domingo, 19 de outubro de 2025

FUTEBOL

Mediante jogos amistosos, a seleção brasileira de futebol masculino vem sendo orientada e testada pelo treinador italiano. Jogo amistoso significa busca de aprimoramento individual e coletivo fora de campeonato. Neste mês, a seleção brasileira jogou com as seleções coreana e japonesa. 
Na Coreia, em 10/10/2025, a seleção local perdeu de 5 x 0. Os brasileiros atuaram com alta velocidade nos movimentos, admirável entrosamento e bom preparo físico. Praticaram o drible sem oposição do treinador. Há treinadores obcecados pelo coletivismo, castradores do individualismo. Acham o drible exibicionista e contraproducente. Neutralizam talentos. Para o bom desempenho do time, o drible é tão importante quanto o passe. Basta moderação nos dois fundamentos. 
No Japão, em 14/10/2025, quer durante a execução dos hinos nacionais, quer durante o minuto de silêncio, o público japonês se manteve quieto e respeitoso. Requinte cultural. Os jogadores japoneses e comissão técnica mostraram espirito esportivo durante a partida. No primeiro tempo, perderam: 2 x 0. No segundo tempo, venceram: 3 x 0. Placar final: vitória da seleção japonesa por 3 x 2. Os japoneses mostraram-se aguerridos, velozes, com bom preparo físico e técnico. Sabem driblar. Marcaram os gols aproveitando vacilos da defesa brasileira. O treinador japonês mostrou que entende de táticas e sabe como alterar o movimento da equipe durante o jogo. O treinador da seleção brasileira, no primeiro tempo, experimentou colocar 8 jogadores que não haviam participado do jogo na Coreia. No segundo tempo, substituiu alguns, sem evitar a derrota.  
O resultado dos jogos amistosos, quando as equipes estão sendo testadas, deve ser submetido a análise racional e a crítica construtiva. Euforia na vitória e rigor condenatório na derrota são sinais de que as partidas amistosas não estão sendo encaradas como testes. Honra ao mérito: os brasileiros se esforçaram e fizeram boa exibição. Eventual vacilo é comum nesse esporte. Quase todo gol marcado tem na sua origem o casual vacilo dos defensores do time que o sofreu. Os jogadores que vacilam não merecem massacre moral. Erram hoje. Acertam amanhã. Errar é humano, diziam nossos avós.   
Tão logo concluída a fase dos testes, neste ou no próximo ano, o treinador montará a estrutura definitiva da seleção brasileira. Há craques que ainda não foram convocados (por ordem alfabética): Coutinho, Dudu, Gabigol, Gerson, Hulk, Lucas Moura, Thiago Silva. A experiência, a capacidade técnica e a criatividade desses craques ensejarão segurança, equilíbrio e eficiência à seleção, principalmente diante de seleções solidificadas e de alto nível técnico. 
Aos treinadores em geral, cabe enxergar a realidade e agir com autonomia e bom senso. Eles enfrentam desafios como: 
1. Escalar os jogadores mais aptos na ocasião dos jogos. 2. Distribuir 11 jogadores em campo: 1 goleiro + 5 zagueiros + 5 atacantes. [Terminologia simplificada].
2.1. Estática: I. Na grande zaga: (i) em cada lado da área: 1 zagueiro (ii) no meio do campo: 1 zagueiro no centro, 1 no lado esquerdo e 1 no lado direito. II. No campo adversário: 1 centroavante, 1 meio-atacante à esquerda, 1 meio-atacante à direita e 1 atacante em cada ponta.
2.2. Dinâmica: Conforme o potencial do elenco e a personalidade, o conhecimento e a experiência do treinador, o movimento dos jogadores em campo pode ser planejado: I. De modo rígido: (i) o treinador traça as linhas de ação no mapa que pretende ver respeitado independente da tática da equipe adversária (ii) mantém um núcleo estável e escala os mesmos jogadores em todos os jogos (iii) coloca a sua vontade e a sua autoridade acima de qualquer contingência ou intervenção. II. De modo flexível: (i) adota esquema aberto ajustando-o à tática do adversário (ii) varia a escalação segundo as características dos jogadores nas respectivas funções (iii) ouve opiniões dos dirigentes, dos auxiliares, dos jogadores, dos torcedores, dos jornalistas esportivos, ainda que não as siga total ou parcialmente. 
Os treinadores se deparam com as seguintes dificuldades: 1. Real situação doméstica e social dos jogadores (conflitos, baladas, desregramentos). 2. Ciclos do rendimento de cada jogador (altos e baixos). 3. Excesso de compromissos esportivos e consequente desgaste da equipe. 4. Jogadores fora de ação para tratamento médico ou por motivo disciplinar. 5. Erros dos árbitros. 6. Pressão das torcidas. 7. Questões financeiras do clube. 8. Questões éticas com os jogadores, com a comissão técnica, com a diretoria e/ou com a entidade dirigente do esporte. 9. Questões jurídicas nos tribunais esportivos e/ou nos tribunais judiciários.
O cultivo do espírito esportivo contribui para fortalecer virtudes humanas e amenizar destemperos. Jogadores sul-americanos costumam ser catimbozeiros, mais indisciplinados e reclamadores do que os europeus. Os asiáticos amarelos são respeitosos e disciplinados. Os asiáticos morenos e os africanos, nem tanto. Isto pode mudar para melhor ou para pior. Nas relações humanas, congelar ideias, vontades e comportamentos não é a regra e sim a exceção.

terça-feira, 14 de outubro de 2025

VAGA NO STF

O jurista Luiz Roberto Barroso aposentou-se do cargo de Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). Para sucedê-lo, nomes de juristas foram apontados pelos meios de comunicação e nas esferas política e forense. O nome de Rogério Favreto não foi cogitado. Trata-se do desembargador do Tribunal Regional Federal da 4ª Região que, em 2018, concedeu habeas corpus em favor de Luiz Inácio Lula da Silva, político preso por decisão e ordem abusivas das autoridades judiciais da fraudulenta Operação Lava-Jato.
Cabe exclusivamente ao Presidente da República (PR), quando achar oportuno, indicar o candidato ou a candidata ao cargo. A Constituição da República (CR) estabelece os requisitos para cidadãos serem nomeados ministros do STF: (i) idade superior a 35 anos e inferior a 65 anos (ii) notável saber jurídico (iii) reputação ilibada. Cabe ao Senado Federal, por maioria absoluta, sabatinar e aprovar ou reprovar o/a candidato/a. Se houver reprovação, o PR será comunicado e, então, indicará outro/a candidato/a. Renova-se o procedimento. Em havendo aprovação, o PR nomeará a pessoa aprovada quando achar oportuno. Não há prazo certo para indicar candidato e tampouco para nomear quem for aprovado. Isto fica ao talante do PR. 
O vocábulo cidadão, que o preceito constitucional utiliza no plural, abrange brasileiros natos no pleno gozo dos direitos políticos. Pessoas com idade igual ou menor de 35 anos e com idade igual ou superior a 65 anos, não poderão ser nomeadas. Os limites foram impostos pelo legislador constituinte de 1988. Antes disto, o PR nomeava pessoas que ficavam poucos dias no cargo e se aposentavam. Havia o propósito de premiar apoiadores civis da ditadura com proventos pagos pelo estado.
O notável saber jurídico exigido do/a candidato/a distingue-se do conhecimento genérico dos bacharéis em direito. Certa vez, em sessão do STF, o ministro Barroso ironizou o “notável saber jurídico” como se tratasse de algo imaterial, subjetivo, de difícil avaliação e fácil enganação. Entretanto, no plano conceitual, trata-se de conhecimento científico e filosófico do fenômeno jurídico na sociedade. Conhecimento haurido da teoria e da prática do direito pelo advogado, pelo defensor público, pelo agente do ministério público, pelo magistrado, pelo professor universitário. Conhecimento notabilizado pela excelência da sua produção no exercício das citadas profissões. Nessa produção entram arrazoados forenses, pareceres, sentenças, votos em sessão de julgamento nos tribunais, títulos acadêmicos, seminários, conferências, artigos em revistas especializadas, livros, aprovações em concursos públicos. Este saber, aferido pelo Senado, inclui maturidade e sensatez decorrentes do modus vivendi do seu portador.
A reputação do/a candidato/a há de ser ilibada, isto é, sem mácula, sem antecedentes desabonadores, não apenas como jurista e cidadão ou cidadã, mas, também, como pessoa natural honesta e cumpridora dos seus deveres para com a família e a sociedade. 
A pessoa nomeada toma posse de um cargo de alta relevância e se investe de autoridade togada cuja função não é só jurídica. O legislador constituinte atribuiu especial função política ao STF quando lhe confiou a guarda da Constituição. Manteve, pois, na competência do tribunal, o controle da constitucionalidade das leis. Isto significa autorizada e legítima interferência judicial, a posteriori, no processo legislativo. Porém, tal como nos demais tribunais judiciários, o STF só atua quando provocado no devido processo legal. Portanto, para sair da passividade, o tribunal depende da iniciativa dos interessados. Como a CR é analítica e extensa, abrangendo as dimensões política, social e econômica da nação, a competência do seu guarda, o STF, adquire igual extensão. Disto resulta o que se convencionou chamar de “judicialização”. Todavia, se os poderes legislativo e executivo atuarem em consonância com os preceitos constitucionais, não haverá “judicialização”. 
A pessoa nomeada para o cargo leva consigo uma incógnita. As qualidades pessoais positivas podem sofrer mutação. O Dr. Jekyll transforma-se no Mr. Hyde. As fraquezas humanas podem macular o caráter daquela pessoa. Espírito público, imparcialidade, independência, serenidade, senso de justiça, dedicação à judicatura, assiduidade, celeridade, eficiência, tudo se avilta por vaidade, arrogância, ímpetos despóticos, atividade política partidária e outros fatores incompatíveis com a magistratura.
A escolha de ministro/a cai regularmente sobre jurista afinado/a com os sentimentos, pensamentos e visão do mundo do PR. Via de regra, tanto nos períodos democráticos como nos períodos autocráticos da história do Brasil, os presidentes seguiram esse caminho que eles não inventaram. Esse caminho foi aberto pelo presidente dos Estados Unidos em 1789 e planificado por seus sucessores após o caso Marbury versus Madison julgado pela Corte Suprema em 1803. A decisão do tribunal, lavrada pelo juiz John Marshall, firmou os princípios: (i) da supremacia da Constituição Federal ante leis federais e estaduais (ii) do controle judicial da constitucionalidade das leis. A decisão foi acatada pelos poderes legislativo e executivo. Isto significou importante conquista política do judiciário e se tornou dogma do constitucionalismo na América e na Europa. Desde aquela época, os presidentes dos Estados Unidos, ad cautelam, indicam e nomeiam para a Suprema Corte, juristas vinculados ao seu partido político (democrata ou republicano).

