quinta-feira, 30 de abril de 2015

POESIA



Verde que eu te quero verde / Verde vento. Verdes ramas / O barco por sobre o mar / e o cavalo na montanha / Com a sombra na cintura / ela sonha em sua varanda / verde carne, tranças verdes / com os olhos de fio prata / Verde que eu te quero verde / Por sob a lua cigana / as coisas a estão olhando / sem ela poder olhá-las.
Verde que eu te quero verde / Grandes estrêlas de escarcha / vêm com o peixe de sombra / que abre o caminho da alva / A figueira arranha o vento / com a lixa de suas ramas / e o monte, gato gordunho / eriça suas pitas ágrias / Mas quem virá e por onde? / Ela está em sua varanda / verde carne, tranças verdes / sonhando na onda amarga.

- Compadre, quero trocar / meu cavalo por sua casa / meus arreios pelo espelho / minha faca por sua manta / Compadre, venho sangrando / já desde os portos de Cabra.
- Se eu pudera, meu amigo / este trato se fechava / Mas eu já não sou eu mesmo / nem esta é mais minha casa.
- Compadre, quero morrer / decentemente na cama / de punhal, se pode ser / com os lençóis de cambraia / Vês a ferida que tenho / desde o peito até a garganta?
- Trezentas rosas morenas / leva tua camisa branca / Teu sangue transuda e cheira / ao redor de tua faixa / Mas eu já não sou eu mesmo / nem esta é mais minha casa.
- Deixai-me subir ao menos / até às altas varandas! / deixai-me subir, deixai-me / até às verdes varandas! / Corrimãos verdes da lua / por onde retumba a água.

Já sobem os dois compadres / até às altas varandas/ Deixando um rastro de sangue / Deixando um rastro de lágrimas / Tremulavam nos telhados / faróis de folhas de lata / Mil pandeiros de cristal / feriam a madrugada.
Verde que eu te quero verde / Verde vento. Verdes ramas / Os dois compadres subiram / O longo vento deixava / na boca um raro sabor / de fel, de menta e alfavaca.

- Compadre! Diz onde está / onde está tua filha amarga?
- Quantas vezes te esperou! / Quantas vezes te esperara / cara fresca, tranças negras / aqui na verde varanda!

Sobre o rosto da cisterna / balançava-se a cigana / Verde carne, tranças verdes / com olhos de fria prata / Um carambano de lua / a ampara sobre a água / A noite tornou-se íntima / qual uma pequena praça / bêbados guardas-civis / brutais, à porta chamavam.
Verde que eu te quero verde / Verde vento. Verdes ramas / O barco por sobre o mar / e o cavalo na montanha.

(“Romance Sonâmbulo”. Frederico GARCIA LORCA. Traduzido por Leônidas e Vicente Sobrinho Porto).

Nenhum comentário: