Nas sessões do Congresso Nacional de 09/12/2014 e da
Câmara dos Deputados de 10/12/2014, parlamentares de ambos os sexos chamaram o
deputado Jair Bolsonaro de estuprador
porque ele como tal se qualificara ao agredir verbalmente a deputada Maria do
Rosário. O ofendido explicou: (1) que durante uma entrevista à imprensa no
salão verde da Câmara, sobre redução da idade penal por ele defendida e na qual
citava o estupro e o assassinato de um jovem casal por meliantes menores de 18
anos, a deputada Maria do Rosário ingressou no salão, contestou-o
agressivamente e por duas vezes o chamou de estuprador;
(2) que após a segunda ofensa, ele respondeu que se fosse estuprador jamais escolheria a deputada para estuprá-la
porque ela não merece; (3) que o episódio foi filmado.
Do contexto informado, possível deduzir que o deputado
revidou para ferir a vaidade da deputada: ele não a considerava mulher
atraente. Confirmada a versão do deputado, quem o qualificou de estuprador está sujeito a responder
processo judicial por crime contra a honra, posto que tal ofensa, ainda que proferida
no recinto da Câmara, não está ao abrigo da imunidade parlamentar e caracteriza
abuso de prerrogativa e falta de decoro. O desvirtuamento de expressões
retiradas do contexto em que foram utilizadas é comum na politicagem. Denise
Frossard, Marta Suplicy e Dilma Rousseff já foram vítimas desse tipo censurável
de oposição. O fato de Bolsonaro representar a extrema direita e ter obtido 400
mil votos no Rio de Janeiro está por trás da “indignação” dos ofensores.
Há países em que meninas são mutiladas e mulheres
apedrejadas em nome da tradição e da lei. País dos marajás e dos ricos
negociantes, da ciência, da religião e dos gurus, a Índia também o é dos parias,
dos miseráveis, da superstição, da ignorância, da magia, dos faquires e dos
estupradores. Homens seviciam mulheres impunemente sob a justificativa de que o
estupro faz parte da cultura indiana. Notícia vinda de lá: depois de seviciadas
por alguns homens, duas adolescentes de 14 e 15 anos foram enforcadas. No
Brasil, o estupro era comum na época colonial e imperial. A mudança na lei não
mudou o costume. Sentimentos nobres estão sombreados por ações perversas. Moralidade,
libertinagem e crueldade andam juntas na sociedade. Belos pensamentos convivem
com práticas deprimentes. A poesia sublime contrasta com a realidade pantanosa.
Progresso na técnica, na ciência, na economia; avanços e recuos nas convenções
sociais, no direito e na política; retrocesso na ética, na religião e na espiritualidade;
assim caminha a humanidade até o momento.
O apetite sexual do macho e da fêmea provoca a conjunção
carnal. No que tange ao animal racional, a satisfação desse apetite encontra
barreiras religiosas, morais e jurídicas levantadas no processo civilizador. O
gênero homo existe há mais de um
milhão de anos. A espécie homo sapiens
existe há mais de vinte mil anos. O homem civilizado existe há mais de seis mil
anos. Apesar de todo esse milenar percurso, o homem das cavernas ainda sobrevive. Mais selvagem do que o homem
das selvas, o homem civilizado encontra-se na África, na América, na Ásia, na
Europa, na Oceania, em todos os países e em todas as cidades. Alguns
trogloditas ainda são peludos, cabeludos e barbudos; outros têm cabelos e
barbas bem cortados, usam perfume e desodorante; vestem roupa civil, farda e
batina; calçam sandálias, tênis, botas e sapatos de couro alemão. Alguns não
usam camisinha Ocupam posições diversas na sociedade: marido, pai, irmão, tio, primo,
amigo da família, moço da festa, chefe, patrão, pároco. Ocultam-se nas
aparências e ficam à espreita. Ao brocardo “a ocasião faz o ladrão”, adite-se:
“e também o estuprador”. Na ocasião propícia, o homem das cavernas surge com fúria, tal qual o Hulk.