Constituição da República Federativa do Brasil. Artigos: 52, X + 84, XIV + 101, p.ú. + 102 caput e inciso I, letra a.
A Corte Suprema e o Direito Constitucional Americano. Lêda Boechat Rodrigues. Rio. Revista Forense. 1958. Pág. 35/41.
Direito Político Brasileiro. Fernando Whitaker da Cunha. Rio. Forense. 1978. Pág. 205/214.
Poder Constituinte e Constituição. Antonio Sebastião de Lima. Rio. Plurarte. 1983. Pág. 84/85.


domingo, 28 de setembro de 2025

BLINDAGEM II

A Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal (CCJ), em sessão do dia 24 de setembro de 2025, rejeitou, por unanimidade, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 3/2021, sobre prerrogativas parlamentares, encaminhada pela Câmara dos Deputados. Os deputados nela haviam incluído presidentes de partidos. Fizeram tábula rasa do fato de o partido político ser pessoa jurídica de direito privado. Outorgaram prerrogativa a quem não era parlamentar e nem autoridade pública. O objetivo era blindar os presidentes, principalmente o do Partido Liberal, livrando-os de inquéritos e processos criminais. 
O Partido Liberal talvez seja o maior partido nazifascista da América do Sul. [Os termos nazifascismo e nazifascista são empregados neste artigo no sentido doutrinário ideológico]. Esse partido contornou exigência constitucional de resguardar a soberania nacional e o regime democrático. A sua atividade é incompatível com a norma constitucional. O nazifascismo é essencialmente autocrático, demolidor das instituições democráticas. O seu líder no Brasil, ao bater continência para a bandeira dos Estados Unidos, sobrepõe a soberania estrangeira à nacional. Ao desfilar na Avenida Paulista sob imensa bandeira daquele país, esse partido mostrou sua devoção à supremacia estrangeira. A bandeira não é simples pedaço de pano para mané enrolar no corpo. Mais do que tecido, a bandeira é símbolo da independência e da soberania da nação juridicamente organizada.    
Na CCJ, os senadores do partido nazifascista mostravam desconforto ao rejeitar a PEC 03/2021. Eles tiveram dificuldade para deglutir a opinião pública exposta no colossal e significativo movimento popular do dia 21/09/2025. Ao coincidir com o início da Primavera, esse movimento simbolizou o florescimento da consciência cívica do povo brasileiro, um novo ciclo do civismo nacional que, por longo tempo, fica adormecido nas profundezas da alma coletiva para só despertar quando surge premente ocasião.  
Senadores do partido nazifascista, despeitados e inconformados por se verem na contingência de seguir a maioria dos senadores da CCJ – pois, se não o fizessem, cairiam em desgraça perante o eleitorado e poderiam não ser reeleitos – discordavam do peso político atribuído ao movimento do dia 21. Disse, um deles, que o movimento anterior do seu partido reuniu multidão maior na Avenida Paulista sem que houvessem semelhantes avaliação e efeito. Esse tipo de reação é apelidado, no jargão forense, de “jus esperneandi”, frase jocosa para indicar o desespero de quem está perdendo a demanda. A citada e almejada superioridade numérica da anterior multidão antidemocrática em relação à posterior multidão democrática na Avenida Paulista, depende da verificação honesta por cálculo sem truques. Além disto, o movimento democrático não se limitou à capital de São Paulo. Aconteceu, também, em Copacabana e em diversas capitais do Brasil. Portanto, trata-se de movimento nacional contrário à blindagem e à anistia. 
O movimento popular democrático, no propósito claro e específico de impedir o ingresso da PEC e do PL no ordenamento jurídico do estado, significou exercício direto da soberania e da cidadania, dois princípios fundamentais da República Federativa do Brasil. Portanto, não foi mero e pálido protesto e sim determinante expressão da vontade soberana do povo que vincula os seus representantes no Congresso Nacional e na Presidência da República. Trata-se do exercício direto do poder do povo pelo povo. Ao rejeitar a PEC, o Senado obedeceu à expressa vontade do povo. A “voz rouca das ruas”, frase agradável aos ouvidos e de sabor poético, destoa do movimento popular de 21 de setembro. Neste, não houve rouquidão. Nada existiu de cavernoso e sem nitidez. Tudo foi bem claro e de alta sonoridade. 
O PL sobre anistia, ainda que camuflado com os arbustos da dosimetria, provavelmente não será aprovado no Senado. Mediante esperteza enganosa, os deputados adentraram seara do Poder Judiciário ao pretenderem reduzir as penas aplicadas a quem cometeu crime contra o estado democrático de direito. Imoralidade e antijuridicidade explícitas.  
Ao contrário do que afirmaram os amargurados senadores nazifascistas na CCJ, os parlamentares democratas não consultam o Supremo Tribunal Federal (STF) por medo ou subserviência e sim por cautela e respeito à Constituição. Amparados no constitucional princípio da harmonia, buscam informar-se a fim de evitar que as normas projetadas, uma vez publicadas, sejam declaradas inconstitucionais pelo tribunal. 
Por outro lado, consulta jurídica é atividade privativa dos advogados. Se feita a ministro do STF e este responder oralmente ou por escrito, ficará tipificado o exercício ilegal da advocacia. Os juízes de direito e os tribunais judiciários não são órgãos de consulta. Por isto mesmo, não podem funcionar como assessores jurídicos do Legislativo e do Executivo e nem como consultores jurídicos de partidos políticos. Essas funções cabem: (i) aos advogados das estruturas administrativas do estado e dos partidos e/ou (ii) aos escritórios de advocacia contratados. Os juízes e tribunais devem manter equidistância, julgar com imparcialidade e se comportar com austeridade, sob pena de: (i) perderem autoridade moral, credibilidade, respeito e assim (ii) converterem-se em massa amorfa no solo de uma desabrida politicagem. 

Constituição da República Federativa do Brasil. Artigos: 1º incisos I/II e parágrafo único + 2º + 14 e seus incisos + 17 caput e §2º + 95 parágrafo único + 102.
Lei Orgânica da Magistratura Nacional. Lei Complementar 35/1979. Artigo 36 e seus incisos. 
Estatuto da Advocacia. Lei federal 8.906/1994. Artigo 1º inciso II.

domingo, 21 de setembro de 2025

BLINDAGEM

A Câmara dos Deputados votou, neste mês de setembro/2025, proposta de emenda à Constituição (PEC) sobre prerrogativas dos parlamentares e votou projeto de lei (PL) sobre anistia. Essas votações causaram: (i) indignação à parcela honesta e de feição democrática do povo brasileiro (ii) satisfação à parcela nazifascista do povo e às organizações criminosas. A PEC e o PL: (i) não atendem ao bem comum, ao bem-estar da população, ao interesse público (ii) protegem interesses particulares dos deputados e os livra da persecutio criminis a que homens e mulheres comuns estão sujeitos. Agora, estão no Senado Federal, sem regime de urgência. Portanto, antes de irem ao Plenário, passarão pelo crivo das comissões permanentes, segundo a competência de cada uma. Se forem rejeitados, não serão incorporados à ordem jurídica nacional. Se forem aprovados: (i) a PEC será promulgada diretamente pelas Mesas da Câmara e do Senado (ii) o PL será encaminhado ao Presidente da República para sanção.   
A PEC sobre prerrogativas recebeu da opinião pública os apelidos de “pec da blindagem”, “pec da impunidade”, “pec da bandidagem”, sinal de indignação ao perceber o propósito dos deputados de salvarem a si próprios e à sua clientela, da punição pelos crimes que cometeram e cometem. O público notou a intenção dos deputados de cobrirem a si mesmos e aos seus clientes, com a chapa malhada na fornalha do processo legislativo.  
Os deputados votaram urgência desnecessária e injustificada para os trâmites da PEC. Desde 2021 ela estava na Câmara sem que houvesse impulso fora do curso normal. Agora, em 2025, os deputados consideraram-na urgente em face: (i) dos julgamentos feitos pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em ações penais contra civis e militares do alto escalão da república, inclusive ex-presidente (ii) do fato de a maioria dos ministros não se intimidar com as pressões internas e externas que o STF vem sofrendo.    
Para a sociedade civil, a PEC não tem importância alguma, eis que as prerrogativas dos parlamentares já estão descritas e asseguradas nos artigos 14, §9º + 53/56, da Constituição. Isto mostra que a pretensão dos deputados não se refere a prerrogativas e sim a privilégios. As prerrogativas existentes, postas pela Assembleia Nacional Constituinte, garantem a livre atividade legislativa desde o início da vigência da Constituição de 1988 e das emendas 6/1994 e 35/2001. Os adeptos da democracia sabem da necessidade e da importância dessas prerrogativas para: (i) o bom funcionamento da ordem jurídica do estado (ii) o desenvolvimento social e econômico da nação. As prerrogativas do presidente da república e dos juízes são igualmente necessárias e importantes para esses mesmos fins. 
O princípio da separação, independência e harmonia dos poderes é da essência da democracia. Os órgãos legislativos, executivos e judiciários, representam o poder do estado e a soberania da nação. Eles devem respeitar o caráter republicano do estado e a forma democrática de governo. Cada órgão tem o dever de respeitar as funções e as prerrogativas dos outros, na dinâmica do mecanismo constitucional de freios e contrapesos.
Entende-se por prerrogativa, o conjunto de direitos específicos e necessários para o titular exercer a sua função pública. O que os deputados pretendem com a PEC chama-se privilégio, vantagem pessoal não outorgada aos outros. Os deputados querem para si imunidade penal plena e liberdade absoluta, enquanto o presidente da república, os juízes e os cidadãos, gozam de liberdade relativa e estão sujeitos às penas da lei se cometerem crimes.    
Ao PL da anistia, também, faltam moralidade e juridicidade. Nota-se o intuito dos deputados – ao violarem o constitucional princípio da separação, independência e harmonia dos poderes – de afrontar a jurisdição do STF. Pretendem anistiar autores de crimes gravíssimos cometidos contra o estado democrático de direito, alguns já condenados pelo STF no devido processo legal. Anistia ampla, geral e irrestrita adequa-se ao arbítrio da ditadura. [1964-1985]. No vigor da democracia, há limites éticos e jurídicos para concessão de anistia. [1988-2025].

