quinta-feira, 7 de agosto de 2014

FILOSOFIA XIII - 12



EUROPA (1600 a 1800). Continuação.

O fortalecimento dos reis com os impérios coloniais e a política mercantilista que facilitaram a formação de exércitos permanentes e bem equipados tirou as cores e o encantamento do altar pontifical e do trono imperial. À margem do imperador, os reis receberam apoio de banqueiros, mercadores e manufatureiros que ainda não tinham condições de defender seus negócios com recursos próprios. Por outro lado, a revolução protestante quebrou a unidade da igreja cristã, aboliu a suserania do papa sobre os governantes seculares, incitou o nacionalismo e encorajou os reis da Europa Setentrional a estenderem sua autoridade sobre os negócios civis e religiosos. O terreno ficou bem adubado para o absolutismo dos reis nos séculos XVI a XVIII, encorajado por fatores econômicos e sociais e animado pelas idéias de um grupo de juristas e filósofos. A discórdia e a confusão reinantes em França (potência européia da época) alimentaram a idéia de ordem defendida por esse grupo de pensadores como o bem supremo da sociedade. Esses doutrinadores afirmavam que o rei governava por direito divino e devia ser obedecido cegamente; que na defesa do bem comum o rei não estava submetido a regras de moralidade. Maquiavel antecipara essas idéias e os pensadores deste período insistiram na sua adoção pelos governantes dos grandes Estados nacionais, embora alguns atenuassem o rigor absolutista fazendo uma distinção entre governo absoluto (respeita as leis fundamentais do reino) e governo arbitrário (sem freios jurídicos e morais). Havia defensores: (1) do direito de resistência ao soberano arbitrário; (2) da ilicitude criminosa de qualquer resistência, ainda que o soberano fosse arbitrário; (3) da licitude da resistência quando o soberano ordenasse contra deus. Conflito de idéias é comum entre os doutrinadores.   

Na Inglaterra, Henrique VII, que subiu ao trono em 1485, quando terminou a guerra das duas rosas, dá início à dinastia Tudor. A classe dos comuns estava insatisfeita com a anarquia gerada por essa guerra no seio da classe dos nobres. Regozijaram-se com a fundação da monarquia. Essa dinastia aproveitou-se disso para: (1) orientar a consciência dos súditos {o monarca torna-se chefe da igreja anglicana}; (2) submeter os súditos, à vontade soberana do rei. Os mais célebres monarcas dessa dinastia foram Henrique VIII (1509 a 1547) e Elizabeth (1558 a 1603). Jaime VI, da Escócia, sucede sua prima Elizabeth no trono inglês com o nome de Jaime I e inaugura a dinastia Stuart. Com amparo na doutrina, esse rei defende o direito divino de governar e o faz de modo arbitrário provocando descontentamento. Os barões invocavam as garantias expressas na Magna Carta. Carlos I, ao suceder o pai no trono, herda aquele descontentamento popular (1625). Ante a recusa do Parlamento de liberar mais verbas para as despesas da guerra com a França, esse monarca toma empréstimos compulsoriamente dos súditos, obriga-os a aquartelar soldados em suas casas, prende pessoas sem o devido processo jurídico. O Parlamento reage e obriga o rei a prover petição de direitos (bill of rights) pela qual se declarava a ilegalidade: (1) de tributos não votados pelo Parlamento; (2) do aquartelamento de soldados em casas particulares; (3) da prisão de qualquer pessoa sem o devido processo jurídico; (4) da instauração de lei marcial em tempo de paz (1628). O monarca inglês insiste nas arbitrariedades e abusa do poder de tributar. Na chefia da igreja anglicana, ele desagrada aos calvinistas ingleses e escoceses. O Parlamento reage e declara sem efeito a tributação naval baixada sem o seu consentimento, extingue os tribunais de exceção, prende os principais auxiliares do rei, proíbe o monarca de dissolver o Parlamento, exige a convocação das sessões parlamentares de três em três anos pelo menos. Em represália, o rei invade a Câmara dos Comuns e expulsa os parlamentares. Irrompe o conflito. Ambos os lados reúnem tropas e iniciam a guerra civil (1642 a 1649). O rei tem o apoio de alguns nobres, latifundiários, católicos e anglicanos. O Parlamento tem apoio dos pequenos proprietários de terra, dos comerciantes, manufatureiros, puritanos e presbiterianos. O rei é derrotado. No Parlamento há dissensão sobre os poderes do monarca e a tolerância religiosa. O rei aproveita-se da discórdia parlamentar e recomeça a guerra (1648). Novamente sai derrotado. Oliver Cromwell comanda as forças do Parlamento. Afastados os presbiterianos da Câmara dos Comuns, os parlamentares restantes acabaram com a monarquia e instauraram a república. Redefiniram o crime de traição nele incluindo os agravos praticados pelo monarca. Instalou-se uma Alta Corte de Justiça que julgou e condenou o monarca. Carlos foi decapitado (1649). Aboliu-se a Câmara dos Lordes. A Inglaterra torna-se uma república oligárquica.

