EUROPA (1900 a
2014). Continuação.
Henri Bérgson (1859 a 1941), filósofo
francês, segue a linha do irracionalismo, do movimento romântico, reagindo
contra a ciência. A ênfase do seu pensamento recai sobre a ação. Demonstra
pouco apreço pela precisão buscada pela ciência. O fluxo da experiência é uma
realidade que se opõe ao disfarce das formas rígidas geradas pela razão. A
influência da lógica há de ser minimizada. O universo se compõe de duas forças:
a material e a vital, ambas envolvidas em uma luta permanente. A força vital é
moldada parcialmente pelas condições materiais em que opera, pois conserva a
sua liberdade de ação. A evolução é um processo criativo que produz novidade
genuína. Bérgson expõe essa teoria no seu livro “Evolução Criadora”. Ele faz uma
analogia com o processo criativo da arte (criação artística). O artista é
levado a se expressar por um impulso criador, tal qual a força vital quando
atua na natureza. No processo evolutivo as mudanças ocorrem mediante
persistentes impulsos criadores que produzem caracteres até então inexistentes.
Na evolução humana o indivíduo passa do predomínio da vida instintiva para o
predomínio da vida intelectiva, responsável por uma vida infeliz. O intelecto
asfixia o instinto; o homem perde a liberdade ante as restrições derivadas dos
conceitos. A forma mais elevada do instinto é a intuição (atividade mental sintonizada diretamente com o mundo). A intuição capta a experiência tal como é.
O problema do intelecto é só se adequar à descontinuidade do mundo material; a
linguagem é estrutura de conceitos descontínuos. A vida é essencialmente
contínua e o intelecto não pode compreendê-la. O tempo da teoria física é uma metáfora
espacial; o tempo da intuição é
real e genuíno. A mente consciente liga o passado e o presente através da
memória.
Benedetto Croce (1866 a 1952), pensador,
jornalista italiano, desfrutou bom padrão financeiro enquanto viveu. Fundou e
foi editor do “La Critica”,
jornal literário (1905). Benedetto não é considerado filósofo do ponto de vista
acadêmico. Foi pouco molestado na era fascista e prestou serviços ao governo
italiano após a guerra. A sua reflexão
filosófica privilegia a Estética. O seu pensamento vem exposto no “Breviário de
Estética”, em quatro lições. A mente se envolve em uma experiência concreta
quando contempla uma obra de arte. A realidade é espiritual. As mudanças no
mundo são progressivas e cíclicas. Ao regressar à fase inicial, a mente estará
enriquecida com nova percepção. A íntima ligação entre o erro e a verdade surge
porque é inconcebível o erro puro e simples; por ser inconcebível, não existe;
se algo existe, então é concebível. “O que pode ser e deve ser, é”. O
erro fala com duas vozes: uma afirma o falso, a outra o nega. É um conflito
entre o sim e o não que se chama contradição. Em princípio, tudo no mundo pode ser
descoberto; daí a perenidade da ciência e da filosofia como paixão do espírito
pela verdade. No seu livro “Lógica como Ciência do Conceito Puro”, publicado em
1928, Benedetto diz que a Lógica – lato
sensu – tem uma posição singular no campo das ciências filosóficas,
parecendo estar dentro e acima da Filosofia, ao mesmo tempo, quando na
realidade ela está dentro e não fora da Filosofia, tal qual o espelho da água
que reflete a paisagem e ao mesmo tempo dela faz parte. As ciências naturais,
enquanto construções de pseudos conceitos, não visam a ação por serem elas
próprias a ação. No seu livro “Filosofia da Prática” publicado em 1932, Benedetto
refere-se à implicação das ciências teóricas com as ciências práticas. Não há
pessoa exclusivamente teórica, nem exclusivamente prática; algumas são mais
teóricas, geralmente de temperamento nervoso e inquieto; outras mais práticas,
de temperamento muscular e gestual positivo. A volição e a atividade prática
conservam peculiar caráter perante o conhecimento. A luz intelectual é fria
enquanto a vontade é cálida. Quando a pessoa passa da contemplação para a ação,
a sensação é de parto. Filhos não se fazem com pensamento e palavra. As leis
são atos volitivos cujo conteúdo é uma classe de ações. Se o espírito é
liberdade, então toda ação só pode ser livre, insuscetível de coação. Ação e
coação se repelem. O povo aceita livremente a coação do governante. Ao invés de
resistir, as pessoas preferem se submeter a fim de não colocar em risco as suas
vidas e os seus bens. O que determina a vida jurídica são motivos de ordem
econômica segundo opções ditadas por razões de oportunidade ou de cálculo.