domingo, 14 de setembro de 2025

JULGAMENTO

Nas sessões dos dias 9, 10 e 11 de setembro de 2025, a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) julgou procedente o pedido de condenação formulado pelo Ministério Público (MP) na ação penal pública originária proposta contra Jair Messias Bolsonaro e outros acusados da prática de crimes contra o estado democrático de direito e o patrimônio público. Foram aplicadas penas privativas de liberdade e pecuniárias. A sentença condenatória (acórdão) conterá os nomes dos réus, sucinta exposição da acusação e da defesa, os motivos de fato e de direito que fundamentaram a decisão, os artigos de lei aplicados e o dispositivo (juízo final). Publicado o acórdão, começa a fluir o prazo para recursos processuais. Transitado em julgado, inicia-se a execução do acórdão. 
Os votos vencedores lastrearam-se nas provas. A defesa reclamou da abundância de provas e do pouco tempo para examiná-las. Como há réu preso, o prazo não podia ser dilatado. Interessante notar, nas sessões, as posturas dos ministros Moraes e Fux: pareciam disputar a autoria do voto mais longo e erudito. Fux venceu. Ele realizou formidável ginástica cerebrina para absolver os réus: considerações iniciais, premissas teóricas, questões preliminares, pletora de citações doutrinárias e jurisprudenciais, inexistência de prova da autoria dos delitos (?!?!), divagações e 14 horas para concluir o seu voto divergente. 
Serenidade mandada às favas. Moraes assemelhava-se a um guerreiro do MP e Fux a um guerreiro da advocacia. Durante a dosimetria, Fux retornava ao seu voto, numa insistência intempestiva. Deixou a impressão de que ele queria mostrar empenho extraordinário para agradar ao líder da tentativa de golpe e ao presidente dos Estados Unidos, a fim de escapar às sanções da Lei Magnitsky. Interessante, também, a coincidência. Há alguns anos, ambos foram acusados de plágio por omissão da fonte. Fux, em obra de direito processual civil. Moraes, em obra de direito constitucional. A extrema direita também pode plagiar a frase do dólar americano, tal como fizeram os chicaneiros da operação lava-jato de Curitiba, atualizando-a: “In Fux, Fachin, Marques, Mendonça, We Trust”. 
Para preencher vagas no STF, o governo de esquerda nomeou Fux e Fachin. O governo de extrema direita nomeou Marques e Mendonça. No cargo, todos se posicionaram à direita. Isto, por si só, não significa desprimor ao cabedal ético, jurídico e cultural dos magistrados. Na democracia, a bipolaridade esquerda-direita é legítima, produto do evolver da civilização ocidental a partir da Assembleia Nacional Constituinte da França de julho de 1789 a setembro de 1791. [Os deputados conservadores ocupavam os assentos à direita e os deputados proressistas os assentos à esquerda do Plenário].    
Lamentáveis são as relações de ódio, violência, intolerância e rancor geradas nos extremos. Nos processos judiciais, o desprimor pode acontecer durante o exame dos casos concretos quando se infiltram pontualmente: amizade, cortesia, antipatia, esperteza enganosa, retribuição de favores, crença religiosa, afinidade política ideológica. 
Quando o juiz diz que o seu julgamento não será político e sim jurídico, acende-se a luz amarela. Vem à memória, os versos de Vinicius de Moraes: “aquele que diz sou, não é, pois quem é mesmo, não diz”. Parlamentares, chefes de governo e magistrados são agentes políticos que, nas democracias, exercem o poder do estado nos limites da Constituição. Na verdade, o juiz está a dizer: meu juízo é imparcial; não tenho lado nas disputas políticas partidárias. Entretanto, pode acontecer de o magistrado tergiversar valendo-se dos seus dotes intelectuais e culturais para atender compromissos extravagantes. Contudo, essa não é a regra. A honestidade, a juridicidade e o espírito de justiça são as regras. 
Fux cumpriu promessa anterior à sua nomeação para o STF. Com a autoconfiança que caracteriza o portador da faixa preta na arte marcial (jiu-jitsu), em atitude de quem espera receber voto de confiança, diz à presidente Rousseff que, a seguir, o nomeou: deixa comigo que “eu mato no peito”. Realmente, ele “matou no peito” a operação lava-jato e, agora, “matou no peito” o Caso Bolsonaro. Nos tribunais, a divergência entre os julgadores é normal e bem aceita. Todavia, essa normalidade não encampa a chicana, mesmo coberta com o verniz da erudição.    
As diferentes definições de democracia trazidas à colação nos votos dos ministros da 1ª Turma, merecem ponderação. A origem do vocábulo democracia é grega. Demo = povo + cratos = poder. Na polis ateniense, em certo período da história antiga, reconhecia-se a capacidade do povo para governar a si próprio dentro do seu território. No sentido estrito, povo era a parcela da população do sexo masculino e de certa idade, proprietária de bens, com direito ao sufrágio. Ante o declínio da monarquia na Europa moderna, as revoluções americana e francesa (1787 e 1789), com fulcro na liberdade, trouxeram à luz a democracia como forma de governo, deferindo o direito de sufrágio à parcela da população do sexo masculino, homens livres, alfabetizados e de certa idade. Nas democracias americanas e europeias do século XX, as mulheres adquiriram direito ao sufrágio e passaram a integrar o povo no sentido de corpo eleitoral. A vida privada (doméstica, social, econômica) compenetrou-se dos princípios democráticos. Com a revolução russa (1917), entra mais vigorosamente no conceito de democracia, o elemento ideológico. Democracia liberal nos estados capitalistas: prevalecem ideias de liberdade limitada pelo direito (burguês), igualdade formal e de propriedade privada. Democracia igualitária nos estados socialistas: prevalecem ideias de liberdade limitada pelo direito (proletário), igualdade material e de propriedade coletiva dos meios de produção. Nos dois modelos de estado democrático, a sociedade civil é a séde do poder. Os seus representantes são eleitos de forma direta e/ou indireta, conforme as regras vigentes em cada estado. 

Constituição da República Federativa do Brasil. Preâmbulo. Artigos 1º, p.u. + 2º + 5º caput + 102 caput. 
Código de Processo Penal. Artigos 381 + 387.
Lei 8.038/1990. Artigo 12, inciso II.
Regimento Interno do STF. Artigos 230 + 245.


segunda-feira, 8 de setembro de 2025

JUÍZO FINAL

Distinguem-se três operações básicas da inteligência humana: 
1. Apreensão das ideias que, na linguagem oral e escrita, se expressam mediante termos. Exemplos: terra, homem, tribunal, democracia. 
2. Formação de juízos que, na linguagem oral e escrita, se expressam mediante proposições afirmativas e negativas. Exemplos: João Francisco é capitão. João Francisco não é marinheiro. 
3. Inferência de proposições relacionadas entre si, denominadas premissas, das quais se extrai proposição denominada conclusão. Trata-se do raciocínio que, na linguagem oral e escrita, se expressa como argumento. Exemplo: Aquele que comete crime contra o estado deve ser punido; ora, João Francisco cometeu crime contra o estado; logo, João Francisco deve ser punido. 
No ato de pensar há conexão entre essas três operações sem necessária ordenação prévia. 
Juízo pode ser tomado nas acepções de: (i) faculdade mental (ii) capacidade intelectual de julgar (iii) expressão do que foi julgado (iv) opinião, parecer, sentença (v) administração de justiça civil, marcial, eclesiástica. 
O Novo Testamento, parte cristã da Bíblia, menciona o juízo final, derradeiro julgamento da humanidade por Jesus, o Cristo, no seu retorno à Terra, quando o mundo acabar. Trata-se de doutrina cristã elaborada por apóstolos de Jesus, virtual personagem bíblico de questionável existência real. Assemelha-se às fantasias do Antigo Testamento, parte hebraica da Bíblia, inventadas por Moisés. 
Nos tribunais civis também há juízos finais após esgotados os recursos processuais previstos nos códigos. Isto acontecerá no julgamento das ações penais propostas pelo Ministério Público (MP) em face dos autores dos crimes praticados contra o estado democrático de direito, cujos processos têm seus trâmites na 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) composta de 5 juízes. Se houver divergência entre os juízes, prevalecerão os votos da maioria (3x2; 4x1). O agente do MP, órgão de acusação, e os advogados dos acusados, sustentaram oral e longamente as suas pretensões na sessão de julgamento realizada na primeira semana de setembro/2025. Na ocasião, a defesa advertiu os juízes sobre: (i) não cometerem com o capitão Bolsonaro o erro que os juízes franceses cometeram com o capitão Dreyfus (ii) a falta de provas (iii) a semelhança carismática entre Bolsonaro e Che Guevara (iv) o esforço hercúleo de um dos réus para demover o então presidente da república, do propósito de utilizar medidas de exceção. A defesa esqueceu de citar os capitães (i) Prestes, herói da intentona comunista e (ii) Virgolino, rei do cangaço.    
Cabe aos juízes da 1ª Turma do STF, a partir da segunda semana de setembro/2025, verificar: (i) se os argumentos da acusação e da defesa estão em sintonia com o conteúdo da instrução processual (ii) se há provas idôneas. As provas podem ser apreciadas livremente pelos juízes, inclusive quanto à existência, pois, se inexistentes, os réus serão absolvidos; se existentes, os juízes verificarão a suficiência delas para sustentar juízo condenatório. Se constatada insuficiência, haverá juízo absolutório
Os juízes podem dar ao caso enquadramento legal distinto do que foi pleiteado pelas partes (CPP 384). Se não houver absolvição, os juízes podem dosar as penas aplicáveis ao caso concreto entre o mínimo e o máximo estabelecidos na lei penal. 
Os condenados por sentença penal transitada em julgado podem obter graça, gênero de favor ou clemência, concedida pelo legislador e/ou pelo chefe de estado. Trata-se de política criminal consubstanciada na anistia, no indulto, na comutação de pena, espécies da graça secular distinta da graça divina. 
Anistia significa esquecimento, livramento da culpa de quem cometeu crime, ato político de perdoar indivíduos ou grupos que praticaram crimes. As circunstâncias influem nas decisões tomadas pela autoridade governamental. "Eu sou eu e minhas circunstâncias" (Ortega Y Gasset). As circunstâncias indicarão se convém conceder a anistia, se o momento é oportuno, se o condenado a merece. Os motivos da concessão devem estar amparados na Moral e no Direito. 
No Brasil, a decisão sobre anistia compete ao Congresso Nacional = Câmara dos Deputados + Senado Federal, com a sanção do Presidente da República (CR 48, VIII). Legislar é atribuição do Congresso. Inobstante, o Congresso não pode votar leis incompatíveis com a Constituição. Tal como o poder de tributar, o poder de anistiar tem que ser exercido dentro dos limites éticos e jurídicos. Se o motivo da concessão não se afinar com as circunstâncias, a anistia concedida pode ser anulada pelo STF dentro do constitucional mecanismo de freios e contrapesos. Isto acontece, por exemplo, quando a anistia resulta da vontade e da ação de partidos da extrema direita, porque lhes falta legítimo interesse. Esses partidos padecem de anomalia congênita: são visceralmente antidemocráticos (CR 17, caput). Destarte, há de prevalecer o interesse nacional por valores de superior hierarquia: vida, liberdade, igualdade, democracia, soberania, situados acima dos interesses individuais e coletivos da comunidade criminosa que se pretende anistiar. Os registros desses partidos no Tribunal Superior Eleitoral devem ser anulados ante a inconstitucionalidade das suas ações e do seu existir no seio da nação brasileira.  
A concessão (i) de indulto = perdão da pena aplicada ao condenado (ii) de comutação de pena = troca do tipo de pena e/ou redução do seu quantum, nos limites da Moral e do Direito, compete privativamente ao Presidente da República (CR 84, XII + parágrafo único). 