A revolução puritana remodelou o sistema político inglês que recebe a denominação de Commonwealth (comunidade governada pelo povo). A função que era do rei foi exercida por um Conselho de Estado composto de 41 membros. Apoiado pelo exército, Cromwell dominou o Parlamento e o Conselho de Estado. Alegando abuso dos legisladores, Cromwell os dispersa e instaura a ditadura (1653). A nova Constituição denominada Instrumento de Governo foi escrita pelos oficiais do exército. Cromwell recebe o título de Lorde Protetor. O seu cargo ficou hereditário. Cromwell afirma que a sua autoridade emana de deus. Tanto o Commonwealth como o Protetorado não tiveram o apoio e a simpatia de grande parte da nação inglesa. Com a morte de Cromwell em 1658, sucede-lhe o filho Ricardo, que não se sustentou no governo. O Parlamento convida Carlos II para assumir o trono da Inglaterra (1660 a 1685). O novo rei jurou respeitar o Parlamento, a Magna Carta e a Petição de Direitos. Iniciou a restauração e foi sucedido pelo irmão católico Jaime II, que ameaça o governo protestante (1688 a 1689). Em oposição a isto, um grupo de políticos oferece o trono inglês ao monarca holandês Guilherme de Orange e a sua esposa Maria, filha mais velha de Jaime II. O holandês aceitou o convite e entrou em Londres com seu exército sem disparar um único tiro. Jaime refugia-se na França. O Parlamento declara vago o trono e entrega a coroa aos novos soberanos. O Parlamento expede lei protegendo a si próprio e aos ingleses contra a intromissão da Coroa; concede liberdade religiosa aos cristãos, exceto aos católicos e unitaristas. O Bill of Rights ganha status de lei (1689). O triunfo do Parlamento colocou fim tanto à república como à monarquia absoluta na Inglaterra. A teoria do direito divino dos reis é rejeitada definitivamente. Guilherme e Maria recebem os seus poderes do Parlamento e não de deus. O Parlamento promulga o Act of Settlement, que lhe dá autoridade para determinar quem será o rei (1701). Em disposição transitória, o Parlamento declara que após a morte de Ana, filha mais moça de Maria, a coroa caberá a Sofia de Hanover ou a qualquer dos seus herdeiros que fosse protestante {a casa de Hanover assumiu o trono e nele permanece até hoje}. A revolução puritana serviu de paradigma para as revoluções americana e francesa do século XVIII. A derrota do absolutismo na Inglaterra inspirou outros povos a lhe seguir o exemplo. Pensadores como Voltaire, Jefferson e Paine, defenderam a idéia de governo limitado. Parte do Bill of Rights foi incorporada pela declaração de direitos francesa e pelas primeiras dez emendas da Constituição estadunidense.          

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