EUROPA (1000
a 1600). Continuação.
John Wycliffe, padre
secular, doutor em teologia, professor em Oxford, faz oposição a igreja de Roma
(1320 a
1384). Na opinião dele, a ordem divina é necessária e restrita a deus. O mundo
não pode ser diferente do que é. Ele censura o mundanismo de papas e bispos
enquanto os fiéis vivem em extrema pobreza {Inglaterra do século XIV}. Somente
os probos têm direito à propriedade e a aspirar à autoridade legítima. O clero
ímprobo fica sujeito a julgamento pela autoridade civil (Estado) e pode perder
a propriedade. Ademais, se Cristo e apóstolos nada possuíam, o clero também
deve nada possuir. O rei é o vigário de deus e representa a divina realeza de
Cristo. Portanto, deve ser obedecido sem contestação ou resistência. No cisma
da igreja (papado italiano x papado francês, 1378 a 1417) John qualificou
o papa de anticristo; elaborou versão inglesa da Vulgata {Bíblia vertida do
grego para o latim por Jerônimo e do latim para o inglês por John}; fundou uma
ordem secular de padres pobres (pregadores itinerantes); e discordou da
doutrina da transubstanciação {mudança de substância:
o pão e o vinho mudam para corpo e sangue de Cristo quando o sacerdote
pronuncia as palavras de consagração durante a missa; permanece a forma ou aparência do pão e do vinho}. Na opinião de John, a igreja
hierárquica, dominada pela cúria romana, deve ser substituída por uma igreja
nacional, reformada e governada segundo o cânon bíblico. [A pregação de John
surtiu efeito com a fundação da igreja anglicana por Henrique VIII. O
particularismo nacional (inglês) superou o universalismo (romano)].
Após derrotar o movimento conciliar que advogava a
supremacia do concílio geral dentro
da igreja, o papa admite a soberania nacional de cada reino ao celebrar acordos
bilaterais com os reis (concordatas).
Chega ao fim a res publica christiana
(unidade temporal e espiritual de todos os povos sob o báculo pontifical).
Sobreveio novo dogma: a igreja existe em
cada nação {ainda que não abranja todas as nações}.
Os costumes, crenças e
idéias medievais são expostos na obra de Dante Alighieri, toda ela penetrada
por textos bíblicos. Ele foi banido de Florença quando o partido rival assumiu
o poder. Morreu exilado em Ravena (1321). Na Divina Comédia, o florentino narra uma viagem do inferno ao céu,
passando pelo purgatório, cheia de digressões e alusões que refletem a sua experiência
de vida e a sociedade do seu tempo. Dante reserva um enclave no inferno aos
filósofos gregos que não eram batizados na fé cristã (velada crítica a Tomás de
Aquino que esposou o pensamento aristotélico). Na obra intitulada Da Monarchia, Dante expõe o seu
pensamento político contrário à intromissão do papa nos negócios de Estado. Tem
diante dos olhos o reinado de Frederico II. Nega a supremacia da igreja e
rebate a teoria das duas espadas. Considera juridicamente nula a doação de
Constantino, posto que a ninguém é lícito praticar, através do cargo que ocupa
no Estado, atos contrários à respectiva função. O imperador não pode alienar a
dignidade do Império e nem o Império se autodestruir. A autoridade do monarca
depende diretamente de deus e não do vigário {absolutismo do rei}. Só deus –
que não está subordinado a poder algum – elege o imperador. O objetivo
principal da política é a ação e não
a especulação, diz o florentino. A
ação supõe uma finalidade comum a todos os homens: a paz universal. [No entanto, os homens (primitivos e civilizados)
amam o combate físico e intelectual. A dialética é vista como guerra entre
opostos. A guerra é vista como lei da natureza. Há quem faça apologia da
guerra]. Na opinião de Dante, para alcançar a paz é necessário alguém que reine
e esse alguém deve ser o imperador, juiz supremo das controvérsias entre os
príncipes. Melhor os homens serem governados por um só (monarquia) do que por
muitos (aristocracia e democracia).
Reagindo contra a
escolástica e o endeusamento de Aristóteles, alguns filósofos como Pletone,
Ficino e Mirandola recorreram a Platão. Seguiam as pegadas de Plotino. Tentavam
conciliar platonismo e cristianismo. Giovanni Picco de la Mirandola defendia
uma religião universal que combinava platonismo, cabala e cristianismo (1463 a 1494). Ele, Pietro
Pomponazzi (1462 a
1525) e outros, não se esquivavam da magia; desta, retiraram os aspectos
naturais. Marsílio Ficino (1433
a 1499) e Tommaso Campanella (1568 a 1638) também admitiam
a magia, porém na sua expressão mais espiritual ou demoníaca. Alguns filósofos
aderem ao estoicismo, ao epicurismo e ao ceticismo. Lorenzo Valla, Pietro Pomponazzi,
Leonardo da Vinci e Niccolò Machiavelli são os grandes nomes do período. Para
Lorenzo, o prazer tranqüilo era o supremo bem, o ascetismo era inútil e morrer
pelo país uma irracionalidade. Quanto a Pietro, lecionava filosofia na
Universidade de Pádua e refutou o misticismo neoplatônico. Ele interpretou o
universo em termos de causa e efeito. Na opinião dele, a crença em recompensas
e punições depois da morte não pode servir de base à Ética. A recompensa pela
virtude é a própria virtude que faz o homem feliz. A punição do vício é o
próprio vício que faz o homem infeliz. Leonardo não escreveu obra filosófica,
mas pensou como filósofo ao rejeitar a autoridade como fonte da verdade, ao
aplicar o método indutivo nas suas pesquisas, ao condenar a guerra como a mais
bestial das loucuras, ao qualificar de atrocidade o homicídio e ao defender o segredo
de invenção para evitar o seu mau uso pelos governantes. [No mundo moderno, o
conhecimento científico está a serviço da política e da economia].
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