quarta-feira, 3 de setembro de 2025

FUTEBOL

O treinador europeu contratado pela Confederação Brasileira de Futebol (CBF) convocou jogadores brasileiros para formar a equipe masculina que enfrentará as seleções do Chile no dia 4 e da Bolívia no dia 9 de setembro/2025. Craques ativos e consagrados ficaram fora da lista: Rodrygo, Vini, Coutinho, Dudu, Gabigol, Hulk, Lucas Moura, Thiago Silva. Os dois primeiros jogam na Espanha; os demais, no Brasil. Como noticiado pela imprensa, o selecionador pretende testar jogadores que ainda não conhece bem. Dos 24 jogadores da lista de convocados, 6 atuam no Brasil: Hugo Souza (goleiro do Corinthians), Vitinho (lateral do Botafogo), Jean Lucas (volante do Bahia), Fabricio Bruno e Kaio Jorge (zagueiro e atacante do Cruzeiro), Samuel Lino (atacante do Flamengo). Dos restantes, 17 jogam na Europa e 1 na Arábia Saudita. Essa preferência do selecionador indica certa cautela ante a proximidade dos jogos e o pouco tempo disponível para ampliar o seu conhecimento. Provavelmente, assim raciocinou: Os jogadores brasileiros no exterior não seriam contratados por clubes europeus e árabe se não exibissem nível técnico e desempenho acima da média; tê-los na seleção brasileira, portanto, significa boa aposta e boa chance de êxito. Ademais, eles estão sob comando de treinadores europeus. Isto facilita o meu trabalho como treinador também europeu.  
Depois de cumpridos os dois compromissos imediatos, haverá nova convocação. A lista de convocados será atualizada conforme o tempo disponível do selecionador para observação e estudo. No momento, embora trabalhe em ambiente cultural distinto do europeu, o treinador italiano parece incluir na sua análise, além da capacidade física e técnica dos jogadores, o critério comportamental, elemento ético influente nas relações internas, no desempenho em campo e na imagem da seleção. Mostra-se determinado a vencer a Copa/2026.
Quanto ao ambiente natural, a seleção brasileira enfrentará adversária invencível: a altitude boliviana. As adversárias humanas são vencíveis. Entretanto, o preconceito não é bom conselheiro. Nas seleções adversárias certamente estarão os melhores jogadores chilenos e bolivianos. Mui remota se afigura a possibilidade de a seleção brasileira fazer com elas o que o Flamengo, clube carioca, fez com o Vitória, clube baiano, em jogo do campeonato nacional: 8 x 0. Mais provável, algo semelhante ao jogo do Bahia, clube baiano, contra o Fluminense, clube carioca, nesse campeonato: 1 x 0. No mundo, sob aspecto técnico, o futebol sul-americano está entre os melhores. Portanto, o desdém é incompatível: (i) com essa realidade (ii) com o devido respeito entre os competidores (iii) com o espírito esportivo.  
A situação da seleção brasileira é cômoda, pois, já está classificada para disputar a Copa/2026. Eventual derrota ou empate agora não pesará na balança. O afeto do povo pela seleção neste século XXI está morno se comparado com a fervura no século XX. As novas gerações não vêem na seleção a “pátria de chuteiras” do período da ditadura militar (1964-1985). O perfil do craque brasileiro mudou de lá para cá. Ficou irreconhecível para os ainda vivos aficionados do esporte bretão daquela época. Ganhos e padrão de vida altíssimos, hipervalorização dos craques, conforto, mimo, salão de beleza; mercantilização, modernidade, derrotas acabrunhantes; tudo a contribuir para a evaporação do encanto.  
No que concerne aos treinadores no Brasil, nota-se invasão estrangeira. O sucesso do português que treina o Palmeiras provocou febre nos dirigentes dos outros clubes por treinadores portugueses. Trouxeram até um venezuelano português (nascido na Venezuela de pais portugueses). Durante 23 anos esse português venezuelano rodou por 12 clubes em vários países de distintos continentes, com média de permanência de 2 anos em cada clube, apimentada com desavenças e resultados pífios. O campeonato mundial de clubes de futebol masculino/2025 mostrou ao mundo esportivo que os treinadores brasileiros são tão bons quanto os treinadores portugueses. As derrotas das seleções brasileiras nas copas mundiais dos últimos 20 anos têm como causa diversos fatores e não só a qualificação profissional dos treinadores. Cabe lembrar que as seleções campeãs mundiais de 1958, 1962, 1970, 1994 e 2002, foram treinadas por brasileiros. 
Há treinadores brasileiros e portugueses com traços comuns: autoritarismo, arrogância, vaidade. Eles não suportam o brilho dos craques. Apagam as estrelas. Querem os holofotes voltados para si e mostrar ao público como eles são isonômicos, justos, inteligentes e capazes. Sempre acham ocasião para justificativas capengas a fim de manter na penumbra os craques que os sombreiam. Mal disfarçam o ciúme diante da consagração dos craques pelo público e pela imprensa esportiva. 
Esse tipo de treinador posta-se como estrela de maior grandeza. Os craques devem abdicar da personalidade própria e se comportar como planetas a girar submissos em torno do treinador. Esse tipo, seja português de Portugal, seja português da Venezuela, de Macau, de Moçambique, chega ao Brasil com a pose de rei da cocada preta, colonizador a constranger colonizado. 

domingo, 24 de agosto de 2025

O PROCESSO E O TEMPO

Movimento, força, essência, existência, espaço, tempo, são categorias condicionadoras do pensamento e da visão de mundo nas quais está imersa a ideia de processo com o significado geral de sequência de procedimentos ordenados a um fim. Há processos naturais como (i) geração, crescimento, maturidade e envelhecimento dos animais (ii) fotossíntese nas plantas verdes. Há processos culturais originários da inteligência, da vontade e do agir dos seres humanos, baseados na necessidade, na utilidade, no interesse. Trata-se do modus operandi pelo qual alimentos e bebidas são preparados; roupas e calçados são fabricados; remédios são elaborados; energia, armas, ferramentas, motores, computadores, são produzidos; casas, estradas, navios, aeronaves, são construídos; ensino e aprendizagem são organizados. Além desse processo social que inclui a produção artesanal, artística, tecnológica, científica, filosófica, religiosa, há também o processo político ramificado em legislativo (elaboração das leis), administrativo (funcionamento do governo) e judicial (solução de controvérsias à luz do direito).   
Entende-se por processo judicial "stricto sensu", o conjunto dos procedimentos em trâmites perante a autoridade judiciária provocado por vontade humana na busca de solução de questões de fato e de direito e/ou de reconhecimento da existência ou da inexistência de relações jurídicas. Implica tensão bipolar: autor no polo ativo versus réu no polo passivo. As partes devem ter legitimidade para agir perante o juiz/tribunal. Na esfera criminal, a legitimidade para propor ação penal pública é do Ministério Público (MP); para propor ação penal privada é do ofendido; para responde-las é do responsável pela ação delituosa. A provocação se dá mediante petição inicial dirigida ao juiz/tribunal denominada denúncia se a ação penal for pública e queixa se a ação penal for privada. A petição deve preencher requisitos estabelecidos na lei, inclusive o pedido de citação da parte contrária. Apresentada a resposta, abre-se ensejo para a parte autora se pronunciar. Exaurido o prazo, inicia-se a instrução: depoimentos das partes e das testemunhas, documentos, perícias. Concluída esta, vem a fase das diligências para esclarecimentos e, a seguir, as alegações finais das partes e  a sentença do juiz/tribunal. 
O tempo tem função relevante no direito. Coisa julgada, perempção, prescrição, decadência, são limites de tempo postos pelo legislador para as questões e os processos não se alongarem em demasia (não se "eternizarem"). 
No processo da ação penal pública os prazos são curtos se o indiciado ou réu estiver preso. A estreiteza do tempo justifica-se pelo apreço à liberdade erigida em direito humano fundamental. Extrapolados os curtos prazos para o inquérito policial estar pronto ou para o MP oferecer denúncia ou para a instrução processual ser concluída, o preso deve ser posto em liberdade por ordem do juiz/tribunal expedida de oficio ou por deferimento do pedido de habeas corpus. No tribunal, o MP, o assistente de acusação e o advogado do réu poderão fazer sustentações orais na sessão do julgamento. Os juízes votam na ordem ascendente (do mais novo no cargo ao mais antigo). Colhido o último voto, o presidente do tribunal proclama o resultado. Na hipótese de condenação, o juiz/tribunal aplicará penas dentro dos limites mínimo e máximo previstos na lei (dosimetria).  
Ao esforço institucional para dar eficácia aos preceitos constitucionais da razoável duração do processo e da celeridade de sua tramitação, opõe-se a praxe dos tribunais que retarda a marcha processual: o deferimento de pedidos de vista dos autos do processo feitos pelos juízes. Contam-se entre os motivos dessa chicana: amizade, cortesia, ideologia, afinidade religiosa, retribuição de favor. Contam-se entre as justificativas: doença do juiz, acúmulo de serviço, necessidade de mais detido exame da questão. Ao contrário do que pensa o vulgo, chicana (ardil, tramóia, trapaça) não é apanágio dos advogados. Fazem-na, também, os magistrados e os membros do MP, como singularmente evidenciado nos processos da denominada “operação lava-jato” da justiça federal de Curitiba/PR. 
A garantia do devido processo legal declarada na Constituição inclui não só o processo judicial como, também, o processo legislativo e o processo administrativo. Para elaborar a lei, por exemplo, o Congresso deve seguir os trâmites regimentais. Caso não o faça, a lei não terá validade. Para participar de um concurso público, o candidato deve preencher os requisitos expostos no edital. Caso não o faça, o seu pedido de inscrição será indeferido. Para se registrar no Tribunal Superior Eleitoral, o partido político deve preencher os requisitos exigidos pela Constituição. Caso não o faça, o seu pedido será negado. Aliás, mesmo formalizado, o registro de partido pode ser cassado por discrepância entre a estática (estatutos) e a dinâmica (ação política). Isto acontece com o Partido Liberal, cuja ação política está longe, muito longe (i) de resguardar a soberania nacional e o regime democrático (ii) de acatar o preceito constitucional que proíbe subordinação a governo estrangeiro. O poderoso chefão desse partido, patriarca da Família Bolsonaro, subordina-se, notória e publicamente, à bandeira e ao governo dos Estados Unidos. Esse partido caracteriza-se pelo nazifascismo evangélico revelado na contínua ação antidemocrática e no visível propósito de instituir governo autocrático. Aqui no Brasil, enquanto vigorar a Constituição da República de 1988, não é lícito a partido político algum (i) exercer o direito à liberdade para eliminar a liberdade (ii) utilizar os mecanismos da democracia para destruir a democracia.  

