domingo, 24 de agosto de 2014

O SORRISO DE MARINA



No velório de Eduardo Campos alguém fotografou Marina Silva junto ao caixão fúnebre no momento em que ela esboçou um sorriso. A fotografia foi lançada na rede de computadores acompanhada de comentários desairosos. Intenção maldosa materializada em comentários maldosos. Focaram o rosto de Marina, mas não o braço dela erguido segurando na mão estendida o retrato de um Eduardo sorridente. Sobre o retrato repousavam dois rosários bonitos e delicados. Gesto de religiosa e respeitosa homenagem ao falecido e aos seus familiares. Os difamadores centraram os seus ataques no que seria um sorriso. Ignoraram os olhos de Marina. Os olhos são espelhos da alma. O olhar daquela mulher não expressava alegria e sim melancolia. Dirigia o olhar ao filho de Eduardo, em muda solidariedade e compaixão naquele momento de dor profunda. A contração labial não era riso, pois a fisionomia não expressava alegria e nem zombaria. Parecia um sorriso de benevolência. Na verdade, não era riso e nem sorriso, mas sim um ricto como o de Gioconda, brotado da alma num intervalo sentimental, hiato entre os pulsares do coração. Alma de mulher de humilde berço, que conheceu as agruras da vida, que muito trabalhou e estudou honesta e persistentemente. Diplomou-se em cursos universitários de graduação e pós-graduação. Militou em partido político e foi eleita senadora da república. Merece respeito e consideração.   

A conduta sem freios éticos dessa malta de difamadores reverteu a minha decisão de não comparecer às urnas nas próximas eleições. Nós, brasileiros maiores de setenta anos de idade, temos o direito de votar, mas não a obrigação de votar. O mesmo se diga dos brasileiros maiores de 16 e menores de 18 anos. Podemos exercer ou deixar de exercer o direito de votar, conforme a nossa vontade livre e soberana. Da mesma liberdade está privada a outra parcela do povo brasileiro que se encontra na faixa etária dos 18 aos 70 anos. Esta parcela não tem o direito de votar e sim a obrigação de votar (salvo os analfabetos). Caso os cidadãos dessa parcela do povo faltem às urnas sem justificativa aceitável sofrerão as penalidades previstas em lei. Comparecendo às urnas, essa obrigada parcela do povo poderá escolher ou deixar de escolher candidato. A Constituição limita-se a declarar obrigatório o voto dessa parcela sem obrigar o eleitor a escolher alguém. O voto é uma das formas de o cidadão manifestar a sua vontade e expressar o seu desejo. Assim, a vontade do eleitor pode ser a de escolher alguém ou a de não escolher pessoa alguma. O voto pode ser em preto ou em branco, positivo ou negativo. Há eleitor que vende o seu voto. Para esse tipo, as eleições ensejam ganho de dinheiro, de bens de consumo e de outras vantagens. Há eleitor que vota por espírito cívico, gratuitamente, em concordância ou discordância com a realidade nacional.

Reformulei o meu propósito inicial e decidi comparecer às urnas. Votarei somente para a chefia dos governos federal e estadual. A União Federal e o Estado-membro não ficarão acéfalos. Reformulei como protesto contra a conduta dos difamadores e também porque Marina Silva se candidatou à presidência da república. Trata-se de mulher valorosa que merece o meu voto. Para o governo do Estado do Rio de Janeiro votarei no candidato do PSOL a título de renovação. Cumpro, assim, o meu dever cívico de não compactuar com a corrupção no Poder Executivo. Quanto aos demais cargos (senadores e deputados) votarei em branco. Recuso-me a contribuir para o funcionamento de instituições políticas moralmente falidas como o Congresso Nacional e a Assembléia Legislativa. Cumpro, assim, o meu dever cívico de não compactuar com a corrupção no Poder Legislativo. 

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