sexta-feira, 15 de abril de 2011

RELIGIÃO

NOVO TESTAMENTO – VI.

O evangelho.

O vocábulo grego evangelho significa boa nova. Esse vocábulo é utilizado em diferentes acepções: (i) a novidade em si mesma (ii) o livro que a contém (iii) todo o NT. Na bíblia, a boa nova se refere à chegada do messias e à mensagem de salvação, amor e paz. No sentido de livro (rolo de pergaminho ou de papiro em que se escrevia) há vários evangelhos, ou seja, narrativas de diferentes autores sobre o mesmo assunto. O clero organizou o NT como unidade teológica e selecionou, além de outros textos, quatro narrativas para integrá-lo: de Mateus, Marcos, Lucas e João. Foram desprezadas narrativas como as de Tiago, Felipe, Judas Tadeu, Tomé e Maria Madalena. No que tange ao conteúdo, o evangelho consiste nos ensinamentos oralmente transmitidos por Jesus aos galileus, samaritanos e judeus nos anos 29 a 33, na Palestina. A partir dos anos 50, os ensinamentos passaram à forma escrita, mediante cartas e rolos (livros) de autoria dos apóstolos. Distintas culturas da Idade Antiga mencionam a vinda de messias. A novidade estava na chegada real de um deles no seio da sociedade hebraica. Jesus foi reconhecido como enviado de Deus apenas pela minoria do povo palestino (galileus + samaritanos + judeus). Da maioria, Jesus recebeu escárnio, incredulidade, agressões, tentativas de morte, acusações de blasfêmia e subversão, que acabaram por levá-lo à prisão e à crucifixão. Além desses acontecimentos, as narrativas incluem milagres, circulação pelo território palestino e os embates com a nobreza judaica.

A narrativa de Mateus.

Este livro foi redigido em aramaico e traduzido para o grego. O nome original do autor era Levi, coletor de impostos. O livro começa com a genealogia a partir de Abraão, passando por Davi até chegar a José, pai adotivo de Jesus: 14 gerações. Narra o nascimento de Jesus, cuja mãe era casada com o carpinteiro José. Antes de o casal transar sexualmente ela ficou grávida; concebeu do espírito santo. Um anjo apareceu ao inconformado José e o convenceu a manter o casamento. José e Maria não se relacionaram sexualmente até a criança nascer em Belém de Judá, no tempo do rei Herodes Magno. O menino recebeu a visita dos magos (não diz quantos nem os nomes) em casa (não diz estrebaria nem manjedoura): Entrando na casa, acharam o menino com Maria, sua mãe; prostrando-se diante dele, o adoraram; depois, abrindo seus tesouros, ofereceram-lhe como presentes: ouro, incenso e mirra (Mateus 2: 11). O Anjo do Senhor apareceu em sonho a José e o instruiu a fugir para o Egito porque Herodes ia procurar e matar o menino, tendo em vista o anúncio do nascimento do rei dos judeus. Para não ver a sua dinastia ameaçada, Herodes mandou matar, em Belém e arredores, todas as crianças com menos de 2 anos de idade. Após a morte de Herodes, José retorna à Palestina, vai para a Galiléia e escolhe a cidade de Nazaré para morar e assim se cumprisse o que foi dito pelos profetas: será chamado Nazareno.

De acordo com a narrativa, José era da linhagem de Davi; casou com Maria, mas não a tocou; portanto, não era o pai biológico de Jesus; logo, Jesus não pertencia à linhagem de Davi. Estranha-se a falta de registro histórico do morticínio de crianças em Belém. Ademais, esta cidade localizava-se na Judéia, jurisdição do tetrarca romano que o tetrarca da Galiléia (Herodes) ou qualquer outro, não ousava desrespeitar. Invadir território sob jurisdição romana para matar crianças ou qualquer pessoa, equivalia desafiar a lei e o poder de Roma; as autoridades judias estavam proibidas de decretar a morte de pessoas. Lucas, no seu evangelho, conta o nascimento de Jesus de modo diferente: menciona a manjedoura, os visitantes não eram magos e sim pastores que se encontravam na vizinhança. Lucas, Marcos e João não mencionam em seus respectivos evangelhos fuga de José e Maria para o Egito. Marcos e João nada falam sobre o nascimento de Jesus. Há dúvida sobre a existência de uma cidade ou aldeia com o nome de Nazaré no território palestino, no tempo dos pais de Jesus. Nazareno não significa naturalidade. Independente da cidade natal, o homem consagrado a Deus recebia a alcunha de nazareno. Lucas cita a lei mosaica (2: 23): Todo primogênito do sexo masculino será consagrado ao Senhor. Essa lei consta do AT (Êxodo 13:2) com redação diferente: Consagra-me todo primogênito; todo que abre a madre de sua mãe entre os filhos de Israel, assim de homens como de animais, é meu (bíblia da editora da Sociedade Bíblica do Brasil, RJ, s/d). Consagra-me todos os primogênitos, que abrem o útero de sua mãe entre os filhos de Israel, assim de homens como de animais, porque todos eles são meus (bíblia da editora Barsa, RJ, 1967). Consagrar-me-ás todo primogênito entre os israelitas, tanto homem como animal, ele é meu (bíblia da editora Ave Maria, SP, 1987).