Constituição da República Federativa do Brasil. Artigos: 5º caput e incisos LIV, LXXVIII + 17 caput e inciso II + 93, inciso XII. 
Código Penal, artigo 32. 
Código de Processo Penal, artigo 387.


domingo, 17 de agosto de 2025

PUNIBILIDADE

A civilização resultou da experiência de milhões de anos de vida em grupo neste planeta para domesticar a fera humana. A domesticação ocorre no contínuo processo civilizatório desde o longínquo passado, quando as comunidades primitivas se organizam em cidades, até o presente, quando as nações se engalfinham em guerras com inovações tecnológicas e em batalhas nos campos das comunicações e das ideologias. Ante a vasta experiência social, os humanos se conscientizaram da conveniência de um comportamento coletivo ordenado, pacífico, preservador da vida e do patrimônio. Criaram regras que, no conjunto, formam o ordenamento social. Defrontaram-se com a necessidade de garantir a vigência e a eficácia dessas regras. 
A desobediência é uma das características do modus vivendi humano. Advém do anseio por liberdade absoluta. Embora a consciência coletiva facilite o respeito ao ordenamento, há sempre pessoas cujas condutas contrariam as convenções, os padrões artísticos, científicos, morais e jurídicos. Alguns avanços nas artes e nas ciências partiram da rebeldia contra o status quo. Célebres são os atrevimentos de Picasso na pintura, de Jorge Amado na literatura, de João Gilberto na música popular, de Nicolau Copérnico e de Galileu Galilei na astronomia. No que tange às regras jurídicas, se a desobediência não tiver o condão de instituir nova ordem válida e aceita pelo detentor do poder político (povo, grupo civil/militar, monarca, ditador) os desobedientes serão castigados. Por não aprovar violações, o estado utiliza medidas preventivas para evitá-las e repressivas para puni-las. A manutenção da ordem se dá (i) pela força moral da autoridade pública e consenso dos jurisdicionados (ii) pela garantia do devido processo jurídico (iii) pela força física. Todo violador do direito está sujeito a ser processado, condenado e punido, seja qual for o seu status social. Incide o princípio da igualdade de todos perante a lei, próprio do regime democrático.
Punir significa: (i) castigar (ii) aplicar pena a quem praticou alguma falta, algum pecado, algum crime (iii) restringir direitos de quem violou direitos de outrem. A punição aplicada pela autoridade privada (pai, mãe, empregador) ou pela autoridade pública (judiciária, administrativa) pode ser justa ou injusta, legal ou ilegal, comedida ou excessiva. Quando aplicada pelo juiz ao criminoso, a pena satisfaz a aspiração do povo a uma justiça concreta. Quando aplicada a um inocente, causa repulsa. No Brasil, as penas previstas são: prisão, multa, indenização, perda de bens e valores, prestação de serviços, interdição temporária de direitos, limitação de fim de semana. [Código Penal 32, 43].  
A paixão por justiça se manifesta individual e coletivamente, de modo equivocado ou não, no ambiente doméstico, nas ruas, nas assembleias, nos templos, nos tribunais. A massa popular vibrava de alegria com a morte das feiticeiras na fogueira, dos bandidos na forca, dos cristãos no Coliseu. A expectativa de punição acompanha o povo. Há permanente espera de algum castigo divino ou secular. “O que aqui se faz, aqui se paga” (Lei do Karma). // “Quem com ferro fere, com ferro será ferido. Olho por olho, dente por dente” (Lei do Talião). 
Os punidos podem ser pessoas físicas, pessoas jurídicas, nações. No curso da história, algumas guerras foram deflagradas por um estado a fim de punir outro estado. Das 3 guerras entre Cartago e Roma (264-146 a.C.), a terceira teve nítido propósito punitivo. Em outubro de 2001, os Estados Unidos (EUA) invadiram o Afeganistão com o propósito de castigar o governo Talibã pelo ataque, em 11 de setembro, às torres gêmeas e ao Pentágono.  
Porque ouviste a voz de tua mulher e comeste do fruto da árvore que eu te havia proibido comer, maldita seja a terra por tua causa. Tirarás dela com trabalhos penosos o teu sustento todos os dias de tua vida”. // “Assim fala o Senhor dos exércitos: Vou pedir contas a Amalec do que ele fez a Israel, opondo-se-lhe no caminho, quando saía do Egito. Vai, pois, fere Amalec e vota ao interdito tudo o que lhe pertence, sem nada poupar: matarás homens e mulheres, crianças e meninos de peito, bois e ovelhas, camelos e jumentos.” // “Quando fores com o teu adversário ao magistrado, faze o possível para entrar em acordo com ele pelo caminho, a fim de que ele te não arraste ao juiz, e o juiz te entregue ao executor, e o executor te ponha na prisão. Digo-te, não sairás dali, até pagares o último centavo”. // “Não matarás; mas quem matar será castigado pelo juízo do tribunal”. // “Do mesmo modo que julgardes, sereis também vós julgados e com a medida com que tiverdes medido, também vós sereis medido”. [Bíblia. AT. Gênesis 3: 17 + I Samuel 15: 2/3. NT. Lucas 12: 58/59 + Mateus 5: 21 e 7: 2].
A punibilidade é intrínseca ao sistema de segurança do estado. Trata-se da real probabilidade de alguém ser punido por conduta tipificada como ilícita. Supõe o conceito de responsabilidade. A partir da idade fixada na lei, a pessoa passa a ser responsável por suas ações e omissões. Quando os atos são criminosos, o agente deve responder por eles, deve ser judicialmente processado e sentenciado. O presidente dos EUA manifestou-se contra esse procedimento ético e jurídico ao exigir do supremo tribunal brasileiro a impunidade de réu acusado de cometer crimes gravíssimos. Segundo o artigo 107 do Código Penal brasileiro, as hipóteses de extinção da punibilidade são: (i) a morte do agente (ii) a anistia, a graça ou indulto (iii) a retroatividade da lei que não mais considera o fato como criminoso (iv) a prescrição, a decadência ou a perempção (v) a renúncia ao direito de queixa ou o perdão aceito, nos crimes de ação penal privada (vi) a retratação do agente ou o perdão judicial, nos casos permitidos por lei. Da vigente legislação, não consta extinção de punibilidade por ordem executiva do presidente dos EUA e nem, tampouco, por ordem apostólica do Papa.

