domingo, 5 de abril de 2015

FILOSOFIA XV - 37



EUROPA (1900 a 2014). Continuação.

Na teoria crítica de Max Horkheimer, o aspecto social da ciência tem relevância. [Do ponto de vista filosófico, criticar significa examinar os pressupostos de alguma coisa segundo critérios de valor (natureza axiológica da crítica)]. A ciência não deve ser pragmática e sim favorável à reflexão autônoma. A verificação prática de uma idéia e a sua verdade são coisas distintas. A teoria crítica visa a descobrir o conteúdo da práxis histórica. Os fatos sensíveis são pré-formados socialmente pelo caráter histórico do objeto cognoscido e do sujeito cognoscente. O positivismo se caracteriza por supor um tipo de razão subjetiva, formal e instrumental, cujo único critério de verdade é o seu valor operacional, ou seja, o seu papel na dominação do homem e da natureza [ou seja, a sua utilidade como diriam Sócrates e os pragmáticos]. A existência social atua como determinante da consciência. A teoria crítica diagnostica uma situação a ser superada sem anunciar uma visão de mundo. Max propõe aos homens que protestem contra a aceitação resignada da ordem totalitária. As relações entre os seres humanos, bem como, as relações entre os humanos e a natureza devem ser configuradas de maneira diversa da que se instaura na dominação. Entre as obras de Max contam-se: “Dialética do Esclarecimento” (em parceria com Adorno); “Materialismo, Metafísica e Moral”; “Crítica da Razão Instrumental”, “Teoria Tradicional e Teoria Crítica”.        

Herbert Marcuse (1898 a 1979), filósofo alemão, professor e conferencista radicado nos EUA desde 1934 para escapar do nazismo. Filiava-se à Escola de Frankfurt, que combina a crítica marxista do capitalismo com os novos conhecimentos oriundos da psicologia e da economia. Foi um dos “novos filósofos” da década de 1960 e esteve na moda principalmente nos meios da juventude universitária contestadora do status quo nos países capitalistas ocidentais. A “nova esquerda” se considerava independente em relação aos partidos comunistas e à orientação da União Soviética. No seu livro “Eros e a Civilização”, Herbert ensaiou uma síntese com as idéias de Freud e de Marx: o inconsciente erótico sofre a repressão do consciente racional (1955). Da mesma forma, a massa revolucionária estava oprimida política e economicamente pela burguesia. A massa ansiava por se libertar dessa opressão. Este anseio acontece tanto na sociedade capitalista como na sociedade comunista, porque os dois tipos são repressores. Herbert desenvolve essa tese nos seus livros “O Marxismo Soviético” e “O Homem Unidimensional”, publicados em 1958 e 1964, respectivamente. Em outro livro de larga repercussão intitulado “Idéias Sobre uma Teoria Crítica da Sociedade”, ele reúne ensaios de diferentes épocas: novas fontes para a fundamentação do materialismo histórico (1932), estudo sobre a autoridade e a família (1936) e sobre o conceito de negação na dialética (1966).

A crítica da economia política há de ser tomada como expressão científica de uma problemática que apreende toda a essência humana. O trabalho exteriorizado na economia burguesa implica alienação do homem, desvalorização da vida, distorção e perda da realidade humana. Além de produzir bens, o trabalho produz a si mesmo e ao trabalhador como mercadoria. O trabalhador se torna mercadoria tanto mais barata quanto mais mercadoria produz. No conceito de trabalho deve se conter uma relação humana e não uma relação econômica. No trabalho se realiza a universalidade tipicamente humana. O trabalho é a verdadeira expressão da liberdade humana.

[O trabalho pode ser o caminho da servidão. A vadiagem pode ser a expressão da liberdade humana. O dono do capital tem o direito de vadiar muitas horas todos os dias durante a semana e muitas semanas durante o ano. O empregado tem o direito de trabalhar muitas horas todos os dias com breve descanso semanal, sendo-lhe reservado poucos dias durante o ano para vadiar. A liberdade virá quando empregador e empregado tiverem o direito de vadiar em igual extensão].

O sentido do trabalho, diz Herbert, consiste em propiciar ao homem a propriedade de bens e torna-los o universo da sua auto-realização e da sua auto-afirmação. A propriedade privada é uma forma falsa de ter bens. O retorno do homem à sua propriedade verdadeira é o retorno à sua essência social. O homem se reconhece como ser social exatamente em seus bens e no trabalho que existe neles. O relacionamento do homem com o objeto do seu trabalho implica relacionamento com outros homens.

Somente a prática resolve as contradições teóricas. O humanismo levado às últimas conseqüências difere do idealismo e do materialismo. O homem é interiormente livre (autônomo) e exteriormente determinado pela autoridade terrena (heterônomo). A reprodução de toda a sociedade só é possível em meio a uma crise permanente. O homem se encontra colocado em um sistema de ordem terrena que não corresponde de modo algum às doutrinas fundamentais da cristandade. Toda interpretação metafísica da ordem terrena traz consigo a tendência à formalização. Herbert cita Calvino: “Não foi o amor ou a justiça divina e sim a majestade divina que atuou na criação do mundo e, desse modo, os desejos e impulsos, as esperanças e queixas dos homens devem orientar-se não pelo amor nem pela justiça e sim pela obediência incondicional e o culto humilde”. Em conexão com a doutrina protestante da Reforma, ocorre uma reorganização programática da família e considerável fortalecimento da autoridade do pater famílias cada vez mais planificada e artificialmente criada. As características que a ordem social vindoura apresentará exigirão reavaliar os valores humanos a partir da infância. Honrar, temer e venerar em lugar de amar se torna o elemento decisivo na relação entre pai e filho.

Herbert critica os conceitos de liberdade e autoridade formulados por Kant e Hegel, ambos encarando a sociedade como ordem universal de coação para a garantia da propriedade privada. A família tem na propriedade não somente sua realidade exterior como também a existência da sua personalidade substancial. A existência social dos homens é construída como ordem autoritária de dominação. A hereditariedade é um dos elementos mais eficazes à vinculação da família à ordem social que a protege. Por trás da camada de abertura conceptual ética e organicista sempre se percebe a irracionalidade pura da autoridade do Estado: uma autoridade que só pode exigir obediência, mas não pode mais fundamenta-la. O direito regula uma organização social que se baseia nos alicerces de defesa da pessoa, dos bens e da família. A família é o ponto central da existência humana, o elo entre a vida individual e a vida em comunidade. A produção material inscreve-se no reino da necessidade. O desenvolvimento das potencialidades humanas está acima desse reino e caracteriza uma liberdade superior. A estrutura material condiciona a superestrutura política e cultural da sociedade e das formas de consciência que lhe correspondem.

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