EUROPA (1800
a 1900). Continuação.
Na esfera das idéias
também houve batalhas entre liberais e conservadores. A ordem foi mais exaltada do que a liberdade. O interesse coletivo prevaleceu sobre o individual. A razão
perdeu terreno para a fé, para a autoridade e para a tradição. Subjacente ao
pensamento dos filósofos havia sempre a concepção de deus e de alma. Para uns,
o atributo dominante de deus era a vontade;
para outros, a razão. Para uns, a
alma era inseparável do corpo; para outros, separável. A partir dessas crenças
eles construíam teorias realistas, teorias idealistas e teorias conciliatórias.
Por divergirem da versão bíblica sobre a origem do universo e do homem, sobre a
idéia de deus e da alma racional, sobre a vida natural e a vida espiritual,
cientistas, livres pensadores, filósofos, atraíram a fúria de católicos e
protestantes. Descartes e outros filósofos lançaram mão de subterfúgios para se
manterem fiéis às suas religiões, porém, o ensino das suas idéias foi vedado
nas escolas católicas e protestantes.
Os horrores praticados
durante a revolução francesa motivaram a reação conservadora. Havia a tendência
dos teóricos em acompanhar a maré política e de aderir ao romantismo inspirado
por Rousseau (emoção acima da razão). O idealismo romântico na Alemanha reflete
bem a reação: conhecimento intuitivo e
instintivo complementa o conhecimento
racional. Atribui significado espiritual ao universo. O bem do grupo deve
prevalecer sobre o bem do indivíduo. Sociedade e Estado resultaram de uma
evolução natural e não da criação artificial do homem para seu proveito
próprio. O indivíduo não pode reclamar uma esfera inviolável de direitos acima
da jurisdição da sociedade. O Estado Natural e o pacto social originário jamais
existiram. A verdadeira liberdade consiste no respeito à lei e à tradição.
As ciências biológicas e
médicas tiveram enorme progresso. Comprovou-se a teoria da evolução orgânica
que teve como predecessores: Anaximandro, Holbach, Goethe, Buffon e Lineu. O
biólogo francês Jean Lamarck (1744
a 1829) foi o primeiro a oferecer hipótese sistemática
da evolução orgânica. O princípio essencial dessa evolução, segundo Lamarck, é
o da herança dos caracteres adquiridos. Submetido à mudança no meio ambiente, o
animal adquire novos hábitos que, por sua vez, refletem-se na sua estrutura. A
mudança operada é transmitida à descendência. Depois de algumas gerações,
resulta uma nova espécie animal. Charles Darwin (1809 a 1882), filho de
médico de aldeia, abandonou o estudo de medicina para se dedicar à carreira
eclesiástica. Dedicou-se mais ao estudo de História Natural. Percorreu o mundo
como naturalista no navio Beagle
fretado para expedição científica. Observou diretamente várias espécies de
animais que viviam nas ilhas e nos continentes durante os cinco anos que durou
a viagem. Ao regressar, leu o “Ensaio Sobre a População” livro de autoria de
Malthus e se impressionou com a assertiva de que no mundo nascem mais
indivíduos do que aqueles que podem sobreviver; que se verifica uma luta pela subsistência
na qual perecem os mais fracos; que a população (lato sensu) cresce em escala geométrica e a produção de alimentos
cresce em escala aritmética. Sobre a tal luta nos reinos animal e vegetal, Darwin
menciona a dificuldade no aumento artificial de alimentos e no controle dos
casamentos. Nessa luta, a vitória é do organismo mais bem adaptado ao meio que
o cerca.
Decorridos vinte anos de
estudos e pesquisas, Darwin publica a “Origem das Espécies” (1859). O fulcro da
obra é a idéia da seleção natural. Os ancestrais de cada espécie geram um
número de descendentes maior do que o número daqueles que podem sobreviver.
Entre os descendentes trava-se uma luta por alimento, abrigo e outras condições
necessárias à vida. Certos indivíduos levam vantagem graças ao fator variação. Não existem dois descendentes
exatamente iguais. Alguns nascem fortes e outros fracos. Alguns têm chifres e
garras maiores do que os outros. [No humano, chifres e garras são metáforas].
