segunda-feira, 8 de julho de 2013

O BRASIL E A CONSTITUIÇÃO X



Os tópicos sobre família, educação e cultura receberam especial atenção na Carta de 1937. A infância e a juventude deviam merecer cuidados e garantias especiais; ao Estado cabiam as medidas destinadas a assegurar-lhes condições físicas e morais de vida sã e de harmonioso desenvolvimento das suas faculdades. O abandono moral, intelectual ou físico da infância e da juventude importava em falta grave dos responsáveis por sua guarda e educação. Na hipótese de abandono, cabia ao Estado prover as crianças e os adolescentes de conforto e dos cuidados indispensáveis à sua preservação física e moral. Aos pais miseráveis assistia o direito de invocar o auxílio e proteção do Estado para a subsistência e educação da prole. A educação integral da prole era o primeiro dever e o direito natural dos pais, cabendo ao Estado suprir as deficiências e lacunas da educação particular. A arte, a ciência e o seu ensino eram livres à iniciativa individual ou das associações e das coletividades públicas e particulares. Era dever da nação e do Estado assegurar às crianças e jovens carentes uma educação adequada às suas faculdades, aptidões e tendências vocacionais mediante instituições públicas de ensino em todos os graus. O ensino profissional e pré-vocacional destinado às camadas desfavorecidas era o primeiro dever do Estado. As indústrias e os sindicatos tinham o dever de criar, na esfera de sua especialidade, escolas de aprendizes destinadas aos filhos dos seus operários ou dos seus associados. Apesar da gratuidade do ensino primário previa-se mensal contribuição à caixa escolar para quem tivesse condições de pagar. O ensino cívico, a educação física e os trabalhos manuais eram obrigatórios em todas as escolas primárias e secundárias. Instituições seriam fundadas com o fim de organizar para a juventude períodos de trabalho anual nos campos e nas oficinas e de promover-lhe a disciplina moral e o adestramento físico, de maneira a prepará-la ao cumprimento dos seus deveres para com a nação. 

Tensão marcante entre liberalismo e socialismo na segunda república (1930 a 1945). A solução conciliatória caracterizou daí para frente o constitucionalismo brasileiro. A inclusão dos pobres e remediados no processo político foi modesta. O governo era para o povo, mas não do povo (o mesmo princípio defendido pelo imperador Pedro I). Nas relações entre governo federal e governo estadual a primazia era do primeiro. O poder central incontrastável acabou com a chamada política dos governadores. As conquistas dos trabalhadores foram inúmeras. O progresso econômico foi notável. Sem descuidar da classe produtora, Vargas suspendeu o pagamento da dívida pública externa e deferiu ao Banco do Brasil o monopólio cambial (1938). Amparou a classe trabalhadora da qual recebia simpatia e aprovação. Ao iniciar os seus discursos dirigia-se aos trabalhadores do Brasil, de modo a salientar o ângulo social do seu governo. Quando multidões o aclamaram no Rio de Janeiro e em São Paulo, a sua argúcia certamente o fez perceber que o povo apreciava mitos. O povo fizera de Luiz Carlos Prestes um mito: cavaleiro da esperança. As manifestações populares em torno de Vargas eram de apoio ao herói da revolução, ao homem providencial, ao pai dos pobres. Vargas aceitou o papel e se colocou acima das facções. Os oligarcas ficaram apreensivos ao vê-lo afastar-se do liberalismo individualista e ficar à meia distância entre capitalistas e socialistas para organizar um Estado Novo com um governo social autocrático à moda fascista. Vargas e o seu séqüito civil e militar estavam acima do direito; a eles cabia o mando e ao povo a obediência. No uso do poder de tributar ele fortaleceu a União. Os Estados devedores do Banco do Brasil ficavam dependentes do governo central, o que os reduzia à condição de províncias (mormente quando chefiados por interventores ao invés de governadores eleitos pelo povo). Além do apoio da massa popular, Vargas recebia o apoio daquela parcela dos militares que almejava governo forte o suficiente para implantar uma política que atendesse aos interesses nacionais e não apenas aos interesses de alguns Estados e das oligarquias regionais; um governo que resolvesse a questão social, amparando a camada baixa da sociedade brasileira. Os militares não aspiravam ao exercício direto do poder e sim garantir um poder nacional dentro daquelas diretrizes.

Na área econômica, as exportações declinaram em face da crise do capitalismo gerada nos EUA (1929) cujas conseqüências desastrosas foram sentidas no mundo ocidental. O governo Washington Luiz tentou equilibrar a queda do café com exportações de frutas. A produção voltou-se para o mercado interno (café, algodão, açúcar, cacau, cereais, erva-mate, frutas, carne, leite, manteiga, ovos, fumo, madeira, borracha). No intuito de proteger a produção, o governo revolucionário de Getúlio Vargas criou o Departamento Nacional do Café e os institutos do Álcool, do Pinho, do Mate, o que beneficiou a camada alta da sociedade. A economia do Brasil entra na fase da industrialização sob política protecionista. A orientação era no sentido de produzir máquinas e equipamentos a fim de livrar o país da dependência econômica em relação aos países industrializados. Durante a segunda guerra mundial (1939 a 1945) cresceram as exportações de borracha e minérios para os EUA. O governo revolucionário criou o Conselho Nacional do Petróleo (embrião da Petrobrás), a Companhia Siderúrgica Nacional, a Companhia Vale do Rio Doce e o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio (órgão único para conjugar interesses da classe patronal com interesses da classe trabalhadora).

No terreno da previdência social foram criados os institutos de aposentadorias e pensões dos marítimos, dos comerciários, dos bancários, dos trabalhadores em trapiches e armazéns de café, dos estivadores e dos industriários. Todas as categorias de trabalhadores urbanos ficaram amparadas. No que tange à cidadania, foi promulgado o Código Eleitoral em 1932 que instituiu a justiça eleitoral, o sufrágio universal, o voto direto secreto obrigatório masculino e feminino, representação proporcional e candidatura avulsa aos cargos eletivos (sem filiação obrigatória a partidos políticos). No período foram publicados: o código Penal, de Processo Penal, de Processo Civil, de Caça e Pesca e de Minas e Águas; o Estatuto dos Funcionários Públicos, a Consolidação das Leis do Trabalho e a Lei de Segurança Nacional. A liberdade sofreu restrições. A expansão da burocracia estatal ensejou milhares de empregos. A escola pública atingiu eficiência impar cuja alta qualidade somente encontrava competidor no colégio jesuíta; para bem organizá-la foi criado um ministério próprio. À ênfase nos deveres dos governados correspondeu o acento na dimensão social dos direitos que sintonizava com o ideário do grupo civil e militar que apoiava Getúlio Vargas, inspirado no governo Mussolini (que prestigiava o capital, o trabalho, a família, a saúde, a educação e a cultura).

Nenhum comentário: