domingo, 23 de novembro de 2014

FILOSOFIA XIV - 12



O trabalho científico e filosófico da era moderna, cujo impulso se deve à revolução francesa e à revolução industrial, afetou a religião cristã dominante na civilização ocidental. A concepção de um universo resultante de um processo evolutivo choca-se com o dogma religioso de um universo criado por deus em certa época e de modo definitivo, habitado por um casal humano original. Ante a concepção mecanicista do universo (deo ex machina) e os postulados da ciência de que os impulsos humanos são conseqüências da herança social e biológica, ficou abalada a idéia de deus e de alma posta pela religião. Ainda podem ser arrolados como fatores do enfraquecimento da religião: (1) os efeitos da revolução industrial (busca por conforto e sucesso financeiro, divórcio entre economia e moral, objetividade para suprir necessidades materiais); (2) nacionalismo; (3) repúdio ao clero; (4) desprezo à religião por obnubilar a mente humana (ópio do povo); (5) socialismo.

As teorias de Lamarck e Darwin serviram de bandeira para seus seguidores desancarem os religiosos e ridicularizarem a versão bíblica da criação do mundo e do homem. Disto resultou a deserção de muitas pessoas das fileiras do exército cristão e judeu. As afirmações de Spencer e Huxley de que as instituições, as idéias morais e as religiões resultaram naturalmente da luta do homem para sobreviver e se adaptar ao meio assombrou os cristãos e os judeus. O antropólogo James Frazer publica, em 1890, “O Ramo de Ouro”, relatando usos, costumes, cerimônias e superstições primitivas. Revela a existência, entre povos antigos, do mito do dilúvio, das idéias de expiação por algum salvador, das lendas de morte e ressurreição de uma divindade, a demonstrar que a estrutura das religiões atuais foi herdada de culturas antigas e resultou do processo social evolutivo. Ao se equiparar o universo à máquina, nos termos propostos por Haeckel, a crença em deus e na alma se torna inútil e desnecessária. O automatismo dessa máquina dispensa qualquer divindade para guiá-la. O espírito humano é função da matéria e está determinado por leis físicas, exclusivamente. O altruísmo é forma disfarçada de egoísmo. A consciência é a soma total das crenças e preconceitos inoculados no indivíduo pela sociedade.

David Friedrich Strauss, professor da Universidade de Tübingen, expõe em seu livro “Vida de Jesus”, publicado em 1835, a biografia do profeta como figura humana. O autor nega a divindade e os milagres de Jesus e lança ao descrédito a inspiração divina das escrituras. William Robertson Smith, professor em Cambridge, publica, em 1885, o livro “Religião dos Semitas”, no bojo do qual mostra a falta de originalidade dos hebreus (israelitas + judeus) cujas crenças eram comuns à maior parte dos povos semitas. [Os hebreus não eram os únicos semitas]. Comenta contradições e inexatidões de diversas partes do Antigo Testamento e menciona vários elementos da teologia cristã de origem babilônica e persa. O golpe desferido pela inteligência dos cientistas e filósofos foi mortal para quem acreditava em uma Bíblia infalível e de autoridade espiritual suprema. Para safar-se da enrascada, a igreja defendeu a interpretação alegórica da Bíblia para substituir a interpretação literal e histórica.

Perante a ciência e a filosofia, os cristãos assumiram duas posições básicas: (1) A conservadora ou fundamentalista que não admite conciliação alguma entre religião e ciência. A Bíblia há de ser interpretada literalmente e a tradição há de ser respeitada. (2) A moderna bipartida em conciliadora e nominalista. (2.1) A moderna conciliadora aceita os resultados da ciência e procura manter a religião em harmonia com os novos conhecimentos. A teoria da evolução apenas enaltece a criação divina. Religião e ciência pertencem a campos distintos. O papa Leão XIII, que esteve no comando da igreja católica de 1878 a 1903, não via real conflito entre razão e fé. Incentivou o estudo da história da igreja. Franqueou os seus arquivos aos eruditos. Instalou equipamentos de astronomia no Vaticano onde reuniu um grupo de astrônomos. Proclamou filósofo oficial da igreja católica o aristotélico Tomás de Aquino. (2.2) A moderna nominalista desiste de conciliar a religião com a vida moderna. Os cristãos desse grupo freqüentam a igreja e seguem os rituais formalmente, sem uma crença sincera, profunda e fervorosa. Pertencem a esse grupo os cristãos estéticos: permanecem na religião porque admiram as suas características artísticas e não por sua teologia.           

