Europa (500 a
1000).
Com a derrocada do império romano
do ocidente no século V (401 a
500), surge paulatinamente nova civilização na Europa fundada na herança
cultural da Grécia e de Roma, capitaneada pelo cristianismo em quase todos os
seus aspectos. Ao mesmo tempo e paralelamente à civilização européia surgem e
se desenvolvem na Ásia a civilização bizantina (500 a 1500) e a civilização
sarracena (600 a
1300). A primeira fase da civilização européia caracterizou-se pelo domínio
político dos bárbaros (germanos, ostrogodos, visigodos, vândalos, lombardos,
francos) e pelo domínio espiritual da igreja cristã. O território que estava
sob a jurisdição romana ficou sob a jurisdição bárbara. Vários reinos se
constituíram. Mesclaram-se usos e costumes de diferentes culturas, porém a
característica marcante da nova civilização foi o cristianismo. Em tempo
relativamente curto os bárbaros aderiram à fé cristã. O domínio cristão foi
facilitado: (1) pela conversão dos chefes bárbaros; (2) pela credulidade e
ignorância da massa popular; (3) pelo travamento da razão. A fé cristã incluía
ascetismo mórbido, desprezo ao mundo material e esperança de vida melhor em um
mundo espiritual.
A península ibérica ficou sob
domínio visigodo e sarraceno; o sul da Itália sob controle de Bizâncio; a
Inglaterra dominada pelos anglos, celtas, dinamarqueses e saxões. A maior parte
da Europa ocidental esteve sob o mais influente e duradouro governo dos
francos. O latim era o idioma comum e geral. A população decresceu. À vista disto,
as mulheres foram proibidas de entrar para o convento antes dos 40 anos de
idade. O propósito da lei era o de incentivar a procriação e frear o assustador
declive demográfico. A economia retrocedeu ao escambo e ao ruralismo diante do
isolamento europeu decorrente do controle do Mediterrâneo pelos mouros.
Decaíram rapidamente o comércio, a indústria e a lavoura. A cidade de Marselha
(sul da França) exemplificou esse estado de coisas: ruas tomadas pelo mato e o
porto parado por 200 anos. O dinheiro sumiu de circulação. O banditismo
aumentou. O estado das estradas era péssimo. Revestiram-se de poderes feudais:
(1) os condes beneficiados com imunidades e isenções concedidas pelos reis
merovíngios e carlovíngios; (2) os donatários das terras doadas por esses reis.
Em conseqüência, surgiram duas classes no campo: a dos aristocratas rurais e a
dos servos da gleba.
Ao cair o último imperador romano
do ocidente, o comandante bárbaro de nome Odoacro se declara rei e governa a
Itália. Sobrevém a invasão dos ostrogodos liderada por Teodorico, que reina por
33 anos na Itália (493 a
526). Este bárbaro favoreceu a agricultura e o comércio, mas não conseguiu
abolir a servidão da massa popular e a concentração da riqueza nas mãos dos
latifundiários. Esse rei consertou e construiu edifícios públicos e estradas,
patrocinou o ensino e estimulou a tolerância em matéria de religião. De
Constantinopla, o imperador Justiniano trava guerra com os ostrogodos e os
vence (552). Logo depois, os lombardos invadem a Itália (568). Duques a
governam até o século VIII (701
a 800), quando Carlos Magno a conquista. A Gália
(França) foi o mais forte estado ocidental no começo da civilização européia.
Clovis torna-se rei da tribo dos francos e inicia guerra de conquista (481).
Domina o território da Gália e parte da Germânia (Alemanha), converte-se ao
cristianismo, obtém apoio do clero e abre caminho para alianças dos seus
sucessores com os papas. Clóvis descendia de Meroveu, patriarca da família. Daí
o nome da dinastia por ele fundada: merovíngia.
Essa dinastia ocupou o trono do reino franco de 491 a 751. A linhagem real se
estiola: os reis francos delegam poderes e sucumbem à luxúria e à indolência (640 a 750). Os delegados do
rei se fortaleceram na autonomia que lhes foi concedida. O mais agressivo
desses delegados, Carlos Martel, considerado o segundo fundador do reino dos
francos, defendeu-o contra os mouros e sufocou rebelião interna, mas não
reivindicou o título de rei. O seu filho, Pepino, “O Breve”, inaugurou nova
dinastia em 751, que ficou conhecida como carlovíngia
em homenagem ao seu maior personagem: Carlos Magno (Carolus Magnus) que reinou de 771 a 814 e conquistou a parte central e
setentrional da Itália e a maior parte da Europa central.