No mundo civilizado, a violência é censurada, porém,
há sempre motivo para a guerra. Os humanos oscilam entre o irracional e o
racional, entre a matéria e o espírito, entre a fé e o intelecto. Sob a
antinatural ética do judaísmo, do cristianismo e do islamismo, esse movimento
pendular mostrou-se fonte de sofrimento. A vida dos crentes tornou-se um
inferno psíquico. Para compensar essa desgraça por elas mesmas provocadas, as
religiões prometem o paraíso em outro mundo. Graças a elas, o nosso lindo
planeta azul transformou-se em caldeirão do diabo. Retalharam a atividade da
alma e do corpo. No avançado estágio cultural conhecido como civilização, os instintos humanos são
represados. Todavia, há um momento em que as comportas se abrem. Limites são
transpostos.
Constranger mulher à conjunção carnal mediante
violência ou grave ameaça tipifica crime contra a liberdade sexual. O estupro
resulta do apetite incontido do macho que dispensa o consentimento da fêmea.
Macho também estupra macho, como se vê nos presídios e nas sacristias, porém o
legislador colocou só a mulher como vítima desse crime. Na lei penal brasileira
o estupro do macho se enquadra na figura do atentado violento ao pudor. A
forçada satisfação do apetite sexual do agente implica violência contra o corpo
e a liberdade do paciente. Em princípio, a responsabilidade pelo estupro é do
macho ativo, pois dele é o apetite, a falta de controle e a violência. Todavia,
como em outros crimes, no estupro o comportamento da vítima também é avaliado
para o fim de apurar até que ponto ela contribuiu para o resultado. O propósito
é verificar se houve ou se não houve culpa concorrente. Os costumes vigentes, a
produção artística (cinema, teatro, televisão), a indumentária sensual da
mulher, o requebrado no andar, o decote ousado, a exposição das coxas até as
rendas da calcinha, a nudez na praia disfarçada com o fio-dental, tudo isto
desperta o desejo no homem cujo nível da testosterona for normal. Além do tato,
o estímulo visual também aguça o apetite sexual. Para o homem, desviar os olhos
é difícil, mesmo com a esposa ao lado. A natureza imantou o homem e a mulher
com zonas eróticas.
Essa realidade natural e social explica o estupro, mas
não o justifica. A imediata e direta conduta da mulher poderá provocar relação
forçada. A espontânea provocação da mulher, tácito convite, atenua o
comportamento do homem. A mulher pode ter a fantasia do estupro para aumentar o
seu prazer. Algumas mulheres gostam de tapas, lábios mordiscados e força na
penetração. Espera que o parceiro satisfaça tal capricho. Trata-se de
resistência encenada com bafo masoquista. Por outro lado, mesmo que a atitude direta
e imediata da mulher seja provocadora e sensual, o arrependimento eficaz e
tempestivo deve ser respeitado pelo homem sob pena de caracterizar o crime. A
resistência da mulher justifica-se, por exemplo, quando o parceiro se nega a
usar camisinha ou a cuidar da higiene. O parceiro incorre na censura da lei penal
ao contrariar a vontade da parceira em tais circunstâncias.
Na hipótese de intempestivo e ineficaz arrependimento
da mulher que direta e imediatamente estimulou a relação sexual, a
responsabilidade há de ser dividida. Tratar-se-ia de culpa concorrente e não de
culpa exclusiva. O caso Mike Tysson é exemplar. A moça concordou em acompanhar
o moço até o quarto do hotel, permitiu as intimidades preliminares e na hora H,
sem motivo plausível, por capricho ou malícia premeditada, negou-se a consumar
o ato. O pugilista ignorou a negativa e completou a relação. Discutível se o
tamanho do pênis é justa causa para a recusa. A esperteza rendeu à moça milhões
de dólares em indenização fixada pela hipocrisia do tribunal daquele país. Nos
EUA, a justiça é puritana, tem epiderme branca e cifrão nos olhos. Aquela transa
sexual foi a mais cara do planeta e certamente inspirou o autor do filme
intitulado “Proposta Indecente”.
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