quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

DIREITO

II

Mencionou-se na referida ação judicial (ADI 4638) – e se menciona com freqüência – o pacto federativo. No Brasil, esse pacto nunca foi celebrado. Cuida-se de ficção jurídica e de retórica política. Pacto significa acordo de vontades entre partes distintas, geralmente livres e em situação de igualdade. Na seara política, federação resulta do pacto entre diferentes e soberanos Estados por decisão dos seus representantes que cedem sua soberania a um governo comum e se reservam autonomia. Isto não aconteceu no Brasil. O legislador constituinte de 1891 simplesmente adotou o modelo de federação dos EUA. Lá, naquele país, os Estados resultantes da independência da colônia inglesa na América eram soberanos (04/07/1776). Diante das dificuldades da época e do interesse na defesa comum, no bem-estar geral e na liberdade, delegados daqueles Estados, reunidos em congresso na Filadélfia, resolveram uni-los por laços jurídicos (17/09/1787). Essa união gerou novo tipo de Estado democrático, republicano, presidencialista, composto de diversos Estados coexistentes, com regras próprias estabelecidas pelos representantes de cada um deles, consubstanciadas em um documento escrito denominado Constituição dos Estados Unidos da América.
 
O Brasil era um Estado unitário, monárquico, com províncias organizadas e distribuídas pelo território, quando o movimento revolucionário, do qual o povo esteve alheio, elevou as províncias à categoria de Estados e no mesmo ato os vinculou em federação. Decreto nº 01, de 15/11/1889: Art. 1º - Fica proclamada provisoriamente e decretada como a forma de governo da nação brasileira, a República Federativa. Art. 2º - As províncias do Brasil reunidas pelo laço da federação ficam constituindo os Estados Unidos do Brasil.

A entusiástica menção ao movimento pendular de centralização x descentralização feita na sessão de julgamento resulta de retórica sociológica acadêmica. Gratifica ao intelecto, porém discrepa da realidade histórica. Durante o governo português a centralização política prevaleceu. As capitanias eram vastas extensões de terra doadas pela coroa portuguesa, sobre as quais o donatário exercia plenamente o direito de propriedade, como um senhor feudal. Após o fracasso do sistema de capitanias, instalou-se governo central na colônia portuguesa da América. O Brasil ainda não existia como nação politicamente organizada. O Brasil surgiu como Estado antes de se caracterizar como nação, graças a João, príncipe português, então regente (a rainha, sua mãe, padecia de doença mental) que elevou a colônia a reino (1815), embora unido ao reino de Portugal. Rompido o vínculo com o reino lusitano (1822/1825), surge novo reino brasileiro por ato de Pedro, príncipe português. Estado soberano, unitário, monárquico, governo centralizado, províncias sem autonomia (Constituição de 1824). Durante o Império (1822/1889) houve movimentos regionais em defesa da autonomia provincial (descentralização administrativa e política). O Brasil perdeu a Província Cisplatina, que se constituiu em república (Uruguai). As demais províncias permaneceram unidas pela superior e conservadora força do governo central. Na república, a força centrípeta continuou a prevalecer sobre a centrífuga, principalmente sob as ditaduras de Floriano, de Getúlio e do estamento militar. Na primeira república houve breve período de grande influência dos governadores. Todavia, a experiência federativa brasileira revela a supremacia do Executivo federal. Centralismo tradicional, herança do Império. 

No século XVII, Galileu utilizou o pêndulo para medir o tempo nos estudos de astronomia (1602). Cinqüenta anos depois, Huygens utilizou o pêndulo no mecanismo de relógio. Na esfera política, falta a regularidade do pêndulo à eventual oscilação entre centralização e descentralização. Lá, na matriz do modelo federativo, houve paulatino fortalecimento do Estado federal e enfraquecimento dos Estados federados, sem alternância e com guerra de secessão. Nos movimentos políticos inexiste essa regularidade pendular; acontecem ao sabor das forças sociais (aparentes e subterrâneas) no curso da história.

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