segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

DIREITO

VII

A União Federal é tratada, algumas vezes, como ente da federação quando, na verdade, ela é a própria federação, Estado Federal resultante da união dos Estados e Municípios e do Distrito Federal (CR 1º). O legislador constituinte incluiu a União Federal, como pessoa jurídica de direito público, na organização política e administrativa da República, ao lado dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, assegurando autonomia a todos e visando primordialmente à distribuição das competências e dos bens públicos (CR 18). Mais do que autônomo, é soberano o Estado Federal (República Federativa do Brasil – CR 1º, I). Os poderes da República, cada qual na esfera da sua competência, são soberanos.                

Na medida cautelar tratada na ação direta de inconstitucionalidade (ADI 4638), o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu, soberanamente, a relevância da matéria e da causa de pedir, o risco à independência da magistratura e dos tribunais, a urgência do assunto, o seu especial significado para a ordem social e a segurança jurídica (lei 9.868/99, 12). Diante disto, o tribunal não se deteve no exame dos requisitos de admissibilidade: (i) da ADI (constitucionalidade x legalidade); (ii) da medida cautelar (virtualidade do bom direito e perigo na demora da prestação jurisdicional). Se o fizesse, teria poupado tempo e esforço. Ver-se-ia que a ADI não merecia prosperar. A medida cautelar dela derivada e liminarmente concedida ficaria prejudicada. Os interessados recorreriam às vias ordinárias.

O tribunal extrapolou o objetivo da sessão: foi além do referendo à decisão interlocutória do relator, ultrapassou a própria medida cautelar e adentrou o mérito da ação principal (ADI). Mandou às favas as regras processuais, descumprindo o seu dever de obediência às normas de processo (CR 96, I). Nada restou para o julgamento final da ADI, salvo se algum ministro mudar o voto. Abriu-se cratera na senda processual. O ministro decano sugeriu elaboração de norma que admitisse o julgamento definitivo do mérito da ação no início do processo. O ilustre ministro reconheceu, implicitamente, a ilegalidade praticada pelo tribunal. Todavia, a mudança exigirá ato legislativo e não apenas ato regimental. 

O processo jurídico, em constante evolução na cultura ocidental, representa uma das garantias fundamentais da eficácia dos direitos. A garantia processual está ínsita no princípio da segurança jurídica e manifesta no princípio do devido processo acolhido pela Constituição da República. As regras processuais devem ser observadas rigorosamente por juízes e tribunais. Vê-las desrespeitadas pela suprema corte do país, quer por despreparo dos seus componentes, quer por má-fé, causa desânimo, desapontamento, descrédito. O argumento de que deve prevalecer o substancial em face do instrumental é nitidamente falacioso e serve para os desvios, o jeitinho, a malícia, na prestação da tutela jurisdicional. A segurança dos jurisdicionados repousa, de um lado, na honestidade, serenidade, eficiência e cultura dos magistrados; de outro, na ordem legal dos procedimentos devidamente obedecida. A soberania e a autonomia não significam licença para arbitrariedades, pelo menos no Estado Democrático de Direito como o brasileiro.

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