10 de abril de 1950. Publicada a lei 1.079 que define os crimes de
responsabilidade e regula o respectivo processo. Essa lei permite o combate à
corrupção que acontece dentro e fora do Judiciário. Entre os crimes dos
ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) definidos nesta lei, estão as
condutas: (i) patentemente insidiosas no cumprimento dos deveres do cargo; (ii)
incompatíveis com a honra, a dignidade e o decoro das suas funções. Qualquer
cidadão brasileiro pode denunciar perante o Senado Federal os ministros do STF
por crime de responsabilidade. Servem de prova: documentos, certidão fornecida
pela secretaria do tribunal, gravações lícitas, depoimentos de operadores do
direito e de pessoas comuns. Ainda que os atos criminosos sejam públicos e
notórios, convém produzir a prova, apesar de a processualística civil dispensar
tal produção (CPC 334). O processo de impeachment tem como fonte subsidiária a
processualística penal e o regimento interno do Senado. Se houver condenação
pelo voto de 2/3 dos senadores presentes à sessão de julgamento, o ministro
denunciado perderá o cargo.
14 de março de 1979. Publicada a lei complementar que dispõe sobre
a organização da magistratura nacional (LC 35). Segundo esta lei, são deveres
dos magistrados: (i) cumprir e fazer cumprir, com independência, serenidade e
exatidão, as disposições legais e os atos de ofício; (ii) não exceder
injustificadamente os prazos para sentenciar ou despachar; (iii) comparecer
pontualmente à hora de iniciar-se o expediente ou a sessão e não se ausentar
injustificadamente antes do seu término; (iv) manter conduta irrepreensível na
vida pública e particular.
Esses deveres são transgredidos
com freqüência. No que tange ao STF, os rotineiros atrasos no início e reinício
das sessões geram redução no tempo de prestação do serviço jurisdicional. Previsto
para as 14,00 horas, no regimento interno, o início das sessões ocorre sempre com
30 minutos, ou mais, de atraso; na ata lida em plenário, todavia, consta que a
sessão teve início às 14,00 horas pontualmente. O regimento prevê intervalo de
30 minutos. Iniciada a sessão, os ministros não escondem a ansiedade para que
chegue o momento do intervalo. O reinício da sessão ocorre além dos 30 minutos;
às vezes, demora o dobro. Cerca de uma hora depois do reinício, a sessão é
encerrada.
A função primordial dos tribunais
judiciários é prestar tutela jurisdicional; existem para, à luz do direito,
julgar os casos submetidos à sua apreciação. Tudo o mais é secundário. No
cotidiano, porém, essa função primordial tem sido negligenciada. Inverte-se a
prioridade transferindo-a para assuntos estranhos à judicatura
(administrativos, protocolares, particulares) tratados dentro do horário
previsto para as sessões de julgamento. As freqüentes ausências de ministros às
sessões acarretam: (i) adiamento dos julgamentos por falta de quorum; (ii)
procrastinação da tutela jurisdicional; (iii) prolongamento da tensão gerada
pelo litígio; (iv) perda de viagens à Brasília por advogados e interessados, sem
ressarcimento das despesas.
O STF passa a imagem de uma
sinecura de barnabés de toga. Urge a sua extinção e substituição por quatro
tribunais constitucionais, um em cada ponto cardeal, soberanos em sua
jurisdição.
05 de outubro de 1988. Promulgada a nova Constituição da República
que outorga competência ao Senado Federal para processar e julgar os ministros
do STF nos crimes de responsabilidade e destituí-los do cargo na hipótese de
condenação (artigo 52, II + parágrafo único).
02 de abril de 2014. O Ministro Gilmar Mendes, do STF, pede vista
dos autos do processo da Ação Direta de Inconstitucionalidade proposta pelo
Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (ADI 4650). Tal demanda tem
por objeto o financiamento de campanha eleitoral por pessoas jurídicas. Cuida-se
de matéria de alta relevância para a limpeza ética na seara política. O peso do
voto deve ser igual entre os cidadãos. O peso do dinheiro abala essa igualdade
democrática. Os partidos não se sustentam somente no voto, mas, também, no
estatuto ficcional, na capacidade de arrecadação de fundos e na propaganda
cara, sofisticada e enganosa.
02 de abril de 2015.
