EUROPA (1900 a
2014). Continuação.
Simone de Beauvoir (1908 a 1986), francesa,
escritora de romances e ensaios, era adepta da filosofia existencialista.
Embora não se considerasse feminista,
Simone foi ícone do movimento feminista, principalmente por seus livros “O
Segundo Sexo”, “Os Mandarins” e “Memórias de uma Moça Bem-Comportada”,
publicados em 1949, 1954 e 1958, respectivamente. No primeiro, ela defende os
direitos da mulher; no segundo, descreve o círculo existencialista em Paris
após a segunda guerra mundial; no terceiro, narra fases da sua vida. Em “A
Força da Idade”, publicado em 1960, Simone conta fatos da sua vida ocorridos
entre 1929 e 1944, tais como: (1) o seu curso de filosofia; (2) o seu encontro
e convívio com Jean-Paul Sartre e a primeira separação; (3) o tempo da sua
formação literária, filosófica e política; (4) o seu magistério e o apogeu do
existencialismo; (5) as viagens, amizades, ocupação da França pelos alemães e a
libertação.
No pórtico do “Segundo Sexo”,
Simone faz duas citações a indicar parâmetros: Há um princípio bom que criou a ordem, a luz e o homem, e um princípio
mau que criou o caos, as trevas e a mulher (Pitágoras). Tudo o que os homens escreveram sobre as
mulheres deve ser suspeito, pois eles são, a um só tempo, juiz e parte
(Poulain de la Barre,
século XVII).
Simone busca alicerces na historia,
no mito e na ciência. Critica a posição subalterna da mulher na historia da
humanidade. O homem é o sujeito, o absoluto, enquanto a mulher é o “outro”. Na Biologia,
ela busca o amparo para demonstrar a injustificada desigualdade social entre o
homem e a mulher. Examina a questão também do ponto de vista psicanalítico. Na
mulher, o homem projeta todas as fêmeas do reino animal que se deitam
servilmente para a posse do macho. Os fenômenos da multiplicação assexuada e da
partenogênese não se mostram nem mais e nem menos fundamentais do que os da
reprodução sexuada. Na maioria das espécies, há cooperação mútua entre os
organismos masculino e feminino para reprodução. A mulher conhece uma alienação
mais profunda quando o ovo fecundado desce ao útero e aí se desenvolve. A
atividade ovariana, que desaparece com a menopausa após os 45 anos de idade,
traz efeitos psicossomáticos. Os dados biológicos desempenham papel relevante
na história da mulher. A eventual fraqueza muscular da mulher comparada à força
do homem não significa fraqueza moral e intelectual. A mulher tem que ser vista
e avaliada dentro de um contexto biológico, psicológico, econômico e social.
Não é a natureza que define a mulher e sim a mulher que se define retomando a
natureza em sua afetividade. Freud não se preocupou muito com o destino da
mulher. Embora admita que em termos evolutivos a sexualidade da mulher está no
mesmo nível da sexualidade do homem, Freud sustenta que a essência da libido é
masculina, surja ela no homem ou na mulher. Uma vida é uma relação com o mundo.
Escolhendo-se através do mundo é que o indivíduo se define; é para o mundo que
nos devemos voltar a fim de responder questões que nos preocupam. A mulher se
define como ser humano em busca de valores no seio de um mundo de valores,
mundo cuja estrutura econômica e social é indispensável conhecer. A mulher deve
se precaver contra o gosto pelo poder e evitar os defeitos dos homens. A teoria
do materialismo histórico evidenciou verdades importantes. A humanidade não é
uma espécie animal e sim uma realidade histórica. A sociedade humana não sofre
passivamente a presença da natureza; ela a retoma em suas mãos. O destino da
mulher e o destino do socialismo estão intimamente ligados. A mulher e o
proletário são oprimidos. Ética verdadeiramente socialista que procure a
justiça sem suprimir a liberdade, que imponha encargos aos indivíduos sem
abolir a individualidade, ver-se-á embaraçada com os problemas postos pela
condição da mulher. O monismo sexual de Freud e o monismo econômico de Engels
são inadequados para explicar e compreender a mulher. A tendência da humanidade
é a de superar-se. A mulher há de superar a sua posição subalterna na sociedade
libertando-se dos grilhões que lhe foram postos.
Marguerite Duras (1914 a 1996), nascida
Marguerita Donnadieu, na colônia francesa de Saigon, Indochina, onde passou a
infância e a adolescência. Mudou-se para Paris, cursou Direito e Ciência Política
na Sorbonne. Formou-se em 1935. Filiou-se ao partido comunista, participou
ativamente da resistência francesa durante a segunda guerra mundial quando a
França foi invadida pelas tropas alemãs. A partir de 1943, começa a publicar
seus livros, dos quais “O Amante” se destacou por seu valor literário e rendeu
a Marguerite o Prêmio Goncourt em 1984. O livro cobre o período de 1932 a 1949. Trata da
experiência de vida da autora, sua mãe e irmãos na Indochina, do seu primeiro
caso de amor com o filho de um milionário chinês aos quinze anos de idade, de
quem ela se torna amante. Descreve a navegação no Rio Saigon, braço do Rio
Mekong, a insuficiência ou ausência de rodovias e ferrovias na região, os
navios que ligavam a Indochina à França em demoradas viagens de 24 dias até que
fossem criadas as primeiras linhas aéreas. A narrativa alcança a vida adulta da
autora em Paris, a morte da mãe e do irmão mais novo. Refere-se ao péssimo
caráter do irmão remanescente, larápio, gigolô, viciado, que vendeu os bens da
família, ficou na miséria, primeiro emprego como vigia de fábrica aos 50 anos de
idade. No seu livro “A Dor”, lê-se: Essa
nova face da morte organizada, racionalizada, descoberta na Alemanha, antes da
indignação, desperta perplexidade. Fica-se assombrado. Como continuar a ser
alemão? Buscam-se equivalências em outras partes, em outros tempos. Não existe
nada. Uma das maiores nações civilizadas do mundo, a capital da música de todos
os tempos, acaba de assassinar 11 milhões de seres humanos de maneira metódica,
perfeita de uma indústria de Estado. Além de dezenas de livros, Marguerite
produziu peças de teatro e filmes como diretora e roteirista. Entre estes,
destaca-se “Hiroshima meu Amor”.
José Saramago, romancista, poeta,
dramaturgo, nascido em 1922 na província do Ribatejo, em Portugal, granjeou
fama internacional com seus livros. Da sua produção intelectual constam:
“Levantado do Chão”, “O Ano da Morte de Ricardo Reis”, “Ensaio Sobre a
Cegueira”, “O Homem Duplicado”, publicados entre 1980 e 2002. Em “O Evangelho
Segundo Jesus Cristo”, José dá vestes próprias aos eventos narrados no
evangelho. Ele se vale da imaginação e da licença artística como ao narrar a
visita do anjo a Maria disfarçado de mendigo, a gruta em que ela estava com o
filho recém nascido, o terror provocado pelo decreto de Herodes, a fuga, os
diálogos com deus, a ovelha que Jesus titubeava em sacrificar e que deus
insistia fosse morta, o debate entre deus e o diabo, e assim por diante. Nada
de pieguice. Nada de milagre. Palavras aos borbotões. Costumes e fatos
históricos citados como pano de fundo. O ostensivo a ocultar o recôndito. A
terra mais saliente do que o céu. Recebeu o Premio Nobel.
Milan Kundera, escritor nascido
em 1929, na cidade de Praga, Tchecoslováquia, testemunha a sujeição do seu país
ao regime comunista. Trabalhou como operário, foi músico de jazz e se dedicou à
literatura. Seu primeiro livro intitulado “A Brincadeira”, publicado em 1967,
inscreve-se no movimento de libertação que culminou com a invasão do país pelas
tropas soviéticas em 1968 (Primavera de Praga). A partir daí, os seus livros
foram proibidos. Milan mudou-se para a França (1975). Tal qual o seu
conterrâneo Kafka, para Milan também a vida é um absurdo, destituída de
qualquer significado, ora sonho, ora pesadelo. A sua experiência de vida
ajudou-o a escrever “A Insustentável Leveza do Ser”, notável romance de amor e
erotismo que tem como personagens dois casais que nas suas mútuas relações
acabam se atraindo para fins libidinosos. Há separações e trocas. O romance
expõe problemas do relacionamento humano num cenário político opressivo
(1983).
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