O legislador constituinte de 1946 listou
como direitos fundamentais a vida, a liberdade, a segurança individual e a propriedade.
A discriminação desses direitos seguiu o modelo liberal, com restrições à
propriedade. No estado de sítio, as garantias seriam suspensas. Além do
tradicional habeas corpus, foi incluído, com nova redação, o mandado
de segurança que constava do item 33, do artigo 113, da Constituição de
1934. Do corpo eleitoral estavam excluídos os menores de 18 anos, os soldados,
cabos e sargentos, os analfabetos, os que não soubessem exprimir-se na língua
nacional e os que estivessem privados dos direitos políticos. A Constituição
silenciou sobre os mendigos, estabeleceu o sufrágio universal, o voto masculino
e feminino direto, secreto e obrigatório, e vedou a organização de partido
político ou associação cujo programa ou ação contrariasse o regime democrático
baseado na pluralidade dos partidos e na garantia dos direitos. Esta vedação
serviu de esteio à decisão do Tribunal Superior Eleitoral que cassou o registro
do Partido Comunista Brasileiro em 1947.
Ao disciplinar a ordem econômica e
social essa Constituição atribuiu função social à propriedade. Além da necessidade
e da utilidade pública, incluiu o interesse social como razão
suficiente à desapropriação pelo poder público. Condicionou o uso da
propriedade ao bem-estar social. A lei poderia promover a justa distribuição da
propriedade com igual oportunidade para todos. Inspiradora da redução das
desigualdades artificiais, conciliadora entre a liberdade de iniciativa e a
valorização do trabalho humano, a justiça
social foi erigida em princípio fundamental da ordem econômica. O trabalho
era obrigação social. A lei das contravenções penais tipificou como vadiagem
a ociosidade sem renda de subsistência de quem é apto para o trabalho (rico
ocioso é capitalista; pobre ocioso é vadio). Assegurava-se a todos o que
possibilitasse existência digna na esfera do lícito. A política estatizante do
regime anterior foi refreada. Permitia-se a intervenção do Estado no domínio
econômico por interesse público e no limite dos direitos assegurados na
Constituição. Salvo necessidade pública, a navegação de cabotagem para
transporte de mercadorias era privativa dos navios nacionais. A lei devia
reprimir o abuso do poder econômico, inclusive uniões e agrupamentos de
empresas individuais ou sociais (qualquer que fosse a sua natureza) que
tivessem por fim dominar os mercados nacionais, eliminar a concorrência e
aumentar excessivamente os lucros. O legislador constituinte remeteu ao
legislador ordinário a disciplina jurídica: (1) dos bancos de depósito; (2) das empresas de seguros, capitalização e fins análogos; (3) das empresas concessionárias de
serviços públicos. O amparo à lavoura e à pecuária dar-se-ia mediante crédito
específico. A fixação do homem no campo obedeceria aos planos de colonização e
de aproveitamento das terras públicas. Dar-se-ia preferência à aquisição de até
100 hectares
aos posseiros de terras devolutas que nelas tivessem a sua morada habitual.
Os preceitos sobre trabalho e
previdência social traziam algumas novidades, tais como: (1) inclusão da greve entre os
direitos dos trabalhadores; (2) o salário mínimo devia suprir as necessidades
normais da família ao invés das necessidades do trabalhador individualmente
considerado; (3) participação
obrigatória e direta do trabalhador nos lucros da empresa; (4) higiene e segurança do trabalho; (5) assistência aos desempregados; (6) seguro por conta do empregador a
fim de proteger o trabalhador em caso de acidente no trabalho; (7) existência
prévia de fonte de custeio como conditio sine qua non para criação, majoração ou extensão de serviço assistencial ou
de benefício compreendido na previdência social. Os preceitos sobre família,
educação e cultura assemelham-se aos do regime anterior: (1) vínculo indissolúvel do casamento
e efeitos civis do casamento religioso; (2)
assistência obrigatória à maternidade, à infância, à adolescência e amparo às
famílias de prole numerosa; (3)
vocação para suceder em bens de estrangeiro existentes no Brasil, tutelada pela
lei brasileira em benefício do cônjuge ou de filhos brasileiros, sempre que
lhes não fosse mais favorável lei nacional do morto. A educação seria
dada no lar e na escola inspirada no princípio da liberdade e no ideal de
solidariedade humana. O ensino era livre à iniciativa particular. O ensino
oficial ulterior ao nível primário seria gratuito a todos que provassem
insuficiência de recursos. As empresas industriais, comerciais e agrícolas com
mais de 100 pessoas eram obrigadas a manter ensino primário gratuito para
empregados e filhos. As empresas industriais e comerciais eram obrigadas a
ministrar aprendizagem aos seus trabalhadores menores de idade, respeitados os
direitos dos professores. O provimento das cátedras no ensino oficial
secundário e superior dar-se-ia após aprovação em concurso de provas e títulos;
os cargos assim preenchidos seriam vitalícios. Cada sistema de ensino teria
serviços de assistência educacional que assegurassem aos alunos necessitados
condições de eficiência escolar. O amparo à cultura era dever do Estado.
