quarta-feira, 28 de maio de 2014

FILOSOFIA XII - 9

EUROPA (1000 a 1600). Continuação.

A obra do florentino Leonardo da Vinci assinala o início do esplendor da chamada “renascença italiana” (1452 a 1519). Gênio incomparável, Leonardo dedicou-se à arte e à ciência. Suas obras primas na pintura: Virgem das Rochas, Última Ceia e Mona Lisa. O primeiro quadro brotou da sua paixão pela ciência. O segundo provocou séria polêmica no final do século XX, com a interpretação publicada no romance intitulado “O Código da Vinci”, de Dan Brown, escritor estadunidense. No quadro pintado na parede do refeitório da igreja de Santa Maria da Graça, em Milão, o apóstolo João é visto na ceia como sendo Maria Madalena e também é identificado um símbolo de união íntima entre ela e Jesus. No entanto, o que se vê na pintura é a tentativa de Leonardo, inspirado nos evangelhos, reproduzir o clima emocional daquela reunião de Jesus com os apóstolos. Evidente que as figuras saíram da imaginação do pintor, pois não havia original a ser copiado e ele não presenciou um conclave ocorrido 1.420 anos antes do seu nascimento. A “Maria Madalena” na verdade é um adolescente imberbe, o mais novo dos apóstolos. O terceiro quadro também tem sido alvo de interpretações díspares, apesar do seu realismo e da sua inovadora técnica de luz e sombra. Em que pese retratar com fidelidade a esposa do napolitano Francesco Giocondo, aquela pintura manifesta a expressividade e a sensibilidade do pintor: desperta em quem a contempla, a sensação de estar diante do gênero mulher que transcende os limites do tempo e do espaço.     

A escultura desvincula-se da arquitetura da qual até então era auxiliar. Donatello foi o primeiro grande mestre da escultura renascentista (1386 a 1466). Miguel Ângelo, além de pintor, foi um dos maiores escultores de todos os tempos (1475 a 1564). Pintava cenas trágicas universais. A sua maior realização como pintor foram os afrescos no teto e nas paredes acima do altar da capela Sixtina no Vaticano. Na parede atrás do altar, o mais impressionante dos seus quadros: Último Julgamento (Juízo Final), onde Jesus forte e robusto como Atlas, condena a humanidade ali representada também por figuras musculosas. No túmulo do papa Julio II, Miguel Ângelo esculpiu o Escravo Acorrentado, representando o talento humano limitado pelos grilhões do destino, e o Moisés, em que expressa a ira do profeta diante da deslealdade dos filhos de Israel, estátua em que a distorção anatômica transmite intensidade emocional. Essa mesma intensidade nota-se também na Pietá, imagem de Maria profundamente angustiada segurando no colo o seu filho morto. Aurora, mulher com a cabeça levantada como ao despertar, e Noite, homem forte que parece sucumbir ao peso da miséria humana, são duas notáveis esculturas de Miguel para os túmulos dos Médici de Florença. Ao lado de Bramante e Rafael, Miguel foi um dos arquitetos da igreja de São Pedro, em Roma, com suntuosas pinturas e esculturas. Rafael está entre os grandes pintores da época (1483 a 1520). Das suas obras emanam doçura e piedade, sem preocupações intelectuais e sem tormentos da alma. Escola de Atenas e Madonna Sixtina estão entre os seus melhores quadros. Tiziano, Giorgione e Tintoretto são os expoentes da pintura veneziana (1477 a 1594). As suas obras refletem a atmosfera luxuosa e amorosa de Veneza. 

A música profana se desenvolve paralelamente à música sacra. Além do canto dos cultos religiosos, os compositores voltam-se também para o canto popular e para a música instrumental. Destarte, a música deixa de ser simples diversão ou mero auxílio para o culto religioso e se torna uma arte independente. O mecenato (instituto do patrocínio) tão importante para o desenvolvimento das outras artes, também o foi para a música. Holanda e Borgonha foram os primeiros centros de cultura musical profana. Posteriormente, a Itália os superou. O apuro técnico se sobrepõe ao efeito artístico. Nesse período, amadurece o contraponto e nasce o sistema harmônico moderno abrindo caminho para novas criações na pauta, na voz e nos instrumentos.     

As autoridades eclesiásticas entendiam que o Estado (esta palavra ainda não era usada e sim reino e república) fora estabelecido por deus como remédio para o pecado (todo poder vem de deus) e que o homem devia ser fiel e obediente, ainda que o governante fosse um tirano. Esse entendimento mudou no curso da Idade Média. O Estado passou a ser visto como produto da natureza social do homem e que o governo pode ser um bem positivo quando a justiça for o princípio diretor. Os teóricos medievais defendiam a unificação da Europa ocidental sob o governo supremo do imperador ou do papa. Frederico (Barba Rubra) e Frederico II consideravam-se sucessores dos imperadores da Roma imperial. Os governos locais (reis e príncipes) ficariam sujeitos à jurisdição suprema. {A unificação da Europa aconteceu no século XX, efetivamente, mas não sob a forma de império e sim de confederação de Estados}. Dante Alighieri defendeu essa idéia em favor do imperador. João de Salisbury e Tomás de Aquino a defenderam em favor do papa. Nenhum desses teóricos acreditava no governo da maioria, salvo Marsílio de Pádua, que defendeu a idéia democrática: o povo tinha o direito de eleger e de depor o governante. Na opinião deste filósofo, um órgão representativo devia legislar exclusivamente sobre a estrutura do governo mantendo os costumes na sociedade civil. Esse órgão devia ser composto pelos melhores cidadãos, ou seja, pelos mais qualificados do ponto de vista social, moral e intelectual. Para Salisbury, os governados tinham o direito de matar o tirano. Ao governante cabia aplicar a lei e não elaborá-la ou modificá-la segundo a sua vontade. A lei era ditada pelo costume ou pela natureza (ordem divina); se ditada pelo governante, carecia de legitimidade.

Tomás segue a lição de Jesus e de Paulo: todo poder vem de deus. A fonte de todo bem é deus. A razão de ser e a finalidade do poder político é a realização do bem comum que se resume na ordem e na justiça. O rei é servo da justiça que tem na lei ou no direito a sua forma concreta. Ao povo cabe o direito de depor – e não de matar – o monarca que se desvia do bem comum. A lei eterna brota da razão divina, fundamento das demais leis. A lei eterna está impressa na mente humana e dela emana a lei natural que comanda os atos dos homens e os dirige aos seus fins, capacitando-os a distinguir o bem e o mal, a não causar dano ao próximo e a servir-se da sua natureza racional na vida em sociedade. Da lei natural provém lei humana (positiva) elaborada pelos homens visando aos seus fins específicos e que está sujeita às mutações sociais. Essa lei é precipuamente o costume, expressão do modus vivendi da comunidade humana, ordenação da razão com vistas ao bem comum. A lei revelada (positiva divina) provém das escrituras sagradas e não pode ser explicada pela razão humana. Na opinião de Tomás, a monarquia é a melhor forma de governo, posto ser “mais vantajoso viver sob o governo de um só rei do que sob o governo de muitos”. Fora da igreja, o tomismo foi menos influente. Prevaleceram o direito romano e o pensamento aristotélico favorecendo o nacionalismo e fortalecendo o rei diante do senhor feudal, do imperador e do papa.

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