domingo, 10 de agosto de 2025

PRISÃO

O ex-presidente do Brasil, patriarca da Família Bolsonaro, teve a sua prisão decretada pelo juiz relator do caso sub judice no Supremo Tribunal Federal (STF). Estribada nos artigos 312 e 319, do Código de Processo Penal e 21 do Regimento Interno, confirmada pela 1ª Turma, a decisão é consistente e adequada, amparada nos fatos e no direito. Entretanto, prolixa. Repetições desnecessárias. Mais parece tediosa postulação do que técnica e serena sentença judicial. 24 laudas! Bastavam duas. 
A Família Bolsonaro (pai e filho) está sendo acusada da prática dos crimes definidos nos artigos 344 e 359-L, do Código Penal e 2º, §1º, da Lei 12.850/2013: coação no curso do processo judicial, abolição violenta do estado democrático de direito, obstrução da investigação sobre organização criminosa. A Polícia Federal representou pela prisão. O juiz optou por aplicar medidas cautelares. Ao invés de cumprir, o patriarca tergiversou. O juiz, então, decretou a prisão domiciliar com fulcro na lei, em sintonia com os incisos LIV, LXI, LXIII, do artigo 5º, da Constituição da República (CR). 
Este episódio insere-se na batalha das forças democráticas contra as forças antidemocráticas no seio da nação brasileira. Nas eleições presidenciais de 2022, as forças democráticas obtiveram 60 milhões de votos; as forças antidemocráticas, 58 milhões. Nas eleições de 2026, esse quantitativo será diferente em consequência da agressão à soberania nacional feita pelo governo dos Estados Unidos com apoio da Família Bolsonaro e seus agregados. Nas eleições de 2022, as forças antidemocráticas colocaram seus representantes no Congresso Nacional. No Estado do Paraná, por exemplo, elas elegeram ex-juiz parcial, lavajatista, nazifascista e deficiente cultural, para ocupar cadeira no Senado. O menor número de participantes no movimento de domingo (03/08/2025) nas capitais do Rio de Janeiro e de São Paulo, comparado com movimentos anteriores, não significa, ipso facto, redução substancial do eleitorado da direita. 
Nazifascismo é corrente política de natureza autocrática e extensão internacional com raízes no nazismo alemão e no fascismo italiano da primeira metade do século XX. No Brasil, essa vertente penetra nas câmaras municipais, nas assembleias legislativas, na câmara dos deputados, no senado federal, nas prefeituras, no governo dos estados, no governo da república e nos tribunais. 
A fatia nazifascista da oposição ao governo federal insurge-se contra o STF. Pretende impunidade aos bandidos. Protesta contra o fato de uma dezena de juízes contrariar cinco centenas de parlamentares. No entanto, esta foi a vontade do legislador nacional constituinte ao organizar os poderes da república dentro do sistema de freios e contrapesos: 01 chefe de estado (presidente da república) x 11 juízes (supremo tribunal) x 531 representantes do povo (câmara dos deputados).    
No figurino ético, juiz não atua por volúpia. Quando as circunstâncias sociais e processuais permitem, o juiz ameniza a punição ou até substitui a prisão por restrições a outros direitos, como permite o artigo 44 do Código Penal. Subjetivamente, o juiz pode ter íntima satisfação por cumprir dever funcional no processo jurídico sob sua direção, quando afasta do convívio social pessoa cuja conduta criminosa se mostra nociva e/ou perigosa à sociedade e ao estado. 
Prisão significa privação da liberdade. O pássaro na gaiola. O peixe na rede. O tigre na jaula. O paciente no hospital. O motorista no engarrafamento. O amante no feitiço da amada. Na seara do Direito Penal, prisão significa perda da liberdade de quem praticou crime. Implica noções de culpa, de castigo e de segurança. No Brasil, a pessoa que não estiver in flagranti delicto, só pode ser presa mediante ordem escrita do juiz. O preso conserva os seus direitos e pode exercê-los enquanto compatíveis com o regime prisional a que estiver submetido ex vi legis. Assim, por exemplo, o preso tem o direito de: 1. Pensar, porém, a manifestação, a expressão e a comunicação do seu pensamento ficam sob controle da autoridade pública (censura oficial específica, individual, legítima e necessária). 2. Locomover-se, porém, dentro do espaço que lhe for reservado e pelo tempo que lhe for assinado pela autoridade judicial. 3. Transar sexualmente com a pessoa que o visita, porém, no dia, no horário e no local indicados pela autoridade administrativa.
A prisão penal não é folguedo liberal e democrático; tem caráter punitivo fundado nas ideias de (i) castigo a quem pratica delito e de (ii) segurança aos demais cidadãos.  
Democracia é forma de governo que: 1. Admite (i) pluralismo político (ii) igualdade de direitos (iii) liberdade de ser, ter e agir (iv) coexistência de opiniões contrárias. 2. Funciona segundo regras de direito postas pelo povo diretamente ou por seus representantes. 
No Brasil, o pluripartidarismo está condicionado ao respeito à soberania nacional e ao regime democrático (CR 17). Destarte, tendo em vista a essência antidemocrática da extrema direita, o seu partido não pode ser registrado no Tribunal Superior Eleitoral. Ainda que os estatutos do Partido Liberal declarem ser ele constituído de anjos amantes da democracia, o seu registro é inconstitucional por causa da notória atividade nazifascista desse partido. A tomada da Mesa da Câmara dos Deputados por essa malta no dia 06/08/2025, foi a mais recente demonstração da necessidade de cassar o registro desse partido e os mandatos eletivos dos seus filiados. A tomada da Praça dos 3 Poderes, no dia 08/01/2023, foi outro episódio típico da violência nazifascista. Os membros desse partido não respeitam: (i) o estado democrático de direito (ii) ordens judiciais (iii) resultado das urnas (iv) a vontade da maioria do povo (v) o patrimônio público (vi) o pluralismo religioso da nação brasileira (vii) a laicidade do estado brasileiro. Utilizam violência física e moral. Isto exige das forças democráticas resistência firme e permanente. Como dizia um político baiano do século XX: “O preço da liberdade é a eterna vigilância”. 

domingo, 3 de agosto de 2025

POLÍTICA & ECONOMIA

A atitude do presidente dos Estados Unidos da América (EUA) ao fixar tarifas a mercadorias exportadas pelo Brasil e aplicar sanções a juiz do Supremo Tribunal Federal (STF) merece o repúdio da nação brasileira. O bufão norte-americano dá ao presidente brasileiro e aos juízes do STF o mesmo tratamento reservado a persona non grata. Mais um modo de exibir simpatia e amizade ao criminoso governo de Israel.    
No plano dos fatos, o Ministério da Fazenda informa que o deficitário nas relações comerciais com os EUA tem sido o Brasil desde 2008. Portanto, não há base fática, ética e matemática para o aumento das tarifas. Por um lado, esse arbitrário aumento indica a preponderância do elemento político na decisão unilateral do agressor. Por outro lado, mostra a influência dos elementos econômico e social na política estatal. 
No plano das ideias, não é diferente. Desde que no século XX, o método interdisciplinar invadiu o mundo acadêmico, passou-se a considerar a conexão dos conhecimentos científicos da Política, da Economia, da Sociologia e do Direito, proporcionando uma visão holística do mundo da cultura [e também do mundo da natureza].  
Separar a superfície comercial do fundo político desta complexa questão tarifária, revela esperteza, mas não apuro científico, ético e patriótico. A soberania nacional está envolvida nessa questão. Negociar neste caso é sucumbir ante o agressor. A soberania é inegociável. À sua defesa em nível retórico devem corresponder ações concretas. 
A fim de aparentar juridicidade, o presidente dos EUA pretende justificar o seu proceder arbitrário e imoral estribando-se na “Lei Magnitsky”. Apesar do nome, não há magnificência alguma nessa lei. Votada pelo Congresso e sancionada pelo presidente dos EUA em 2012, brotou da obsessão desse país com a Rússia. Leva o nome de um advogado ucraniano, Sergei Magnitsky, que denunciou a existência de corrupção no governo russo. Ele foi processado e condenado por fraude fiscal. Morreu na prisão em 2008. Episódio semelhante ao do mafioso estadunidense Al Capone, processado e condenado por sonegação fiscal, preso em 1931, cumpriu parte da pena, solto por questão humanitária (doença grave), morreu em casa (1947). Os defensores de Sergei, aliados dos EUA, afirmam que ele não praticou crime algum. A Justiça Russa, após o devido processo legal, decidiu que o réu praticou o crime descrito na denúncia do Fiscal da Lei (Ministério Público). 
O propósito inicial da lei norte-americana era o de punir as autoridades russas que participaram do episódio Magnitsky. Todavia, no decorrer desses 13 anos de vigência, a lei teve ampliada a sua aplicação a fim de atingir autoridades de qualquer país acusadas: (i) de graves violações dos direitos humanos (ii) de práticas corruptas em grande escala. 
Considerando o vigor dos princípios da dignidade da pessoa humana, da cidadania, da soberania, da autodeterminação dos povos, da igualdade entre os estados, agasalhados pelo direito internacional e inscritos na Carta das Nações Unidas, cada estado tem a sua própria jurisdição sobre os seus cidadãos, as suas representações e instituições públicas e privadas. As decisões de um estado só poderão ser executadas em outro estado se entre eles houver tratado ou convenção. Portanto, imposições do governo dos EUA surtirão efeito no Brasil apenas se o governo brasileiro consentir. 
A reação do governo do Brasil à conduta injuriosa do governo dos EUA tanto pode ser explícita como implícita, alicerçada na Constituição da República, artigos: 1º, incisos I a III; 4º, I a V; 84, VII/VIII e XIX/XX; 85, II; 137 e 142. Com lucidez, coragem e atitude firme, a reação dar-se-á: 
1) Explicitamente, através de: I. Nota oficial do Presidente da República. II. Petição dirigida ao competente órgão administrativo dos EUA. III. Ação judicial anulatória proposta perante (i) tribunal dos EUA (ii) tribunal internacional. IV. Revisão unilateral de tarifas com base na lei de reciprocidade. 
2) Implicitamente, através de (i) atos sem publicidade contrários às sanções aplicadas pelo agressor (ii) busca de novas parcerias (iii) menosprezo ao agressor.
Todo estado compõe-se de 3 elementos estruturais: território, povo e governo. No Brasil, o governo se compõe de 3 órgãos de cúpula independentes e harmônicos entre si: Legislativo, Executivo e Judiciário. O STF é a cúpula do Judiciário. Ofendê-lo é ofender o Judiciário. Ofender o Judiciário é ofender o estado. A defesa do estado brasileiro compete ao Presidente da República, chefe de estado e chefe de governo, quer como diretor superior da administração pública federal, quer como comandante supremo das forças armadas.
A reação às ofensas dirigidas a juiz do STF pode ocorrer individual e coletivamente. Em nível individual, o juiz avalia se sepulta as ofensas na indiferença ou se as contesta. Se contestá-las, poderá utilizar as vias judicial e extrajudicial. Em nível coletivo, a contestação dar-se-á por solidariedade dos membros do Poder Judiciário, do Ministério Público, da Defensoria Pública, da Ordem dos Advogados do Brasil e dos corpos docente e discente das faculdades de direito. 
No caso em tela, não há sequer indício de violação dos direitos humanos pelo juiz. A acusação feita pelo presidente norte-americano é leviana. Ao tratar do caso das corporações norte-americanas big tech no Brasil, o juiz relator e o tribunal seguiram os trâmites do devido processo legal e aplicaram a Constituição e a legislação em vigor no Brasil. Liberdades absolutas são incompatíveis com a ordem jurídica vigente no Brasil. Aqui, tal como as demais liberdades, a liberdade de expressão é relativa e o seu exercício deve se conter nos limites da moral e do direito positivo constitucional e infraconstitucional.    
Leviana, também, a acusação daquele presidente de que o seu amigo, ex-presidente do Brasil, está sendo vítima de perseguição política pela Justiça Brasileira. O referido amigo conspirou contra o seu próprio país, tentou golpear o estado democrático de direito, além de praticar outros crimes provados e denunciados pelo Ministério Público.
Da conduta do presidente norte-americano extrai-se a máxima “inimigo do meu amigo meu inimigo é”, com a qual busca assegurar proteção aos aliados atuais e seduzir futuros aliados. A esse presidente pouco importa se os seus amigos são criminosos. Moralidade não faz parte do seu caráter.  

