quarta-feira, 30 de novembro de 2011

MAGISTRATURA

XIII

Quando as controvérsias não se resolvem diretamente de modo pacífico e extrajudicial, com ou sem auxílio de árbitros, os juízes e tribunais são chamados a prestar tutela jurisdicional conciliando as partes ou, na ausência de acordo, ditando a solução mediante sentença.
A questão constitucional debatida no processo mencionado no capítulo anterior versa a extensão e os limites da imunidade parlamentar em face da cidadania, da dignidade da pessoa humana, do valor social do trabalho e dos direitos fundamentais da pessoa natural (integridade moral e liberdade do pensamento e de profissão). Abarca o problema da finalidade do mandato político: (i) se a imunidade inclui fins contrários ao interesse público, à utilidade pública, à necessidade pública, à verdade, à honestidade e à decência nos negócios públicos; (ii) se ofensas e repúdio ao eleitor são compatíveis com os fins do mandato; (iii) se o repúdio a pessoas está entre os fins essenciais do mandato que a imunidade visa a proteger.
A referida ação tomada como exemplo vai além do interesse das partes e da fronteira estadual; interessa às populações de todos os municípios do território nacional, aos profissionais da imprensa, aos vereadores, deputados e senadores. Isto mais acentua a estreiteza de visão dos assessores que elaboraram os despachos. Há burla ao devido processo legal quando questões judiciais são decididas por assessores e não por magistrados. Formal ou informal, delegação do poder jurisdicional a assessores frauda o direito do povo de receber a tutela jurisdicional do juiz natural (CR 5º, XXXVII + LIII).
A Constituição garante a apreciação judicial de qualquer lesão a direito ainda que produzida por titular de imunidades. A responsabilidade do parlamentar pode ser apurada de modo independente no processo judicial e na casa legislativa a que pertence. O tribunal adotará, no caso concreto, a solução razoável no confronto entre o direito fundamental da pessoa e a prerrogativa do parlamentar. A inviolabilidade não socorre o parlamentar nos casos de excesso de poder, de desvio de finalidade, de condutas incompatíveis com o decoro (CR 55). Neste sentido, a lição do professor Darcy Azambuja sobre o “cuidado de evitar que, à sombra da imunidade parlamentar, sob o pretexto da liberdade da palavra, os concidadãos sejam injuriados, difamados e crimes sejam praticados”. (Introdução à Ciência Política. Porto Alegre, Globo, 1969, p. 190).
O fato devidamente provado e incontroverso funciona como pressuposto da solução jurídica. No recurso extraordinário, o tribunal tomará posição sobre o limite da imunidade, tendo em vista que ao parlamentar movido por interesse privado sem nexo com o interesse público, mesmo durante sessão da casa legislativa, é vedado: (i) ofender impunemente as pessoas de bem; (ii) servir-se do mandato para satisfazer sentimento pessoal de vingança contra qualquer pessoa.
Entre o decoro e a desfaçatez, entre a honestidade e a safadeza, está a fronteira moral que separa a inviolabilidade da responsabilidade.
Ofensas recíprocas entre parlamentares não é o mesmo que ofensas de um grupo de parlamentares contra pessoa ausente e sem chance de defesa. Moção de repúdio sem justa causa tipifica constrangimento ilícito. Moção de repúdio a pessoas é ato estranho à competência de legislar e por isso mesmo fora do alcance da imunidade parlamentar. Moção de repúdio a cidadão pela assembléia de representantes do povo assemelha-se à pena de ostracismo. Decidida fora do devido processo, sem prévia cominação legal, caracteriza abuso de poder e colide com preceitos estruturantes do Estado Democrático de Direito.

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