terça-feira, 16 de agosto de 2011

CONTO

Capítulo II.

O táxi os deixou no portão de entrada da casa em que moravam. Arrumadas as coisas, banho tomado, saída de automóvel para um lanche rápido com os pais e a irmã, Júnior não quis mais saber de conversa. Assistiu a programa de televisão por breves minutos e foi para a cama. Na manhã seguinte, domingo enevoado, chegou a sua vez de acordar o pai. Leonardo não gostou da iniciativa do filho e levantou de mau humor. O menino tinha resolvido a charada que o vinha perturbando desde a viagem de avião. Estava ansioso para contar a Leopoldo precisamente isto: se estivesse em uma nave espacial e se aproximasse bastante de uma estrela, o tamanho dela seria grande. A professora ensinara que havia estrelas maiores do que o Sol. Júnior não conseguia imaginar o tamanho de estrelas de primeira a quarta grandeza. Somente a de quinta, por causa do Sol. Quanto mais se afastasse com a nave, menor ficaria a estrela, como visto nos filmes 2001 - Uma Odisséia no Espaço e Guerra nas Estrelas.

- A Terra é como nave espacial – comparou o menino. Da nave olhamos para as estrelas que ficam muito longe. Por isso, parecem bem pequenas. O Sol está perto da Terra. Por isso nós o vemos grande e ficará maior à medida que dele nos aproximarmos.

Diante da matinal, intempestiva e entusiástica “exposição científica” do filho, Leopoldo o atiça com azedume:

- Se chegasse perto do Sol sem proteção especial contra altíssima temperatura a nave derreteria por inteiro e seus ocupantes morreriam torrados.

Júnior dirige ao pai um olhar indulgente, como se estivesse diante de uma pessoa de poucas luzes. Pensou um pouco e respondeu:

- É claro! Eu só estava dando um exemplo de como a distância faz as coisas parecerem pequenas.

- Ah, bom! O pai contemporizou, franziu a testa como se estivesse intrigado e pede explicação a Júnior. Você se refere à distância só no espaço ou também no tempo?

O menino ficou envaidecido. O pai pedia esclarecimento a ele! Sentiu, porém, que o assunto se aprofundava além da sua compreensão. Saiu pela tangente. Pediu ao pai o motivo da pergunta. Ganhou tempo somado ao adminículo paterno. Leopoldo estimou a sagacidade do filho e atendeu ao pedido.

- A passagem do tempo, que podemos entender como distância entre o passado e o presente, tanto pode atenuar como pode agravar os nossos problemas. Depois de algum tempo, dissabores são esquecidos. Sem dúvida que a distância, sob este prisma, favorece o esquecimento. Entretanto, se houver rancor, não haverá esquecimento. Situações mal resolvidas ficam tormentosas e perturbam o nosso espírito.

Júnior assumiu postura corporal de espera sem dizer palavra. Diante da atitude do filho, Leopoldo ficou indeciso se continuava ou se interrompia a conversa. O filho ainda não vivera o suficiente para adquirir o lastro empírico necessário à compreensão de certos assuntos. Mesmo assim, já que fora acordado, saltara da cama e preparava o café matinal, Leopoldo resolveu espichar a conversa.

- As coisas são o que são e não ficam pequenas nem grandes, salvo quando algo lhes é tirado ou acrescentado, ou quando é da sua natureza encolher e crescer. Os seres vivos, por exemplo, nascem, crescem, reproduzem e fenecem.

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