domingo, 13 de março de 2011

RELIGIÃO

RESUMO DOS LIVROS BÍBLICOS

Considerando a senda religiosa, mística e filosófica aberta com os artigos publicados neste blog; considerando que a compreensão desses artigos pode ser aumentada com a leitura dos textos religiosos e místicos; considerando a eventual dificuldade de acesso aos referidos textos por alguns leitores; considerando a dinâmica social moderna adversa à leitura; considerando o período propício à reflexão sobre assuntos espirituais (quaresma posterior ao carnaval e anterior à páscoa dos católicos); resolvi apresentar este resumo da Bíblia acompanhado de esporádicos e breves comentários.

A Bíblia se divide em duas grandes partes: (I) Antigo Testamento, sobre a história do povo hebreu (idéias, crenças, nomadismo, organização social) que influiu no cristianismo; (II) Novo Testamento, sobre a vida e doutrina de Jesus e a catequese de judeus e pagãos.

Do ponto de vista gramatical e semântico, a Bíblia publicada pela editora Ave Maria, São Paulo/SP, 58ª edição, 1987, apresenta grau de excelência. Foi com base nessa edição que procedi ao resumo. Ali, os organizadores seguiram a ordem lógica por assunto. Aqui, seguirei a ordem cronológica dos livros históricos, sapienciais e proféticos.

ANTIGO TESTAMENTO - I.

Essa parte da Bíblia se compõe de vários livros que o clero católico organizou em quatro grupos: - cinco primeiros livros conhecidos como Pentateuco ou como o Livro da Lei: Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio; - 16 livros históricos: Josué, Juízes, Rute, Samuel (I e II), Reis (I e II), Crônicas (I e II), Esdras (I e II-Neemias), Tobias, Judite, Ester, Macabeus (I e II); - 7 livros sapienciais: Jó, Salmos, Provérbios, Eclesiastes, Cânticos, Sabedoria, Eclesiástico; - 18 livros proféticos: Isaías, Jeremias, Lamentações, Baruc, Ezequiel, Daniel, Oséias, Joel, Amós, Abdias, Jonas, Miquéias, Naum, Habacuc, Sofonias, Ageu, Zacarias e Malaquias.

Todos ou pelo menos alguns dos livros do Pentateuco foram escritos depois da morte de Moisés, conforme a arguta observação de Thomas Hobbes (Leviatã, terceira parte, capítulo 33). Esses livros contêm leis cuja autoria é atribuída a Moisés.

Números esotéricos (3, 7, 12, 40) se destacam na Bíblia. Exemplo: 12 são as tribos de Israel; 12 são os signos do Zodíaco; 12 são os apóstolos do círculo interno da comunidade de Jesus.

Gênesis.

Este livro trata: (i) da criação (gênese) do mundo, do primeiro homem (Adão) e da primeira mulher (Eva); (ii) da expulsão desse primeiro casal do paraíso porque desobedeceram à ordem da divindade ao comerem o fruto da árvore da ciência do bem e do mal plantada no meio do Jardim do Éden; (iii) do descaminho da humanidade e da punição pelo dilúvio; (iv) da geração da nova raça humana a partir de Noé e seus familiares e da aliança da divindade com Noé; (v) da conversão do caldeu Abrão, depois Abraão, ao culto do deus único e sem nome, formação do povo hebreu na linhagem de Abraão, sua aliança com esse deus, que terá como sinal a circuncisão (o deus promete prosperidade ao povo e o povo promete fidelidade ao deus). O primogênito de Abraão foi Ismael, nascido de Agar, escrava egípcia de Sara, estéril esposa do patriarca. O segundo filho de Abraão, Isaac, nasceu de Sara, cuja esterilidade foi curada aos 90 anos de idade por benção divina. Ismael e Agar foram afastados da tribo e abandonados no deserto por ordem divina (Ismael sobreviveu e gerou a nação árabe). Abraão teve mais filhos com a concubina Cetura. Abraão presenteou esses filhos e os despachou para o Oriente Médio. Abraão nomeou Isaac seu sucessor. Jacó, filho e sucessor de Isaac, celebra nova aliança com o deus de Abraão. Esse deus promete especial segurança a Jacó e à sua descendência e o batiza com o nome de Israel. Jacó (Israel) teve 12 filhos (6 com Lia, 2 com Raquel, 2 com Bala, escrava de Raquel, e 2 com Zelfa, escrava de Lia). A cada filho de Jacó corresponde uma tribo (12 tribos de Israel). José, filho de Raquel, foi vendido por seus irmãos, pelo preço de 20 moedas de prata, a uma caravana de ismaelitas que passava no lugar onde eles apascentavam o rebanho. No Egito, José foi revendido a um eunuco da corte do faraó. Por interpretar sonhos, José caiu nas graças do faraó e se tornou ministro. Jacó (Israel) e seu pequeno clã, que passavam agruras na Palestina (Canaã) se mudaram para o Egito, sob a proteção de José e lá permaneceram por 450 anos.

