoas preferem se submeter a fim de não colocar em risco as suas vidas e os seus bens. O que determina a vida jurídica são motivos de ordem econômica segundo opções ditadas por razões de oportunidade ou de cálculo.              

Bertrand Russell (1872 a 1970), inglês, matemático, filósofo, professor, foi o expoente da corrente neo-realista. Ele escreveu: “Lógica e Misticismo”, “História do Pensamento Ocidental”, “Os Princípios da Matemática”, “A Análise da Mente” entre outros notáveis trabalhos sobre ciência, religião, ética, educação, história e política. Para os filósofos dessa corrente, a razão prevalece sobre a fé. Embora a ciência seja incompleta e atire o homem num universo frio e estranho, a verdade concreta dela derivada é o único guia seguro na vida. O fato de o homem ser um punhado de átomos não o impede de pautar sua vida pela nobreza moral. O divórcio entre a filosofia e a ciência é um desastre irreparável. Parte da desgraça no mundo se deve ao misticismo. O ser humano devia: (1) evitar ações que possam causar sofrimento; (2) nutrir pensamentos sublimes que enobrecem sua breve jornada; (3) desdenhar os terrores covardes do escravo do destino; (4) cultuar o santuário que construiu com as suas próprias mãos. Os homens forjam os seus próprios erros e ilusões e dificilmente descobrem que estão errados. Isto não afasta os acertos. A natureza não erra, pois nada declara. Devido à sua natureza social, o homem se defronta com problemas éticos. A escolha dos fins compete ao homem, à sua volição mais do que à sua razão. Daí, a impossibilidade de justificar, sob ótica científica, os fins e os princípios éticos adotados pelos homens. Os homens diferem entre si em muitos aspectos. No entanto, princípios éticos assumem caráter universal na vida civilizada. (O dever de honestidade e a fraternidade humana servem de exemplo). Nenhum princípio científico veda a crueldade, mas nota-se a prevalência do juízo de valor que a condena. A investigação científica e filosófica há de ser imparcial e livre de atribulação, sem preocupação de enaltecer ou de magoar, pois seu único compromisso deve ser com a verdade. A liberdade é essencial à busca da verdade. A tolerância é necessária. Nenhum caminho deve ser fechado por censuras artificiais. Não vale a pena o homem viver uma existência que não se pode examinar.    

Pierre Teilhard de Chardin (1881 a 1955), jesuíta francês, teólogo, cientista, filósofo, professor, cujo trabalho científico culmina com uma impressionante visão de mundo exposta em sua obra “O Fenômeno Humano”. A advertência inicial do autor de que o seu livro deve ser lido como uma dissertação científica exclusivamente, não impede que nele se veja os aspectos filosófico e teológico. A sua cautela deve-se à fiscalização da igreja da qual podia resultar a sua excomunhão. De fato, o caráter evolucionista do citado trabalho é incompatível com o dogma do pecado original e da criação divina do primeiro casal humano. A igreja católica proibiu-o de lecionar e de publicar suas obras. Na época, os seus textos eram mimeografados e circulavam no meio intelectual. Desse modo, a sua obra ficou conhecida. A igreja, no uso da sua autoridade, confinou-o na China, onde ele contribuiu com o estudo antropológico do “Homem de Pequim” (gênero sinathropus, espécie pekingensis).

Chegados ao extremo das suas análises, os cientistas já não sabem dizer se a estrutura por eles atingida é a essência da matéria que estudam ou se é o reflexo do seu próprio pensamento. O ser humano percebe os objetos e as forças em círculo à sua volta. O homem é centro de perspectiva e de construção do universo. Desde que existe, o homem se oferece a si próprio em espetáculo. Para o homem se descobrir é necessário toda uma série de sentidos cuja aquisição gradual abrange e imprime ritmo a própria história das lutas do espírito: sentido da imensidade espacial, sentido da profundidade, sentido do número, sentido da proporção, sentido da qualidade ou da novidade, sentido do movimento e sentido do orgânico. O homem não pode se ver fora da humanidade, nem a humanidade fora da vida e nem a vida fora do universo.

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