quinta-feira, 25 de março de 2010

AMOR4

Quarta parte.

Relação supõe bilateralidade: o eu e o tu. Possível a exceção: relacionamento unilateral do eu consigo mesmo. Nesse caso, a pessoa cuida do seu bem-estar, da sua aparência, busca satisfação sexual no onanismo, cultiva bons sentimentos e pensamentos: “mens sana in corpore sano” consoante lema da antiga Roma. A pessoa revela amor próprio quando tenta se elevar espiritualmente mediante orações, rituais e exercícios espirituais. A exacerbada paixão pela pátria, pela religião, por doutrinas e instituições, conduz ao fanatismo. O indivíduo fanático não se intimida com ameaças nem com o poderio adverso; não se importa de morrer, desde que possa aniquilar os que com ele não comungam sentimentos e pensamentos. Na segunda guerra mundial, ficaram famosos os camicases, pilotos japoneses que faziam seus aviões colidirem com o alvo inimigo. Na atualidade, homens e mulheres se transformam em bombas na defesa da sua crença religiosa, da sua ideologia política, do território do seu país, da sua identidade e soberania nacional.

O magnetismo do amor associa os seres humanos. O indivíduo sente-se atraído: pela beleza, harmonia e elegância das formas; por pessoas bonitas, perfumadas, bem cuidadas e bem vestidas; por animais de tal ou qual raça; por flores e plantas comuns ou exóticas; por paisagens, quadros, estátuas, arquiteturas, textos filosóficos, religiosos e místicos. Padrões morais também atraem os seres humanos que se unem na defesa de valores como justiça, verdade, bondade, santidade. Entre outros fins, os seres humanos associam-se para: elaborar leis e estabelecer o direito visando a uma convivência ordeira e pacífica na sociedade; cultivar a inteligência, estudar fenômenos naturais e culturais; levantar balizas para a retidão de conduta de modo a se reconhecerem como pessoas dignas; exercer atividades místicas e religiosas para se ligarem a Deus.

O relaxamento moral enfraquece o amor; o enfraquecimento do amor acarreta o relaxamento dos princípios morais. Imoderação, corrupção dos costumes, mentalidade mercantil nas instituições públicas, religiosas e místicas são sinais do relaxamento ético. Aos tipos de conduta considerados nocivos, a sociedade reage formulando normas penais. A indústria da pornografia e da perversão sexual, aliada ao tráfico de drogas, de mulheres e crianças, constitui mercado que rende bilhões de dólares aos seus exploradores e se difunde pela circulação de fotografias e gravações audiovisuais. A sociedade organiza e utiliza o aparelho policial e judiciário do Estado para combater essas atividades tipificadas como criminosas; além disso, promove campanhas educativas pelos meios de comunicação. Autoridades públicas e setores privados servem-se do erário como se fosse cofre particular; desprovidos do senso de moralidade, os agentes do governo utilizam o cargo para obter vantagens ilícitas, prejudicar adversários e conquistar favores sexuais de homens e mulheres adultos, adolescentes e crianças.

O ideário filosófico, a visão de mundo, o ritual patriótico, religioso ou místico e seu simbolismo, atraem e associam pessoas. Chamam filosofia ao amor à sabedoria; justiça ao amor à igualdade; teose ao amor a Deus. Atraída pelas coisas do espírito, a pessoa associa-se a outras em instituições onde são cultivadas doutrinas e crenças, às vezes, sem preocupação com explicações racionais. O amor à razão tende a dominar todos os assuntos e amortece a fé. Esta se rebela contra aquela. Blaise Pascal destacou a influência da inteligência emocional na conduta humana ao afirmar as razões do coração ignoradas pela inteligência racional. Por veredas emocionais próprias, o amor conduz à sabedoria. Os místicos utilizam a sabedoria do coração; dão-lhe prioridade ante o conhecimento exclusivamente racional. A imaginação produz o saber; a razão o formaliza e o cristaliza.

A arte fala do amor que aspira a eternidade, como a uma vida capturada na imobilidade da morte. Talvez tenha sido esse paradoxo que levou o poeta brasileiro, Vinicius de Moraes, a ironizar: “o amor é eterno enquanto dura”. Falava do amor como afeição do homem pela mulher e vice-versa. Às vezes, o discurso adquire extensão não cogitada pelo emissor. Da ironia contida na frase do poeta brasileiro capta-se ensinamento valioso.

No sentido cósmico, o amor é eterno, como vida, força afetiva universal vibrando no seio de Deus, genetriz e motor do universo. A teoria dos físicos contemporâneos concebe o universo composto de três tipos de matéria: o tipo de menor extensão, com estrutura atômica conhecida em escala microscópica (núcleo atômico) e macroscópica (galáxias); o tipo de média extensão, composto de matéria escura desconhecida, que ocupa os vazios existentes no espaço interno e externo das galáxias; o tipo de maior extensão, espécie de plasma inefável, substância tênue de estrutura desconhecida, ao que parece já em nível de onda; não estaria, pois, ao lado dos outros dois tipos e sim os envolvendo. Em termos científicos, afigura-se a hipótese de esse tipo de maior extensão sustentar os outros dois; em termos místicos, esse plasma pode ser comparado à alma universal. Stephen Hawking, expoente da Física contemporânea, informa: da observação do universo pelos astrônomos e astrofísicos verifica-se que o espaço continua, continua, continua. Apesar disso, o citado físico entende que há limite nessa expansão; formula a hipótese de o universo ser uma esfera com todos os bilhões de galáxias no seu interior afastando-se umas das outras até o momento da contração; a partir desse ponto, todas as galáxias concentrar-se-ão em uma só; a galáxia única contrair-se-á em uma só estrela, que se contrairá a um só átomo e chegará ao ponto zero. Supondo confirmada essa hipótese, caberá à ciência explicar o que existe mais além da superfície externa da esfera cósmica em sua máxima extensão.

Expressando-se na existência humana individual, o amor dura fração da eternidade; os sentimentos humanos têm o seu tempo de duração. Como o tempo é a fração da eternidade capturada pela inteligência humana, a existência individual e os sentimentos duram essa fração. No curso da existência a relação amorosa entre seres humanos sofre desgaste e pode chegar ao ponto zero. No caso de parceria para existência em comum e satisfação sexual, quando o desgaste chega ao ponto máximo, os parceiros se matam ou separam-se. Perdidas as ilusões, buscam novas parcerias ou preferem aventuras esporádicas e solidão regular. Motivados pela educação que receberam, por crença religiosa que professam, por circunstâncias políticas, sociais e econômicas que os cercam, alguns casais preferem manter a parceria apesar do desgaste. Como pedras, ex-parceiros rolam pela estrada da vida sem jamais se erigir em pedra angular; outros, de tanto rolar se tornam pedras polidas; esses caminhantes têm por companhia a esperança – doce ilusão que renasce no mais vivido e sofrido coração.

Após uma taça de poesia, seguir-se-á o tema FELICIDADE.

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