quinta-feira, 27 de novembro de 2014

FILOSOFIA XIV - 14



EUROPA (1800 a 1900). Continuação.

Na França, surgiram os pioneiros do realismo. Honoré de Balzac (1799 a 1850), na “Comédia Humana”, mostra de maneira franca a estupidez, a cobiça, a baixeza de homens e mulheres. Ele trazia à superfície os motivos ocultos da ação humana e revelava a corrupção existente sob a capa de respeitabilidade da sociedade burguesa. Sobre a sua produção literária Balzac dizia: “Minha obra tem sua geografia tal como sua genealogia e suas famílias, seus locais e suas coisas, suas pessoas e seus fatos; tem, também, sua heráldica, seus nobres e seus burgueses, seus artesãos e seus camponeses, seus políticos e seus dandies, seu exército; em suma, todo o seu mundo”. [Dandy era o apelido do homem bem vestido, bem apessoado, barbeado, perfumado, educado, gentil integrante das camadas média e alta da sociedade]. Gustave Flaubert (1821 a 1880) ao escrever “Madame Bovary” procede a uma análise da degradação humana. Ele expõe o conflito entre o sonho romântico e a dura realidade existencial. Guy de Maupassant (Henri René Albert) (1850 a 1893), francês, poeta, contista, romancista, jornalista, discípulo de Flaubert, nascido no seio de próspera família burguesa da Normandia. Morreu no manicômio vítima da sífilis que lhe causou perturbações mentais.  A sua primeira novela o celebrizou como obra-prima: “Bola de Sebo”. Suas obras realistas envolviam situações psicológicas e crítica social. A pequena burguesia era alvo das suas observações. O romance “Pierre et Jean” se destacou no gênero. Vários dos seus contos foram reunidos na coleção intitulada “La Maison Tellier”. Muito apreciados também, entre os seus 300 contos, os “Mademoiselle Fifi” e “O Horla”. De sua lavra foram convertidas em filmes as seguintes obras: “Bel Ami, o Sedutor” (nome do seu barco), “Une Femme Coquette” e “Masculin/Feminin”. Émile Zola (1840 a 1902) interessava-se pela natureza e pela exatidão científica. Alcoolismo, perversão, pobreza, doença, integram o cenário das suas obras, as quais refletem a miserável infância por ele vivida. Mostra simpatia pelo homem comum e paixão pela justiça social. Nutria esperança de uma sociedade melhor com o fortalecimento moral do homem. Zola defendeu vigorosa e publicamente o capitão Dreyfus no caso que agitou a Europa. O envolvimento de banqueiros judeus em escândalo financeiro serviu de pretexto aos monarquistas para atacar os republicanos. Acusaram o governo de corrupto e atribuíram parte da responsabilidade aos “judeus devoradores de dinheiro”. Em 1894, um judeu chamado Alfredo Dreyfus, capitão da artilharia, foi acusado por oficiais monarquistas de vender segredos militares à Alemanha. Ele foi julgado e condenado à prisão perpétua pela prática do crime de traição. Três anos depois, oficial superior do serviço secreto afirmou que eram falsos os documentos que alicerçaram a sentença condenatória. Movimento popular exigiu novo julgamento. O Ministério da Guerra se opôs. A nação francesa dividiu-se. Monarquistas, clérigos, militares, civis, operários, colocaram-se contra a revisão. Republicanos, socialistas, liberais, inclusive figuras de proa da literatura como Emile Zola e Anatole France, posicionaram-se a favor e tiveram êxito. O capitão foi libertado em 1899 e absolvido pela Corte Suprema em 1905. Reintegrado ao exército, ele foi promovido ao posto de major e condecorado com a insígnia da Legião de Honra. O movimento monarquista em França foi reduzido à insignificância depois desse episódio.      

