terça-feira, 2 de julho de 2013

O BRASIL E A CONSTITUIÇÃO VII



Foram designadas eleições para a assembléia constituinte e criada comissão para elaborar o projeto de Constituição (decreto 21.402 de 14/05/1932). Contrariada com a redução dos ganhos na produção do café, com o seu afastamento do poder e com a tardança do governo provisório em reunir a assembléia constituinte, a aristocracia paulista serviu-se da força pública estadual com adesão das forças federais aquarteladas nos Estados de São Paulo e de Mato Grosso para insurgir-se contra o governo central e exigir uma Constituição. A refrega começou em 09 de julho de 1932 e terminou em 03 de outubro do mesmo ano com a derrota dos rebeldes (para recordar essa intentona há um logradouro na capital de São Paulo com o nome Avenida Nove de Julho). Houve prisões e exílios; depois, anistia geral. A Comissão Itamarati (assim chamada porque se reunia no palácio das relações exteriores chefiada pelo chanceler Afrânio de Melo Franco) retomou os trabalhos e os apresentou à Assembléia Nacional Constituinte (ANC) instalada em 15/11/1933.  

A ANC se propôs a organizar um regime democrático que assegurasse unidade, liberdade, justiça e bem-estar à nação. Dela participaram deputados eleitos pelo sufrágio universal e deputados eleitos por seus respectivos órgãos de classe. Estruturou-se uma tríplice ordem: política, econômica e social. Adotou-se a forma republicana e federativa de Estado, o sistema de governo democrático, representativo e presidencialista, o voto feminino, a separação dos poderes e a declaração dos direitos individuais. Reservou-se na Câmara dos Deputados vagas para representantes eleitos pelas organizações profissionais divididas em 4 grupos: (I) lavoura e pecuária (II) indústria (III) comércio e transportes (IV) profissionais liberais e funcionários públicos. Estabeleceu-se que Ministério Público, Tribunal de Contas e conselhos técnicos (representação corporativa) eram órgãos de cooperação nas atividades governamentais. Atribuiu-se função moderadora ao Senado (coordenação dos poderes, continuidade administrativa, velar pela Constituição, colaborar na elaboração das leis). Criou-se justiça federal, eleitoral e militar. Disciplinou-se em capítulo próprio a ordem econômica e social. Concedeu-se autonomia aos municípios e aos territórios federais (Acre, Amapá, Guaporé, Iguaçu, Ponta Porã). A nova Constituição foi promulgada em 16/07/1934. No dia seguinte (17/07/1934) a ANC escolhe Getúlio Vargas para Presidente da República com mandato até 03/05/1938 (Disposições Transitórias, 1º +  §§).

Denominou-se Corte Suprema ao tribunal de cúpula do Poder Judiciário. Reservou-se 1/5 dos lugares nos tribunais aos advogados e membros do Ministério Público. Entre as garantias dos juízes foi incluída a inamovibilidade. Ao juiz era permitido exercer um cargo de professor, vedada qualquer outra função e atividade político-partidária. O juiz estava obrigado a sentenciar. Ante a lacuna da lei, o juiz devia decidir por analogia, equidade ou aplicar os princípios gerais de direito. Foram proibidos: (1) foro privilegiado; (2) tribunais de exceção; (3) prisão por dívidas, multas ou custas; (4) extradição por crimes políticos ou de opinião; (5) penas de caráter perpétuo, de morte, banimento e confisco. Aos necessitados foram concedidas assistência judiciária e gratuidade quanto às despesas processuais. Foram previstas cautelas relativas à prisão do indivíduo com o dever da autoridade de comunicá-la imediatamente ao magistrado. Unificou-se o processo judicial (estadual+federal). A competência para legislar sobre direito processual, direito rural e arbitragem comercial coube à União.     

Constaram do texto constitucional de 1934 os direitos a liberdade, subsistência, segurança individual e propriedade. A inclusão do direito a subsistência refletia o aspecto social da Constituição. O corpo eleitoral ampliou-se com a inclusão dos sargentos, das mulheres e dos cidadãos com 18 anos de idade. O voto era obrigatório para os homens e facultativo para as mulheres, salvo se estas exercessem função pública remunerada. Continuaram excluídos do corpo eleitoral os analfabetos, os mendigos, os cabos e soldados e todos os que estivessem privados dos direitos políticos. Permitia-se a todos os brasileiros o acesso aos cargos públicos na forma da lei, vedada acumulação. A primeira investidura dependia de exame de sanidade e concurso público de provas ou títulos. No rol das garantias o legislador constituinte acrescentou o direito adquirido, o ato jurídico perfeito, a coisa julgada (já constavam da lei civil) e criou o mandado de segurança para defesa de direito certo e incontestável ameaçado ou violado por ato manifestamente inconstitucional ou ilegal de qualquer autoridade. O interesse social foi lançado como restrição ao direito de propriedade, permitida a desapropriação por necessidade ou utilidade pública. Na hipótese de perigo atual ou iminente, o Estado podia usar a propriedade particular. As marcas de indústria, de comércio e o nome comercial receberam proteção. A todos foi reconhecido o direito de prover à própria subsistência e à da família mediante trabalho honesto. Ao poder público coube o dever de amparar os indigentes. Das repartições públicas foi exigida celeridade tanto nos procedimentos como no fornecimento de certidões para defesa de direitos. A profissão de escritor, jornalista ou professor ficou isenta de imposto direto. Qualquer cidadão podia pleitear anulação dos atos lesivos do patrimônio da União, dos Estados e dos municípios. 

Com a Constituição de 1934 a democracia social ingressa no constitucionalismo brasileiro. União, Estados e municípios tinham atribuições no setor social, tais como: (1) assegurar amparo aos desvalidos criando serviços especializados; (2) estimular a educação eugênica; (3) amparar a maternidade e a infância; (4) socorrer as famílias de prole numerosa; (5) proteger a juventude contra toda exploração e abandono físico, moral e intelectual; (6) adotar medidas: (I) legislativas e administrativas visando a restringir a mortalidade infantil (II) de higiene que impedissem a propagação de doenças transmissíveis; (7) cuidar da higiene mental e incentivar a luta contra os venenos sociais; (8) favorecer o desenvolvimento das ciências, artes, letras e da cultura em geral; (9) proteger os objetos de interesse histórico e o patrimônio artístico do país; (10) prestar assistência ao trabalhador intelectual.

Cabia à família e ao poder público ministrar educação visando à eficiência de fatores da vida moral e econômica da nação que desenvolvesse no espírito brasileiro a consciência da solidariedade humana. O ensino era facultado a estabelecimentos laicos e religiosos. O ensino religioso era facultativo, ministrado de acordo com os princípios da confissão religiosa do aluno. Era garantida a liberdade de cátedra. O vínculo do casamento era indissolúvel. A família estava sob a proteção do Estado. Os nubentes tinham de apresentar prova de sanidade física e mental. O casamento era civil e gratuita a sua celebração. O casamento religioso era reconhecido desde que observasse os procedimentos legais e fosse inscrito no registro civil.

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