Mateus refere-se: (i) à pregação de João Batista, precursor de Jesus e arauto do reino dos céus (ii) ao batismo de Jesus por João Batista (iii) à experiência extática de Jesus no deserto depois de jejuar 40 dias e 40 noites. Com a prisão de João Batista, inicia-se a pregação e o trabalho terapêutico de Jesus na Galiléia, onde recrutou os seus apóstolos. Para lá convergiam pessoas de outras localidades. Diante do povaréu, Jesus profere o sermão que contém sua doutrina.

Bem-aventurados: os que têm um coração de pobre, porque deles é o reino dos céus; os mansos, os que choram, os que têm fome e sede de justiça, os misericordiosos, os limpos de coração, os pacíficos, os que padecem perseguição por amor da justiça; sois o sal da terra e a luz do mundo. Jesus se pronuncia sobre os mandamentos e os amolda à sua doutrina: Não vim para abolir a lei, mas para aperfeiçoá-la. (Lei = Pentateuco = cinco primeiros livros do AT). Recomenda servir ao próximo em silêncio e não agir como hipócrita, sob pena de perder a recompensa divina: Guardai-vos de fazer vossas boas obras diante dos homens para serdes vistos por eles. Ensina a orar: pai nosso que estais no céu, santificado seja o vosso nome, venha a nós o vosso reino, seja feita a vossa vontade assim na terra como no céu, o pão nosso de cada dia nos dai hoje, perdoai-nos as nossas dívidas assim como nós perdoamos aos nossos devedores e não nos deixeis cair em tentação, mas livrai-nos do mal. Aconselha: não ajunteis para vós tesouros na terra, a cada dia basta o seu cuidado, olhai como crescem os lírios do campo, não trabalham nem fiam, entretanto vos digo que o próprio Salomão no auge da sua glória não se vestiu como um deles; buscai em primeiro lugar o reino de Deus e a sua justiça e todas estas coisas vos serão dadas em acréscimo; não julgueis e não sereis julgados; não atireis aos porcos as vossas pérolas; tudo o que quereis que os homens vos façam, fazei-o vós a eles; entrai pela porta estreita, porque larga é a porta e espaçoso o caminho que conduzem à perdição; guardai-vos dos falsos profetas, pelos seus frutos os conhecereis. Jesus conclui o discurso advertindo que não basta ouvir as palavras dele; há necessidade de colocá-las em prática.

Ficar no deserto por 40 dias e 40 noites era uma provação que santificava. Jejuar todo esse tempo sem morrer de fome, de sede ou sem ser atacado por animal faminto, parece impossível sob critério natural. Certamente, trata-se de número esotérico (40 = tempo indeterminado). A localização da montanha onde Jesus proferiu o sermão é desconhecida; talvez, ao Norte da Galiléia, alguma elevação montanhosa próxima a Cafarnaum, ou ao Sul da Galiléia, no Monte Tabor, posto que, o sermão antecedeu o ministério na Judéia.

A igreja católica adotava a oração “Pai Nosso” como está acima (e na bíblia protestante), porém, na segunda metade do século XX, visto que ninguém estava disposto a abrir mão dos seus créditos junto aos devedores, mesclou-a com o “Pai Nosso” mais breve de Lucas, na passagem que fala das dívidas: perdoai-nos os nossos pecados, pois também nós perdoamos aqueles que nos ofenderam (Lucas 11: 4). João e Marcos não mencionam essa oração.

Seguem: (i) a narrativa de diversas atividades de Jesus, como o episódio da barca em que ele acalma a tempestade pelo vigor da sua voz (ii) a discussão com fariseus e com discípulos de João Batista que praticavam o jejum e por isso censuravam Jesus por compartilhar a mesa de publicanos e pecadores (iii) as instruções e outorga de poderes aos 12 apóstolos (iv) as discussões com escribas (v) as parábolas (vi) a mensagem e a morte de João Batista (vii) a multiplicação dos pães (viii) a transfiguração na presença de três apóstolos (ix) os anúncios da paixão (x) a formação de igrejas: onde dois ou três estão reunidos em meu nome, aí estou eu no meio deles.

Mateus narra o ministério de Jesus na Judéia: a entrada em Jerusalém no lombo de um jumento; a expulsão dos mercadores do templo; o tributo a César; as discussões com escribas e fariseus; o resumo da lei nos dois maiores mandamentos: amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda tua alma e de todo teu espírito; amarás teu próximo como a ti mesmo; a profecia sobre a destruição de Jerusalém e o juízo final. Na sexta parte do livro, Mateus relata: (i) a conspiração dos sacerdotes (ii) o episódio em que sob os protestos dos discípulos, certa mulher (sem identificação) derrama perfume caro na cabeça de Jesus (outro apóstolo diz que foi nos pés e a mulher era irmã de Lázaro) (iii) a traição de Judas (iv) a última ceia (v) a angústia no Getsêmani (vi) a prisão e os julgamentos sucessivos perante o Sinédrio, Herodes e Pilatos (vii) o suicídio de Judas Iscariotes (viii) a ajuda prestada a Jesus por Simão de Cirene para carregar a cruz (ix) a crucifixão, sepultura e ressurreição (x) a aparição de Jesus a Maria Madalena e aos apóstolos (xi) a outorga aos apóstolos da missão de ensinar a doutrina a todas as nações e batizar em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Amém.

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