terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

POESIAS

O vaso azul destas verbenas / partiu-o um leque que o tocou: / golpe sutil, roçou-o apenas / pois nem um ruído revelou. / Mas a ferida persistente / mordendo-o sempre e sem sinal / fez, firme e imperceptivelmente / a volta toda do cristal. / A água fugiu calada e fria / a seiva toda se esgotou / ninguém de nada desconfia / não toquem, não, que se quebrou. / Assim, a mão de alguém, roçando / num coração, enche-o de dor / e ele se vai, calmo, quebrando / e morre a flor do seu amor; / embora intacto ao olhar do mundo / sente, na sua solidão / crescer seu mal fino e profundo / já se quebrou: não toquem, não. (“O Vaso Partido” – René François Armand Prudhomme).

De Palos – como a errar, longe do azul natal / os gerifaltos vão – em chusmas, audaciosos / ávidos capitães, pilotos cobiçosos / partiram navegando empós de estranho ideal... / vão conquistar além, das minas do metal / que Cipango entesoura, os veios fabulosos; / sonham, boiando em luz países misteriosos / praias, climas, regiões do mundo ocidental... / sulcam assim, mar alto, infatigavelmente / miragens tropicais, longe, enganosamente / esboçam construções e torres de ouro no ar... / e eles à proa vão das alvas caravelas / vendo só, despenhado em turbilhões de estrelas / todo o infinito céu sobre o infinito mar.../ (“Os Argonautas” – José Maria de Heredia).

De repente uns desejos fúteis / tivestes, de escutar um pouco / as várias músicas inúteis / das minhas flautas de som rouco. / Esta canção que eu comecei / ante a paisagem, frio e grave / ficou melhor quando a cessei / para olhar vosso olhar suave. / Sim, este vão sopro que expulso / até meu último limite / (meus dedos, hirtos movo a pulso) / falha se imita, embora imite / o vosso claro, natural / riso infantil e matinal. (“Folha de Álbum” – Stephane Mallarmé.)

“Para os puros tudo é puro” – assim fala o povo. / Mas eu vos digo: para os porcos tudo é porco! / Por isso os fanáticos e os que curvam a cerviz que também têm o coração inclinado / predicam desta forma: “o próprio mundo é um monstro lamacento!” / Por que todos esses têm o espírito sujo, especialmente os que se não dão paz nem sossego / enquanto não vêem o mundo por detrás: são os crentes do mundo posterior. / A esses lhes digo eu na cara conquanto não soe muito bem: o mundo parece-se com o homem por ter traseiro também; isto é uma verdade! / Há no mundo muita lama; isto é grande verdade! / Mas, nem por isso, o mundo é um monstro lamacento! / É sensato haver no mundo muitas coisas que cheirem mal; o próprio asco cria asas e forças que pressentem mananciais! / Até nos melhores há qualquer coisa repugnante / e até o melhor é coisa que se deve superar! / Oh! Meus irmãos! É sensato haver muita lama no mundo! (Trecho de “Assim Falou Zaratustra” – poema bíblico em prosa de Friedrich Wilhelm Nietzche).

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