quarta-feira, 14 de maio de 2014

FILOSOFIA XII - 5



EUROPA (1000 a 1600). Continuação.



Na Renascença surge um novo cristianismo com Inocêncio III, Francisco de Assis e Tomás de Aquino. A igreja admitiu a importância da vida terrena e a centelha divina no homem. Deus existia para o bem do homem. O sacerdote era herdeiro da autoridade conferida por Jesus ao apóstolo Pedro. O sacerdote cooperava com deus na realização de milagres e na absolvição dos pecadores. Havia os seguintes sacramentos: batismo, crisma, penitência, eucaristia, casamento, ordem e extrema unção. Segundo a igreja católica, sacramento é o meio pelo qual a graça divina é comunicada aos homens. A eficiência dos sacramentos independe do caráter pessoal de quem o ministra. O padre pode ser corrupto sem que isto nulifique o sacramento. Segundo a teoria da transubstanciação, o pão e o vinho se transformam no corpo e no sangue de Jesus. Cuida-se de transformação essencial e não existencial; o gosto do pão e do vinho não se modifica. A teoria da sagrada herança e a teoria do sacramento fizeram do cristianismo uma religião eclesiástica e mecânica semelhante ao paganismo romano. O papa Nicolau impõe a teoria da supremacia do sumo pontífice na hierarquia eclesiástica (858 a 867). Para provar o vigor da citada teoria ele serviu-se de uma coleção de documentos forjados denominada “Decretos de Isidoro”. Com o papa Gregório VII (1073 a 1085) a monarquia eclesiástica recuperou forças e com o papa Inocêncio III (1198 a 1216) firmou-se em definitivo. A partir do 4º Concílio de Latrão, a confissão do crente foi exigida (1215). O inconformismo com esta exigência foi um dos motivos da futura revolução luterana.

O mosteiro de Cluny emprestou o seu nome ao primeiro movimento de reforma monástica. Na Europa ocidental do século X, a maioria dos mosteiros era de beneditinos que se corromperam e caíram sob o poder dos senhores feudais. O objetivo da reforma era livrar os mosteiros do poder feudal e fortalecer as regras de piedade e castidade entre os monges. No século XI, havia objetivos mais amplos: eliminar a corrupção e os interesses materiais de toda a igreja; estabelecer a supremacia absoluta do papa em assuntos eclesiásticos; acabar com o tráfico de objetos sagrados e a venda de bens espirituais (simonia); afastar dos assuntos eclesiásticos as autoridades seculares; instituir celibato para o clero. O monge Hildebrando, o “Satã Sagrado”, ao se tornar papa em 1073 com o nome de Gregório VII, implantou quase todas as reformas pleiteadas pelo movimento Cluny. Esse movimento perdeu força no final do século XI e enveredou para os vícios que tanto combateu. Reagindo a essa decadência surgiram as ordens cartuxa e cisterciense com regras mais rigorosas (1084). Estas duas ordens também decaíram dos seus princípios e propósitos, tanto pelo acúmulo de riqueza, como por incompatibilidade com os ideais da época.

Diferentes dos monges, os frades entram na cena religiosa como homens leigos, sem pertencerem ao clero (século XIII). Devotavam-se ao trabalho social, à pregação e ao ensino. O fundador da primeira ordem foi um jovem de nome Francisco, filho de rico mercador de Assis, cidade do norte da Itália (1182 a 1226). Este jovem imitou Jesus, desprendeu-se dos bens materiais, dedicou-se aos pobres e privilegiou a prática cristã em face da doutrina. Ele se preocupava com as coisas deste mundo, devotava profundo amor à natureza e nela via a presença divina. Francisco não era asceta e nem hipócrita, não desprezava o corpo, nem macerava a carne no intuito de salvar a alma. Indiferente ao conforto, aos prazeres, às posses terrenas, vestia roupas simples, hábitos morigerados. Foi um dos raros homens que mereceu o título de cristão. Domingos, nobre espanhol, fundou uma nova ordem de frades por volta de 1215, no sul da França, com o propósito de combater a heresia. No século XIV, tanto os franciscanos como os dominicanos distanciavam-se dos ensinamentos e do exemplo dos fundadores. Houve cisões, porém os frades continuavam a influir na cultura européia. Alguns filósofos e cientistas dos séculos XIII e XIV eram franciscanos e dominicanos.