Observações. A versão hebraica da criação do mundo e do dilúvio deve-se a outras culturas da Antiguidade. A ciência contemporânea desmente a versão bíblica, quer no que tange à cronologia, quer no que tange ao processo criativo. Israel, novo nome de Jacó, resulta da combinação dos nomes das divindades egípcias: Isis = lua + Ra = sol + El = sagrado. A autoria deste livro é atribuída a um príncipe e sacerdote egípcio (Moisés). Ismaelitas eram os descendentes de Ismael, que constituíram a nação árabe.

Êxodo

Este livro narra, no estilo épico, a saída do povo hebreu do Egito. Depois da morte de José, os hebreus perdem as regalias e a especial atenção dos faraós. Moisés, príncipe egípcio, sacerdote de RA, assume a tarefa de libertar o povo hebreu por determinação de um deus. Afirma estar exilado em Madiã (região situada no lado asiático do Mar Vermelho) quando esse deus se manifestou em uma sarça ardente que não se consumia com o fogo. A divindade se identificou como sendo o deus de Abraão, Isaac e Jacó e explicou que ocultara o seu nome a esses patriarcas, mas que agora o revelava: Javé. Com esse nome, a divindade se proclama deus do povo hebreu; promete aos hebreus uma terra fértil da qual mana leite e mel, espaçosa, habitada pelos cananeus, hiteus, amorreus, ferezeus, heveus e jabuzeus. Moisés já se afastava quando a divindade o chama e lhe dá a missão libertadora, assegurando que o faraó seria convencido à força. Na disputa de prodígios com os magos do faraó, Moisés e seu irmão Aarão saíram vitoriosos. Fizeram prodígios com suas varas mágicas transformando-as em serpentes, tingindo de sangue as águas, provocando pragas de rãs, mosquitos, moscas, gafanhotos, chuva de granizos, escuridão no céu, tumores e úlceras, mortandade de animais e de primogênitos egípcios, até o faraó permitir o êxodo. Autorizados pela divindade, os hebreus, ao partirem, despojaram egípcios do ouro, prata e vestidos. Moisés conduz os hebreus para fora do Egito, separa as águas do Mar Vermelho e atravessa o leito seco. Quando os egípcios tentam fazer o mesmo, morrem afogados. No deserto, Moisés sobe o Monte Sinai, celebra aliança com Javé e recebe os 10 mandamentos que constituem o direito fundamental do povo hebreu. Moisés dita normas sobre escravatura, propriedade, homicídio, lesões corporais, além de outras normas sobre moral e religião (costumes, rituais, festas). Enquanto Moisés, na montanha, se entrevistava com Javé por 40 dias e 40 noites, os hebreus, na planície, retornaram ao paganismo, fizeram um bezerro de ouro e passaram a adorá-lo. Moisés fica furioso, quebra as tábuas da lei, mata mais de 3 mil hebreus a golpe de espada, retorna ao Monte Sinai, pede perdão a Javé, grava novamente os 10 mandamentos e restabelece o monoteísmo. Manda construir uma arca onde as tábuas da lei são guardadas, que se denominou Arca da Aliança, símbolo da presença da divindade no seio do povo.