A arte clássica reviveu no tempo de Napoleão. Ele adotou a águia romana como um dos seus emblemas, nomeou rei de Roma o seu filho, erigiu colunas, templos e arco do triunfo em Paris. Essa conduta do governante refletiu-se nas artes. A influência da revolução francesa e da revolução industrial no espírito e nas obras dos artistas foi o denominador comum das artes desse período. O classicismo foi superado pelo romantismo. Para os românticos, a música não era só beleza objetiva e sim um meio de exprimir os impulsos íntimos do ser humano. Insuficiente agradar; era preciso dizer alguma coisa, despertar uma vibração simpática no ouvinte. O nacionalismo se expressa na música alemã: a ópera desvencilha-se das delicadezas artificiais e lança mão do poder dramático, emprega motivos germânicos, exprime-se numa atmosfera heróica visando a inspirar o amor pelo país. Ludwig Von Beethoven (1770 a 1827) compõe com liberdade, combinando o espírito romântico e a disciplina do classicismo.

Johann Wolfgang Von Goethe (1749 a 1832) poeta, cientista, advogado, estadista alemão, nasceu no seio de abastada família em Frankfurt Am Main. Formou-se em direito pela Universidade de Strassburg e exerceu a profissão jurídica. Carlos Augusto, grão-duque de Weimar, admite-o como conselheiro político e econômico. Nesta cidade, mora em requintada casa para os padrões da época. Da sua produção científica resultaram: “Ensaio de História Natural e de Morfologia”, “Ensaio Sobre a Metamorfose das Plantas”, “Teoria das Cores”. Na opinião de Goethe, frequentemente os problemas da ciência estão ligados à carreira: uma só descoberta pode tornar um homem famoso e lhe garantir venturoso futuro. [Tentação que pode levar o cientista a cometer fraudes]. Todo fenômeno observado pela primeira vez é uma descoberta. Toda descoberta é uma propriedade. Mexa-se na propriedade de um homem e logo as suas paixões vêm à tona. Da sua produção literária resultaram, entre outras obras, as seguintes: “Os Sofrimentos do Jovem Wertker”, “O Rei de Tule”, “Ifigênia em Táuride”, “Egmont”, “Torquato Tasso”, “Os Anos de Aprendizagem de Wilhelm Meister”, “Poesia e Verdade” e “Fausto”, esta última considerada a sua obra-prima, na qual ele gastou quase 60 anos devido a algumas interrupções. Movido pela sede de saber e de gozar, Fausto celebra um pacto com Mefistófeles (diabo). Seduz a jovem Margarida e depois a abandona. Em duelo, mata o irmão da moça. Desesperada, a jovem mata o filho que gerou. Condenada pelo crime, mas arrependida, ela morre nos braços de Fausto. A segunda parte versa a aposta entre deus, que diz que Fausto se salvará, e o diabo, que diz o contrário. Deus vence a aposta. Fausto é salvo graças ao seu idealismo.

Madame de Staël (1766 a 1817), nascida Anne-Louise Germain Necker, em Paris, filha de rico banqueiro suíço, baronesa de Staël-Holstein em virtude do casamento com o barão do mesmo nome, escreveu os romances: “Sophie”, “Jane Gray”, “Delphine” e “Corinne”, em 1786, 1790, 1802 e 1807, respectivamente. Mantinha um salão literário e político em Paris desde 1796. Depois de separar-se do marido teve diversos casos amorosos. Contemporânea da revolução francesa e da restauração da dinastia Bourbon, filiava-se ao iluminismo e se posicionou contra o governo de Napoleão. Juntamente com Benjamin Constant e outros políticos e intelectuais, ela integrava o núcleo de resistência liberal. Por causa dessa militância política, Napoleão a expulsou de Paris em 1803. Os livros “Da Influência das Paixões sobre a Felicidade dos Indivíduos e das Nações” e “Da Literatura Considerada nas suas Relações com as Instituições Sociais”, escritos respectivamente em 1796 e 1800, refletem sua teoria literária e seu pensamento político e sociológico.

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