segunda-feira, 21 de julho de 2025

MAFIOSOS & CANGACEIROS

O comportamento da família Bolsonaro, desde que o seu patriarca assumiu a presidência da república em 2019, assemelha-se ao comportamento dos membros da máfia italiana e ao comportamento dos cangaceiros no Brasil. Tais comportamentos constituem a parte dinâmica dos grupos de homens associados para fins ilícitos. De um modo geral, esses grupos apresentam as seguintes características: (i) organização estribada em regras consuetudinárias que incluem código de honra, hierarquia e disciplina (ii) constituídos de parentes [pais, filhos, irmãos, primos, tios, sobrinhos] e agregados (iii) patrimônio privado valioso [fortunas em dinheiro e bens móveis, imóveis e semoventes] (iv) influência nos costumes políticos e sociais (v) pretensão de submeter a ordem pública aos seus valores e interesses privados.  
Família Corleone, ícone da máfia italiana, vulgarizada na literatura e no cinema, mostra a existência de grupos organizados para a prática de crimes, ramificações na América, rivalidade entre eles, disputa por territórios. Significado de máfia: organização criminosa. Significado de mafioso: homem criminoso membro da organização (chefe, gerente, executor). 
Família Ferreira, ícone do cangaço brasileiro, vulgarizada no cinema, na literatura, inclusive a de cordel, na tradição do sertão nordestino, tem o seu herói na pessoa do pernambucano Virgolino Ferreira da Silva, vulgo Lampião. Ele e o seu bando de cangaceiros armados com rifles, pistolas, facas e punhais, aterrorizaram e exploraram o povo nordestino (fazendeiros, comerciantes, pessoas da cidade e do campo, vereadores, prefeitos) durante os anos 1922 a 1938. Do governo, Lampião recebeu a patente de Capitão com a precípua missão de combater a Coluna Prestes e de matar o respectivo comandante líder do movimento comunista. Do povo, Lampião recebeu o título de Rei do Cangaço por suas virtudes e façanhas superiores a de todas as lideranças que o antecederam. O seu bando era integrado por seus irmãos mais velhos, primos e outros homens dedicados ao cangaço. 
Família Bolsonaro, ícone da criminalidade institucional no Brasil, destaca-se pela instrumentalização dos mecanismos e recursos do estado em proveito próprio. Caracteriza-se como organização criminosa baseada na hierarquia e na disciplina, sem estatutos escritos, integrada: (i) pelo pai e pelos filhos homens formando núcleo duro (ii) por agregados civis e militares. Do funcionamento dessa organização verifica-se o objetivo de assumir o comando do estado e instituir uma autocracia vinculada à seita cristã evangélica. O seu patrimônio inclui dinheiro e bens móveis e imóveis na posse direta e indireta dos seus dirigentes. A ação dos membros dessa organização revela: (i) religiosidade bíblica pseudo-evangélica impregnada de judaísmo, fanatismo e nazifascismo explícitos (ii) perversidade e ódio (iii) disposição para o uso de métodos violentos. 
O patriarca da Família Bolsonaro responde a processo criminal perante o Supremo Tribunal Federal (STF) sob as seguintes acusações: (i) tentar abolir o estado democrático de direito e depor o presidente da república (ii) organizar-se para fins criminosos (iii) causar danos ao patrimônio público. As provas produzidas durante a instrução processual evidenciaram a autoria e a materialidade dos delitos e a culpa do réu. Por isto, há enorme probabilidade de o STF condenar o réu a penas severas. 
A Família Bolsonaro buscou e obteve apoio do governo dos EUA. O presidente norte-americano atua como agregado da Família e cúmplice da delinquência. Ele pressiona o STF, cancela o visto dos juízes desse tribunal, ameaça o governo brasileiro com tarifas altas, exige a impunidade do delinquente. Ele não se dá conta da imoralidade do seu proceder e da antijuridicidade da sua intromissão nos assuntos internos da república brasileira.
Aliás, ante os comentários sobre a debilidade mental desse presidente, a Casa Branca publicou nas redes sociais mediáticas, o resultado do exame da saúde física do presidente. O público aguarda o exame da saúde mental do presidente norte-americano a ser feito, talvez, por junta médica idônea. Como o resultado deste exame pode alicerçar impeachment, a sua realização pode demorar ou até não ocorrer. 
Ante a provável condenação do patriarca da Família Bolsonaro no devido processo legal, os líderes da seita evangélica se movimentam para intimidar e desmoralizar os juízes, inclusive levando o rebanho de crentes para as ruas em sinal de protesto. Outrossim, o plano de fuga mesmo sem passaporte ficou transparente. Os fatos antecedentes apontam para isto. Se estivesse com o passaporte nas mãos, o réu já estaria nos EUA junto com um dos seus filhos e teria obtido asilo político indevido. Certamente, esta era a sua intenção quando ele se ofereceu para negociar pessoalmente com o presidente dos EUA a suspensão de sanções contra o estado brasileiro. Ao contrário de se intimidar e cair na astuta armadilha, o STF assegurou a sua jurisdição e determinou medidas preventivas: uso de tornozeleiras eletrônicas e restrições à comunicação do réu com outras pessoas, inclusive membros do núcleo duro da organização criminosa. Se a prisão preventiva fosse decretada não seria exagero, porém, poderia ser vista como precipitada execução de sentença ainda não prolatada.  

domingo, 13 de julho de 2025

POLÍTICA & DIREITO

No desempenho do seu cargo, o presidente dos Estados Unidos da América (EUA) mostra-se grosseiro, agressivo, irresponsável e desonesto. O seu discurso não merece resposta, eis que dito por um boçal. Acontece que esse boçal governa uma grande potência. Isto obriga os governos de outros países a lhe prestarem atenção e a se acautelarem contra bizarrias e fanfarronices que podem causar danos se eventualmente materializadas. 
A lata de lixo é o merecido destino das cartas que circulam nas redes sociais mediáticas. Embora sem validade jurídica por lhes faltar assinatura, as cartas recebem atenção da comunidade internacional porque a autoria é atribuída ao presidente norte-americano. Elas pressionam os meios políticos e econômicos e geram: (i) incertezas nos negócios de cada país (ii) ansiedade nos setores de exportação e importação (iii) atritos diplomáticos. 
A dimensão normativa e a dimensão axiológica do direito são os filamentos jurídicos da estrutura e do funcionamento do estado. Princípios e regras de direito componentes da civilização ocidental vigoram nos países integrantes dessa família cultural (direito romano + direito germânico). A dimensão normativa do direito inclui os requisitos de validade e de invalidade dos atos praticados individual e coletivamente no seio da nação e nas relações internacionais. Ato unilateral de vontade não tem validade jurídica se não estiver assinado pelo autor e por testemunhas idôneas, na forma da lei. A validade do documento exige (i) que o seu autor seja mentalmente capaz (ii) que o seu objeto seja lícito (iii) que o motivo e os fins sejam lícitos do ponto de vista moral e jurídico. As cartas cuja autoria é atribuída ao presidente norte-americano não preenchem tais requisitos.       
No mesmo diapasão das cartas estão as tarifas anunciadas pelo presidente norte-americano. No vigor da democracia, a criação das tarifas e as suas alterações devem obedecer ao devido processo nos âmbitos legislativo e executivo. Sem este pressuposto, elas não terão valor jurídico. As tarifas devem estar previstas em lei. O aumento ou a redução delas deve constar de ato oficial do chefe de governo publicado na forma da lei. Prescindir desse cuidado é mergulhar no estado de fato característico da ditadura. As tarifas ventiladas pelo presidente pairam no ar como vontade pessoal de intimidar. Bufonaria de um mentecapto.  
No Brasil, por exemplo, o anúncio do presidente da república de que vai modificar alíquota de imposto não tem validade jurídica. Serve apenas para alertar os contribuintes. Entretanto, quando alicerçado na Constituição da República e na lei, o presidente publica decreto sobre essa matéria, a nova alíquota torna-se válida e exigível, incorporada à ordem jurídica do estado. 
Se o teor das cartas for confirmado por ato oficial do presidente norte-americano publicado na forma da lei, consolidar-se-á, então, jurídica e validamente, a vontade governamental documentada. Com o selo do salão oval, ficarão oficialmente comprovados: (i) o atentado contra a soberania do estado brasileiro (ii) a difamação das instituições brasileiras (iii) a intromissão atrevida e injuriosa nos assuntos internos do Brasil (iv) a ofensa ao Supremo Tribunal Federal (STF).
Destarte, o presidente norte-americano estará falando – não em nome pessoal – mas em nome do governo dos EUA. Sem procuração e sem inscrição na Ordem dos Advogados, ao defender réu acusado de cometer vários crimes, esse presidente se colocou na posição de cúmplice. Isto não é novidade. O governo estadunidense é useiro e vezeiro na prática delituosa como autor, como co-autor e como cúmplice. Servem de exemplos: 1. A co-autoria e a cumplicidade nos crimes praticados pelo governo de Israel (genocídio, assassinatos, prisões ilegais, esbulho, danos, espionagem). 2. A cumplicidade e a co-autoria nos crimes praticados por ditadores civis e militares em países da América Latina (golpes de estado, assassinatos, prisões ilegais, torturas, esbulho, danos, espionagem).  
Cabe ao tribunal brasileiro processar e julgar cidadão brasileiro pelos crimes políticos e pelos crimes comuns cometidos. Trata-se da persecutio criminis inerente ao combate à delinquência; perseguição legítima, necessária à segurança pública, dentro dos cânones do devido processo, segundo a ordem jurídica do estado. Longe, portanto, das levianas acusações feitas pelo bufão dos EUA. "Vergonhoso" não é submeter o réu a processo judicial e às penas estabelecidas na lei, dentro das garantias constitucionais, como faz a Justiça Brasileira nos períodos democráticos da história do Brasil. Vergonhoso é o estado ser chefiado por um sujeito doidivanas.   
Dizer que o réu no processo penal em trâmites no STF é "líder respeitado em todo o mundo", significa menosprezar a inteligência e a consciência dos povos contemporâneos. O réu talvez seja respeitado pelos membros das facções nazistas dos EUA (Texas à frente), de Israel (Tel Aviv à frente), da Alemanha (Berlim à frente) e do Brasil (Santa Catarina à frente). Contudo, perante a porção democrática do povo, esse réu é visto como estúpido candidato a ditador. 
Cabe lembrar que o atual presidente dos EUA tem conduta nazifascista, pretensão imperialista e intenção de recuperar a perdida hegemonia do seu país. Ele vê a aliança BRICS como barreira. Irritou-se e “perdeu a paciência” com o governo brasileiro por reunir a cúpula da BRICS no Rio de Janeiro. Ele não gostou de ver inimigos no seu quintal. Apelou para o terrorismo político e comercial. Guiou-se pela equação [arma + dinheiro = poder] e pela anacrônica doutrina Monroe: A América para os americanos (anglo-saxões brancos do Norte). Hodiernamente, essa doutrina está desossada. O vocábulo americano ganhou ampla extensão, abrangendo todos os nascidos nas Américas [Sul + Centro + Norte]. Eficaz intercâmbio econômico e cultural intensificou-se entre os países do continente americano e os países dos continentes africano, asiático e europeu. Os preconceitos de origem, raça, cor e sexo, arrefeceram.    