A vista concedida
a Gilmar completa um ano. O ministro retém os autos do processo da mencionada
ação judicial embora esgotado o prazo estipulado no artigo 134 do Regimento
Interno do STF: “Se, algum dos Ministros, pedir vista dos autos, deverá
apresentá-los, para prosseguimento da votação, até a segunda sessão
ordinária subseqüente”. O abuso de direito praticado pelo ministro é evidente.
A demora na devolução dos autos é proposital, excessiva e injustificada. O
julgamento da ação teve início e deve terminar sem procrastinação, conforme
exige o princípio do devido processo legal. Daí, o dever do ministro de
devolver os autos dentro do prazo regimental. A conduta abusiva do ministro
tipifica violação do princípio da razoável duração do processo e de celeridade
nos trâmites processuais (CR 5º, LXXVIII).
A referida ação judicial tem seus
trâmites há quatro anos no mesmo tribunal, onde houve audiências públicas com a
oitiva de pessoas representativas da sociedade brasileira. A extensa discussão
pública sobre a matéria e os votos de mais da metade dos membros do tribunal significam
que os juízes estavam preparados para julgar. Portanto, a justificativa de que
o retentor está estudando o processo
não convence. A capacidade intelectual do ministro moroso não deve ser tão
inferior à dos ministros que já votaram. O ocupante do cargo de ministro da
corte suprema deve preencher os requisitos de notável saber jurídico e reputação
ilibada (CR 101). Ao se mostrar deficiente intelectual ou de reputação
duvidosa, o ministro deve desocupar o cargo, voluntária ou compulsoriamente. O ministro
Gilmar: (i) preenche o requisito do saber jurídico; (ii) parece estar na posse
plena das faculdades mentais; (iii) está no exercício das suas funções. Logo, a
excessiva demora não se justifica. A desculpa do acúmulo de processos também é inaceitável por dois motivos: (i) o
acúmulo é comum a todos os ministros; (ii) a ação judicial já está em
julgamento e, por isso mesmo, tem prioridade. O ministro retarda, mas não
parece retardado mental. Talvez, seja caso do juiz tardinheiro de que falava Ruy Barbosa.
A reputação de Gilmar deixou de
ser ilibada principalmente: (i) depois do caso Dantas, em que exibiu desembaraço
fulminante e rapidez extraordinária; (ii) no entrevero com o ministro Joaquim
Barbosa; (iii) com a demora abusiva para devolver os autos do processo da ADI 4650. A excessiva
velocidade num caso de maior complexidade e a excessiva lerdeza em outro caso de
menor complexidade é sintoma de proposital desequilíbrio incompatível com os
princípios da impessoalidade, moralidade e eficiência (CR 37). A censurável
conduta do ministro autoriza: (1) qualquer cidadão, inclusive parlamentar, a
oferecer denúncia perante o Senado Federal para apurar a responsabilidade do
ministro (impeachment); (2) as partes, a pleitearem a busca e apreensão dos
autos do processo e a imediata continuação do julgamento.
10 de abril de 2015. A lei 1.079 completa 65 anos de vigência e de reduzida
aplicação, apesar dos inúmeros episódios que justificariam a sua maior
incidência. Nos períodos de normalidade democrática no Brasil, os ocupantes dos
altos escalões da república se mantiveram acima da lei, pelo menos, até a
primeira década do século XXI. Membros de tribunais judiciários raramente são
punidos por suas faltas.
12
de abril de 2015. Manifestação de 0,2% da população paulista a
favor do impeachment da Presidente da República, da extinção do PT e contra a
corrupção. Evidenciou-se a irracionalidade do movimento. Falta amparo, moral e
jurídico, para a instauração do processo, como exposto no artigo anterior sobre
o tema. Ainda que fosse possível o afastamento da Presidente, a vaga seria
preenchida pelo Vice-Presidente e não pelo candidato derrotado nas eleições. Do
ponto de vista jurídico, a extinção de partido só é possível nos casos
previstos em lei. Do
ponto de vista moral, a merecida extinção não seria apenas do PT, mas, também,
do PSDB e dos partidos comunheiros na patifaria. No que tange à corrupção, o combate
já é realidade. Como dito alhures, foi preciso mulher na presidência para que
essa luta fosse empreendida eficazmente no Brasil.
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