Alguns têm coloração melhor do que outros para enganar os inimigos. Os
favorecidos exemplares da espécie saem vencedores na luta pela existência. Os
fracos são eliminados antes de se reproduzir. [A teoria científica da
sobrevivência do mais apto aplicada à sociedade justifica a competição selvagem
entre os humanos, a limpeza étnica, os governos autocráticos, o domínio da
nação mais forte sobre a mais fraca. Certamente, Darwin, um liberal, não
concordaria com esse desvirtuamento da sua teoria]. Na obra intitulada “A
Descendência do Homem”, Darwin tenta provar a existência de um ancestral
simiesco da espécie humana (1871). Causou alvoroço nos meios civis e
eclesiásticos. A nova teoria – melhor dizendo, a mesma teoria de Anaximandro,
mas agora com novo enfoque e com riqueza de detalhes – contrariava a versão
bíblica (Gênesis). Na opinião dos críticos, a teoria ofendia a dignidade do
homem. [A hipótese de os macacos ficarem ofendidos não foi considerada]. O humano,
ser da natureza pertencente ao gênero animal, também está sujeito ao processo
evolutivo. Os caracteres herdados não são de importância fundamental na
evolução. A variação e a seleção natural são mais importantes.
Theodor Schwann (1810 a 1882), biólogo
alemão, mostrou que, além das plantas, os animais também se compõem de células
{isto equivale ao impacto da teoria atômica em Física}. Ressalvadas as formas
mais simples, todos os seres vivos crescem e amadurecem pela divisão e
multiplicação dessas diminutas unidades estruturais. Verificou-se, ainda, que
todas as células se compõem de uma combinação de matéria essencialmente
idêntica. Hugo von Mohl (1805
a 1872) deu o nome de protoplasma a essa matéria. A Citologia
(estudo das células) surgiu como nova ciência derivada desses trabalhos. Karl
Ernst von Baer (1792 a
1876), cientista russo + alemão, considerado o pai da Embriologia, constatou a existência de uma lei natural que batizou
de lei da recapitulação. Durante o
período embrionário cada indivíduo recapitula ou reproduz os vários estágios
importantes da história da espécie a que pertence.
Na área da saúde houve
grande progresso. A vacina contra varíola foi descoberta (1796). O éter
passa a ser utilizado como anestésico geral, o que serviu de impulso para a
busca de anestésicos que permitissem maior tempo para o cirurgião operar (1842).
Empreendem-se pesquisas para aliviar a dor física. Os casos de infecção foram
reduzidos por uma descoberta de Semmelweiss, médico húngaro: lavar as mãos em
soluções antissépticas. O médico Joseph Lister estendeu, com êxito, a prática
antisséptica a todo o campo cirúrgico (1865). Claude Bernard (1813 a 1878) funda a Fisiologia moderna e explica o
funcionamento do coração e a circulação do sangue. Louis Pasteur, químico
francês, ao se opor à teoria da geração espontânea, lança as bases da Bacteriologia (1865). Acreditava-se que
a bactéria e outros organismos minúsculos nasciam espontaneamente da água ou da
decomposição da matéria vegetal e animal. Pasteur concebeu a lei da biogênese: toda vida vem de uma vida preexistente.
Qualquer forma de vida provém de seres vivos exclusivamente. Ele descobriu que
as moléstias são produzidas por germes. Por ser químico, Pasteur não foi levado
a sério pela comunidade médica. A corporação dos médicos considerava os germes
como efeito e não como causa das doenças. Desafiado pela classe médica, Pasteur
demonstrou a verdade da sua teoria ao inocular germes em parcela do gado que
serviu de cobaia. Além disto, o químico estabeleceu, com sucesso, um método de
tratamento da hidrofobia (1885). Robert Koch, médico da Prússia Oriental,
descobriu o bacilo da tuberculose e do cólera asiático (1882). Foram isolados
os germes de outras doenças (difteria, peste bubônica, tétano, moléstia do
sono) e produzidos soros e antitoxinas para combatê-los. Descobriu-se que a
malária e a febre amarela são propagadas por mosquitos. Progrediu-se no
tratamento da sífilis.
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