domingo, 6 de julho de 2025

JUSTIÇA TRIBUTÁRIA

No episódio em andamento no Brasil sobre matéria tributária, defrontam-se dois titãs do estado democrático: Poder Legislativo x Poder Executivo. Este, baixou decreto alterando alíquota do imposto sobre operações financeiras (IOF). Aquele, numa clara declaração de guerra, baixou decreto suspendendo o decreto do presidente da república. Inconformado, o Executivo (governo stricto sensu) recorreu ao Poder Judiciário mediante ação de constitucionalidade protocolada no Supremo Tribunal Federal (STF). O ministro desse tribunal, relator do processo, suspendeu liminarmente a eficácia dos dois decretos e intimou agentes dos dois poderes para audiência prévia de conciliação.  
O legislador constituinte brasileiro foi categórico: Todo o poder emana do povo que o exerce por meio de representantes eleitos. São poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. [Constituição da República Federativa do Brasil (CR), artigo 1º, parágrafo único + artigo 2º]. 
Nota-se, desde logo, no citado episódio, a ruptura desse princípio estrutural da república. Harmonia se opõe a conflito. Discordância entre os poderes da república democrática é compreensível. Todavia, ela deve ser resolvida dentro dos parâmetros constitucionais. O legislador constituinte nacional instituiu um estado de direito. Portanto, divergências entre os poderes devem ser resolvidas no devido processo jurídico. Este pode ser: [1] Extrajudicial, trato direto entre os poderes na seara política e administrativa [2] Judicial, ação processual adequada em trâmites pelo Poder Judiciário.
O fulcro da divergência neste caso concreto gira em torno da alíquota do tributo (IOF). A lei que instituiu o imposto não foi impugnada (8.894/1994). A sua constitucionalidade, pois, não está sendo discutida e sim a dos decretos presidencial e legislativo. 
Ao discordar do decreto presidencial sobre alteração de alíquota, cabia ao Legislativo entender-se direta e pacificamente com o Executivo, ou, então, recorrer ao STF para solucionar a controvérsia. Está em jogo a exclusividade da competência constitucional do presidente da república para alterar alíquotas (CR 153, §1º). Ao exercer função judicante neste episódio, o Legislativo abusou do seu poder político. 
Na ação de constitucionalidade proposta pelo Executivo, o STF verificará se o decreto presidencial atende as condições e os limites estabelecidos na lei para as alíquotas. Se a resposta do tribunal for positiva, o decreto presidencial será mantido no ordenamento jurídico do estado. Se a resposta for negativa, o decreto será anulado.
Servindo-se do poder moderador comum aos três poderes da república, inerente ao constitucional sistema de freios e contrapesos, cabe ao Judiciário, neste episódio, buscar a solução razoável. O ministro relator seguiu esse caminho ao suspender liminarmente a eficácia dos decretos até que o tribunal resolva o mérito da questão. O ministro serviu-se do poder cautelar próprio do juiz da causa tão logo a conheça no devido processo. Desde que proposta a ação principal, o exercício do poder jurisdicional de cautela independe de pedido específico. Depende apenas do discernimento e da sensibilidade do magistrado ao examinar prima facie o aspecto substancial da demanda, sem emitir juízo sobre a procedência ou a improcedência da pretensão deduzida pelo autor.     
O procedimento prévio de conciliação tão logo proposta a ação judicial, integra a processualística brasileira. Abrange as esferas administrativa, cível e penal. Daí o acerto da decisão liminar do ministro relator. Trata-se de discórdia entre poderes quando a CR exige harmonia. A busca de solução consensual neste caso não tem exclusivo caráter político. Cuida-se também de exigência jurídica processual.      
O decreto do Executivo objetiva obtenção de receita a ser aplicada em fins sociais. Beneficia a massa popular. O decreto do Legislativo tem por fim impedir a eficácia do decreto presidencial e preservar o status quo. Beneficia a elite econômica. Trata-se de batalha no campo político entre a esquerda e a direita, tensão no seio da sociedade entre a minoria possuidora de um patrimônio muito além do que lhe é necessário e útil e a maioria possuidora de um patrimônio muito aquém do que lhe é necessário e útil. 
O decreto do Executivo apresenta-se como esforço oficial para reduzir essa desigualdade. Sintoniza-se com os objetivos fundamentais da república brasileira (CR 3º, I a IV).       

terça-feira, 1 de julho de 2025

GUERRA & PAZ

A ordem da colocação das palavras no título deste artigo pode ser questionada. A paz, vista como o estado natural das relações humanas, devia preceder a guerra vista como exceção. No entanto, a colocação pode ser invertida sem prejuízo algum ao entendimento. A guerra é tão natural quanto a paz. 
No mundo da natureza, os animais irracionais lutam por seu território, pela sobrevivência, por domínio no interior do grupo, por defesa no exterior diante de outros grupos. Nesse âmbito, a guerra é comum e natural. 
No mundo da cultura, os animais racionais, armados ou não, lutam ofensiva e defensivamente por suas ideias, por seus valores, por seus interesses, por suas paixões, por seus bens, por suas instituições. Nesse mundo criado pelos humanos, paz significa ausência de conflito, sublime aspiração brotada do instinto angelical da natureza humana. Guerra significa presença de conflito, impulso brotado do instinto demoníaco da natureza humana. O direito, produto da cultura lato sensu, coloca a paz na categoria do lícito e a guerra na categoria do ilícito
No plano internacional, guerra consiste numa persistente sequência de agressões armadas, intencionais e recíprocas, entre duas ou mais nações. A guerra tem sido tratada como: (i) intervenção armada necessária ao restabelecimento da paz e da segurança internacionais (ii) forma de punir estados autores de crimes (iii) meio violento, mas tolerável, de solucionar litígios (iv) santa, quando tem por principal motivo (embora não o único) implantar, manter e preservar com primazia determinada religião (monoteísta, politeísta, cristã, islâmica).   
O Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas pode, por exemplo, ordenar intervenção armada em Israel a fim de extirpar o nazismo judeu. Não haverá paz e segurança no Oriente enquanto não houver desarmamento dos estados. Caso Israel se recuse a se desarmar, então, a paz e a segurança dependerão da paridade de armas, o que exigirá do Irã e dos outros estados a urgente e necessária produção de energia nuclear e de bombas atômicas. Temor recíproco a uma catástrofe nuclear, paridade de armas, certeza de reação contra estado violador do direito, são fatores que ajudam a garantir a paz e a segurança das nações.
As guerras da Rússia x Ucrânia e de Israel + Estados Unidos (EUA) x Irã, geraram um clima de beligerância no planeta. As diplomacias dos EUA e da China pretendem espaços estratégicos para seus países em solo brasileiro, o que é preocupante, ainda mais em tempo de guerra. Convém ao povo ficar atento e mobilizado para defender a soberania territorial do Brasil. 
Os EUA pretendem instalar bases militares em solo brasileiro (aeroporto de Fernando de Noronha e base aérea de Natal) o quê, nesta conjuntura internacional, representa potencial perigo à soberania nacional e à vida de civis. Assim como o Irã bombardeou as bases militares americanas do Catar e do Barein em represália ao criminoso ataque dos EUA, instalações militares americanas em território brasileiro também podem ser alvo das hostilidades.
A má conduta dos beligerantes nessas guerras teve como efeito jurídico a tácita  revogação dos tratados internacionais sobre a fabricação, estocagem e uso de armas convencionais e de armas nucleares. Os EUA devem indenizar o Irã pelos danos dolosamente causados.   
Ad cautelam, o governo brasileiro não deve admitir em seu território bases militares de país algum. Cabe lembrar que na área setentrional do Brasil situa-se a região amazônica cobiçada pelos EUA, o que não recomenda o assentamento das forças armadas daquele país, ainda que seja temporário como referido no inciso XXII, do artigo 84, da Constituição da República. 
O governo estadunidense alega ter direito histórico de retorno à ilha e à cidade onde outrora manteve bases militares para fins estratégicos durante a segunda guerra mundial e a guerra fria. Esse direito existe como história e não como normatividade positiva, vigente e eficaz no plano político e jurídico da atualidade. A guerra quente terminou em 1945; a guerra fria, em 1980. Portanto, o arrendamento perdeu a sua razão de ser, o seu vigor e a sua eficácia, há mais de 40 anos. Com a saída do inquilino da casa alugada, o contrato de locação se extingue e o proprietário recupera a posse direta do imóvel. O retorno do ex-inquilino deve ser objeto de novo contrato se isto for do interesse do proprietário do imóvel. O caso em tela enquadra-se neste exemplo. Se for da conveniência e do interesse do Brasil, o arrendamento das mencionadas áreas do território nacional poderá ser objeto de novo tratado. Incide a cláusula “rebus sic stantibus” = estando assim as coisas. Se as coisas do passado que justificaram o tratado (ou contrato) deixaram de existir, os direitos e obrigações delas emergentes extinguiram-se ipso facto et pleno jure. Com o fim da segunda guerra mundial e da guerra fria as avenças perderam a fonte, o sentido e a vigência. 
Atualmente, a realidade política e jurídica não é a mesma do passado. O Brasil tem outros e novos compromissos incompatíveis com o retrocesso. A participação efetiva do Brasil na aliança BRICS constitui um dos empecilhos à celebração de tratado (ou contrato) de arrendamento do terreno com o belicoso governo estadunidense.
A China solicita, para fins pacíficos, acesso ao Centro Espacial de Alcântara (Maranhão). Até o momento, parece não existir óbice político, ético e jurídico ao governo brasileiro para, mediante tratado (ou contrato), atender ao pedido do governo chinês.