Observações. Se perseguição houve, certamente foi porque os hebreus estavam levando o ouro e a prata dos egípcios da vizinhança onde moravam. O condicional “se” é necessário porque há muita fantasia nessa história. Faltam dados históricos confiáveis e razoabilidade. A intimidade de Moisés com o deus Javé beira ao ridículo. Os dois conversam, o egípcio se afasta, o deus o chama de volta: “Moisés, Moisés, vem cá meu filho, preciso terminar a conversa”; o deus exibe a sua parte traseira a Moisés (o que dispensa o escritor de descrever o rosto de Javé). Se a saída do Egito era desejada pelos hebreus, então não havia motivo para Javé criar dificuldade e endurecer o coração do faraó. O contrário seria de esperar, ou seja, que esse deus amolecesse o coração do faraó. Para cessar as supostas desgraças provocadas pela magia de Moisés e Aarão, bastava ao faraó prender os dois e executa-los, pois dispunha de inteligência, força e poder para esta singela solução bem adequada aos costumes da época. Tampouco havia fortes razões para o faraó exigir a permanência dos hebreus em solo egípcio. Não há prova alguma da escravização dos hebreus pelos egípcios. Há notícia de uma tribo que não acompanhou Abrão e seguiu direto da Caldéia para o Egito sem que fosse escravizada. Do ponto de vista político, aquela gente citada no livro era egípcia, porque nascida no Egito, onde vivia há quatro séculos e meio (450 anos). No mundo atual, por exemplo, há judeus de nacionalidade brasileira, argentina, inglesa. Se esses judeus quiserem migrar para Israel, certamente não haverá estorvo algum da parte dos governos do Brasil, da Argentina e da Inglaterra (salvo se houver contas a prestar à Justiça). Ainda que conservasse costumes hebreus, aquela gente mencionada no livro estava sob as leis do Egito. O deus identificado como Javé, confessa que a sua intenção era a de mostrar o seu poder ao faraó. Muito estranha, para um deus, essa necessidade de exibir poder perante uma autoridade humana. Se o poder da mente divina foi suficiente para criar o mundo, muito mais o seria para, sem qualquer esforço físico, dissuadir o faraó ou qualquer ser humano. Por aí se vê que o poder desse deus era limitado e seu caráter censurável. O escritor hebreu pretende colocar vestes de herói em Moisés e elevar o povo hebreu ao nível de impérios majestosos como o egípcio, babilônio, assírio, caldeu, persa, quando, na verdade, os hebreus situavam-se em nível bem modesto, como o dos cretenses e sumerianos. Os egípcios eram da raça negróide, diferentes dos artistas caucasianos dos filmes de Hollywood sobre aquela admirável civilização. Sendo egípcio, Moisés pertencia à raça negróide. O escritor hebreu comete ato falho ao relatar o episódio da fuga para Madiã: “Um egípcio nos protegeu contra alguns pastores e, além disso, tirou água ele mesmo e deu de beber aos animais.” (Êxodo 2: 18/19). As filhas do sacerdote não identificam Moisés como hebreu, caldeu, árabe, e sim como egípcio. A raça não era discriminada em sua própria terra e arredores. O povo hebreu nunca assimilou inteiramente o monoteísmo. O povo resiste ao que é imposto à força. Moisés trouxe o monoteísmo da escola de mistérios formada pela nobreza egípcia e o enfiou na goela dos hebreus. Segundo versão complementar, Javé era divindade dos kenitas, povo do deserto que vivia próximo ao Monte Sinai. Moisés lhes tomou a divindade por empréstimo. Volta e meia, os hebreus recaíam no animismo e no politeísmo consoante tradição sua e dos povos daquela época. Essas recaídas acabaram por dividir o povo hebreu (930 a.C.): os monoteístas ortodoxos, de um lado (reino de Judá = duas tribos); os flexíveis e adoradores de deuses estrangeiros, de outro (reino de Israel = dez tribos). O decálogo do Êxodo é de época posterior a de Moisés, certamente introduzido por Esdras no século IV a.C. (400/301). Não há certeza histórica se houve um decálogo anterior, recebido por Moisés no Monte Sinai.

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