sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

TERAPEUTICA

Cura pela razão e pela fé – VIII.

Paulo criou um judaísmo cristianizado e um cristianismo judaizado. Discriminou as mulheres seguindo a tradição hebraica. “Penso que seria bom ao homem não tocar mulher alguma. Todavia, para evitar incontinência, cada homem tenha sua mulher e cada mulher o seu marido”. “Mas quero que saibais que senhor de todo homem é Cristo, senhor da mulher é o homem”. “Como em todas as igrejas dos santos, as mulheres estejam caladas nas assembléias: não lhes é permitido falar, mas devem estar submissas como também ordena a lei; se querem aprender alguma coisa, perguntem-na em casa aos seus maridos” (Coríntios, 7: 1,2; 11: 1,3; 14: 34,35). “Esposas, sede submissas ao próprio marido, como convém ao Senhor” (Colossenses 3: 18).

Paulo desprezou o exemplo do grande mestre. Jesus acolhia homens e mulheres, adultos e crianças. No apostolado havia mulheres. Elas o acompanharam e apoiaram nas jornadas pelo território palestino (Galiléia + Samária + Judéia). Ele se casou com uma delas. A ceia do cordeiro (pascal) era na sexta-feira. Por algum motivo Jesus a realizou na quinta-feira com os seus discípulos e não só com os 12 apóstolos, circunstância que inclui as mulheres. (João 13:1; Mateus 26: 17/19; Marcos 14: 12/17; Lucas 22: 7/20). Lá estavam elas em frente ao palácio de Pilatos. Seguiram Jesus por toda a via crucis. Verônica enxugou-lhe o suor e o sangue do rosto cuja imagem ficou estampada no pano (ou véu) utilizado. (Essa passagem talvez seja lenda, pois não consta do NT; talvez seja real, mencionada em livro não incluído no NT, como o evangelho de Felipe e o evangelho de Maria Madalena. O pano ou véu, falso ou verdadeiro, estaria entre as relíquias de São Pedro, em Roma, por volta do ano 700). Os marmanjos que diziam amar Jesus debandaram com medo de represálias (salvo João). As mulheres retiraram Jesus da cruz, envolveram-no em lençol de linho e o colocaram no sepulcro. José de Arimatéia e Nicodemus, que não eram apóstolos e sim príncipes judeus admiradores de Jesus, prestaram auxílio. Embora a crucifixão e o sepultamento tenham ocorrido na sexta-feira, Madalena e outras mulheres só voltaram ao sepulcro no domingo, com os perfumes para ungi-lo, porque a lei mosaica, imposta a todos os palestinos, proibia atividades no sábado. Jesus não estava mais lá.

Palavras de Jesus aos apóstolos, ignoradas por Paulo: “Sabeis que os chefes das nações as subjugam e que os grandes as governam com autoridade. Não seja assim entre vós. Todo aquele que quiser tornar-se grande entre vós, se faça vosso servo. E o que quiser tornar-se entre vós o primeiro, se faça vosso escravo” (Mateus 20: 25/27; Marcos 10: 42/44; Lucas 22: 25/26). Visando a harmonia no seio da congregação, Jesus adverte: “Nisto todos conhecerão que vós sois meus discípulos: se vos amardes uns aos outros” (João 13: 34/35); “não vos façais chamar rabi, porque um só é vosso preceptor e vós sois todos irmãos” (Mateus 23: 8). Para evitar o “primus inter pares”, Jesus constituiu o colégio com um numero par de apóstolos: 12. Obediência “interna corporis” por reverência e não por subordinação.

Contrariando a organização e os fins preconizados por Jesus, a igreja se hierarquizou. Passo a passo, foi reduzindo a liberdade inicial. Primeiro passo: anciãos e sacerdotes se constituíram em colégios; o culto e o ensino passaram dos lares para prédio exclusivo, realizados na forma eclesiástica. Segundo passo: quem rejeitasse total ou parcialmente a doutrina elaborada pelo colégio de presbíteros (anciãos + sacerdotes) era expulso da comunidade (excomunhão). Terceiro passo: os presbíteros da cidade principal de uma região ou de uma província tomam o nome de bispos metropolitanos e se revestem de autoridade sobre os presbíteros das paróquias. (Tiago, irmão de sangue de Jesus, tornou-se bispo de Jerusalém). Quarto passo: os bispos das comunidades maiores e mais importantes como Constantinopla, Antioquia, Alexandria e Roma tomam o nome de patriarcas e se revestem de autoridade sobre o clero das suas respectivas circunscrições no século V (401/500). Quinto passo: o patriarca de Roma, apoiado no decreto do ano 455, expedido pelo imperador Valentiniano III, revestiu-se de autoridade universal sobre toda a comunidade cristã, adotou o título de “Pontifex Maximus” e se declarou sucessor do apóstolo Pedro. O Concílio do Vaticano acrescentou o dogma da infalibilidade no que tange à doutrina sobre fé e moral (1870).

Impostura e incoerência. Ainda que sucessão houvesse – apesar de decorridos 370 anos entre a morte de Pedro e a criação do papado – o sucedido seria Paulo, o fundador da igreja, e não Pedro, o apóstolo de Cristo. O poder pontifical se estendeu sobre reis e reinos. No período da história européia entre os séculos V e XIII (401/1300) o papado preencheu o vazio deixado pela queda do império romano. Com a extinção do regime feudal e a conquista da soberania laica pelos monarcas europeus, o império secular da igreja católica desmorona. O império espiritual (unidade católica) também ruiu com o advento do protestantismo no século XVI (1501/1600) seguido, nos séculos posteriores, da expansão do islamismo e da invasão das doutrinas e práticas orientais no Ocidente (hinduísmo, budismo, ópio). Antes disto, houve reação aos desvios éticos e ao formalismo da igreja, movimentos religiosos de retorno ao cristianismo simples de Jesus. Exemplos: (i) os “Pobres de Lião” (ou Valdenses, por causa do nome do seu fundador Pedro Valdo), no final do século XII (1101/1200) no sul da França, de origem tradicional nos apóstolos de Cristo; (ii) os “Irmãos da Vida Comum”, no século XV (1401/1500), nos países baixos e na Alemanha, cuja doutrina foi exposta por Thomas Kempis no livro “Imitação de Cristo” (1453).

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