O papa Gregório VII se opôs a que bispos, abades e padres fossem investidos por reis e príncipes. Henrique IV, imperador alemão, desafiou o papa e prosseguiu nas investiduras. O papa o excomungou e lhe retirou a autoridade política. O imperador se humilhou e obteve o perdão. A pretensão do papa incluía jurisdição sobre toda a cristandade com o poder de punir, anular decretos e destituir reis e imperadores. Gregório insiste na supremacia da Igreja em relação ao Estado: “quem pode duvidar de que os sacerdotes de Cristo não sejam os pais e os mestres dos reis, dos príncipes e de todos os fiéis?”. Elabora e promulga o “Dictatus Papae” com 27 artigos entre os quais os que seguem: 1) A igreja romana foi fundada por um só Senhor. {O papa se refere a Jesus. No entanto e na verdade, João Batista e Jesus Nazareno fundaram uma seita judia reformista de cunho místico na Palestina e não em Roma. Pedro, Paulo e apóstolos como Tiago, Judas Tadeu, João, Barnabé, instituíram a igreja cristã depois da morte daqueles dois líderes. O nome de “cristã” foi dado à igreja por seus adversários (judeus e “gregos” da Antioquia) e foi mantido pelos adeptos da nova doutrina. O apelido de “romana” foi dado pelos bispos para distingui-la da “bizantina”}. 2) Somente o pontífice romano tem o direito de ser considerado universal (católico). Em todo concílio o seu legado está acima de todos os bispos. 3) O sumo pontífice não está submetido a qualquer jurisdição {portanto, está livre do poder judicial do Estado}. 4) O papa tem o direito de depor os imperadores e de livrar os súditos do juramento de fidelidade prestado aos monarcas injustos {poder de ligar e desligar supostamente atribuído a Pedro por Jesus}.

Gregório alicerçava-se na Doação de Constantino do ano 315, em que este imperador reconhecia a superioridade do trono do papa em face do trono dos reis, determinava que a igreja romana fosse venerada e reverenciada, subordinava as igrejas de Antioquia, Alexandria, Constantinopla e Jerusalém à igreja de Roma e transferia a Silvestre, chamado de “papa universal”, todos os palácios, províncias e distritos da Itália e das regiões do ocidente. Tal como os “Decretos de Isidoro” e a lista de sucessão dos bispos de Roma desde Pedro até o século III, o documento de doação também é falso, forjado pelo papa e redigido em letras douradas por um diácono de nome João. O imperador Oto III denunciou a falsidade documental (983 a 1002). Esta denúncia foi confirmada em 1440 por um secretário pontifical e historiador de nome Lorenzo Valla que provou a falsidade de inúmeros documentos inclusive a doação de Constantino sobre a qual se baseava a supremacia do papa. Nesse falso documento o imperador Constantino reconhecia em favor do papa o mais alto poder temporal e espiritual. Lorenzo provou ainda, a deturpação na Vulgata (versão latina da Bíblia) ao compará-la com textos gregos mais antigos e a falsidade do Credo dos Apóstolos jamais criado pelos apóstolos. O laudo pericial sobre a falsidade da doação só foi publicado em 1519. Apesar desta constatação, a igreja insistiu na legitimidade da doação até o século XIX, quando caiu no descrédito geral. Para justificar as fraudes que pratica, a igreja invoca a lição de Orígenes, teólogo cristão, sobre a mentira econômica e pedagógica necessária ao plano divino e aos nobres objetivos. Daí derivou a mentira piedosa para esconder notícia má ou assunto inconveniente. A lição de Jesus Nazareno é oposta: se permanecerdes na minha palavra sereis meus verdadeiros discípulos, conhecereis a verdade e a verdade vos libertará.


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