sábado, 11 de abril de 2015

FILOSOFIA XV - 40



EUROPA (1900 a 2014). Continuação.

Se a humanidade persistir na violência da lei do talião, a práxis política radical renovará o terror do passado, afirmava Theodor Adorno. Ao criticar a práxis brutal da sobrevivência, a obra de arte apresenta-se como antítese da sociedade. A obra de arte adquire prioridade epistemológica e autonomia. A música constitui a manifestação imediata do instinto humano e ao mesmo tempo a instância própria para o seu apaziguamento. Ela desperta a dança das deusas, ressoa da flauta encantada de Pã, brotando ao mesmo tempo da lira de Orfeu, em torno da qual se congregam saciadas as diversas formas do instinto humano. A música de entretenimento preenche os vazios do silêncio que se instalam entre as pessoas deformadas pelo medo, pelo cansaço e pela docilidade de escravos sem exigências. O programa musical ético de Platão tem a característica de uma purificação, de uma campanha de saneamento de estilo espartano. À mesma classe pertencem outros traços da pregação musical dos capuchinhos. O prazer do momento transforma-se em pretexto para desobrigar o ouvinte de pensar no todo, cuja exigência está incluída na audição adequada e justa; sem grande oposição, o ouvinte se converte em simples comprador e consumidor passivo.

Na opinião de Theodor, a nova etapa da consciência musical das massas se define pela negação e rejeição do prazer no próprio prazer. Assemelha-se tal fenômeno aos comportamentos que as pessoas soem manter em face do esporte ou da propaganda. A música atual caracteriza-se como mercadoria. Os bens da cultura fazem parte do mundo da mercadoria, são preparados para o mercado e são governados segundo os critérios do mercado. A modificação da função da música atinge os próprios fundamentos da relação entre arte e sociedade. No pólo oposto ao fetichismo na música opera-se uma regressão da audição. A audição regressiva relaciona-se com a produção através do mecanismo de difusão o que acontece precisamente mediante a propaganda. Na audição regressiva o anúncio publicitário assume caráter de coação. As vítimas da regressão auditiva agem como crianças: exigem o mesmo alimento que provaram anteriormente. Embora a audição regressiva não constitua sintoma de progresso na consciência da liberdade, é possível que inesperadamente a situação se modificasse se, um dia, a arte de mãos dadas com a sociedade, abandonasse a rotina do sempre igual.                  

Jean-Paul Sartre (1905 a 1980), escritor francês, ateu, filósofo filiado ao existencialismo, autor de romances como “A Náusea” e “Os Caminhos da Liberdade” e de algumas peças de teatro. A sua obra literária ilustrava o seu projeto filosófico consubstanciado no tratado “O Ser e o Nada” escrito em 1943. Após a segunda guerra mundial, ele aborda questões políticas em seus escritos, principalmente sobre o marxismo. “Para nós, franceses, o individualismo conservou a velha forma clássica da luta do indivíduo contra a sociedade e especialmente contra o Estado; isto não existe nos Estados Unidos”, dizia ele.

Na esfera filosófica, Jean-Paul procura as estruturas fundamentais da existência humana; salienta o choque entre a consciência e o mundo objetivo; considera a liberdade uma característica que melhor define o ser humano e que deve ser manifestada na atividade política. O homem escolhe o seu destino, sem vínculos com a tradição e com o passado. O cientista e o sacerdote tentam escapar dessa realidade racionalizando ou espiritualizando o mundo. Jean-Paul rejeita a concepção de liberdade sintonizada com necessidade, predominante na ciência teórica. A rebeldia dos adeptos do existencialismo contra o racionalismo advém do sentimento de opressão. A existência não pode ser deduzida de princípios lógicos gerais. {O ser humano existe como fenômeno biológico e não como produto de um princípio lógico}.

Hannah Arendt (1906 a 1975), alemã, nascida Johanna Arendt, no seio de família judia em Hanover, escritora, filósofa, cientista política, jornalista, professora e, no que tange à produção sociológica, integrante da tradição intelectual da república de Weimar. Estudou nas universidades de Marburgo, Heildelberg e Friburgo. Doutorou-se em Filosofia com a tese sobre o conceito de amor em Santo Agostinho. Durante os seus estudos na Alemanha, tornou-se amante de Heidegger, seu professor e mentor. Dele separou-se em decorrência da pressão social, pois ele era casado com outra mulher e tinha filhos. Alguns anos depois, Heiddeger aderiu à política nazista, motivo pelo qual Hannah rompeu as relações cordiais que ainda mantinha com ele. Casou duas vezes com maridos diferentes. Ela foi presa pela Gestapo em 1933, por três meses; então, sai da Alemanha e permanece em Paris até 1939. Presa novamente e enviada a um campo de concentração, foge e emigra para os EUA (1941). Dez anos depois, adquire a cidadania americana. Em seqüência, lecionou na Universidade de Chicago (1963) e na New School for Social Research de Nova Iorque (1967 a 1975).

No livro intitulado “Eichmann em Jerusalém” publicado em 1963, Hannah Arendt juntou cinco artigos que escreveu a serviço do jornal The New Yorker, quando cobriu o julgamento desse servidor do nazismo. Considerou o réu homem normal, burocrata típico, zeloso cumpridor de ordens por amor ao dever sem considerar o bem ou o mal. Nesse livro, ela denuncia a cumplicidade de lideranças judaicas com o nazismo. As organizações judaicas americanas quase a crucificaram. Faltou pouco para ela não perder a sua cátedra na Universidade.

[Norman G. Finkelstein, judeu americano nascido no Brooklin em 1953, professor de Teoria Política da Universidade de Nova Iorque, lançou o livro “A Indústria do Holocausto” em 2000, denunciando a elite judaica que, para oprimir o povo palestino, aproveita-se do mito em que, na América, foram transformadas as atrocidades nazistas. Essa elite judaica exagerou o número de sobreviventes dos campos de concentração com o propósito de extorquir bancos suíços, indústrias alemãs e países do leste europeu e, assim, obter vultosas indenizações e se apropriar de obras de arte e outros objetos valiosos apreendidos durante a guerra. Tal qual aconteceu com Hannah, organizações judaicas se mobilizaram para impedir a circulação do livro e para afastar Norman da cátedra universitária].

Hannah Arendt defendia a democracia direta como alternativa à democracia representativa. O pluralismo é a condição da vida política e possibilita um potencial de liberdade e de igualdade entre as pessoas. Importante é incluir o outro. Hannah apresenta originalidade na sua obra. Ela procede à crítica da filosofia de Sócrates, Platão, Aristóteles, Maquiavel, Montesquieu, Kant, Heidegger e Jaspers. Desafia os conceitos convencionais tanto da esquerda como da direita. No livro “Origens do Totalitarismo”, publicado em 1951, ela exibe o que há de comum entre a política de Hitler e a de Stalin, vendo nisto um novo fenômeno político: imposição à sociedade, mediante o terror, de uma abstrata ideologia. Buscando os fatores que podiam explicar a submissão ou o consenso das vítimas dos regimes totalitários e as atrocidades neles praticadas, incluindo a prisão e tortura nos campos de concentração, Hannah se deparou com os efeitos das mudanças sociais e econômicas que abalaram e desenraizaram as massas. “Nada pode se comparar à vida nos campos de concentração; nenhum relato consegue expô-la plenamente, pela simples razão de que o sobrevivente volta ao mundo dos vivos, o que o impede de acreditar inteiramente em suas experiências passadas”.

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