No esporte coletivo (futebol, basquete) o vocábulo amistoso tem significado próprio. No
Paraná, anos 50, jogar baralho ou futebol a “leite de pato” significava jogar
sem apostar, disputar sem prêmio em dinheiro ou troféu ao vencedor. Este é o
sentido de “amistoso” no futebol: disputa fora de campeonato, “a leite de
pato”. Amizade e cordialidade são componentes do espírito esportivo:
as equipes não se tratam como inimigas e se pautam pela civilidade, lealdade,
respeito humano. Isto não obsta a virilidade na luta pela vitória, ainda que o
jogo seja amistoso. O jogador violento está sujeito à sanção aplicada pelo
árbitro (expulsão de campo), pelo clube (censura) e pelo tribunal (suspensão).
Nos jogos amistosos da seleção brasileira com as seleções
do Panamá e da Sérvia (03 e 06 de junho/2014) houve lances ríspidos e revides.
A brasileira foi vitoriosa, porém não convenceu. Está no caminho. A vedete da
seleção parece incorrer no equívoco de se preocupar em ser o melhor jogador do
mundo sem levar em conta as peripécias nos bastidores da FIFA para essa
escolha. A pretensão é justificável, mas não a preocupação. Esta é óbice
psíquico a atrapalhar o bom desempenho do jogador, como ficou evidente nestes
amistosos. A preocupação dos jogadores com o aplauso do público foi outro óbice
que influiu no rendimento de toda a equipe. Ótimos em seus clubes, na seleção alguns
não exibiram o mesmo nível. A badalação gera esse efeito negativo. Os
dirigentes da seleção certamente sabem disto, mas para eles o resultado
financeiro positivo é mais importante do que o bom resultado esportivo.
“Treino é treino; jogo é jogo”, dizia o mestre Didi.
Os amistosos foram treinos. Espera-se que nos jogos da copa a seleção
brasileira seja mais convincente. A rapaziada folga sábado e domingo. Os
treinos recomeçam na segunda-feira (09/06). O primeiro jogo é contra a seleção
da Croácia, na quinta-feira (12/06). Empate e derrota da seleção brasileira não
estão descartados. Ufanistas, preparai-vos!
Na Europa oriental, a Iugoslávia era respeitável
escola de futebol. Dessa república federativa socialista faziam parte: Bósnia/Herzegovina,
Croácia, Eslovênia, Macedônia, Montenegro e Sérvia. Os quatro primeiros estados
se retiraram da federação logo após a dissolução da união soviética em 1991. Os
dois remanescentes (Montenegro e Sérvia) constituíram a República Federal da
Iugoslávia, que se extinguiu em 2003.
A sobrevivente comunidade Montenegro + Sérvia foi
rompida em 2006. Diante dessa fragmentação política, o futebol iugoslavo
(“eslavo do sul”) parece que perdeu a sua primitiva força, apesar do talento de
alguns jogadores. Bósnia e Croácia mostram-se dispostas a manter a tradição. O
público avaliará o nível do futebol eslavo durante a copa.
No público dos esportes coletivos prevalece a emoção.
Isto dificulta análise desapaixonada. Todavia, funciona a inteligência
emocional. O público percebe o que está bom ou ruim nas equipes. Daí, as vaias
ocasionais. No estádio do Morumbi, localizado na cidade de São Paulo, o público
gritou o nome de Fabiano durante o jogo entre as seleções do Brasil e da Sérvia.
O público – que não é cego e nem idiota – sabia que aquele jogador não estava
no banco dos reservas e nem integrava o elenco e, portanto, não poderia
participar do jogo e nem da copa. O grito foi de protesto contra a injusta exclusão
de Fabiano. O público sabe que esse jogador está em boa forma e que por sua
visão de jogo, por saber driblar, prestar assistência e finalizar com sucesso é
tecnicamente superior a Fred, Jô e outros convocados.
Nos amistosos desta semana, jogadores brasileiros,
inclusive a vedete criada pela imprensa esportiva e pela propaganda comercial,
mostraram-se tão temperamentais quanto Fabiano e mais vacilantes do que ele. O
público manifestou a sua opinião e a sua discordância de modo legítimo. A
liberdade de manifestação do pensamento é garantida pela vigente Constituição
brasileira. Em país democrático, no qual todo o poder emana do povo, a vontade
popular há de ser respeitada, ainda mais quando manifestada publicamente, de forma
plural, clara e inequívoca. No campo esportivo, entretanto, a democracia ainda
não chegou. Persiste a ditadura civil dos dirigentes das entidades esportivas
com o apoio de setores da imprensa.
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