quinta-feira, 9 de abril de 2015

FILOSOFIA XV - 39



EUROPA (1900 a 2014). Continuação.

Holismo, novidade, mudança, essencialismo, são tópicos caros à corrente do historicismo contrária à visão naturalística, afirma Karl Popper. Há elemento comum às ciências naturais e às ciências sociais quanto aos métodos adotados. Assim pensa a corrente naturalista do historicismo. Tal qual a Física, a Sociologia é um ramo do conhecimento que pretende ser teorético e empírico ao mesmo tempo. Como disciplina teorética, a Sociologia explica e prevê eventos valendo-se de teorias e leis universais que procura descobrir. Como disciplina empírica, a Sociologia se baseia na experiência, nos fatos observáveis. A observação é a base para aceitar ou rejeitar qualquer teoria proposta. A previsão pode ser profética ou tecnológica. A primeira (previsão profética) refere-se a um evento futuro e inevitável. O seu valor prático está em permitir a prevenção, isto é, que possamos nos preparar para enfrentá-lo. A segunda (previsão tecnológica) é construtiva, indica o caminho que se nos abre se quisermos alcançar certos resultados. Este segundo tipo é próprio da engenharia social que pode ser de ação gradual e holística. A engenharia social holística tem por fim remodelar toda a sociedade, enquanto a gradual (tecnologia de ação por partes) projeta a criação e a reforma de instituições sociais de caráter público e privado. O planejamento holístico carece de base científica.

A concepção historicista de desenvolvimento social não implica fatalismo. Ideais, sonhos, raciocínios, desejos, conhecimentos, temores, energia, interesses, constituem forças do desenvolvimento social que não se aprisionam em planos. O historicista pode interpretar e favorecer o desenvolvimento social, mas não altera-lo. O método historicista surge como parte de uma ampla interpretação filosófica do mundo. A voga do historicismo pode ser vista como puro reflexo da voga evolucionista. A chamada hipótese evolucionista resulta da explicação de observações biológicas e paleontológicas fundada no pressuposto de uma ancestralidade comum de formas relacionadas. Tal hipótese carece do status de lei universal.

Na opinião de Karl, a evolução da vida na Terra é um processo histórico peculiar, um enunciado histórico singular e não uma lei universal. A dinâmica social difere da dinâmica natural. Os fatos da sociedade humana não giram em órbita, nem se movem progressivamente em uma trajetória, como se fossem fenômenos da natureza. O tipo de sociedade que o sociólogo denomina “estática” corresponde justamente ao sistema físico que o cientista natural denomina “dinâmico”. A hipótese de que existem tendências é um artifício estatístico útil, mas tendências não são leis e sim coisas radicalmente diversas. O enunciado da tendência é existencial e não universal. A tendência não deve ser utilizada como base para previsões de caráter científico.

A tentativa e o erro são necessários ao avanço científico. Através de ensaios e erros as gerações passadas chegaram ao conhecimento que transmitiram à geração presente e modelaram a sociedade. O cientista social encara tais ensaios e erros como seu método experimental para alicerçar suas teorias. Em época de rápida mudança social constata-se a caducidade das leis sociais em que nos apoiamos e verifica-se que elas não tinham o caráter universal que supúnhamos. Verifica-se, também, o caráter regional das leis sociais quando constatamos que outros povos se guiam por leis diferentes das nossas. A educação e a propaganda padronizam interesses e crenças e eliminam diferenças individuais. O progresso da ciência depende da livre competição de pensamentos e necessita de liberdade política. Sem suprimir a crítica pública, o governo democrático toma medidas duras e necessárias diante de males e perigos concretos.

O progresso pode ser desprezível em conseqüência de um fenômeno natural incontrolável ou de aspectos da natureza humana como a indolência e o esquecimento. Além de psicológicas, as condições do progresso científico e industrial também são institucionais e sociais. Ao tomar consciência de que a pesquisa científica em torno de problemas sociais exerce influência sobre a vida social, o cientista social fica impossibilitado de conservar a adequada atitude científica de desinteressada objetividade. O progresso científico poderá findar se um dia a humanidade mergulhar no misticismo, na busca do nirvana. O apelo emocionalmente persuasivo para que os homens se congreguem em torno de um propósito comum implica no apelo para que opiniões diferentes e opostas sejam abandonadas. Isto pode significar o abandono do pensamento racional. A liberdade de ser ímpar e diferente dos outros, de discordar da maioria e seguir o próprio caminho, pode constituir a mola propulsora da evolução e do progresso.                          

Theodor Wiesengrund-Adorno (1903 a 1969), graduado em filosofia pela Universidade de Frankfurt, faz da música e da tecnologia motivo para reflexão filosófica. Escritor prolífico, Theodor escreveu: “Dialética do Iluminismo”, “Teoria Estética”, estudos sobre Husserl e sobre Hegel, além de outras obras. Refugiou-se na Inglaterra para escapar do nazismo e lecionou na Universidade de Oxford. Mudou-se para os EUA, onde realizou estudo considerado modelo de sociologia empírica: “A Personalidade Autoritária”. Regressou a Frankfurt depois de terminada a guerra e reorganizou o Instituto de Pesquisa Social (1950).

A técnica, diz Theodor, se define enquanto: (i) qualquer coisa determinada interna e esteticamente; (ii) desenvolvimento exterior às obras de arte. As técnicas de reprodução sacrificam a distinção entre o caráter da obra de arte e o caráter do sistema social quando visam à produção em série e à homogeneização. A técnica é fonte de poder na sociedade. As circunstâncias que favorecem tal poder são geradas pelos mais fortes economicamente. A racionalidade da técnica identifica-se com a racionalidade do domínio. Rádio e cinema não podem ser tomados como arte por serem negócios e seus fins realizados mediante sistemática e programada exploração de bens considerados culturais caracterizadora de uma indústria cultural.

A expressão indústria cultural substitui a enganadora expressão cultura de massa utilizada pelos donos dos veículos de comunicação de massa. Essa “cultura” não surge das massas como fazem acreditar os senhores da comunicação, mas é por eles produzida e adaptada ao consumo das massas. Em larga medida, tais senhores determinam o próprio consumo. Ao “criar necessidades” ao consumidor (que deve contentar-se com o que lhe é oferecido) a indústria cultural se organiza para que o indivíduo se conforme a condição de objeto. A indústria cultural faz da humanidade a consumidora dos seus produtos e é portadora da ideologia dominante que outorga sentido a todo o sistema do mundo industrial. A humanidade tornou-se vítima de novo engodo: o progresso da dominação técnica que tolda a consciência individual e impede a formação de indivíduos independentes, capazes de conscientemente julgar e decidir. Instaurando o poder da mecanização sobre o homem, a indústria cultural cria condições cada vez mais favoráveis à implantação do seu comércio fraudulento onde os consumidores são continuamente enganados em relação ao que lhes é prometido e não cumprido.

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