domingo, 20 de novembro de 2011

MAGISTRATURA

VIII
Bandidos ganham a liberdade com estribo em decisões do Supremo Tribunal Federal fundadas na letra da Constituição e desprovidas de visão ampla dos valores acalentados pela nação brasileira. A população sofre as nefastas conseqüências, como atesta a crônica policial.
A prisão da pessoa está condicionada ao devido processo jurídico, garantia herdada do direito britânico (“Due process of Law”). O caráter político e jurídico desse instituto pouco tem a ver com o trânsito em julgado da sentença. No final do processo está a sentença. O trânsito em julgado ocorre em momento posterior, pela exaustão do tempo estabelecido em lei para torná-la irrecorrível. O devido processo compreende a seqüência de procedimentos previstos na ordem jurídica. De acordo com a Constituição, ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal. No âmbito do direito brasileiro há processo legislativo, administrativo e judicial. Na esfera judicial penal, o processo tem por objetivo apurar a materialidade dos delitos e a responsabilidade dos seus autores. Com o recebimento da petição inicial (denúncia ou queixa) pelo juiz, instaura-se o processo. O réu é citado e interrogado e se lhe abre ensejo ao contraditório e à ampla defesa (argumentação e produção de prova). Encerrados a instrução processual e os debates, sobrevém a sentença.
Até essa fase processual, o acusado tem a seu favor a presunção de inocência. A partir da sentença, a presunção cede passo à certeza da inocência (sentença absolutória) ou à certeza da culpa (sentença condenatória), certezas provisórias enquanto não confirmadas ou reformadas pela superior instância em segundo ou terceiro grau de jurisdição conforme os recursos disponíveis na legislação e utilizados pelas partes. Certezas provisórias são apanágios das ciências naturais e culturais, pois toda verdade científica reveste caráter provisório. Na taxonomia das ciências culturais se inclui o direito. A certeza e a verdade, apesar de provisórias, resultam de um racional e metódico processo de conhecimento característico das ciências, enquanto a presunção resulta da mera conjectura do espírito humano.
O imoral dispositivo da Constituição que exige o trânsito em julgado da sentença condenatória para que o réu seja considerado culpado atende a dois objetivos: (i) proteger da prisão os criminosos do colarinho branco e (ii) facilitar a vida de políticos corruptos. De cambulhada, os demais criminosos se beneficiam. Se o delinqüente não pode ser considerado culpado, não pode ser preso. A sentença perdeu força jurisdicional. O papel do juiz ficou limitado a de mero instrutor. Correto estava o código de processo penal quando, confiando na autoridade do juiz, na atuação do ministério público e do advogado, determinava a expedição do mandado de prisão após a sentença condenatória, sem esperar o trânsito em julgado que pode demorar décadas para ocorrer. Com a sentença condenatória proferida no devido processo jurídico, o interesse individual do criminoso cede passo ao interesse geral da sociedade, entre os quais está o de ter, no Legislativo, parlamentares de vida pregressa sem mácula, dignos do elevado cargo.
A frouxidão das leis não implica frouxidão dos juízes. Sensíveis aos problemas individuais e coletivos, mormente os relacionados com a segurança, parcela dos juízes recorre aos princípios fundamentais da ordem jurídica em vigor, sempre que a aplicação das regras ordinárias ao caso concreto se mostre prejudicial ao interesse da nação ou conduza a evidente afronta aos valores vigentes na sociedade.

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