sexta-feira, 22 de abril de 2011

POESIA

O céu azul sobre o telhado/ repousa em calma /uma árvore sobre o telhado / balança a palma. / A voz de um sino mansamente / ressoa no ar. / Um passarinho mansamente / põe-se a cantar. / Meu Deus, meu Deus, esta é que é a vida / simples, tranqüila / como o rumor suave de vida / que vem da vila. / Tu que aí choras, que é que fizeste / dize, em verdade / tu que aí choras, que é que fizeste / da mocidade? (“Canção” – Paul Marie Verlaine).

Senhor, bem sabes como eu me dirijo ao céu / rogando pelos que a minha alma te invoca. / Venho agora pedir por alguém que era meu / meu vaso de frescor e mel de minha boca. / Cal de meus ossos e razão desta jornada / gorjeio de um ouvido e tear de minha veste. / Cuido daqueles a quem nunca devi nada. / Não te zangues, Senhor, se te peço por este. / Digo-te que era bom, digo-te que teria / o coração à flor do peito, digo que era / suave de índole, franco, e como a luz do dia / em milagres irmão da própria primavera. / Severo, tu dirás que é de rogos indigno / e que não soube ungir os seus lábios febris / e uma tarde se foi sem aguardar teu signo / partindo as veias como cântaros sutis. / Mas eu, Senhor, eu te respondo que hei tocado / como o nardo que em seu perfil vi florescer / todo esse coração inquieto e atormentado / e tinha a sede de um capulho por nascer. / Que foi cruel? Senhor, esqueces que o queria / e que sabia sua a entranha que chegava. Que secou para sempre as minhas alegrias? / Não importa, Senhor. Compreendes que eu o amava. / E amar, bem sabes disso, é um estranho exercício / manter os rostos sempre em lágrimas molhados / de beijos refrescar as tranças dos cilícios / sob elas escondendo os olhos extasiados. / O ferro, ao penetrar, tem um gostoso frio / quando abre como quilha as carnes amorosas. / E a cruz – recordarás o teu drama sombrio - / carrega-te também como um galho de rosas. / Aqui estou, Senhor, com a pálpebra caída / sobre o pó, a falar-te um crepúsculo inteiro / ou àqueles todos a que alcance minha vida / se tardas em dizer-me a palavra que espero. / Cansarei teu ouvido em soluços nervosos / lambendo humildemente as fímbrias do teu manto / nem me podes desviar os olhos amorosos / nem esquivar os pés às águas de meu pranto. / Dize o perdão, enfim. Vai espargir o vento / a palavra, e o odor de cem pomos odores / ao derramar-se, a água será um deslumbramento: / o ermo deitará flor e canteiros de flores. / De luz se molharão os olhares das feras / e, vendo tudo, estas montanhas que forjaste / chorando acordarão o chão de primaveras. / E toda a terra, então, saberá que perdoaste. (“A Súplica” – Gabriela Mistral).

Nenhum comentário: