sábado, 22 de junho de 2013

O BRASIL E A CONSTITUIÇÃO III



A deposição pelo governo central da junta governativa eleita pelo povo causou forte reação liberal em Pernambuco (1822). Com a outorga da Carta Imperial (1824) a oposição republicana inflamou-se. O caldo entornou quando o governador escolhido pelo povo (Paes de Andrade) foi substituído por outro (Pais Barreto). Os pernambucanos recusaram o indicado, mantiveram o eleito, romperam com o poder central e organizaram a Confederação do Equador (referência à linha planetária). As províncias do Maranhão, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Alagoas e Bahia aderiram à confederação. Os líderes confederados convocaram assembléia constituinte para organizar um Estado nos moldes dos EUA. Divergências internas enfraqueceram o movimento republicano que terminou derrotado pelas forças imperiais de terra e mar.

No Sul, a Província Cisplatina pretendia desligar-se do Brasil e integrar-se às Províncias Unidas do Rio da Prata (Argentina). Apoiados pela população local, os platinos invadiram a província. O governo brasileiro reagiu com força militar (1825). Três anos depois, com a intermediação da Inglaterra, as partes beligerantes celebraram a paz, ocasião em que foi reconhecida a independência da Cisplatina e a sua conversão em Estado soberano: República Oriental do Uruguai (1828).

No período da regência que se seguiu à abdicação de Pedro I (1831 a 1840) houve levantes populares como a cabanagem, na Província do Grão-Pará, a sabinada na Província da Bahia e a balaiada, na Província do Maranhão. A cabanagem proveio das agruras daquela gente pobre e trabalhadora (sertanejos, ribeirinhos, negros, índios, caboclos, mulatos), cujas habitações pareciam cabanas, de onde derivou o nome desse movimento social (1835 a 1840). Os cabanos pleiteavam melhores condições de vida. Desatendidos e reprimidos pelo governo, reagiram e partiram para a luta armada. Sem planejamento, guiavam-se pela emoção e pela intuição. Expulsaram o presidente da província, assumiram o governo, mas não sabiam o que fazer. Embora insatisfeitos com o status quo, faltava-lhes ideário e projeto de mudança (só vontade e insatisfação eram insuficientes para governar). A sabinada, nome derivado do seu líder, o médico Francisco Sabino Álvares da Rocha Vieira, foi uma revolta urbana que obteve a adesão de parte das forças imperiais, libertou Bento Gonçalves da prisão em Salvador, expulsou o presidente da província e proclamou a República da Bahia (1837 a 1838). Por causa do seu ofício, Francisco dos Anjos Ferreira recebeu o apelido de Balaio. O movimento liderado por ele e que se caracterizou como guerrilha rural, recebeu o nome de balaiada. Ele se revoltou contra a autoridade pública quando viu impunes os policiais que violentaram suas duas filhas. À semelhança do outro Ferreira (Virgulino, o Lampião) formou um bando, percorreu o interior da província praticando violência e ampliou sua revolta contra o governo imperial (1838 a 1841).

Os distúrbios continuaram com Pedro II no governo (maioridade antecipada). Em Pernambuco, marginalizados da atividade econômica, os brasileiros revoltaram-se contra os lusitanos (comerciantes e senhores de engenho). Denominado revolta praieira (nome derivado da Rua da Praia onde se localizava o jornal dos liberais) o movimento começou na capital e adentrou a província apoiado pelos liberais radicais (1844 a 1850). Os pernambucanos almejavam participar da atividade comercial, obter garantia de trabalho e voto livre e universal, entre outros direitos. No Sul, descontentes com a centralização política e com a concorrência platina no comércio do couro e do charque, ruralistas se revoltaram. Na estância, peões e escravos largavam o trabalho e pegavam em armas para defender os interesses do patrão e suas idéias separatistas e republicanas. Conhecido como guerra dos farrapos, esse movimento foi liderado por Bento Gonçalves, aclamado Presidente da República Riograndense (1835 a 1845). A revolução farroupilha estendeu-se à Província de Santa Catarina onde foi proclamada a República Juliana. Houve, ainda, operações militares na Argentina, contra o governo de Rosas (1851 a 1852); no Uruguai, contra o governo de Aguirre (1864); e no Paraguai, contra o governo de Solano Lopez (1864 a 1870).

A deposição de Pedro II resultou do golpe contra a monarquia desferido por um grupo de militares. A população ficou surpresa. Política era negócio da elite (donos de fazendas e engenhos, banqueiros, empresários, bacharéis, intelectuais). Liberais de um lado e conservadores de outro disputavam o governo; todos ricos ou bem amparados no erário. A parcela humilde da população se entristeceu com o exílio do Imperador, homem sexagenário, culto, estimado e visto como um pai bondoso. O movimento republicano intensificou-se diante dos efeitos sociais e econômicos da abolição da escravatura. As idéias republicanas vinham de longe, motivaram a dissolução da primeira assembléia constituinte e geraram conflitos internos até desaguarem no golpe militar de 1889. Essas idéias espelhavam a vocação da América para a república (oposta à vocação da Europa para a monarquia). Depois da independência, as colônias européias no continente americano se tornaram repúblicas.

A América Portuguesa formara uma sociedade escravocrata do século XVI ao XIX. A pretexto da perda da mão-de-obra escrava, os fazendeiros e senhores de engenho colocaram-se contra a monarquia. Os destinos do Brasil continuavam nas alvas mãos do patriciado (feição aristocrática da sociedade brasileira). A exploração da borracha na região amazônica aumentou a riqueza da aristocracia rural, trouxe luxos urbanos e empregos a nordestinos e nortistas. No sul do Brasil, os cafeicultores progressistas reivindicavam maior autonomia às províncias e a descentralização do poder político visando à pronta e eficiente solução dos seus problemas. Pleiteavam incentivo à imigração, financiamento de ferrovias e crédito à produção. O setor agrário e o exportador predominavam na economia. O surto industrial, a expansão das ferrovias e dos estabelecimentos de crédito, o desenvolvimento do comércio e dos serviços urbanos geraram uma classe média urbana que pouco a pouco foi se fortalecendo com maior participação na vida política e se integrando à corrente republicana. Essa corrente ganhou um forte elo ao ser apoiada pela igreja católica desde que o governo imperial se recusou a acatar bula do Papa que proibia vínculo de católicos com maçons (1864). Obedecendo à bula, os bispos expulsaram os maçons das irmandades religiosas (1873). O governo imperial processou os bispos e os condenou à prisão com trabalhos forçados (depois, eles foram anistiados). Separação entre Estado e Igreja fazia parte do ideário republicano.

Após a guerra com o Paraguai, o exército brasileiro se fortaleceu e não mais se conformou com o pouco apreço que lhe devotava o mundo civil. Oficiais e alunos da Escola Militar aderiram ao positivismo de Augusto Comte. Isto lhes ensejou autoridade intelectual e um rumo político e ideológico seguro. Os militares estavam contrariados com algumas decisões do governo imperial, inclusive as concernentes à captura de escravos; achavam-se também no direito de participar do governo de modo mais efetivo. O militarismo integrou a vida republicana desde o nascedouro. O exército recrutou pessoal em todas as camadas sociais, equipou-se materialmente, elaborou doutrina militar e criou mentalidade própria das forças armadas, o que lhe ensejou papel institucional relevante.

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