Na literatura realista inglesa destacam-se: Charles Dickens (1812 a 1870), Thomas Hardy (1840 a 1928), George Bernard Shaw (1856 a 1950) e Herbert George Wells (1866 a 1946). O primeiro escritor retro mencionado (Dickens) mostra simpatia pela camada menos afortunada da sociedade. Entre outros livros, escreveu: “Oliver Twist” e “David Copperfield”. Ele relata os horrores no interior das fábricas, ataca os adiamentos (postergações) dos casos nos tribunais e critica o tratamento desumano dispensado às pessoas presas por dívidas. O segundo escritor retro citado (Hardy) apresentava o homem como um joguete do destino. O universo é belo, mas não amável. A batalha com a natureza é quase impossível de ser vencida. Deus, se existe, espreita com indiferença os habitantes do formigueiro humano. O homem é um grão de pó agarrado às rodas da máquina cósmica. O terceiro escritor citado (Shaw) irlandês, dramaturgo, crítico de arte, recebeu o prêmio Nobel de literatura (1925). Morava em Londres, escreveu mais de 50 peças para o teatro. “Pygmalion”, a mais popular, foi adaptada para a comédia musical “My Fair Lady”. Variavam os temas: prostituição, socialismo, exército da salvação, evolução criadora. Shaw aderiu ao socialismo e liderou a Sociedade Fabiana vinculada ao marxismo em nível doutrinário. Devotou-se à filosofia materialista, nutriu fé na ciência e desprezo pela sociedade burguesa. O escritor citado por último (Wells), professor, historiador, jornalista, seguiu linha semelhante ao realismo de Shaw: fé no socialismo e na ciência. Escreveu: “A Máquina do Tempo”, “O Homem Invisível”, “A Guerra dos Mundos”. Os seus livros contêm utopia e ficção científica. A fadiga e a pobreza seriam eliminadas como efeito do progresso tecnológico. A guerra e a superstição seriam banidas por uma educação adequada. A verdadeira tragédia humana está na escravidão dos indivíduos às instituições caducas e aos ideais pervertidos.
Robert Louis Stenvenson (1850 a 1894), escocês, poeta, ensaísta, novelista, romancista, deixou extensa obra, apesar de morrer cedo. Tornou-se mundialmente conhecido por seus livros narrando aventuras, dos quais, o mais famoso, é “A Ilha do Tesouro”. A novela “O Estranho Caso do Dr. Jekyll e Mr. Hyde”, também vulgarizada com o título “O Médico e o Monstro”, alcançou sucesso mundial ao relatar o desdobramento da personalidade de um médico que colocou a si mesmo como cobaia de experiência científica. Após ingerir um composto químico, o médico se transformava física e emocionalmente em outra pessoa má e horrorosa. Robert explora a dualidade da alma humana, a bondade e a maldade do ser humano em constante luta intestina.
Oscar Wilde (1854 a 1900), dandy irlandês, filho da nobreza, poeta, dramaturgo, romancista, novelista, criou o movimento estético, a arte pela arte, o belo como solução dos males da sociedade. Casado, dois filhos, vida social intensa e desafiadora na Inglaterra conservadora, caiu em desgraça ao ser descoberta a sua homossexualidade, considerada crime na época. Foi processado, condenado e preso. Esse episódio o inspirou a escrever dois grandes livros: “De Profundis” e “Balada do Cárcere de Reading”. Outras obras famosas, escritas antes da prisão, foram: “O Fantasma de Canterville”, “O Príncipe Feliz” e “O Retrato de Dorian Gray”. Esta última teve versões para o cinema. O personagem vende a alma ao diabo para permanecer sempre jovem e bonito. O seu retrato sofre modificações pela degradação da matéria e do espírito. Na sua produção literária e na sua dramaturgia anteriores à prisão, Oscar costumava ridicularizar a aristocracia inglesa e a burguesia estadunidense. Cumprida a pena, ele foi morar em Paris, onde morreu pobre e abandonado.