Bertrand Russell (1872 a 1970), inglês, matemático,
filósofo, professor, foi o expoente da corrente neo-realista. Ele escreveu:
“Lógica e Misticismo”, “História do Pensamento Ocidental”, “Os Princípios da
Matemática”, “A Análise da Mente” entre outros notáveis trabalhos sobre
ciência, religião, ética, educação, história e política. Para os filósofos
dessa corrente, a razão prevalece sobre a fé. Embora a ciência seja incompleta
e atire o homem num universo frio e estranho, a verdade concreta dela derivada
é o único guia seguro na vida. O fato de o homem ser um punhado de átomos não o
impede de pautar sua vida pela nobreza moral. O divórcio entre a filosofia e a
ciência é um desastre irreparável. Parte da desgraça no mundo se deve ao
misticismo. O ser humano devia: (1) evitar ações que possam causar sofrimento;
(2) nutrir pensamentos sublimes que enobrecem sua breve jornada; (3) desdenhar
os terrores covardes do escravo do destino; (4) cultuar o santuário que
construiu com as suas próprias mãos. Os homens forjam os seus próprios erros e
ilusões e dificilmente descobrem que estão errados. Isto não afasta os acertos.
A natureza não erra, pois nada declara. Devido à sua natureza social, o homem
se defronta com problemas éticos. A escolha dos fins compete ao homem, à sua
volição mais do que à sua razão. Daí, a impossibilidade de justificar, sob
ótica científica, os fins e os princípios éticos adotados pelos homens. Os
homens diferem entre si em muitos aspectos. No entanto, princípios éticos
assumem caráter universal na vida civilizada. (O dever de honestidade e a
fraternidade humana servem de exemplo). Nenhum
princípio científico veda a crueldade, mas nota-se a prevalência do juízo de
valor que a condena. A investigação científica e filosófica há de ser
imparcial e livre de atribulação, sem preocupação de enaltecer ou de magoar,
pois seu único compromisso deve ser com a verdade. A liberdade é essencial à
busca da verdade. A tolerância é necessária. Nenhum caminho deve ser fechado
por censuras artificiais. Não vale a pena o homem viver uma existência que não
se pode examinar.
Pierre Teilhard de Chardin (1881 a 1955), jesuíta
francês, teólogo, cientista, filósofo, professor, cujo trabalho científico
culmina com uma impressionante visão de mundo exposta em sua obra “O Fenômeno
Humano”. A advertência inicial do autor de que o seu livro deve ser lido como
uma dissertação científica exclusivamente, não impede que nele se veja os
aspectos filosófico e teológico. A sua cautela deve-se à fiscalização da igreja
da qual podia resultar a sua excomunhão. De fato, o caráter evolucionista do
citado trabalho é incompatível com o dogma do pecado original e da criação
divina do primeiro casal humano. A igreja católica proibiu-o de lecionar e de
publicar suas obras. Na época, os seus textos eram mimeografados e circulavam
no meio intelectual. Desse modo, a sua obra ficou conhecida. A igreja, no uso
da sua autoridade, confinou-o na China, onde ele contribuiu com o estudo
antropológico do “Homem de Pequim” (gênero sinathropus,
espécie pekingensis).
Chegados ao extremo das suas
análises, os cientistas já não sabem dizer se a estrutura por eles atingida é a
essência da matéria que estudam ou se é o reflexo do seu próprio pensamento. O ser
humano percebe os objetos e as forças em círculo à sua volta. O homem é centro
de perspectiva e de construção do universo. Desde que existe, o homem se
oferece a si próprio em
espetáculo. Para o homem se descobrir é necessário toda uma série de sentidos cuja aquisição gradual
abrange e imprime ritmo a própria história das lutas do espírito: sentido da
imensidade espacial, sentido da profundidade, sentido do número, sentido da
proporção, sentido da qualidade ou da novidade, sentido do movimento e sentido
do orgânico. O homem não pode se ver fora da humanidade, nem a humanidade fora
da vida e nem a vida fora do universo.
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