PAI NOSSO.
Os apóstolos Mateus e Lucas
reproduzem essa oração ensinada por Jesus no sermão da montanha. Os demais
apóstolos silenciam a respeito. Segundo Lucas, os discípulos solicitaram ao
mestre que lhes ensinasse a rezar. Mateus não menciona tal solicitação e coloca
a prece no bojo do discurso que Jesus proferia sem interrupção.
Depreende-se do evangelho de
Mateus, que o mestre ensinava o modo de rezar. O discípulo devia orar em
segredo, isolado em um quarto, com portas fechadas, sem multiplicar as
palavras, diferente dos hipócritas que gostam de orar em pé nos templos e nas
esquinas das ruas. No dizer do apóstolo Marcos, as palavras devem sair conforme
inspiração do momento, pois antes de serem pronunciadas, Deus sabe quais serão
(Mc 13: 11). A atitude de fé, de respeito e de recolhimento vale tanto quanto
as palavras. Jesus exemplifica. Entretanto, os seus seguidores mantêm atitude
diversa e congelaram as palavras do exemplo como se fossem únicas e eternas:
Pai nosso que estais no céu, santificado seja o vosso nome, venha a nós
o vosso reino, seja feita a vossa vontade, assim na terra como no céu. O pão
nosso de cada dia nos dai hoje, perdoai-nos as nossas dívidas assim como nós
perdoamos aos nossos devedores e não nos deixeis cair em tentação, mas
livrai-nos do mal. (Mt 6: 5-13)
Pai, santificado seja o vosso nome, venha o vosso reino, dai-nos hoje o
pão necessário ao nosso sustento, perdoai-nos os nossos pecados, pois também
nós perdoamos aqueles que nos ofenderam e não nos deixeis cair em tentação.
(Lc 11: 2-4).
Da comparação entre o texto de Mateus e o texto de
Lucas, percebe-se que a linguagem dos apóstolos não espelha fielmente as idéias
e as palavras do mestre. Nesta e em outras passagens, os quatro evangelistas
colocam na boca de Jesus palavras que ele não disse, pois algumas são
contraditórias e outras desprovidas de sentido. Marcos e Lucas não são
testemunhas da vida de Jesus. Marcos narra o que lhe contou o apóstolo Pedro.
Lucas declara expressamente, no prólogo do seu evangelho, não ter sido
testemunha ocular dos acontecimentos. Mateus e João, apóstolos da primeira
hora, escreveram depois de 50 e 70 anos da crucifixão de Jesus,
respectivamente, lapso de tempo favorável ao esquecimento e à confusão. Além
disto, o clero procedeu a acréscimos e supressões que desfiguraram a mensagem
original. O evangelho de Mateus foi escrito em aramaico; os três restantes, em
grego; todos traduzidos para o latim em conseqüência do domínio romano. Durante
os séculos IV (anos 301 a
400) e V (anos 401 a
500), Jerônimo, erudito sacerdote católico, procedeu, a pedido do papa Dâmaso,
à revisão das versões latinas dos evangelhos e os reuniu na versão denominada
Vulgata. Após a queda do império romano, o latim perdeu, paulatinamente, o
papel de língua universal. A partir do século XIII (anos 1201 a 1300) a bíblia começa
a ser traduzida para o vernáculo de reinos medievais e de nações modernas. No
século XX (anos 1901 a
2000), centros de estudos bíblicos traduziram textos originais dos apóstolos –
e não exclusivamente dos quatro evangelistas – o que possibilitou melhor
compreensão daquele movimento histórico. Nessa viagem de dois mil anos,
passando por diferentes mãos, épocas e contextos históricos, os evangelhos
sofreram interpolações. Há discrepâncias que abalam sua credibilidade.
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