Carlos Magno extinguiu o cargo de
prefeito do paço e os ducados tribais; designou pessoas da sua confiança para
exercerem os poderes locais com o título de condes;
nomeou mensageiros reais para prevenir abusos das autoridades nos condados (missi dominici); modificou o sistema de
justiça privada e concedeu poderes aos condes para intimarem pessoas a
comparecer perante os tribunais; concedeu maior poder aos magistrados no que
tange ao processo judicial; estabeleceu o sistema romano de inquirição sob
juramento para elucidar crimes. Carlos Magno auxiliou o papa Leão III, que fora
exilado, a retornar à Itália e a ocupar o trono da igreja. Em retribuição,
durante missa na igreja de São Pedro, no natal do ano 800, o papa o coroa
Imperador: “Augusto coroado por Deus,
grande e pacífico imperador dos romanos” saudaram-no os fiéis presentes à
igreja. Apanhado de surpresa quando se ajoelhara para orar durante a missa,
Carlos Magno ficou embaraçado {versão discutível}, pois não queria ficar
devendo ao papa a sua coroação como imperador, posição que já sustentava de
fato no ocidente. Ele pretendia ressuscitar a grandeza de Roma. {Os bárbaros tinham obsessão pelo império de César}. Apesar da
coroação pelo papa, Carlos Magno não admitiu limites eclesiásticos à sua
soberania; legislava amplamente em assuntos religiosos, fiscalizava a nomeação
para cargos na igreja, instruía bispos e padres quanto à moral e aos sermões.
Quiçá por ser analfabeto, Carlos Magno deu grande importância à educação e à
cultura, reunindo em sua corte as mais primorosas e cultas inteligências da sua
época. Após a sua coroação e a instalação de um novo império no ocidente
paralelo ao império romano do oriente {ao menos formalmente, a jurisdição de
Constantinopla ainda abrangia a Europa}, o cristianismo dividiu-se em latino e
bizantino. Puxando a brasa para a sua sardinha, citando a coroação de Carlos
Magno e se intitulando representantes de deus, os papas se declaravam os
verdadeiros fundadores do novo império e afirmavam a primazia do seu poder
espiritual sobre o poder secular dos reis. {A igreja tinha o divino direito de
produzir ilusão; o crente tinha o secular direito de produzir alimento}.
Segundo a tradição dos francos, o
território do reino devia ser partilhado entre os filhos do monarca falecido.
Com a morte de Carlos Magno, a unidade imperial tão cara à igreja cristã ficou
estilhaçada com a divisão do território entre os herdeiros (814).
O povo germano exerceu
considerável influência na civilização européia. Ora pacificamente, ora pelo
uso da força, os germanos foram ocupando a Europa com seus costumes e leis.
Parte deles veio com os comandantes romanos que os admitiam no exército e na
guarda pessoal dos imperadores. Milhares deles foram colocados nas grandes
propriedades como servos; outros milhares ingressaram no exército. Sentindo-se
tão fortes quanto os romanos, os bárbaros começaram a dominar a Itália (378),
Gália (410), Roma (455 e 476) e finalmente todo o império romano do ocidente.
Dos germanos, a nova civilização herdou: (1) a concepção da lei como expressão
dos costumes e não como imposição da vontade do soberano; (2) a lei como proteção
pessoal que acompanha o indivíduo por onde ele for (jus sanguinis), diferente da concepção romana segundo a qual o
vigor da lei se limita ao território (jus
soli); (3) relação entre governantes e governados em termos contratuais: ao
governante cabe a obrigação de proteger; ao governado cabe a obrigação de
produzir; (4) relação honrosa entre suserano e vassalo (comitatus): mediante juramento de honra e lealdade, os guerreiros
se obrigavam a servir e a lutar pelo chefe; (5) o ordálio como prova no processo
judicial; (6) os juramentos nos tribunais; (7) a idealização da virtude
feminina; (8) a importância da fidelidade conjugal, o que influiu na
glorificação da união conjugal como sacramento da igreja cristã medieval.
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