Na literatura realista alemã destacam-se: Henrik Ibsen (norueguês), Gerhart Hauptmann e Thomas Mann, nascidos em 1828, 1862 e 1875, respectivamente. O primeiro dos escritores retro citados (Ibsen), autodidata, leitor incansável, vivenciou a pobreza que o marcou para o resto da vida. Na sua obra nota-se a amarga revolta contra a tirania e a ignorância reinantes na sociedade. Suas peças mais conhecidas são: “Os Pilares da Sociedade” e o “O Inimigo do Povo”. Ele satiriza as convenções e as instituições sociais que se dizem respeitáveis. Há nos seus escritos desconfiança em relação aos governantes (classe dominante). Na opinião dele, a democracia entroniza pessoas sem princípios que tudo fazem para angariar votos que as perpetuem no poder. O segundo dos escritores citados (Hauptmann) dramaturgo, poeta, romancista, abordava as lutas dos trabalhadores contra a pobreza e o tratamento desumano dado pelos patrões. Escreveu: “Antes do Sol Nascer”, “Gente Solitária”, “Os Tecelões”, a comédia popular “A Peliça de Castor” e peças satíricas e simbólicas sobre conflito psicológico. Recebeu o prêmio Nobel de literatura (1912). O terceiro escritor mencionado (Mann), romancista, contista, ensaísta, distinguiu-se pelo volume dos detalhes significativos em “Buddenbrooks”, novela sobre a saga (ascensão e declínio) de quatro gerações de uma grande família de comerciantes de Lübeck. Por essa obra, ele recebeu o prêmio Nobel de literatura (1929). Entre outras obras, escreveu: “A Montanha Mágica”, “José e Seus Irmãos”, “Carlota em Weimar”, “Doutor Fausto”.       

Na literatura realista russa o destaque coube a Ivan Turgueniev (1818 a 1883), Feodor Dostoievski (1821 a 1881) e Leão Tolstoi (1828 a 1910). O primeiro (Turgueniev) passou parte da sua vida na França, capital da cultura européia. “Pais e Filhos”, obra na qual ele cunhou o termo niilista, trata da luta entre as gerações no seio da família. O herói da narrativa é niilista, convencido de que toda ordem social nada tem em si que valha preservar. O segundo escritor retro mencionado (Dostoievski) fazia resplandecer a sua tragédia pessoal nos seus textos. Condenado por atividades revolucionárias, ele foi exilado na Sibéria por quatro anos. Regressando, enfrentou a pobreza, obrigações familiares e ataques epiléticos. Como literato, descreveu os aspectos piores da vida, a angústia dos miseráveis, os atos ignominiosos provocados pelas emoções primitivas. Revelou-se um mestre da análise psicológica. Na opinião dele, a alma do homem só pode ser purificada pelo sofrimento. Os personagens dos seus livros eram trágicos. Suas mais conhecidas obras são: “Crime e Castigo” e “Os Irmãos Karamazov”. O terceiro escritor citado (Tolstoi) divide com Dostoievski a glória de ser o maior novelista russo. Anarquista e defensor da vida simples do camponês, o conde Tolstoi doa os seus bens à esposa, veste-se e alimenta-se como um campônio. Em “Guerra e Paz”, obra universalmente conhecida e apreciada, ele descreve aspectos da Rússia quando invadida por Napoleão. Mostra como os indivíduos ficam à mercê do destino quando se desencadeiam forças elementares poderosas. No seu livro “Ana Karenina”, igualmente famoso, ele mostra a tragédia que se esconde atrás da procura de satisfação do desejo egoísta. Levine, protagonista da história, encontra no amor místico pela humanidade o refúgio da dúvida e da vaidade. Em “Ressurreição”, Tolstoi condena instituições da sociedade civilizada, o egoísmo e a cobiça; valoriza o trabalho manual e as virtudes cristãs da pobreza, da humildade e da resignação.

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