sexta-feira, 21 de março de 2014

PILULAS


Hipocrisia. A Ucrânia, país que faz fronteira com a Rússia e que integrava a União Soviética, está às voltas com problemas internos. Houve golpe de Estado que derrubou o governo legítimo. A província da Criméia não assimilou o golpe. Por decisão da sua assembléia legislativa (parlamento) e do povo (referendo) resolveu desligar-se da Ucrânia, declarar-se Estado independente e se vincular à federação russa. O governo russo apoiou a decisão, aceitou o ingresso da Criméia na federação e colocou forças armadas à disposição da província rebelde como garantia contra os golpistas. O governo americano entendeu ilegítimas a conduta do povo e dos parlamentares da Criméia e a atitude do governo russo, por violarem a soberania da Ucrânia e o direito internacional. O presidente Barack Obama recuou do inicial propósito de uma intervenção armada no quintal da Rússia e propõe outro tipo de represália. Apelidamos de “quintal” a zona contígua e contínua de influência de um Estado poderoso e centralizador, e de “satélites” os países nela situados. Os EUA não admitem interferência no seu quintal, segundo a doutrina do presidente Monroe: “a América para os americanos”. No entanto, não costumam respeitar o quintal alheio, salvo quando o quintal é de outra potência como a Rússia ou a China. O governo americano considera legítimo apenas o que atende aos seus interesses: democracia é coisa interna dos EUA válida apenas para os países que estiverem de acordo com os propósitos americanos, caso contrário, valem a ditadura e os golpes de Estado que lhes forem favoráveis. Acovardada, parcela da comunidade internacional finge que não percebe a hipocrisia; outra parcela, movida por interesses econômico e estratégico, apóia o governo dos EUA e se dispõe a excluir a Rússia do grupo dos grandes países. Os EUA sentem-se no exclusivo “direito” de invadir e espoliar qualquer região do planeta, mas negam o mesmo “direito” a qualquer outro país. O governo americano lança bombas atômicas no Japão; invade a Coréia, o Vietnã, o Afeganistão, o Iraque, praticando atrocidades e genocídio; patrocina a deposição de governos legítimos na América Latina e os substitui por ditaduras; sem o devido processo legal, mantém presas em suas bases e sob tortura pessoas acusadas de terrorismo; menospreza a cultura de outros povos, principalmente as culturas de fundo religioso como a islâmica, a budista e a hinduísta; ergue barreiras protecionistas contra produtos estrangeiros e reclama contra outros países que fazem o mesmo; decreta embargo econômico aos países que ousam desafia-lo; recusa-se a assinar o protocolo de Kyoto na defesa do seu “direito” de poluir o planeta, colocando o seu interesse econômico acima de uma saudável qualidade de vida para a humanidade. Após o final da segunda guerra mundial (1945), Rússia e EUA disputaram o domínio sobre as diferentes nações do planeta. A soberania nacional não foi empecilho para invasões. Após a implosão do império soviético nos anos 80, os EUA ficaram senhores da situação internacional. O presidente Ronald Reagan impõe a doutrina da globalização: nova ordem mundial que esvazia o conceito de soberania nacional. Os EUA, entretanto, continuaram ciosos da sua soberania, do seu território, do seu patrimônio, do seu modo de vida. Ao governo americano falta autoridade moral para julgar a ação do governo russo, do governo chinês ou de qualquer outro governo.

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