Ciências, artes e letras eram livres. A lei criaria institutos de pesquisa
junto aos estabelecimentos de ensino superior preferencialmente.
O processo de industrialização
continuou como decorrência da substituição das importações; diversificou-se a
partir de 1950. A
classe empresarial aderiu ao capital estrangeiro e à política
desenvolvimentista que mantinha a dependência tecnológica e financeira do
Brasil em relação aos EUA. A falta de emprego e de boas condições de vida nas
regiões de origem provocou a migração de trabalhadores nortistas e nordestinos
para a região sudeste. O fluxo excedeu a capacidade de absorção da economia
urbana; formaram-se favelas e cortiços; agravaram-se os problemas urbanos de
São Paulo e Rio de Janeiro. Pleito por aumento salarial e pela redução do custo
de vida motivou inúmeras greves de operários (em São Paulo, 1953, uma
delas durou quase um mês, com centenas de milhares de operários de braços
cruzados). O governo Dutra fundou a Companhia Hidrelétrica do São Francisco,
construiu a usina de Paulo Afonso e as refinarias de Cubatão e Mataripe e
organizou a Frota Nacional de Petroleiros. Para evitar inflação, Dutra
discordava de qualquer aumento salarial. Eleito para o qüinqüênio 1951 a 1955, Getúlio Vargas
aumentou em 100% o salário mínimo; baixou normas sobre economia popular,
comissão parlamentar de inquérito e corrupção de menores; fundou a Petrobrás, a
Eletrobrás e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico; investiu em setores
básicos da economia (energia, siderurgia, construção naval). Com pertinácia,
buscou a emancipação nacional e a ascensão dos trabalhadores. A queda no preço
do café diminuiu a receita oriunda do exterior (1953). Vargas liberou as
importações, a entrada e saída de capitais, facilitou o crédito à indústria
mediante baixas taxas de juro; a dívida externa chegou à casa dos 600 milhões
de dólares.
A imprensa oposicionista (Tribuna da Imprensa, Estado
de São Paulo, Globo) denunciava corrupção em negócios do governo e
alardeava suposto golpe de Estado. Gregório Fortunato, chefe da segurança
pessoal do presidente, toma as dores de Getúlio e planeja o assassinato de
Carlos Lacerda, dono do jornal Tribuna da Imprensa. O pistoleiro
contratado erra o alvo e acerta Rubens Vaz, major da Aeronáutica que
acompanhava o jornalista. Os militares reagiram vigorosamente e instauraram
inquérito. Os oposicionistas não perderam a chance: exigiram a renúncia de
Getúlio. O presidente lavrou depoimento em que denunciava as forças adversas
aos interesses do povo, a campanha subterrânea de grupos internacionais aliados
a grupos nacionais contrários às garantias do trabalho, à lei dos lucros
extraordinários e às empresas públicas como Petrobrás e Eletrobrás. Getúlio
Vargas encerra a carta testamento dizendo que saía da vida para entrar
na História (24/08/1953). O suicídio de Vargas comoveu o povo e provocou
greves, invasão da embaixada dos EUA, empastelamento do jornal O Globo e
retração dos oposicionistas. O vice-presidente Café Filho assumiu a presidência
como permitia a Constituição. (Em reportagem de emissora de TV em 2013, a vedete Virginia
Lane afirma ter presenciado o assassinato do presidente, de quem fora amante;
contesta a versão do suicídio e a autenticidade da carta testamento).
Nenhum comentário:
Postar um comentário